quinta-feira, 28 de setembro de 2006

SMS 177. A questão do suborno

28 Setembro 2006

A OCDE, em Outubro, envia a Portugal uma missão para avaliar o que as autoridades portuguesas têm feito no combate ao suborno, especialmente em matéria de grande corrupção em mercados internacionais, estando na mira o suborno de titulares de cargos públicos em negócios de nível internacional, autarcas incluídos. Ora, com muito respeito pela OCDE e mais respeito ainda pela Convenção Anti-Suborno que Portugal ratificou em 1997, o problema não será tanto o de ver ou de consultar papelada sobre o que as autoridades públicas do Estado Português (do mais importante Ministério à mais recôndita Câmara Municipal) fizeram ou dizem ter feito no combate ao suborno, mas sim o de verificar se alguma vez o Estado soube ou quis combater o suborno, impedir o suborno, acabar com o suborno – do grande ao pequeno, a começar sobretudo pelo grande e não pelo pequeno que de vez em quando tem servido apenas para dar mostras de haver combate e não mais. Naturalmente que o suborno a sério, o grande – então na imobiliária! – por natureza e por garantia de eficácia, tem as características do segredo de Estado, e quando faz parte da cultura do Estado confunde-se com o próprio segredo de Estado ou faz-se passar, aos olhos do cidadão normal, como segredo de Estado quando só e apenas é cancro do Estado, a doença mais incurável do Estado. Todos os dias vamos sabendo de histórias que, contadas obviamente à boca calada, não chegam aos ouvidos da OCDE. Se no Algarve fosse criada uma linha verde anti-suborno, não direi que os telefones entupiriam mas muita gente autárquica e dos serviços do Estado ficaria entre o amarelo e o azul, as cores que dão no verde...

Carlos Albino

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Flagrante contraste: O orgulhoso, impante e empresarial Farense de há uns anos, e o humilhante, cabisbaixo e mercearesco Farense de agora.

quinta-feira, 21 de setembro de 2006

SMS 176. O género de Câmaras que temos

21 Setembro 2006

Ficou-se a saber que a esmagadora maioria das câmaras municipais do País não respondem aos e-mails dos munícipes, e igualmente se tomou conhecimento de que por entre as câmaras relativamente mais bem comportadas nessa matéria não consta nenhuma do Algarve. Não espanta. É claro que, no caso das mensagens serem dirigidas a serviços municipais, a culpa ou a responsabilidade directa não será, à partida, dos presidentes ou dos vereadores eleitos mas dos assessores entalados por mordomia e dos funcionários, de alguns funcionários ou do algum género de funcionários – os chamados de costas quentes - que a administração local sempre teve emblematicamente e que acabam por determinar o género de Câmaras que temos. O mal, de resto, vem de cima – à excepção explicável do Ministério das Finanças, mais concretamente dos departamentos ligados aos impostos, quase nenhum responde a correio electrónico justificado que não provenha dos ministérios pares ou de instituições acima. No caso do Algarve, é verdade que não há câmara que não faça gala de uma página de autopromoção na internet nem mesmo junta de freguesia que não disponha de endereço electrónico. Mas, caro leitor, tente escrever expondo dúvidas, pedindo uma informação, apresentando uma reclamação ou formulando uma sugestão, que receberá a resposta na eternidade. A cunha e o tráfico de influências, isso, é rápido.

Carlos Albino
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Flagrante contraste: A interdição do funcionamento nocturno do heliporto do Hospital de Faro antes de uma morte, e o pedido para a permissão e a permissão dada para o funcionamento apenas depois da mesma morte.

quinta-feira, 14 de setembro de 2006

SMS 175. Estádio do Algarve sem escadote

14 Setembro 2006

As recentes histórias sobre o heliporto feito à toa no Hospital de Faro e sobre o deboche do Estádio do Algarve são apenas dois maus presságios para esta região porque são sinais de políticas de improviso, sem seriedade e aprumo. Mas a do Estádio do Algarve, apesar de não ter sido tão trágica como a do heliporto em part-time do hospital, é o cúmulo – as redes de uma das balizas com um buraco que obrigou a atraso do primeiro jogo oficial da época (com multa para o clube anfitrião), o relvado do campo numa lástima, o placar electrónico paralisado (é preciso pagar horas extraordinárias ao presumível técnico que não se sabe o que fará durante a quinzena), as bancadas sujas e imundas de uma ponta a outra... Para o conserto das redes valeu a perícia de um voluntário das bancadas embora a tarefa mais difícil tivesse sido a de encontrar um escadote naquele estádio que nasceu com o lema «Construímos vitórias» mas que a continuar assim poderá morrer com o epitáfio «Apenas não vencemos as mordomias». Nem vale a pena gastar mais espaço com delongas: a administração do empreendimento, das duas uma – ou explica bem as coisas deste deboche ou deve demitir-se por falta de escadote. O circo chinês foi há muito.

Carlos Albino
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Flagrante contraste: As cartas de condução «compradas» por tuta e meia pelos imigrantes na Ucrânia e em Cabo Verde, e o rigor das brigadas da GNR nos cruzamentos estratégicos.

quinta-feira, 7 de setembro de 2006

SMS 174. Uma provocação inútil

7 Setembro 2006

O ministro do Ambiente, Nunes Correia, teve a infeliz ideia de ter sugerido em Aljezur que o financiamento da Barragem de Odelouca – vital para a Região – venha a ser conseguido através da factura da água que os algarvios consomem. E avançou com o peregrino argumento de que «é justo que sejam os cidadãos beneficiários a pagar o custo». Por certo, o ministro Nunes Correia deve ser mais um a ter uma noção de Algarve construída a partir das vivendas dos nossos conhecidos amigos com duplas piscinas e relvados à beira mar, ou aquela que Sampaio tinha e que pouco mais excedia que o perímetro dos campos de golfe acrescido do peito condecorável dos respectivos proprietários. A ideia de Nunes Correia não só foi infeliz, mas também por várias razões – todas elas políticas – foi uma provocação inútil aos Algarvios do Algarve e não tanto aos Algarvios sem papéis. É claro que Mendes Bota, líder do PSD, contra-atacou e, com razão e até fundamento, desafiou o ministro a que as receitas fiscais que o Estado arrecada no Algarve fiquem na região, caso o Governo aplique esse princípio de que quem quiser obras que as financie. Na verdade, Mendes Bota tocou num dos pontos essenciais da regionalização – o destino e uso das receitas fiscais obtidas no Algarve e das quais a região beneficia uma parte ínfima, a conta-gotas e muitas vezes tarde e a más horas. Gostaria de ter ouvido Miguel Freitas, líder do PS, a dizer alguma coisa sobre esta infeliz ideia, mas até agora não ouvi nada. Deve estar já em Bruxelas.

Carlos Albino
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Flagrante contraste: A memória que devíamos ter e o inofensivo sericoté do Hino do Algarve nada referir dos Descobrimentos, do saber náutico. Gil Eanes não vai perdoar a Macário Correia este hino que é um hino do Sotavento...

quinta-feira, 31 de agosto de 2006

SMS 173. A política está sem fôlego

31 Agosto 2006

Embora os políticos algarvios que por aí foram surgindo não tenham tido grande golpe de asa, o certo é que de vez em quando tinham ou simulavam ter fôlego, gritando como se exige a bons funcionários de partido. Agora nem isso, pois vociferar dois ou três pensamentos profundos retirados de algum livro que ninguém descobre ou supostamente conhecerá, não é o mesmo que gritar. Os nossos deputados, sobretudo os líderes partidários regionais que apenas chefiam, lá vão aguentando cada um o seu barco muito pianinho, os presidentes das câmaras à cautela não levantam muitas ondas e até os das juntas de freguesia, sobretudo ex-electricistas falhados e ex-mecânicos de oficinas falidas, já imitam aquele antigo Presidente da República que sabia como ninguém que no calar é que está o ganho. Toda esta gente em que a democracia faz acreditar, fogem como o gato da água a falar do Desenvolvimento, da Educação, da Cultura, da Segurança, da Saúde, da Administração Pública (estatal e autárquica), da Imigração, fugindo sobretudo a falar da Política para o que preciso ter preparação, quadro mental e, obviamente, o fôlego que advém da autoridade moral, do prestígio ético e da sabedoria política. E nessa arte da fuga, grudam nos discursos altíssimas preocupações com o corriqueiro, com o sericoté, com a trivialidade e com a conjugação do tal verbo Eu – eu Eu, eu Tu, eu Ele eu Nós... Dizia Lautréamont que todo o figo come o seu burro.

Carlos Albino
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Flagrante contraste: A grossa e porca poluição nas praias de Vale de Lobo e a atribuição de «responsabilidades» às límpidas águas das chuvas quando copiosamente vão pela Ribeira de Carcavai a qual, pelos vistos, terá um r a mais.

quinta-feira, 24 de agosto de 2006

SMS 172. Isto não augura nada de bom

24 Agosto 2006

O ambiente não é deveras famoso: o incumprimento sistemático da lei por alguns que julgam ter o rei na barriga, pois em terra de cegos o zarolho é rei; a onda de falta de civismo que varre a sociedade de alto a baixo, sendo até já de mau tom invocar essa horrível palavra do civismo porque da civilidade nem se fala; o egocentrismo impante que se tornou regra nas relações humanas; o desvirtuamento da política ou a transformação da política praticamente na correria aos bons empregos ou na luta por um emprego político melhor, com a secundarização do interesse geral e do bem-comum numa só cajadada; o horror paulatinamente consolidado ao escrutínio dos cargos públicos, sendo até já de mau tom questionar comportamentos espúrios ou pôr em causa decisões, mesmo as que, à evidência, denotam total falta de ética – o que é isso, a ética?; o que se sabe do funcionamento por dentro das câmaras e de alguns serviços do Estado, mas que ninguém ousa ou quer revelar tim-tim por tim-tim por receio fundado de represálias ou porque já fez a outros o mesmo, ou ainda pior; os campeões supostamente endinheirados que vêm de fora e no Algarve se instalam com muletas escondidas, concitando o respeito geral expondo como boa a lei da selva; a cultura popular que por aí há e bem financiada, mas que é contra o povo, recoberta já daquela erudição das papas e bolos com que se enganam os tolos; por aí fora... Isto não augura nada de bom, não digo o naufrágio, mas qualquer coisa próxima do pior da Sicília. Oxalá me engane.

Carlos Albino
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Flagrante contraste: a Região Metropolitana ainda à espera do hino e da letra posta a concurso público por Macário, e a tanta música que se dá no Algarve e aos Algarvios

quinta-feira, 17 de agosto de 2006

SMS 171. Dois casos de polícia

17 Agosto

Primeiro caso: o espavento dos cassetetes. É hábito antigo – vou àquela estação de serviço comprar jornais, encher o depósito do carro, trocar as bilhas de gás e, como é ponto de encontro de quem vai ou vem, há sempre dois dedos de conversa num encontro inesperado de Agosto. É verdade que, por esta época, a discoteca em frente, onde o fim da madrugada equivale à manhã alta do comum dos mortais, despeja o inacreditável para as bermas do cruzamento daí lavando as mãos ou pensando que lava as mãos. É igualmente verdade que a autoridade policial também há muito sabe que o desacato é, naquelas bandas, uma rotina diária, pelo que a mais elementar das regras da ordem pública sugeriria, para ali, uma prevenção constante em vez da repressão à última hora. Mas não – ao espectáculo da visível degradação humana estampada nos rostos dos que saem da discoteca, volta e meia soma-se o espectáculo da degradação da segurança, o espavento circense de suposta força a dissimular a fraqueza do sistema de prevenção que, desde logo, deveria atacar as causas pela raiz como em todo o mundo civilizado onde há discotecas desta espécie e produtos deste género, se faz. Esta semana presenciei o simultâneo desses dois espectáculos degradantes, cada um vivendo do outro. Uns cinco ou seis rapazes filhos da noite, perante larga assistência de primos-irmãos da mesma confusão entre madrugadas e manhãs, embalados pelo produto interno bruto da sua longa madrugada, tentaram fazer o que todas as manhãs fazem – uma detestável prova de vida através do desacato e da provocação. Perante isto, desceram-se as grades de ferro da estação de serviço, a porta encerrou-se transformando aquilo numa jaula, alertou-se a autoridade, chega um carro patrulha, chega outro em sentido contrário, mais outro em contra-mão com brusca travagem e ligando a sirene para afastar quem estava no bom sentido, outro ainda mais e por fim um jeep certamente preparado para transportar delinquentes. E eis como um bom número de agentes empertigados de bastões no ar perante meia-dúzia de rapazolas cuja heroicidade precária se esgota em enfrentar a autoridade fardada – porque, na ausência de prevenção, é isso o que apenas querem, julgando-se nivelar – transformam amiúde aquele pacífico e afável ponto de encontro numa faixa de Gaza.

Segundo caso: Valentina Calixto. Em nome do chamado Plano de Ordenamento da Orla Costeira, expirado um prazo de dez dias no dia 7, marcou-se para fosse executada à noite, ou pela calada da noite, a demolição de quatro apoios de praia em Quarteira. Para já, não se percebe porque é que o Estado, pessoa de bem e que não tem propriamente alma de vagabundo, tenha que executar essa boa acção pela calada da noite e não à luz do dia. Depois, muito menos se percebe que a vice-presidente da CCDR, Valentina Calixto, perante o fracasso dessa operação secreta, tenha comentado que «a acção revelou-se mais complicada do que se esperava» porquanto, disse ainda, «o empreiteiro não deu garantias de desenvolver o trabalho durante a noite»... Esta obsessão de executar demolições legais à noite e com os directamente implicados a dormir, é que choca – não é humano e só pode partir de quem tem do ambiente uma daquelas noções que mais contribuem para o aquecimento global . E choca porque a lei é lei, e sendo lei, é legível durante o dia mas torna-se ilegível quando tenha que ser executada apenas pela calada da noite por um empreiteiro que «dê garantias» de apenas fazer «o trabalho» como polícia nocturno. E mais ilegível se torna quando as próprias autoridades marítimas tomaram posições para essa guerra esconsa, sabendo-se afinal que a Capitania de que dependem, emitiu e cobrou licenças válidas até 30 de Setembro, pelo menos para um dos apoios na mira. Mas, deixando a Capitania com as suas licenças, suponhamos que uma dúzia, duas dúzias de chalés, sobretudo os que, a partir de apoios semelhantes aos de praia ou pouco mais do que isso, se ergueram na Ria Formosa, que não cumprem o POOC ou que um POCC a sério deveria tornar ilegais, um dia destes são demolidos pela calada da noite por um empreiteiro que «dê garantias de desenvolver o trabalho». Claro que chocará «um trabalho» desses durante a noite ou que apenas tenha que ser feito à noite, e, como diria Valentina Calixto numa ironia ao ambiente, «a acção revelar-se-á mais complicada do que se esperava». Fiquemos por aqui.

Carlos Albino
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Flagrante contraste: o barulho de José Vitorino e o silêncio de José Apolinário.

quinta-feira, 10 de agosto de 2006

SMS 170. A doença infantil das auditorias

10 Agosto

Bem nos recordamos de como antes de cada ciclo de eleições locais e quem quer ganhar anuncia, exige e promete sob honra auditorias às contas municipais. O anúncio é feito de forma a sugerir graves prevaricações, a exigência é descrita com argumentação vaga cuja explicitação é remetida para momento oportuno e a promessa é, com alguma sabedoria, transformada em prato forte da captação dos votos daqueles que são sensíveis à moralidade nas coisas públicas. A auditoria é assim tratada como que poção mágica para sufrágios renhidos, a tal ponto que quem está no poder, iluminado pelo velho princípio do quem não deve não teme, já se vê na obrigação de anunciar auditorias à sua própria gestão, antes que o adversário que lhe ambiciona a cadeira tome a iniciativa em primeiro lugar.

Se por acaso uma oposição passa ao poder, a primeira conferência de imprensa festiva e o primeiro comunicado são dedicados à reclamadíssima auditoria, mas, depois, passam os meses, largos meses, meses mais do que suficientes para pôr o preto no branco e o assunto é deixado cair – e então como o Verão Algarvio facilita os esquecimentos! E se também por acaso quem estava no poder não o perdeu, a tal auto-auditoria igualmente vai caindo no conveniente esquecimento, pois quem perdeu, por tradição que não deixa de ser esquisita, bate com a porta, vai à vida e declara-se desiludido com a política. Mas o que é mais espantoso é que na hipótese de ter havido auditoria mesmo e a sério, a investigação de contas, decisões e procedimentos não tenha afinal revelado qualquer resultado escandaloso, ilícito de monta ou crime manifesto como as suspeitas sugeridas ou as invocadas honras pessoais iniciais – conforme os casos - levavam a presumir.

Ora, assim, a política não é jogo limpo.

Carlos Albino

quinta-feira, 3 de agosto de 2006

SMS 169. Estratégias é que não faltam

3 Agosto 2006

Aí temos em discussão pública a proposta para um Plano Regional de Ordenamento do Território do Algarve cuja sigla (PROTAL) a maior parte conhece mais do que o conteúdo, sabendo a maior parte também que, independentemente dos resultados, a totalidade do desordenamento consumado fica legitimada. De qualquer forma, talvez para descargo de consciência dos poderes públicos que tentaram a concertação possível para não se estragar mais o que já está definitivamente estragado ficando, no caso, prejudicados os que a tempo não beneficiaram do regabofe, de 14 de Agosto até final de Novembro aí temos a bendita discussão pública no âmbito da qual, todos e cada um tem a oportunidade de julgar ou até de se autoconvencer que vai salvar o mundo. Depois disto, a proposta, que é uma larva, metamorfosear-se-á no plano propriamente dito, o insecto que, aprovado em Conselho de Ministros, ficará apto a pôr de novo ovos dando origem ás futuras e previsíveis larvas em terrenos propícios para a continuação da espécie – o terreno da estrutura regional de valorização e protecção ambiental, o terreno das regras de concretização dos investimentos estruturantes e o terreno da protecção do litoral, para enumerar os terrenos principais de que larvas e insectos tanto gostam.

É claro que este PROTAL não é uma estratégia do Algarve, é apenas uma táctica de Máximo Divisor Comum entre as muitas estratégias que há no Algarve, algumas contraditórias entre si – estratégias da imobiliária, estratégias da hotelaria, estratégias dos ecologistas (que no Algarve aparecem sempre em casamentos do monte), estratégias dos autarcas (alguns dos quais surgem tão rapidamente no poder como águias reais como rapidamente passam a linces na oposição), e, claro, na lista de muitas mais estratégias não faltam as estratégias dos xicos-espertos tanto os que conservam todo o dinheiro junto do coração como aqueles que, directamente ou por interpostas pessoas e empresas, jogam com o dinheiro inimaginável que manobram em paraísos fiscais. Portanto, estratégias há muitas e se o PROTAL multiplicar por setenta a burocracia que já existe - como tudo leva a crer que vai acontecer -, vão ver como a impunidade reinará, sem apelo nem agravo. Não vendam tácticas por estratégias.

Carlos Albino

quinta-feira, 27 de julho de 2006

SMS 168. Cheios de razão e de motivos

27 julho 2006

As gentes de Vila do Bispo protestam contra o abandono da Fortaleza de Sagres e do Forte de Santa Catarina e insurgem-se contra o facto do Farol de Sagres estar encerrado. Os protestos têm, obviamente, o endereço do IPPAR que tutela e gere o segundo lugar mais visitado do País, arrecadando receitas que não reinveste naqueles monumentos. Pois os de Vila do Bispo, estão cheios de razões e motivos.

Para não falar do mamarracho que se permitiu, o IPPAR tem normalmente olhado para Sagres de soslaio e, nessa atitude, não está só, porquanto o estranho desprezo e o desleixo escrutinador com que a Comissão Nacional da UNESCO tratou do processo de candidatura do Promontório a Património Mundial chocaram os espíritos atentos mas inconformados face aos que sabem tudo. Parece até que alguém teme que em Sagres se possa identificar com segurança algo de incomparável mas que, em função daquele soslaio, desprezo e desleixo, anda entre a boa embora escassa informação e a lenda.

Claro que o decisor em última análise do IPPAR, no seu gabinete em Lisboa, e a ministra da Cultura, no alto do Palácio da Ajuda, não são nem podem ser fiscais directos e no terreno do que se passa com o património e com a cultura no Algarve – para tanto dispõem no Algarve de extensões, o Ministério tem uma Delegação Regional e o IPPAR conta com uma Direcção, igualmente de nome, Regional.

Mas não direi mais do que o seguinte: quanto à Delegação do Ministério, tenho saudades de João Ventura nesse posto, do seu entusiasmo, dos seus conhecimentos, melhor, da sua constante procura de conhecimentos, e quanto à Direcção a conversa acabou quando verifiquei que não valia a pena, nem valendo a pena recordar. E sendo assim junto-me aos de Vila do Bispo nos seus protestos e nas suas razões.

De facto, nesta matéria, justifica-se uma «mexida regional».

Carlos Albino

quinta-feira, 20 de julho de 2006

SMS 167. Inadmissível

20 Julho 2006

A forma como, sem supervisão adequada e sem fiscalização preventiva (aqui é que bate o ponto), se permitiu a descarga de seis toneladas de lamas de esgotos em terrenos xistosos, na cabeceira de uma das linhas de água do Caldeirão a verter para a barragem de Odeleite e a escassas centenas de metros dos furos municipais que abastecem as populações da Cortelha, Barranco do Velho e Vale Maria Dias, é inadmissível. Com o calor, foi o cheiro nauseabundo, além de que, como se sabe, as moscas não pedem licença à Direcção Regional da Agricultura nem os mosquitos solicitam parecer à CCDR. Sabe-se que idêntica falta de respeito e ausência do mais elementar civismo ocorreu igualmente em São Bartolomeu de Messines. Inadmissível também, desconhecendo-se se os «autos de notícia» levantados para os dois casos, começam, terminam ou têm lá pelo meio a transcrição da tal quadra de Aleixo que, obviamente recebeu antes da DGA e da CCDR nascerem, o parecer favorável do povo algarvio:

Uma mosca sem valor
poisa c’o a mesma alegria
na careca de um doutor
como em qualquer porcaria.


É claro que episódios como estes chamam à memória a saga da construção do aterro sanitário do Sotavento, precisamente naquela mesma Cortelha, em área da proclamadíssima Rede Natura, saga que ao fim e ao cabo foi um «negócio político» assinado com a mesma alegria com que a mosca sem valor pousa nesta inadmissível política feita com as lamas dos esgotos da burocracia. Negócio político anti-natura que é, forma uma rede, uma rede anti-natura.

É por estas e outras razões e motivos que se deveria passar a designar proeminentes ecologistas por egologistas – ou peritos na ciência do eu. Porque servem o eu. Perderam a consciência e o bom cheiro da origem etimológica daquele eco (do grego oíkos, casa) e nesse eu que é a sua alegre casinha, o bicho homem conta menos que a mosca - mesmo que o bicho homem esteja em extinção na Serra do Caldeirão, pelos vistos com parecer favorável e licenciamento aprovado desde que se cubra o bicho no prazo de 48 horas como a burocracia determina para as lamas.

Carlos Albino

quinta-feira, 13 de julho de 2006

SMS 166. Ambiente escaldante

13 Julho 2006

No momento em que os fundos comunitários para o Algarve, até 2013, vão quase pela certa sofrer um corte de 75 a 80 por cento (a região, por assim dizer, terá de se contentar com 254 milhões de euros por, à luz fria das estatísticas, estar a sair artificialmente do chamado «objectivo de convergência»), pois é neste momento que o Plano Regional de Ordenamento do Território entra em discussão pública, com cada um a puxar para ao seu lado, o pequeno e já delido lençol algarvio.

As câmaras estão divididas procurando algumas, sem grande autoridade moral em matéria de ambiente, acautelar os quintais costeiros que restam; os investidores ameaçam, e, como se o capital financeiro tivesse sede na região e beneficiasse directamente o Algarve, só agora reclamam por «regras claras no turismo» quando nestes últimos 20, 30 ou 40 anos, nenhuma clareza reclamaram para os processos de financiamento e de recuperação; e como se tudo isso não bastasse, lá surgem uns quantos com ar melífero mas para quem a defesa do ambiente se esgota em malandramente acariciar um imaginário lince ou a cheirar tomilho, enquanto não conquistam algum bem remunerado posto de consultor ambiental, calando-se depois, cada um à sua vez.

Sem dúvida que o problema ambiental do Algarve é grave, atrever-me-ei a afirmar que, em termos de segurança, de bem-estar colectivo e de identidade, este será até o mais grave dos problemas que o Algarve enfrentou ao longo da sua velha história, porquanto, hoje o Algarve dos Algarvios não teme apenas um Remexido, que até era de mau tom e pior aspecto, mas teme, sim, umas boas dezenas de Remexidos, todos eles com muito bom tom e melhor aspecto apesar dos indisfarçáveis tiques próprios dos salteadores.

De facto, não sou eu que digo agora – tem sido voz corrente nos últimos anos que «o Algarve está ao assalto». Quem tiver dúvidas, que olhe para aquelas falésias de Albufeira ou mesmo para muito do que já foi domínio público marítimo.

Carlos Albino

quinta-feira, 6 de julho de 2006

SMS 165. Manuel da Luz Afonso, louletano

6 Julho 2006

Vem a propósito: o seleccionador dos célebres Magriços, Manuel da Luz Afonso, era de Loulé, terra que tem dado ao País políticos, engenheiros, literatos e militares de nomeada. No desporto, anos a fio, esse louletano tem sido uma referência incontornável, mas, até agora, a sua terra não lhe fez a homenagem adequada e devida. Creio que nenhum dos Magriços sobreviventes recusaria estar em Loulé para uma evocação condigna, designadamente Simões e Eusébio.

Na verdade, vendo o panorama, Manuel da Luz Afonso foi a personalidade ímpar louletana que mais se notabilizou na área desportiva, pelo seu carácter firme, digno e correcto, pelos seus testados conhecimentos e pelos insofismáveis feitos. Ele fez uma escola que galvanizou gerações de desportistas.

Não sei, então, porque é que Loulé espera para dar o nome de Manuel da Luz Afonso ao belo Pavilhão Desportivo da cidade.

Seruca Emídio tem a palavra para que Loulé salde de vez a dívida. Uma grande dívida. Pelo meu lado, gostaria de chegar ao fim daquela avenida e ler em letras de gente agradecida – Pavilhão Manuel da Luz Afonso, seleccionador dos Magriços. E já agora, porque há dinheiro para tanta criancice, não me repugnaria ver, num recanto arrelvado, um grupo escultórico com o Manuel da Luz Afonso de braço erguido, com os 11 Magriços cada um na posição de campo… Eusébio e Simões, de certeza, fariam de Loulé paragem obrigatória. Estou para ver.

Carlos Albino

quinta-feira, 29 de junho de 2006

SMS 164. A Ex.ma Sr.ª Dona Corrupção…

29 Junho 2006

Depois do que foi revelado pelo coordenador da investigação da criminalidade económica da PJ/Coimbra, Nuno Maurício que, no Centro de Estudos Judiciários, afirmou que um terço dos inquéritos sobre corrupção tem as câmaras municipais como alvo e que, ficando-se a saber que entre 2002 e 2005, dos 6.976 inquéritos abertos envolvendo crimes económicos e financeiros, os da corrupção somaram 1.251, bem!, depois disto nem se percebe tanta polémica à volta do lugar da Igreja Católica no Protocolo de Estado, a que se segue a presente disputa entre os conselheiros do Tribunal Constitucional e os do Supremo Tribunal de Justiça, cada um a não querer ficar atrás do outro na fila de precedências do mesmo protocolo, como se a honra de entrar primeiro fosse o principal problema da honra do Estado. A Ex.ma Sr.ª Dona Corrupção, ao que se sabe, nunca se preocupou com o seu lugar no Protocolo, mas, a avaliar a gravidade das advertências de Nuno Maurício, um quadro superior da Polícia Judiciária, ela está de pedra e cal na lista de precedências do Estado e com a consciência tranquila, porquanto essa tão poderosa quanto benemérita senhora que, numa democracia saudável apenas viveria quando muito com um estatuto de meretriz reformada, sabe que os inquéritos que contra si movem, na maior parte, são arquivados ou geridos até calculada prescrição, por mais que Nuno Maurício e outros que não são poucos, fiquem a protestar contra o à vontade dos «infractores de luxo».

Advertindo que a corrupção é uma «séria ameaça aos pilares da democracia e ao próprio progresso social e económico», Nuno Maurício não especificou quais as regiões do País onde aqueles 1.251 inquéritos tiveram cenário, quantos, por exemplo, foram abertos no Algarve e destes, quantos resultaram em acusação e quantos descansam em paz no arquivamento. Em todo o caso, lembrando ele que a Ex.ma Sr.ª vende o seu corpo à custa de meios de pressão ilegítimos para obter determinado resultado que, segundo um processo natural, não seria porventura conseguido, não é difícil a cada um dos nossos leitores olhar à sua volta e verificar se na sua rua, na sua terra ou na área do seu Município não haverá uma acompanhante dessas que, como todas as acompanhantes no activo, garante o maior sigilo e apartamento privado se calhar em turismo rural, ganhando pela calada da noite aquilo que com grande espavento mas sem justificação aparente à excepção do decote, exibe à luz do dia.

Carlos Albino

quinta-feira, 22 de junho de 2006

SMS 163. Cônsules honorários…

22 Junho 2006

Ou pelo turismo, ou pela mão-de-obra, ou por negócios (uns claros, outros nem tanto…), ou por exigências de serviço a comunidades estrangeiras aqui radicadas, ou ainda por um bom número de razões insondáveis, o certo é que se registou em Portugal um boom de cônsules honorários. No Algarve, ao certo, ninguém sabe quantos eles são, quem exactamente são eles, como operam e onde estão os escritórios consulares. Pelas Páginas Amarelas, que não são propriamente uma folha oficial, os cônsules honorários no Algarve serão sete e, destes sete apenas um se revela com nome e rosto - o cônsul alemão, Michael Bruno Bach, com representação sedeada em Faro, cidade que alberga mais três escritórios consulares (Holanda, México e Canadá), havendo um outro em Almancil/Loulé (o da Suécia), mais um em Portimão (Cabo Verde) e outro ainda em Vila Real de Santo António (Espanha). Para além das Páginas Amarelas, a informação que é de interesse público é escassa ou nenhuma – o Ministério dos Negócios Estrangeiros é tradicionalmente omisso na matéria, o mesmo acontecendo com o Ministério da Administração Interna e com as antenas institucionais do Governo nos distritos como são os Governos Civis. Ainda no caso do Algarve, esperar-se-ia que a RTA colocasse no seu site oficial (excelente, diga-se) a listagem de consulados e cônsules, mas nem isso. Restará outro caminho, o das embaixadas acreditadas em Lisboa, mas também por aí a informação peca, e basta citar o caso da missão diplomática do Brasil que nem refere a existência de um suposto cônsul honorário brasileiro no Algarve que apenas se lobriga através do site particular da Casa do Brasil, como passando os seus dias no Apartado 1084 em Vilamoura… Ora, um cônsul num apartado, mesmo sendo honorário, perde a honra.

Estou em crer que haverá no Algarve mais do que os sete cônsules das Páginas Amarelas, seis dos quais sem nome público e em endereços descaracterizados – serão agências de viagem? Escritórios de advogados? Empresas de construção civil ou imobiliárias? Não fica claro.

Não é preciso gastar muito espaço a explicar porquê, mas é já o momento do Governo Civil ao menos por uns motivos, mas também a RTA por outras evidentes razões, publicarem directórios completos e oficiais dos consulados honorários no Algarve, onde fique patente quem é quem e onde opera, porque o assunto é mais sério do que à primeira vista parece. Não há decreto que obrigue mas há motivos que aconselham.
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P.S.: Claro que lemos o relatório da Universidade do Algarve sobre Faro/Capital da Cultura. Uma conclusão útil: há no Algarve 42 opinion leaders!


Carlos Albino

quinta-feira, 15 de junho de 2006

SMS 162. A integração dos imigrantes

15 Junho 2006

Não há, no Algarve, uma política ou políticas de integração dos imigrantes que, no conjunto, formam já uma apreciável faixa da população residente e que vive à margem, à excepção do que a força de trabalho faz supor. Os municípios não estimulam a criação de associações próprias e abertas dessas comunidades nacionais (algumas indecorosamente sem qualquer apoio também dos Estados de origem) e são raras as iniciativas que visem dar a conhecer a cultura da comunidade que as acolhe e as vias e valores de participação no muito que, no dia a dia, acabam por ter em comum.

Fora o trabalho, é um viver de costas voltadas uns para uns outros quando a verdade é que a cada esquina todos dão de cara uns nos outros. Claro que a integração não é fazer de cada ucraniano um português, de cada romeno um algarvio, de cada cabo-verdiano um quarteirense ou de cada moldavo um vereador da Câmara de Faro. Nada disso! A integração é a descoberta das responsabilidades de quem abre as portas e de quem por elas entra; é a partilha do que pode e deve ser partilhado para que não se corra o risco da formação de guetos; é o sistema de tácita vigilância para que o bem-comum se mantenha bem-comum e não capa protectora dos marginais que se organizam dentro das margens postergadas; é o apoio jurídico, social e cultural a quem optou por viver entre nós ou entre nós tenta uma vida melhor com contrapartidas que, na maior parte dos casos, são duras, violentas e sem protecção de qualquer espécie. Os municípios, nestas matérias, têm deveres que não estão a assumir. E não é por falta de dinheiro, é por falta de sensibilidade e por ausência de vontade política. Assunto para continuar.

Carlos Albino

quinta-feira, 8 de junho de 2006

SMS 161. As contas do Parque

8 Junho 2006

A nomeação de Rogério Gomes para o comando do Parque das Cidades, foi, até ver, uma coisa sensata. O Parque das Cidades não foi inventado para se constituir em «terceiro município» ao lado de Faro e de Loulé e, ainda que de forma palpável a sua existência não vá além do Estádio, o parque encerra potencial – um potencial que depende em primeiro grau do nível de entendimento entre os dois municípios fundadores, e depois, naturalmente, da vontade política do governo que é a condição e a condicionante. Portanto, a gestão do Parque só por insensatez poderia ser entregue a um «politiqueiro falhado» que veria ali, sobre o antigo aterro, a oportunidade de vingar às mil maravilhas sucessivos fracassos de um super-ego trapalhão, sem consistência ideológica e sem seriedade, pois oportunidades não lhe faltariam para dar bordoada política ora a Faro hoje, ora a Loulé amanhã, ora à AMAL e à Junta Metropolitana uma vez por mês, ora ao Governo, e se calhar, à UE e até bordoada à ONU – sim, porque por megalomania haveria de se encontrar pretextos para responsabilizar Kofi Annan por não termos já ali, no Parque, o almejado Complexo Desportivo, o desejado Centro de Congressos, o reclamado Hospital Central, e, dentro daquilo que se delineou ser a área verde polivalente, um Jardim Botânico a sério e um Circuito de Manutenção que não seja para brincar!

Por outras palavras, o líder da empresa criada pela associação de municípios Loulé/Faro, poderia converter-se através de uma meia dúzia de conferências de imprensa, de uns oito comunicados e por um contrato com uma agência de comunicação, em personalidade mais importante que o presidente de Faro, o presidente de Loulé, qualquer presidente, sem que os problemas do Parque ficassem ou fossem deveras resolvidos. Sabemos como em muitas terras deste nosso Algarve se aprecia e até se estimula a luta de gladiadores, porquanto o nível de eficácia da discussão política parece depender, nessas mesmas terras, das espadeiradas e punhaladas mortais, da arte do golpe baixo e das prosas de franco-atiradores que obviamente não querem servir o Algarve mas tão só servirem-se a si próprios, valendo tudo até o arrancar olhos ao mais fiel amigo e matar a mãe. Até ver, a escolha de Rogério Gomes para liderar um projecto defensável – defensável e importante para todo o Algarve – afasta à partida aquele cenário daquela gente que faz política à custa do sangue derramado. O PSD conhece gente dessa e o PS conhece também essa gente.

Ora o que se espera, para já de Rogério Gomes? É simples: que, apesar o seu ordenado ter descido da categoria B1 para C1, faça o que até agora não foi feito – faça e torne públicas as contas do Parque – que ponha em dia os planos de actividades, os orçamentos e as contas anuais de gerência… Rogério Gomes é jurista, pelo que me garantem é pessoa séria e, portanto, sabe que sem transparência é impossível o ganho de causa.

Carlos Albino

quinta-feira, 1 de junho de 2006

SMS 160. O elefante incolor

1 Junho 2006

A Associação de Municípios Loulé/Faro, que é uma pessoa colectiva de direito público, gere, como se sabe o Estádio Algarve o qual, bem vistas as coisas, é um elefante branco e também a bandeira do chamado Parque das Cidades. Por sua vez, este Parque (225 hectares) foi atirado aos olhos da população como «um projecto estruturante para o Algarve» que iria albergar «importantes infra-estruturas complementares ao Estádio», enumerando-se um Complexo Desportivo, um Centro de Congressos e um Hospital Central. No pressuposto de que o elefante não iria ser branco por muito tempo mas colorido de promessas políticas, acrescentou-se ainda que o Parque iria dar guarida a um Jardim Botânico e a um Circuito de Manutenção, rematando-se as promessas com aquele fórmula que apenas engana algum analfabeto distraído que tenha entrado ilegalmente no Paraíso – a fórmula das «outras valências de carácter lúdico, desportivo e didáctico»… Creio que para este Parque e para esta Associação intermunicipal que possui um conselho de administração bem pago, muito bem pago para o que faz e pode fazer, chegou a hora da verdade, porque o elefante branco já é, pior será se vier a ser incolor. Diremos mais, na próxima semana. O que recentemente se passou à volta da escolha do «presidente do conselho» afinal do Parque, justifica mais umas linhas até porque o elefante é uma pessoa colectiva de direito público e não propriamente uma caixa de correio de mordomias.

Carlos Albino

quinta-feira, 25 de maio de 2006

SMS 159. Conferência regional de segurança

25 Maio 2006

Penso que não exagerei, na semana passada, com o alerta para a segurança e com os sublinhados para uma vigilância mais atenta, mais responsável, dissuasora e preventiva, com efectiva visibilidade e presença continuada das autoridades policiais em locais e corredores estratégicos. A GNR, onde não há PSP, não pode limitar-se com razões de sobra a fazer o expediente das vítimas; a PSP, onde a GNR a não substitui, não pode converter-se com fundados motivos em vítima sistemática do expediente; as restantes autoridades (polícias de investigação e de imigração) não podem comprazer-se apenas com os resultados de operações esporádicas por mais evidente que seja o êxito e a tonelagem do crime perseguido; e os Municípios, os 16 em conjunto e cada um por seu lado, não podem continuar a assobiar para o lado nesta matéria da segurança.

É impensável, por exemplo, que a GNR no Algarve obedeça a três ou quatro comandos diversos se não é que não são longínquos e que nada têm a ver com Algarve e com os problemas especiais do Algarve, conforme o caso, desmotivando quem, sendo militar, está a postos. É impensável que a PSP no caso peculiar e especialíssimo do Algarve que em metade do ano vê a sua população subir dos 400 mil e picos para mais de um milhão e meio, não esteja presente com organização, meios e recursos adequados em cada uma das cidades, grande parte das quais se atravessa, seja de dia seja de noite, sem se ver um agente à vista desarmada, com excepção para as braçadeiras da polícia de trânsito que só adianta o trânsito. Como também é impensável que os municípios, que há bem poucos anos deram mostras de febre securitária com a reivindicação de polícias municipais, agora se isentem da chamada de competências, da pressão política e das trancas à porta.

Naturalmente que não culpo as pessoas, a pessoa dos responsáveis, sejam agentes da administração ou eleitos. Culpo o sistema que está desadequado, desfasado e que, no caso do Algarve inesperado que temos, actua como se isto fosse o Alto Alentejo ou a Beira Litoral, que não é e está longe de ser, pois a segurança autónoma dos aldeamentos turísticos de porte não é a segurança do Algarve e dos Algarvios.

Por isso, julgo que seria oportuna a convocação de uma conferência regional de segurança envolvendo todas as partes implicadas (agentes políticos, da justiça e das polícias) e da qual saíssem pontos de situação credíveis, recomendações ao Governo e algum sinal para a população do Algarve, sobretudo a residente que, pelos factos e pela doutrina dos factos, está deveras indefesa e à mercê do acaso ou da sorte. Claro que o Governador Civil e o Presidente da Junta Metropolitana teriam ou terão uma palavra a dizer. Estou em crer que o Algarve em peso agradeceria tal palavra.

Carlos Albino

quinta-feira, 18 de maio de 2006

SMS 158. Prioridade à segurança

18 Maio 2006

Na última semana, para além de ter sido inusitadamente bombardeado com telefonemas, e-mails e conversas de café dando conta de diversos assaltos nas zonas rurais em redor de Loulé, roubos de monta em estabelecimentos comerciais das principais cidades do centro algarvio e descaradas actuações de delinquentes envolvendo negócios criminosos um pouco por toda a parte, então não é que eu próprio fui vítima? Primeiro, em plena tarde, foi um inacreditável assalto à minha residência numa das principais avenidas de Lisboa e, dois dias depois, dois brasileiros assaltaram-me à mão armada, na mesma zona. Não pelo que me aconteceu, mas por aquilo que está a vitimar todos os dias dezenas e dezenas de cidadãos, penso que chegou o momento para, de forma clara e inequívoca, todos reclamarmos por mais segurança, por esquemas preventivos e dissuasores mais eficazes das autoridades com funções policiais, por critérios mais sopesados por parte das autoridades da imigração e, sobretudo ou acima de tudo, poses sem lassidão dos decisores políticos que muitas vezes se comportam ou justificam medidas como se fossem membros de uma ONG ressabiada. É que há um género de anti-xenofobia que acaba por ser xenófona com todas as letras e que acaba por favorecer o pasto para incrementar a verdadeira e temível Xenofobia que ninguém que seja sério deseja ou quer ver nos seus dias.

Nada adianta a cada um dos responsáveis – desde políticos e polícias, a tribunais e agentes de imigração – descartar culpas para cima dos ombros de cada um dos outros, deixando o cidadão atónito perante este jogo de lavar de mãos que pode garantir sucesso para abertura de telejornais e manchetes de tablóides, mas que não passa, tal jogo, de manifestações secundárias de adolescentes tardios da democracia. Igualmente nada adianta jogos de estatística, de percentagens ou de comparações com outros países e outras regiões, quando a insegurança é um facto e, além disso, quando a criminalidade se revela cada vez mais violenta e executada por gente, essa sim, sem dúvida, xenófoba, impiedosa e desumana.

Carlos Albino

quinta-feira, 11 de maio de 2006

SMS 157. Direitos adquiridos

11 Maio 2006

«Diga lá! O ké ke kéri?» - foram estas as primeiras palavras que a funcionária, bem aperaltada e com ares de mestrado em prepotência municipal, me dirigiu, além disso espetando o dedo como bico de pita na minha inicial tentativa de dizer boa tarde, pelo que apenas disse boa e engoli a tarde. E estava eu mastigando em silêncio aquele venenoso formulário de atendimento público, quando a funcionária volta à carga, fazendo subir a voz como o clarinete de Paderne a disfarçar a fífia - «Vá! O ké ke kéri? Diga lá!». Claro que perante esta ordem municipal para eu dizer , disse imitando tanto quanto possível o contra-baixo da banda de Portimão e retirei-me sem tratar do caso. É que não tenho mesmo nenhuma paciência para aturar estes plebiscitos de duas pernas que se sentam nas repartições públicas como direitos adquiridos e que degolam qualquer educação cívica e qualquer instrução pública. Disseram-me depois que aquele plebiscito está ali apenas por ser afilhada de um padrinho, e se aqui trato deste caso de mordomia poluída sem nome e sem local, é porque também me disseram que o caso é mais geral no Algarve do que eu antes supunha e que não ocorre apenas com bicos de pita, enfim sempre são pitas, mas que se repetem com árvores de maior porte que a desconcentração e descentralização por aqui planta...

Carlos Albino

quinta-feira, 4 de maio de 2006

SMS 156. Nem a Mãe Soberana entende

4 Abril 2006

Ali, no alto daquele monte, a vez não é dos políticos, nem dos actores, nem dos animadores de tertúlias, nem dos homens ricos por serem ricos, nem dos pobres encartados por serem pobres e muito menos dos jornalistas. Ali, a digna vez é dos padres, é a vez de um padre que, de ano para ano, se costuma designar por «orador sagrado» e de cuja boca, também de ano para ano, se espera que diga palavras que de alguma forma sagrem a convivência humana e um raro momento em que os inimigos esquecem inimizades, os adversários enterram machados de guerra e os desconhecidos se tratam por conhecidos. Falo da Festa da Mãe Soberana que, em Loulé, leva em triunfo para o alto desse monte largos milhares de seres humanos numa feérica movimentação da qual, uma vez acabada, apenas resta uma coisa que é uma grande coisa – um momento raro de fraternidade humana. Pois, lá no alto do monte e pelas encostas do monte, misturam-se crentes convictos, ateus de conveniência, agnósticos por vários motivos (sendo eu um dos mais fracos motivos), mas também indiferentes por cultura, distraídos da vida arrastados, e pelo meio da amálgama uns quantos desesperados sem causas à espera de um sinal de esperança a que se mistura gente de sucesso para quem a vida tem sido um mar de rosas ou talvez mesmo um pântano de expedientes. O certo é que todos sobem, uns limitam-se a saudar com entusiasmo contagiante, outros acompanham mesmo a Mãe Soberana num exercício secular que apenas pode ter uma explicação que é uma grande explicação – um exercício raro de paz humana, além do mais transbordante de alegria. A isto não se chama espectáculo, chama-se fraternidade.

E mal anda o «orador sagrado» se não percebe isso, se não entende quem tem à frente e se pretende impor um discurso codificado, findo o qual toda a gente, à excepção do próprio, diz que falou muito bem mas não compreendeu rigorosamente nada, apesar da voz bem colocada e da frase bem construída a custa de códigos, tal alguns economistas usam para a crise económica sem nunca enunciarem claramente uma solução ou tal como alguns dentistas para ingloriamente explicarem ao paciente uma terrível dor de dentes não sendo esse o momento para teorias. Foi o que este ano aconteceu, porque há discursos «fraternos» que são contra a fraternidade – prática em que o fundamentalismo, qualquer fundamentalismo (então o islâmico!) é useiro e vezeiro. Pois o «orador» deste ano, vendo aqueles milhares de crânios, o que fez? Desfasado daquela entusiasmadíssima Festa de paz e sem compreender aquela alegre Festa de fraternidade, o «orador» como que descobriu a grande e irrepetível oportunidade histórica de derramar para aqueles crânios as coisas de peso do Antigo Testamento, do Novo Testamento e admito até que do Futuro Testamento, insistindo no filho morto quando todos, todos ali desde ateus a crentes e passando por agnósticos tementes, só vêem o filho vivo, e mais grave, fazendo incidir a oratória sagrada na Mãe Súbdita quando todos, todos desde desesperados a peritos em expedientes da vida só vêem a Mãe Soberana. É claro que, nestas circunstâncias, abandonei o mais rapidamente que pude o alto do monte, como nunca fiz. Ali, ninguém contesta e até todos desejam que a Igreja faça prova de vida o que não consegue com um sermão que nunca se sabe se é mais semelhante ao que no século XVIII antecedia o auto de fé ou se é repetição, ainda que vaga, do que se seguia à purificação dos condenados.

Loulé, melhor, a Festa da Mãe Soberana merece um «orador sagrado», mas um orador que sagre. De outra forma, nem a Mãe Soberana entende porque há no seu património valores que excedem a Festa e que jamais podem ou devem ser alienados – a paz e a fraternidade, coisas entendíveis apenas numa linguagem sem aqueles códigos que não vão ao problema, sem aquela presunção de frase bonita mas que põe em crise a convicção, sem aquelas fórmulas que desumanizam e que por mais que divinamente inspiradas pareçam ser, acabam por dar para o torto.

Carlos Albino

quinta-feira, 27 de abril de 2006

SMS 155. Palavra de general

27 Abril 2006

É claro que o general Mateus da Silva ao afirmar que o Algarve precisa de «um Alberto João Jardim» não estava a dizer que o Algarve precisa de Alberto João Jardim. Nada disso. Precisa de um, não precisa de. E é verdade – o Alberto João Jardim não faz aqui nenhuma falta, mas um faz. O que o Alberto João Jardim é, todos sabemos – homem inconsequente e que desafia a civilidade por todos os poros, provocador consoante as conveniências e figura do mais recuado provincianismo, o Alberto João Jardim está para a Maria da Fonte assim como o Remexido estava para o Ali Babá e seus 40 ladrões. Mas quando se fala da necessidade de um Alberto João Jardim o que se pretende dizer é que o Algarve precisa de líder, de projecto de afirmação, de ideia que reconduza à identidade, que foi exactamente o que um Alberto João Jardim conseguiu dar à Madeira, porquanto quem por certo se lhe seguirá, já não poderá fazer recuar a Madeira para o estado de estagnação e de descaracterização em que se encontrava. E é por esta ordem de ideias que poderemos afirmar que até os Açores tiveram até agora não um mas dois Albertos – Mota Amaral e Carlos César. O Algarve não teve nenhum.

Alguns homens, em certo momento, até tiveram condições para liderar o Algarve, mas faltou-lhes ideia, projecto, discurso e sapatada nas mordomias. Assim aconteceu com Luís Filipe Madeira que tem discursado muito mas feito pouco ou mesmo nada (será quando muito um líder provinciano em que a manha oculta ideias) e em certa medida assim aconteceu com José Mendes Bota que é um CD regravado. A Júlio Carrapato faltou aquele acessório do brilhantismo e sobraram-lhe as navalhadas nas costas, algumas tão discretas quanto fatais. A José Vitorino faltou sobretudo a Enciclopédia Luso-Brasileira, da letra A até à letra Z. A Cabrita Neto faltou perceber que a política não é uma empresa e, quanto a figuras, poucas mais saltam dos registos destes 32 anos de democracia não havendo portanto azo para pedir desculpas para eventuais omissões, até porque Macário Correia ainda não deixou de ser apenas o presidente da Câmara de Tavira. Bem, vem aí a geração mais jovem de políticos que ainda não provaram nem tiveram tempo, muito embora alguns não deixem de ser meros afilhados de vícios antigos e quanto à quota de mulheres, obviamente que não chegam lá apenas por via de convocação de conferências de imprensa e comunicados provincianos para jornais que tomam igualmente por provincianos. Por exemplo para Miguel Freitas a prova de ter ou não ter chama, apenas agora começa, aguardemos.

Assim, as declarações do general Mateus da Silva, algarvio confesso e espírito inquieto com o que se passa na Terra, são uma verdadeira e inesperada pedrada no charco. A política algarvia está reduzida às coisinhas de indivíduos contra individuozinhos das coisas, está confinada à disputa de lugares para listas mais ou menos futuras de deputados, empregos políticos e comissões partidárias e está bloqueada por gente que tem da democracia uma ideia de proveito próprio. O Algarve precisa de um, de dois, de três Albertos que não se transformem no Alberto João Jardim. Mas que precisa pelo menos de um, lá isso precisa. A palavra do general foi um tiro certeiro e não foi um tiro curvo.

Carlos Albino

Nota: As ilustrações escolhidas para este apontamento reproduzem os, até agora, mais credíveis símbolos do Algarve. Em cima, o brasão de armas, e, em baixo, a bandeira, conforme nos descreve o reconhecido perito em hieráldica, Simas Alves de Azevedo. Coisas a ter em conta pelo Governo Civil e pela Junta Metropolitana.

quinta-feira, 20 de abril de 2006

SMS 154. Uma questão de puro civismo

20 Abril 2006

É difícil encontrar região do país pior que o Algarve, em matéria de estacionamento, de ruído e de asseio. O que verifico em Loulé, não encontro em Bragança nem em Castelo Branco e muito menos na Feira; o que se passa em Faro, é difícil em Viseu; o que há em Portimão, seguramente não se vê em Aveiro; as bandas de Albufeira não se comparam às bandas da Figueira da Foz, andar por Silves não se compara a andar por Évora; e o que se avista em Lagos nem por um canudo se enxerga em Braga. Não é que as terras da comparação sejam paraísos, mas não são tão infernos onde o civismo arde e pena. E como eu gostaria que o Algarve fosse uma Terra de Civismo!

Qualquer um, no Algarve, estaciona o carro onde quer desde que descubra uma nesga, qualquer um faz o barulho que lhe apetece e qualquer um atira para o chão o que muito bem entende. Estaciona-se em cima de passadeiras de peões, de calçadas acabadas de fazer, em segunda e terceira fila, onde quer que seja, para não se andar a pé uns metros até à cama ou até à sala; motas e motoretas por aí andam de escape aberto num festival de ruído e em afirmações de poder pelo estrondo do escape; e, quanto à noção de asseio público, nem vale a pena descrever o espectáculo de imundície com cães ou sem cães porque a imundície é sempre de raça apurada. E o curioso é que pouca gente protesta abertamente, que raros são os municípios que levantam o dedo contra este estado de coisas, e que raramente se nota a autoridade a pôr ordem nisto e a zelar pela aplicação da lei, cada um à sua maneira assim contribuindo para a deterioração do ambiente público, da paz urbana e do bem-estar nas ruas onde todos e cada um de nós passamos, afinal, grande parte da vida ou mesmo o melhor da vida.

Por princípio, sou contra a repressão, como sou, também por princípio, a favor de campanhas de instrução pública (sim, digo instrução, não tenho medo da palavra), a favor de campanhas de sensibilização, de acções que previnam tudo aquilo que a repressão não cura nem pode curar – a repressão, apenas em último caso e como último recurso, quando apenas a autoridade pode evitar o confronto directo ou a impunidade continuada e desafiadora dos que fingem não saber viver em sociedade ou, pior, querem mesmo provocar os mais sensíveis alicerces da vida em sociedade.

E como em tudo, há terras piores e terras melhores, e mesmo dentro das melhores há zonas de evidente decoro imposto e outras zonas completamente ao deus-dará – não vou, por agora, citar casos concretos, para que não se diga que torço pelos de Aljezur contra os de Alcoutim ou que enxerto carrapatos em Ferragudo esquecendo-me das pulgas dizimadas em Moncarapacho. Não vou por aí. Mas em todas as terras, os municípios podem e devem fazer mais do que fazem através de posturas e de acções de sensibilização; em todas as terras, as forças com funções de polícia podem e devem actuar mais do que actuam, por vezes abrindo mais os olhos que convenientemente fecham; e todos nós, os cidadãos para quem a palavra civismo foi inventada, podemos e devemos reivindicar, em todas as terras, o bom jogo dos deveres e dos direitos. Mesmo que os deveres sejam difusos, não é sr. Cabrita?

Carlos Albino

quinta-feira, 13 de abril de 2006

SMS 153. As nossas Marbellas de trazer por casa.

13 Abril 2006

Mesmo que não vá, e até peço para não me forçarem a uma tourada, é nisto que gosto dos espanhóis: quando querem matar o touro, matam mesmo e não andam com rodeios a fingir que não se mata para depois matar às escondidas ou fora das vistas despudoradas. E os espanhóis são assim, tanto na fiesta como na política. A ditadura franquista matou sem esconder muito ou mesmo nada, julgando com isso perpetuar-se; e também a democracia espanhola, pelo que se acaba de ver com Marbella mas para perpetuar a democracia, igualmente não hesita em dar a estocada à vista de todos e para que todos saibam, acabando assim com fiesta a mais. E quanto aos portugueses? Pois quanto aos portugueses, o nosso antigo regime autoritário, supostamente homólogo do franquismo, quando quis ou lhe convinha matar, fê-lo sempre com aquela morte que não se vê, a morte discreta, na sombra, atrás de biombos ou pela calada da noite num monturo, pelo que tal morte, por isso, jamais poderia ser descrita como acto praticado por autores assumidos ou provados. E mesmo quando esporadicamente a morte se viu ou foi vista, como no caso do assassinato do general Delgado, ou mais remotamente no “acidente” que vitimou Duarte Pacheco, a nossa branda ditadura providenciou sempre para que se chegasse à seguinte conclusão bem portuguesa: ninguém foi, não se apurou, a investigação foi inconclusiva e os tribunais declararam-se sem provas concludentes…

Vem isto a propósito de Marbella, da Marbella espanhola. O governo central de Madrid, em sintonia, como se viu, com a autonomia andaluza, o que fez quando a fiesta da corrupção tinha que acabar em final de espectáculo? Pura e simplesmente, o governo dissolveu a câmara, fechou a casa municipal para obras, deu a estocada. E nós, salvo seja? Pois em Portugal, com as nossas Marbellas de trazer por casa, imita-se na praça a estocada mortal para não se faltar à “verdade” do toureio, mas apenas se imita, imitando-se arrastadamente no tempo, até que algum dia, se consiga induzir a conclusão de que ninguém foi, não se apurou, a investigação foi inconclusiva e os tribunais declararam-se sem provas concludentes…

É claro que fazemos votos para que, no Algarve, Deus nos livre de Marbellas, embora indícios de fiesta não faltem, ou não tenham faltado ao longo destas décadas de democracia – apesar das nossas festas serem todas menores, temos várias Marbellas de trazer por casa, algumas até a nível de freguesia onde tenha havido mais um andar a troco de qualquer coisa impossível de apurar e sem azo de prova. E compreendamos: nestas coisas de fiesta ou de toureio da transparência, os toureiros autárquicos de Marbella cometeram um erro fatal: deram nas vistas. Aquilo foi avião, foi helicóptero e foram tantas e tão vistosas as manuelinas com o capote da legitimidade política, que estas culminaram na quarta fortuna de Espanha, o que era de dar nas vistas. Pois, aqui, em Portugal, também nesse mundo de faenas em que o enriquecimento sem justa causa dá espectáculo à nossa escala (sem helicóptero, claro), a discrição ou o não dar nas vistas é a regra que vai de encontro ao que somos tanto na política como nos negócios esdrúxulos. E é assim que quando se tenta indagar as razões que estão por detrás dos maiores atropelos que estão aos olhos de todos como factos consumados (você, caro leitor, não conhece factos consumados?) eis que, quanto a responsáveis, a conclusão é e será sempre a de que ninguém foi, não se apurou, a investigação foi inconclusiva e os tribunais declararam-se sem provas concludentes…

Moral da história: os da Marbella real, comparados com os das nossas Marbellas de trazer por casa, são uns aprendizes de feiticeiros, não é sr. Cabrita?

Carlos Albino

quinta-feira, 6 de abril de 2006

SMS 152. João Guerreiro, peço deferimento!

6 Abril 2006

O novo reitor da Universidade do Algarve, João Guerreiro (bom trabalho, amigo!) anunciou intenções e medidas logo no primeiro minuto das suas funções. Para já, foi algum abanão nas consciências instaladas e nas inteligências estaladas quando João Guerreiro disse, alto e bom som, que a ligação da universidade à Sociedade não se faz apenas com contratos, com protocolos. Muito bem, João Guerreiro – contratos e protocolos são naturalmente importantes mas não são tudo, estão longe de ser tudo e mal de uma universidade se invoca contratos e protocolos (com municípios, empresas, estruturas regionais…) fundamentalmente para descargo de consciência. e como meio para relativamente sustentar consciências instaladas e inteligências estaladas.

O papel de uma universidade e de cada universidade é o que considerandos como os de João Guerreiro nos levam a questionar. Não cabe, obviamente, neste modesto apontamento (as SMS são mera tentativa de reposição de um velho género jornalístico que é precisamente o apontamento e não mais do que isso) pois não cabe aqui fazer lição, muito menos dar lição e, claro, ensinar a lição ao padre-cura. Mas cabe aqui, sim, observar, assinalar. Então assinalemos, no que toca a uma Universidade do Algarve que não se quer ficar pelos contratos e pelos protocolos.

E haverá falhas, haverá lacunas na Universidade do Algarve? Até pela definição de universidade, há. – um centro de saber tem que permanentemente identificar as zonas de saber que lhe escapam e onde o saber deve e tem que entrar se pretende uma ligação constante, profícua e facilitadora para coma Sociedade onde se insere e que serve. Por exemplo, na sua tarefa de observatório em que nenhuma outra instituição a pode substituir com total rigor – pode mas não será com todo o rigor. Já o dissemos alguma coisa sobre isto a propósito da triste novela do observatório do turismo. Mas há mais casos, citando-se, sem que se veja nisto puxar a brasa à sardinha, por exemplo a área da Comunicação Social que é uma área-chave e que é uma área onde, ou muitos nos enganamos ou dentro em breve vai acontecer no Algarve o mesmo que na imobiliária sucedeu – iniciativas construídas e pensadas apenas na mira do lucro a qualquer preço, ao serviço do lucro como finalidade última, senão até como braços branqueados de lucros difusos.

A Universidade do Algarve tem nesta área da Comunicação Social uma tarefa-chave na sua ligação à Sociedade e que obviamente não se esgota com contratos, com protocolos. É até uma tarefa obrigatória, pelo que, chamando os nomes às coisas, caberá à Universidade do Algarve erguer um Observatório da Comunicação Social do Algarve não para fazer história dos anos 20 do século passado mas para produzir relatórios anuais para este Século XXI, relatórios que sejam guião crítico da Sociedade e para consulta obrigatória das consciências não instaladas e das inteligências coesas. A «nossa» universidade tem, neste domínio especialistas (bons), peritos (estudiosos e abnegados) e até animadores aguerridos que por serem aguerridos merecem a minha particular estima mesmo quando a animação se vira contra mim. Então, reitor João Guerreiro, requeiro a VEXA a constituição de um Observatório da Comunicação Social do Algarve, feito com a prata da sua casa (que é boa) e que produza relatórios anuais sobre o estado das coisas, doa a quem doer, mas sempre ligando esta área-chave da Sociedade à Universidade. Peço deferimento.

Carlos Albino

quinta-feira, 30 de março de 2006

SMS 151. Post-scriptum muito comprido

30 Março 2006

O sr. Cabrita, presidente do Conselho Distrital de Faro da Ordem dos Advogados, contestou aquilo que aqui referimos sobre famas. Dirigindo-me pois ao sr. Cabrita no mesmo tom em que se legitimou, está patente que ele confunde iniciativas de advogados no Algarve com iniciativas de advogados do Algarve. Além disso, o sr. Cabrita amputa a pergunta aqui feita e que se repete: «Os advogados com arraiais assentes no Algarve, alguma vez debateram formalmente entre si como está e como pode ser a justiça melhorada e, já agora, a imobiliária no Algarve, livrando-se da fama que alguns têm?». A isto, o sr. Cabrita diz que sim, nós voltamos a dizer que não.

Com certeza que têm sido feitas «reuniões magnas» de advogados, magistrados e solicitadores no Algarve – a região até precisa desse movimento de congressos, reuniões magnas, fóruns. Tais congressos foram no Algarve como poderiam ter sido na Póvoa do Varzim, não se contesta. Com certeza que, pelo nosso lado, até seguimos com particular interesse o VI Congresso dos Advogados onde, por sinal, foi discutida com coragem, rigor e precisão aquilo que os jornalistas há muito deviam ter feito e não fizeram - a sua organização deontológica em bases democráticas. O sr. Cabrita concederá que atribuímos pior fama aos jornalistas no Algarve que a alguns advogados no Algarve. Fama, repetimos. Fama e apenas fama. Por certo inconsistente, mas fama.

Mas fora essas reuniões magnas, devemos dizer ao sr. Cabrita que muito gostaríamos de registar debates regionais, sérios e com serenidades, sobre famas e realidades da justiça do Algarve e no Algarve. Entre nós e com as parcerias naturais, designadamente universidade e institutos superiores do Algarve. E já agora - se o meu interlocutor aceitar mudar o tom também o mudarei com todo o gosto - devo dizer ao sr. Presidente do Conselho Distrital da Ordem dos Advogados que até apoio a extensão desse debate para áreas onde a deontologia e os exercícios profissionais podem reclamar zonas de harmonização recíproca, designadamente advogados e jornalistas. Já uma vez tentei isso no passado, sem êxito, por sinal por culpa dos advogados e não dos jornalistas, porque há pessoas que apenas ligam às reuniões magnas com presenças magnas. Mas se o Dr. António Cabrita desejar actualizar essa agenda deontológica e manifestamente não-sindical (sindicatos é outra questão), garanto-lhe que da banda dos Jornalistas tem gente com quem contar, gente que não se revê nem quer rever-se na fama de alguns, poucos, insignificantes diga-se, mas basta um só para a fama – seja jornalista, seja advogado.

Carlos Albino

quinta-feira, 23 de março de 2006

SMS 150. Mudanças no território

23 Março 2006

O governo parece apostado em mudar o mapa ou pelo menos o aspecto do mapa. Primeiro, com o fim dos distritos a ditarem a extinção de 13 dos 18 governos civis, mantendo-se cinco dessas representações do poder central nas áreas a que, supostamente, se atribui características de região, como será o caso do Algarve. Depois, com o fim das comarcas judiciais e a criação de novas unidades territoriais para aplicação da justiça. Isto não significa profissão de fé do governo na regionalização, nem sequer o tipo de vontade que tem em matéria de descentralização e desconcentração – significa apenas alguma vontade de arrumo das coisas, com o estabelecimento de um critério claro. Finalmente, com o anunciado propósito de submeter as assembleias metropolitanas a sufrágio, é um primeiro passo para a legitimação de estruturas que não sendo «de região», particularmente no caso do Algarve, servem para isso – é uma questão de vontade e daquele bom senso político sinónimo de consenso.

No Algarve, as medidas não vão causar polémica – não se perde nada, embora também não se saiba se os ganhos serão relevantes. Seja distrito de Faro como tem mandado a tradição, região do Algarve por favor ou área metropolitana por condescendência, os conceitos reportam-se ao mesmíssimo território e, mais ou menos, têm-se reciprocamente suportado como respeitáveis figuras de estilo. O chefe do distrito há muito que desapareceu, a região não existe e a área metropolitana nem sequer trabalha a meio-vapor.

Seja como for, os dados estão lançados e resta saber quais os passos que se seguirão e aí é que bate o ponto. Mudar o aspecto do mapa, é positivo. Mas não basta mudar de aspecto. Já se tentou «mudar de aspecto» com o fundamentalismo municipalista e veja-se os resultados em termos regionais – uma manta de retalhos; também se tentou «mudança de aspecto» com aquela ideia peregrina das secretarias de estado descentralizadas (ainda se recordam?) e veja-se no que deu. Aguardemos, pois. Já basta de areia para os olhos.

Carlos Albino

quinta-feira, 16 de março de 2006

SMS 149. Se a moda pega...

16 Março 2006

Sei que há pareceres que viabilizam, mas, mal de uma sociedade democrática e de um estado de direito que seja ao mesmo tempo estado de transparência, se os pareceres apenas tivessem que ser jurídicos e só jurídicos, sem mais, sem algo mais que tem a ver com a ética política. Refiro-me à questão das incompatibilidades dos titulares de cargos políticos, designadamente aos que exercem estes cargos a tempo inteiro. Mais concretamente me refiro a casos em que presidentes de junta de freguesia acumulam funções de assessoria ou de adjuntos de presidentes de Câmara. O PS fez isto, agora o PSD faz o mesmo, uns imitam os outros e é apenas por astuta veneração pelo estado de direito que se recorre ao parecer jurídico, mas perdeu-se o pudor voltando-se as costas ao estado de transparência.

É inadmissível, do ponto de vista ético, que um presidente de junta seja ao mesmo tempo adjunto do presidente de câmara, podendo influir em matérias para as quais convirá separação clara e inequívoca de funções, quer de âmbito financeiro, quer do foro urbanístico com toda a carga de venalidade que neste Algarve se conhece. Aliás, os casos de duvidosa compatibilidade estiveram e estão aliados a casos de duvidosas parcerias, interesses e influências. O parecer jurídico pode encontrar a escapatória de que a lei é omissa ou que não proíbe, logo sendo permitido... é o habitual mas detestável corolário.

Nos casos em que o da junta é um quadro, um reputado quadro e insofismável especialista, vá lá, ainda se compreenderá que o presidente da câmara não queira perder o préstimo do quadro e o contributo do especialista. Mas quando não se trata de um quadro, muito menos de um especialista e, quando muito, de se trata de conhecido artista? Aí, desculpem-me, não compreendo como é que o da junta a tempo inteiro possa ser adjunto da câmara a tempo inteiro igualmente.

Se a moda pega, é o desvirtuamento das juntas de freguesia e é a suspeição instalada nas câmaras municipais. A coisa é triste e quem pode sair mal do filme não será tanto o da junta mas, desnecessariamente, o da câmara. Nem tudo o que é permitido, é tolerável. A deformação dos juristas não é boa conselheira...

Carlos Albino

quinta-feira, 9 de março de 2006

SMS 148. A fama que alguns têm…

9 Março 2006

1 – Os arquitectos que vivem e usufruem do facto de desenharem no Algarve, fizeram alguma reunião, debate ou fórum – para não chegar a congresso – para debaterem como servir melhor e mais eficazmente o Algarve e os cidadãos deste Algarve onde vivem e do qual usufruem e como podem livrar-se da fama que alguns têm?

2 – Os advogados com arraiais assentes no Algarve, alguma vez debateram formalmente entre si como está e como pode ser a Justiça melhorada e, já a agora, a Imobiliária no Algarve, livrando-se da fama que alguns têm?

3 – Os engenheiros que por aí ornamentam os paraísos de empregos municipais, alguma vez debateram como podem servir o Algarve, como podem evitar estrangulamentos no desenvolvimento e como podem livrar-se da fama que alguns têm?

4 – Os jornalistas que por aí sobrevivem escrevendo sobre tudo e mais alguma coisa do Algarve fizeram alguma reunião para debaterem os limites entre a informação a propaganda, a fronteira entre a narrativa da realidade e a publicidade dos negócios virtuais, a linha que demarca a divulgação do que se revele de interesse público e o capacho onde os autarcas mais poderosos limpam os pés, havendo muito mais quem limpa, livrando-se da fama de uns tantos?

5 – E os professores alguma vez se livraram da fama de uns tantos?

6 – E os chefes de estação para não falar dos nadadores-salvadores?

7 – E os engraxadores, os lambe-botas e os rastejantes logo a seguir prepotentes?

8 – E os plagiadores, os plumitivos e os calaceiros logo a seguir virtuosos e moralistas que até os bombeiros evitam contactar?

9 – E os intermediários?

10 – E os que vivem também e apenas à custa da fama dos outros (dos arquitectos aos intermediários), alguma vez fizeram um congresso, um seminário, uma simples reunião que fosse para debate sobre como a chantagem ou o jogo do ou fazes o que me interessa ou eu digo o que tu fazes e ficas tramado, alguma vez discutiram como esse jogo está a bloquear o exercício livre da Crítica no Algarve, a negar a noção mais sadia de Autarquia, a bloquear a própria Política e, em última análise, a riscar do mapa a nossa restante Identidade, a qual, segundo julgo, será já o primeiro caso de gripe das aves?

Carlos Albino

quinta-feira, 2 de março de 2006

SMS 147. O Algarve Oriental

2 Março 2006



É mau, muito mau para o Algarve e para o País, a desatenção constante para o Algarve Oriental. É evidente que o Orçamento de Estado não pode prestar atenção para todos os lados e ao mesmo tempo, mas a desatenção que vem de há décadas e décadas para a zona algarvia de fronteira com Espanha não serve a ninguém do lado de cá. Refiro-me naturalmente a Vila Real de Santo António e a toda a área onde o Guadiana assume esplendor próprio para se encontrar com o mar. Desta desatenção, os algarvios têm sido muito responsáveis, sobretudo os algarvios que vivem obcecados pelos centros de poder, pela sua própria e egocêntrica afirmação nesses centros de poder, e pelo «comércio» político que fazem com os decisores nacionais exclusivamente em função dos alegados centros de poder em que é suposto terem mão no Algarve, os quais, diga-se, pouco ou nenhum poder têm, nem sequer o poder de influência.

Ora falta para o Algarve Oriental uma ideia de arrojo que renda Espanha e os Espanhóis, como de resto os Espanhóis estão a fazer por toda a linha de fronteira com Portugal sem resposta nossa, sem um adianto original. Falta neste Algarve Oriental uma ideia algarvia e não apenas autárquica que atraia, um plano de afirmação do Sul e não apenas de capricho voluntarista, um projecto salvador deste castelo de cartas em que o Algarve se converteu, à mercê de ventos e marés. Falta sobretudo que o Algarve seja politicamente afirmado como sendo Vila Real, Faro e Portimão e não apenas Faro, Portimão e Faro. O Guadiana é um valor estratégico incomparável no contexto algarvio e devia ser por isso um polo de referência. Não é, por irresponsabilidade de alguns algarvios detentores dos centros de poder mas que cantam na sé de Viena como eunucos, e sobretudo por erro de sucessivos governos onde os algarvios ou não têm voz ou até têm vergonha da voz que têm.

Carlos Albino

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2006

SMS 146. O milagre da multiplicação

23 Fevereiro 2006

É um problema a que não consigo dar resposta. Possivelmente esse problema corresponde a uma daquelas condenações a que o ser humano está sujeito e que é a de, permanentemente, ter de se sujeitar ao dilema da escolha entre o grande e o pequeno, sendo que aquilo que é grande tem tanto direito e até legitimidade como aquilo que é pequeno. Isto a propósito do Carnaval ou dos carnavais – há um grande, os outros são pequenos, alguns pequenos já maiores do que eram, outros ainda mais pequenos, mas cada terra quer ter o seu Carnaval, convencendo-se cada uma que o seu Carnaval é o maior, o mais animado, o mais genuíno, o mais popular, por aí fora. E quanto mais carnavais, cada um deles mais freguesia tira ao outro, porque o Algarve tem a população que tem, os forasteiros são com o número que são e ninguém é omnipresente – ou se está num lado, ou noutro. É certo que todas as terras têm direito ao seu carnaval, nenhuma terra, grande ou pequena, pode reclamar um decreto que proíba o carnaval da outra, sendo também certo que, esta e outra terra, tal como na Política, também no Carnaval e nas mascaradas, ficam mais fechadas sobre si mesmas, a rirem-se de si próprias ou para si próprias, ou seja, se a festa do carnaval fosse procissão, fica cada terra a atirar os foguetes e a apanhar as canas. Acaba por não ter piada este milagre da multiplicação dos carnavais.

É claro que, para um optimista como eu que prevê sempre um fim trágico para tudo (permitam-me esta brincadeira de carnaval...), o caso até poderia significar vitalidade, força anímica e não apenas um estado de alma próprio dos macacos de imitação. Só que receio bem que tenha que ser, neste caso, excepcionalmente pessimista prevendo um fim alegre para tudo (novamente desculpas por repetir de outra forma a brincadeira...). E porquê? Suspeito que a pandemia da imitação – fenómeno que se transmite também das aves para os humanos – é já quase uma pose cultural. À falta de imaginação imita-se, copia-se.

Pois o que se passa com os carnavais do Algarve acontece com o resto das festas – da Política à Comezaina, da Cultura aos Cultos da Personalidade. Querença inventou, e bem, a festa das chouriças – pois há já chouriças por todo o lado. Silves, julgo que foi Silves, inventou a das cervejas – há já cerveja por todo o lado. Não vou ser exaustivo, mas há festas da sardinha por todo o lado, do marisco por todo o lado e dentro do marisco a festa do camarão, há feiras do livro por todo o lado, festivais internacionais por todo o lado, e, claro mas noutro plano que é aí que quero chegar, também a festa das marinas e das construções mafarricas por todo o lado – se Vilamoura tem, porque motivo Albufeira não tem, e se esta tem porque não Faro, e Tavira, e Castro Marim, e Lagos, e Aljezur, e Olhão? E já agora porque não se faz também uma marina ou um edifício de 18 andares neste preciso espaço deste mesmo apontamento, facilitando assim o trabalho de Lídia Palma que me atura todas as semanas no envio da prosa sobre a linha de risco do fecho do jornal?

Carlos Albino

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2006

SMS 145. Ministros e secretários absolutistas...

16 Fevereiro 2006

É evidente que o Presidente de São Brás de Alportel tem toda a razão, neste assunto do novo mapa das freguesias, ao questionar os procedimentos e métodos do secretário de Estado Eduardo Cabrita. A forma como este governo – não é só o secretário Eduardo Cabrita, há pior – , está a avaliar o Algarve, e sobretudo a maneira como pondera o Algarve Interior que é a maior parte do Algarve e também a mais pobre, com algumas áreas que são mesmo as mais pobres do País, é um erro. Um erro que corresponde ao desapontamento de muitos – o meu caso, para atalhar conversa – , e que certamente não dará regozijo a ninguém mesmo àqueles que nunca acreditaram e por isso não votaram na gente deste governo, porque o erro não é mais do que o prolongamento dos erros dos governos anteriores. Temos vindo a engolir, à vez.

O governo, melhor, alguns membros deste governo ainda não perceberam (perceberam, fingem é que estão despercebidos) que o facto de governarem suportados por maioria absoluta, não lhes dá legitimidade para serem absolutistas... Sim, para governarem como se fossem pequenos reis iluminados, cheios de algum direito divino, prescindindo pois da audiência pedida e da obrigatoriedade democrática da audição. Numa democracia, nada pior do que isto, sendo isto pior do que a arruaça – a arruaça ouve-se mas o absolutismo de gabinete é silencioso e quase sempre mata sem ai nem ui como espetar sabre no rim. Fazer isto é desvirtuar a democracia. É fugir ao escrutínio público por mais que se simule aparecer em público por via da televisão que se converteu na mais recente escrava da corte, ao mesmo tempo bôba da corte.

Eduardo Cabrita quer extinguir a freguesia de São Brás de Alportel? Então porque não consultou previamente a Câmara, porque não ouviu as populações? Também engoliu o garfo?

Mexer na indefesa organização administrativa do pobre Algarve Interior terá que ser feito assim, a traço de esquadro sobre o mapa das conveniências orçamentais, tal como a Conferência de Berlim desenhou a África?

Carlos Albino

PS: Já agora, fiz umas contas que as Estatísticas da Europa devem ponderar muito a sério – se o Algarve tivesse apenas dois habitantes, o Senhor André Jordan e eu, o rendimento per capite seria o que nem imaginam nem eu sei, mas que o Senhor Jordan sabe.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2006

SMS 144. «Discurso Algarve» praticamente nulo

9 Fevereiro 2006

Naturalmente que não podemos estar à espera de um decreto para que haja um «discurso Algarve» ou se ouça, mesmo ao longe, algum Algarve político no discurso político. Pela certa, esse decreto jamais virá de Lisboa. Não haverá decreto nesse sentido, nem esse discurso pode ser imposto entre nós, pela vontade de uns sobre a vontade dos outros. Resta-nos a constatação: politicamente o «discurso Algarve» é nulo. E porquê? Primeiramente, as iniciativas, poucas que sejam, visando a regionalização, pouca que esta também seja, tais iniciativas não têm consistência política e não ganharam a opinião pública algarvia que, de resto, cada vez existe menos, tão dividida e retalhada tem vindo a estar em função das autarquias cada vez mais fechadas sobre si e dentro de si, e em função de uma comunicação social que anda entre a sobrevivência e meia dúzia de ávidas considerações pessoais pois nada há a esperar da comunicação social de raiz administrativa (a pública ou, seja como for, a dependente do Estado, obviamente). Não há «discurso Algarve» - a Junta Metropolitana não assume nem deixam que ela assuma, a associação de municípios tem a unidade própria dos casais desavindos que em comum mantêm apenas a discussão pelo que recusam ao mesmo tempo a separação para que a discussão se prolongue como a única coisa que têm em comum, e, além disto, sobressaindo como causa também castrante de um discurso político próprio, acresce o jogo de manutenção ou disputa fratricida dos empregos políticos, supostamente bem pagos e que dependem meramente das políticas locais que, como se sabe, não brilham pelo escrutínio – muitas empresas tuteladas pelos municípios são exemplo desta falta de crivo ou de avaliação, responsáveis que são pelo aparecimento de uma nova classe de funcionários apolíticos, paradoxalmente os filhos mais legítimos ou legittimados da política. Ninguém, há escassos anos atrás, pensaria que o Algarve chegaria a 2006 sem lideranças (líder e alternativas a líder), sem uma ideia política discutida na avenida larga da crítica e, sobretudo, sem discurso. Ao Algarve chamam-lhe região mas não é, deram-lhe o título de metrópole mas não cheira a nada. Um caranguejo não pode passar por sapateira.

Carlos Albino

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2006

SMS 143. Terceiro Presidente

2 Fevereiro 2006

Cavaco Silva é o terceiro Presidente da República que teve o Algarve como berço, não interessando por agora se o Algarve ficou nos olhos em cada um desses três com a mesma intensidade – interessa o berço, a ligação inicial a algum destes 16 ladrilhos de barro autárquico, interessa aquela cor da terra nítida e do mar profundo que se grava nos olhos de criança e que faz com uma criança seja algarvia deixando para adulto o que queira ser em adulto. Estão neste caso Teixeira Gomes, Mendes Cabeçadas e agora Cavaco Silva – o “nosso” terceiro Presidente.

Teixeira Gomes, mesmo com o labéu da resignação em 1925 na sequência de um mandato marcado por gigantesca instabilidade política e social e passados escassos dois anos apenas após ter sido eleito no Congresso, obviamente tem um lugar na História mais pelo sulco que, como exímio estilista da língua, deixou nas Letras.

Para Cavaco Silva, a História começa em 9 de Março e porque se trata de História as adivinhações não têm legitimidade. Mas suspeita-se que fará História e aguardemos que seja boa História ou pelo menos História que reponha nitidez nesta terra e profundidade no mar – perdemos muita nitidez e muito mar.

Mas, lamentavelmente, apenas Mendes Cabeçadas está mal colocado na História. Mal e injustamente. Louletano, tal como Cavaco Silva, Mendes Cabeçadas nesse já longínquo ano de 1926 e com o golpe de 28 de Maio como cenário, recebeu do Presidente Bernardino Machado a chefia do Governo e com a posterior renúncia de Bernardino à chefia do Estado, Cabeçadas passou a exercer a Presidência da República por escasso tempo, escassíssimo, mas o suficiente para ficar com o ferrete de homem da Ditadura – o que não era, nem foi verdade. Mendes Cabeçadas, tal como outros grandes homens da época – Fernando Pessoa, António Sérgio... para não enumerar mais – aderiu ao golpe do 28 de Maio pensando que o essencial do regime constitucional ficaria acautelado e que a purga da corrupção e do tráfico de influências que então grassava e afundava o País seria uma purga transitória, breve e sem endereços para regime autoritário e de partido único. Mendes Cabeçadas, o homem a quem se deve o sinal de arranque da implantação da República, renunciou à chefia do Estado porque bastaram-lhe poucos dias para perceber onde estava metido e até à morte foi opositor da Ditadura.

Não é justo que Loulé, por exemplo, ainda não tenha promovido Mendes Cabeçadas ao seu posto de almirante (ainda o trata num largo de sub-mundo como tenente!) e os que o não têm em conta como o segundo Presidente algarvio, se calhar nem viram ainda quem a galeria presidencial do Palácio de Belém abre com o relógio pelo qual Mendes Cabeçada viu as horas em 1910... Por acaso Sampaio foi o primeiro em Belém a fazer a primeira justiça a este marinheiro sonhador que, sendo louletano, sempre esteve muito acima dos marinheiros de água doce que Loulé tem. Voltaremos a este assunto de Mendes Cabeçadas porque a anterior câmara local de Vítor Aleixo tem culpas no cartório apesar da santa paciência. Ainda bem que foi Sampaio a fazer alguma justiça porque se fosse Cavaco a fazer isso agora, poderia ser entendido como puxar a brasa à sua sardinha.

Carlos Albino