quinta-feira, 31 de maio de 2007

SMS 212. Mas 54 mil camas são poucas!

31 Maio 2007

Segundo a lista apresentada pela RTA ao ministro da Economia, pede-se a provação de 54 mil camas turísticas para projectos de excepção, antes da entrada em vigor do PROT que limita as hipóteses a 24 mil camas até 2018, o mítico ano do comboio de elevada velocidade Faro-Huelva...

Ora, enquanto é tempo, pedir 54 mil camas é pouco para terminar esta obra-prima de enterrar o Algarve em betão e enterrar neste os residentes estrangeiros, sabendo-se que o desenvolvimento caótico é que é desenvolvimento, e que o desenvolvimento a sério não permite espaços livres nos relativamente escassos quilómetros da primeira linha da costa algarvia. Aliás, para determinada gente com a febre do negócio - cujo modelo será a Costa do Sol - não há desenvolvimento sem caos, sem problemas de tráfego, de insegurança, de abastecimento e de lixos. Até nem se sabe que futuro possa ter o Algarve sem Mijas à portuguesa em Albufeira, sem uma Fuengirola à esquerda e outra Estepona à direita, cabendo ainda uma espécie de Manilva entre dois campos de golfe, um dos quais em cave. É que não se pode imaginar um Algarve desenvolvido sem a nossa Málaga em Quarteira e Marbella em Armação, porquanto Portimão e arredores é já uma espécie dessa hipertrofia urbanística que é barata e dá milhões, sendo sem dúvida um sistema ambiental sustentável.

Duvida-se é se com 54 mil camas apenas, se conseguirá essa meta de progresso e de potencial interesse nacional, pelo que a RTA deveria ter pedido não 54 mil camas, mas 45 vezes mais, muito embora dois milhões de camas fosse o ideal para se acabar de vez com isto tudo desenvolvido.

Carlos Albino

Flagrante falha: António Pina deixa o cargo de governador civil sem publicar a lista dos cônsules honorários no Algarve. Não por culpa de António Pina - segundo consta, haverá muito honorário que prefere andar pela calada e não levantando ondas.

quinta-feira, 24 de maio de 2007

SMS 211. Um exemplo de revista

24 Maio 2007

Por interposta mão, chegou-me por acaso a revista al-‘ulyà do Arquivo Municipal de Loulé (a explêndida capa aqui ao lado). No limiar entre o propósito de rigor científico e o de divulgação, a revista é um exemplo de como a cultura não cai do céu mas faz-se quando quem a ajuda fazer, cumpre sem pretensões aquele velho preceito fundador do humanismo e que consiste no «conhece-te a ti mesmo». A revista mergulha nas raízes e na memória de Loulé, obriga a que os de hoje arquivem um abraço aos do passado, fora das lendas e contarelos endrominados como verdades – um abraço, nem que seja a pretexto de um caco que, assim sendo, vale ouro.

Por regra, a noção de arquivo prende-se à de guardar para esquecer, por vezes até para fazer esquecer quando se arquiva sem arrumo. Ora, mas que surpresa, chegar às mãos uma revista de arquivo que faz precisamente o contrário – lembrar! É o caso do texto consolidado de Hélder Raimundo que, ousando mexer no passado recente, situa Casimiro de Brito no seu lugar, lugar que é Loulé, onde ainda menino, ao colo de António Aleixo sentiu pela primeira vez a função da poesia, e que é, acima de tudo, a de que os homens se conheçam a si mesmos. Ainda bem que Casimiro de Brito, em Loulé, já está a sair do arquivo.

Carlos Albino

Flagrante consenso: O que António Pina recolhe para a RTA. Quando há consenso, muita prosápia acaba.

quinta-feira, 17 de maio de 2007

SMS 210. Que a ideia vá para a frente

17 Maio 2007

As minas de sal-gema de Loulé, nos seus cerca de 40 quilómetros de galerias em quatro pisos até perto dos 300 metros de profundidade, tem todas as condições para albergar um centro subterrâneo de reabilitação e terapêutica para vias respiratórias, alergias, doenças da pele e perturbações do metabolismo. Por outras palavras, tem condições para ser um pólo de turismo de saúde. Sabendo disto, Mendes Bota não terá perdido um segundo para fazer o que falta: munir-se da anuência interessada da entidade proprietária das minas, sensibilizar o município local e colher por via da cooperação a experiência de quem a tem – e, se há no mundo experiência nesse turismo de saúde, ela está em Wieliczka, cidade do sul da Polónia, na área metropolitana de Cracóvia e quase na fronteira com a Áustria, sob a qual existe uma das mais antigas minas de sal-gema, descobertas em 1044 e exploradas com regularidade desde o século XIII. (Fotos da mina ao lado)

E é assim que, à hora em que estas linhas chegam às mãos do leitor, a senadora polaca Urszula Gacek, a convite de Mendes Bota, já deambulou pelas profundezas das galerias de Loulé, acompanhada pela encarregada de negócios da Polónia, Dorota Ostrowska-Cobas, após uma reunião de interessados no projecto, este provavelmente sustentado por um acordo de geminação entre Loulé e Wieliczka, terras que, ficando onde ficam, não são concorrentes mas podem ser cooperantes por aquilo que, entre povos, a política tem de mais puro e sem dúvida de mais belo. A concretizar-se a geminação, esta nada terá, pois, a ver com ideias peregrinas que por regra andam coladas como carraças às geminações. Será uma geminação com sentido, que a ideia vá para a frente. Vítor Aleixo, o anterior presidente da câmara louletana, deve estar muito arrependido porque até teve a ideia entre as mãos e deixou-a escapulir.

Embora a utilização do sal-gema algarvio extraído a céu aberto reporte provavelmente a tempos remotos da história e, mau grado os que obsessivamente apenas lêem árabe em todo o lado, justifique o dedo fenício em topónimos, é claro que as minas de Loulé não têm o acervo cultural e patrimonial multissecular das minas de Wieliczka, por isso mesmo, desde 1978, na lista do património da humanidade, sendo por isso também que Wieliczka só no primeiro trimestre deste ano recebeu 140.224 turistas… Não será isto que Loulé pode pretender, mas com números obviamente mais modestos, o turismo de saúde é uma boa causa, um bom motivo e uma finalidade de excelência. É por estas e por outras que se vão perdoando os pecados a Mendes Bota.

Carlos Albino

Flagrante ignorância: A de quem se pronuncia contra ou a favor da autonomia administrativa, mas sobretudo contra, confundindo os conceitos de desconcentração, descentralização e regionalização, e, ignorância mais grave, contrapondo autonomia administrativa à organização municipal. É o problema das licenciaturas apressadas…

quinta-feira, 10 de maio de 2007

SMS 209. Não há oásis

10 Maio 2007

1. Coloquemos as questões nos devidos termos – o casal inglês tinha os seus filhos normalmente protegidos (vir para Lagos não é o mesmo que ir para Bagdad ou para a Amazónia entre cobras), a polícia agiu com prontidão, a colaboração da população revelou-se de imediato forte e apaixonada, e o retrato-robot é sempre um robot de retrato pelo que só por nacionalismo obtuso - defensivo ou ofensivo - é que alguém poderia garantir que o robot do robot tinha que, à partida, ser inglês e não poderia ser português… Não se pode orientar a sanha conforme a criança vítima se chame Madeleine ou Joana.

2. É defensável que se pense que o Algarve não é mais uma zona de segurança como se sentiu ter sido neste hiato mais recente da sua história - outrora, em largos períodos, não foi, pela actuação das piratarias de diversas procedências e das quais rapidamente se perdeu a memória e os vestígios, com longo historial de pilhagens, violações e tráfico de seres humanos. O mundo está a mudar para o bem e para o mal, e o Algarve também está a mudar nos seus paradigmas, não estando naturalmente imune às novas piratarias. Temos com insistência alertado para isto a fim de que responsáveis públicos não assobiem para o lado e as populações não enterrem a cabeça na areia quando o perigo bate à porta ou os sinais de perigo se tornam evidentes.

3. Ora quando se assobia para o lado ou se enterra a cabeça na areia, entra-se num estado geral de impunidade, valendo neste caso a verdade do velho rifão segundo o qual em terra de cegos o zarolho é rei, sabendo todos nós que o autêntico pirata, por definição, é zarolho e tanto melhor pirata será quanto mais eficazmente dissimular nas polícias, nos tribunais e junto das populações, o gancho que lhe substitui a mão.

4. Assim, contra a nova pirataria, contras as novas piratarias, não basta a «polícia de proximidade» para sossego dos cidadãos ao mesmo tempo que se reza a oração de que o «Algarve é seguro» como num terço com um glória ao poder de circunstância nos convenientes intervalos da recitação monocórdica. O que tem que voltar a haver, porque já houve isso no Algarve de forma natural e espontânea, é uma política de vizinhança, de firme estímulo e apoio sólido às relações de vizinhança. Um resort inglês explorado por um operador inglês e acolhendo ingleses do mercado turístico inglês, só por isto, não é um oásis mesmo que tenha segurança privativa inglesa e ainda que, por acaso, o pirata até seja inglês. Não há oásis para ingleses ao lado de oásis para clandestinos e de outros mais oásis para traficantes de droga, de seres humanos ou de capitais ilícitos, com o turismo a servir de pretexto que não é e de causa que também não é.

5. O turismo não pode ser pensado, como sempre foi, como um mundo aparte no Algarve. Madeleine e os pais são as mais recentes vítimas deste sistema inseguramente fechado e falsamente aberto. Não há que desculpabilizar os verdadeiros culpados – os raptores, e muito menos há que aceitar a impunidade que a segregação provocada por uma espécie de turismo colonial gera e impõe, mas do qual a pirataria, qualquer pirataria, gosta e se serve, quer se trate do Algarve, das Canárias ou de Marbella.

Carlos Albino

Flagrante interrogação: O que é que os municípios algarvios têm feito preventivamente para se travar os indícios da crescente delinquência juvenil associada ao insucesso escolar e ao desenraizamento social e cultural?

quinta-feira, 3 de maio de 2007

SMS 208. Quem mais se deve preparar, não é o Governo?

3 Maio 2007

Mal começou o movimento no sentido de novo referendo para a criação das regiões, o Governo não perdeu um segundo anunciando a intenção de descentralizar departamentos a fim de preparar a almejada regionalização. E com isso pediu tempo, remetendo para depois de 2009, pelo menos, qualquer veleidade política e mesmo assim sem garantias de que em 2009 o assunto não volte a ser remetido para 2014 até à ressurreição dos mortos. Ou seja, o Governo mesmo antes de saber qual o resultado do referendo, vai preparar a regionalização, e assim sendo, vai prepará-la como o Estado a quer e para o que o Estado a quer, como se a regionalização tivesse que ser uma outorga e mais não fosse que uma outorga, e cada região uma criança de menor idade. Ora, são as regiões que tem que se preparar ou devem ser preparadas para a regionalização, ou não será antes o Governo que deverá preparar-se? É de mau tom transformar-se a causa em efeito.

Claro que tudo o que seja desconcentração e descentralização são coisas bem-vindas numa lógica de regionalização que é a lógica da Constituição e a lógica de um regime democrático construído para aproximar os cidadãos da administração e não para os afastar. Todavia os laivos de desconcentração e de descentralização não têm sido portadores dessa lógica, antes pelo contrário têm servido um pouco por todo o País, para sustentar mordomias e distribuir empregos políticos não na lógica das regiões mas na lógica do poder central e das forças que o ocupam circunstancialmente. Daí que a pouca desconcentração e a tímida descentralização que tem acontecido tenha sido pretexto para nomeação de funcionários que nada ou pouco têm a ver com as regiões para onde são destacados às quais se adaptam como ilustres desconhecidos, mesmo em áreas politicamente pouco polémicas – as delegações regionais do Ministério da Cultura têm disto sido cabal exemplo, ora como sinecuras, ora como empregos políticos de impositivo empenho. Naturalmente que há, houve excepções, mas as excepções têm sido sol de pouca dura porque não interessam à lógica da central de mordomias, apenas se tendo salvado ao longo dos anos, de alguma forma, a figura do governador civil, mantida, por temor, numa zona de relativo equilíbrio político.

Sério, coisa séria seria para já o Governo comprometer-se, quanto antes e não à espera de 2009, a devolver às regiões ou a partilhar com sageza os poderes desconcentrados ou descentralizados colocando-os em mãos que as regiões aceitem e desejem, para isto não sendo critério absoluto o da naturalidade mas o do conhecimento dos interesses e a identificação com os anseios das regiões. E além disso, agilizando instituições já existentes para o escrutínio do exercício desses mesmos poderes e respectiva tutela. Seria bom que o Governo desse provas de querer preparar-se para a regionalização desta forma, e, para já, no Algarve que, como o mundo sabe, é um excelente sítio para quem não é algarvio ou com o Algarve não se identifique (mais isto), passar férias e fazer negócios…

Carlos Albino

Flagrante pergunta: O mar não vai subir no Algarve? Quanto subirá pela certa até 2050? Quem irá pagar os diques pelas asneiras de hoje?