quinta-feira, 2 de fevereiro de 2006

SMS 143. Terceiro Presidente

2 Fevereiro 2006

Cavaco Silva é o terceiro Presidente da República que teve o Algarve como berço, não interessando por agora se o Algarve ficou nos olhos em cada um desses três com a mesma intensidade – interessa o berço, a ligação inicial a algum destes 16 ladrilhos de barro autárquico, interessa aquela cor da terra nítida e do mar profundo que se grava nos olhos de criança e que faz com uma criança seja algarvia deixando para adulto o que queira ser em adulto. Estão neste caso Teixeira Gomes, Mendes Cabeçadas e agora Cavaco Silva – o “nosso” terceiro Presidente.

Teixeira Gomes, mesmo com o labéu da resignação em 1925 na sequência de um mandato marcado por gigantesca instabilidade política e social e passados escassos dois anos apenas após ter sido eleito no Congresso, obviamente tem um lugar na História mais pelo sulco que, como exímio estilista da língua, deixou nas Letras.

Para Cavaco Silva, a História começa em 9 de Março e porque se trata de História as adivinhações não têm legitimidade. Mas suspeita-se que fará História e aguardemos que seja boa História ou pelo menos História que reponha nitidez nesta terra e profundidade no mar – perdemos muita nitidez e muito mar.

Mas, lamentavelmente, apenas Mendes Cabeçadas está mal colocado na História. Mal e injustamente. Louletano, tal como Cavaco Silva, Mendes Cabeçadas nesse já longínquo ano de 1926 e com o golpe de 28 de Maio como cenário, recebeu do Presidente Bernardino Machado a chefia do Governo e com a posterior renúncia de Bernardino à chefia do Estado, Cabeçadas passou a exercer a Presidência da República por escasso tempo, escassíssimo, mas o suficiente para ficar com o ferrete de homem da Ditadura – o que não era, nem foi verdade. Mendes Cabeçadas, tal como outros grandes homens da época – Fernando Pessoa, António Sérgio... para não enumerar mais – aderiu ao golpe do 28 de Maio pensando que o essencial do regime constitucional ficaria acautelado e que a purga da corrupção e do tráfico de influências que então grassava e afundava o País seria uma purga transitória, breve e sem endereços para regime autoritário e de partido único. Mendes Cabeçadas, o homem a quem se deve o sinal de arranque da implantação da República, renunciou à chefia do Estado porque bastaram-lhe poucos dias para perceber onde estava metido e até à morte foi opositor da Ditadura.

Não é justo que Loulé, por exemplo, ainda não tenha promovido Mendes Cabeçadas ao seu posto de almirante (ainda o trata num largo de sub-mundo como tenente!) e os que o não têm em conta como o segundo Presidente algarvio, se calhar nem viram ainda quem a galeria presidencial do Palácio de Belém abre com o relógio pelo qual Mendes Cabeçada viu as horas em 1910... Por acaso Sampaio foi o primeiro em Belém a fazer a primeira justiça a este marinheiro sonhador que, sendo louletano, sempre esteve muito acima dos marinheiros de água doce que Loulé tem. Voltaremos a este assunto de Mendes Cabeçadas porque a anterior câmara local de Vítor Aleixo tem culpas no cartório apesar da santa paciência. Ainda bem que foi Sampaio a fazer alguma justiça porque se fosse Cavaco a fazer isso agora, poderia ser entendido como puxar a brasa à sua sardinha.

Carlos Albino

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