quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

SMS 351. A lição da Madeira


25 fevereiro 2010

O que aconteceu, aconteceu - será uma perda de tempo apontar o dedo à procura de culpados que nem haverá porque a mãe-natureza é assim os filhos que, independentemente de culpas, lhe chamam mãe nos dias de sol com passarinhos e nas noites de luar com luze-cus. Mas o que aconteceu na Madeira, tal como o que noutros lados tem ocorrido menos tragicamente, designadamente de quando em onde no Algarve, não é apenas um aviso para se fazer fábula mas factos de que se deve tirar lição e lição a ser aplicada enquanto é tempo ou enquanto há tempo. É que com as linhas de água não se brinca e não vale a pena argumentar que a engenharia resolve tudo e tudo previne, pois basta a mãe-natureza esquecer os passarinhos e os luze-cus, para inesperadamente qualquer engenharia ir por água abaixo seguindo as linhas com que a natureza se cose e riscando dos mapas os “rigorosos cálculos” dos humanos tantas vezes calculados em função de mais um lote, de mais uma urbanização, de mais uma negociata na vertical ou na horizontal.

É claro que será impossível pensar o mundo sempre em função de um hipotético dilúvio ou tornar a terra agradável e habitável sempre em função da pior catástrofe que se possa imaginar mas não prever. Mas tal como a natureza não dá saltos a todo o momento e muito menos avisa quando os dá, ela, a mesma natureza, mostra-nos também evidências sobre as quais o homem não pode saltar e com as quais se deve munir para não ser inteiramente surpreendido no momento mais inesperado ou quando passarinhos e luze-cus apontarem para tudo menos para catástrofe ou coisa perto disso. Linhas de água, fracturas sísmicas, arribas de costa... há mais evidências mas bastam essas três para que, no Algarve, seja aconselhável que tudo deva ser feito para se prevenir, e não ficar à espera para se remediar, mesmo que aquilo que se tenha que fazer seja demolir, rectificar, repor ainda que se ponha em causa o reputado autor do disparate. Antes que seja tarde. É que não só é mais barato e mais ético identificar já hoje os responsáveis por desvios e desvarios que, a benefício de uns poucos, amanhã podem prejudicar tragicamente todos, do que na hora da tragédia procurar culpados, ou, mais grave, ilibar responsáveis válidos com expedientes indecorosos.

Há felizmente capacidade técnica e científica para se fazer o diagnóstico e, volta e meia, alguns esboços de diagnóstico têm sido apresentados por entidades idóneas e que até sobem com êxito ao noticiário quotidiano se por acaso há algum sismo lá longe ou calamidade mais perto que mobilize bombeiros, escuteiros e protectores civis para algum necessário espectáculo da prevenção. Admite-se que este esforço esteja já a impedir ou pelo menos a tornar impopulares os tais “erros no futuro”, mas não se vê lá grande vontade em corrigir os erros do passado que são os que aí estão cometidos, alguns tais que não só arrepiam como entram pelos olhos, até de qualquer leigo, que não se resolvem com engenharias do tipo lego. Quem não conhece urbanizações sobre linhas de água ou sobre o que natureza, quando entender, considerará como uns simples canudos de brincadeira?

Carlos Albino

    Flagrante clareza: Sem aquelas derivas, se responde a muitos anónimos e a bastantes identificados que nos escreveram e responde-se claramente – há uns quantos cargos públicos no Algarve (que até não são muitos) que devem ser confiados apenas a Algarvios. Para os de lá, até é a regra que vale por costume político nas Beiras, no Minho e por aí fora incluindo o Alentejo.

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

SMS 350. Factor anímico


18 fevereiro 2010

Não há casa, café, rua ou mesmo alma que não esteja inquieta e, pior que inquieta, dividida sobre o que se está a passar. E não vale a pena dissimular pois a vida está como que suspensa desse factor que é a condição sine qua non de uma democracia que não seja arremedo ou não esteja mascarada. O factor é a confiança pública nas instituições e em instituições que não dependam dos indivíduos ou de qualquer que seja o indivíduo. A confiança pública nas instituições é o factor anímico, e sem esse factor haverá e sentir-se-á um vazio que jamais poderá ser preenchido por olhos que se vêem sem se ver os corações. Há muito que, aqui na poderosa repartição do estado e ali no pequeno pedestal da autarquia, ou este lá mais ao alto e aquele cá mais ao baixo, têm vindo a esticar a corda da confiança pública, em casos isolados mas cujo somatório crescente começou deveras a inquietar. Há muito que se foi notando que o poder estava a cair em mãos de quem trata da coisa pública assim como se joga ao pocker. Com jogadas, portanto. Mas ainda se acreditava na capacidade de escrutínio dos partidos, designadamente a capacidade de escrutínio interno, pois na verdade os partidos numa democracia não servem apenas para a conquista do poder pelo voto mas sobretudo para o escrutínio do exercício do poder e para o impedimento de jogadas de pocker ou de política decidida por golpes. Em qualquer democracia plena, os partidos são isso e servem para isso, doa a quem doer.

Só que, aquilo que se está a passar, não tem nada a ver com casos isolados nem com o seu somatório que, com toda a paciência, creio que todos estão dispostos a aguentar porque naturalmente o próprio calendário eleitoral e a garantia de eleições impõe, como preço, que todos tenhamos paciência com jogadas e jogadores. O que se está a passar tem a ver com o factor anímico de que o país precisa – confiança pública.

Ora este factor não depende dos votos, nem vai a votos, muito menos será corolário desse exercício de moções que de vez em quando agita o parlamento – esse factor ou se tem ou não se tem, ou há ou não há. E até já dependeu da crença que vinha dos discursos, da propaganda ou mesmo das figuras, mas já não depende disso – a confiança, agora, como nunca até antes de ontem, depende das convicções que o eleitor paga como contribuinte e das evidências que o contribuinte promove como eleitor, muito embora tais convicções e evidências sejam perturbadas, sem dúvida, por uma falange de serviçais da política que se encastoaram nos partidos como empregados de casino. E é isto que deve acabar, tem que acabar desde cá de baixo até lá ao alto, se queremos Democracia e se queremos que Democracia signifique confiança pública, sobretudo confiança nas instituições. E assim sendo, o problema não é tanto o da credibilidade do poder, mas o da confiança no poder.

Carlos Albino

    Flagrante pergunta: Afinal, a segurança social quer mesmo acabar com os centros comunitários ou não? Será razoável esperar que responda inequivocamente quanto antes aos referidos centros.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

SMS 349. Julgava-se que…


11 fevereiro 2010

O raciocínio que subjaz aos jogos de azar é o pior dos instrumentos para a economia pública. E mal vai uma sociedade quando os grandes investimentos não são planeados pelo previsível e em função de soluções para problemas previamente enunciados com rigor. Na verdade, a primeira pergunta a fazer para os investimentos públicos deve ser esta – qual é o problema? Mas não, os que lançam à sorte em última análise os dinheiros do contribuinte não formulam qualquer problema e avançam com soluções, as suas soluções mesmo que não haja problema. E depois que tenhamos sorte porque se fica a depender da sorte, coisa que é mais cega que o acaso. É assim que temos elefantes brancos, como no caso dos estádios com que se polvilhou o país como se polvilha um pastel de nata com canela.

Não duvido que um estádio para o Algarve fazia falta, mas não sei qual foi o problema que se formulou ou que problema; sei apenas que se arranjou aquela solução independente do problema pois um circunstancial jogo Portugal-Rússia de que pouca gente já se lembra, não era um problema do Algarve. Mas também não duvido que se julgava que o Farense iria ser uma equipa de referência nacional, ou que à falta de sorte com o Farense, o Louletano subiria a esse escalão mobilizador de multidões, de negócios certos e lucros compensadores. Ou ainda que, em caso de falta de sorte do Louletano, o Olhanense cumpriria esse papel de garantir uma justificação pública a um estádio público, se é que, mais remotamente alguém não tivesse pensado no Portimonense a fazer de suplente para a sorte do estádio. Julgava-se também que o estádio, ficando no internacionalizado Algarve, seria o cenário privilegiado com alguma regularidade para jogos internacionais, para torneios internacionais, enfim, para esses eventos que não apenas um mas oito ou nove elefantes brancos disputam, cada um para contornar a má sorte. Também se julgava que, depois do estádio, também ali ao redor haveria sementeira rápida de outros investimentos ou soluções para problemas, porque se julgava que o governo central era um seguro aliado de quem reclama soluções para problemas. O Hospital Central que devia estar lá há muito, não está, e outros equipamentos públicos ou estruturas de serviço para todo o Algarve que lá poderiam estar, também não estão, alguns, por assim dizer foram para recônditos becos de Faro por questão de bairrismo atávico e de capitalidade pífia. Faro está sem dinheiro, Loulé não quer e também não poderá dar mais um cêntimo, e o governo (o actual, os anteriores e por certos o que se lhe seguirá) onde os interesses algarvios não pesam nem onde o Algarve tem influência decisiva muito menos decisória, tem uma fila de elefantes brancos a quem acudir por falta de sorte.

Portanto, julgava-se que e agora explicam alguns que daqui a trinta anos talvez haja sorte, continuando-se a não formular o problema que é por onde se devia ter começado.

Carlos Albino

    Flagrante solução: A de revivificar o centro antigo de Faro com os estudantes universitários, como o reitor João Guerreiro propõe e Coimbra ensina há séculos. E para tanto comecemos por uma ponte aérea entre Faro e Gambelas sem molestar aquela exemplar espécime urbanística que é o Montenegro…

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

SMS 348. Um caso de prova dos nove


4 fevereiro 2010

Há um caso que por aí prova a incapacidade das câmaras e das polícias (GNR aqui, PSP ali) em fazer cumprir a lei, por vezes até saber da lei ou mesmo ultrapassar o compadrio. É o caso do Artigo 50.º invocado pelas placas de estacionamento proibido e que por aí se prega nas portas como se fosse um autocolante do Benfica. Todos sabemos como é que isso começa ou começou: faz-se um prédio com garagens supostamente destinadas ao condóminos ou arrendatários e como tal com direito ao tal Artigo 50.º, mas, passados uns tempinhos, as garagens deixam de ser para esse efeito dando lugar a estabelecimentos comerciais ou mais escandalosamente a casas de habitação, por regra sem condições e continuam com o Artgo 50.º como se fossem ainda garagens... Temos por aí centenas e centenas de tais casos sobretudo vindos dos tempos mais delirantes do chico-espertismo, quase sempre por obra de alguém com um compadre na câmara, compadre esse que legaliza o ilegal com mais normalidade que o diabo baptiza um anjo. A fiscalização camarária passa e assobia para o lado, os agentes da GNR ou da PSP passam e assobiam para o ar se é que não passam multa ou, com a autoridade que advém de sabedoria do género da das novas oportunidades, garantem ao comerciante em eventual altercação com o incauto cidadão transformado em infractor, que o sinal está legal e que, mesmo à evidência não existindo garagem ou parque, basta aquele sinal para a multa se tornar evidente. Isto acontece praticamente em todo o Algarve que é a região onde há mais placas do Artigo 50.º por metro quadrado, talvez mais até do que autocolantes do Benfica. Com certeza que temos a lei geral, e que há uma montanha de regulamentos municipais designadamente prevendo as condições do estacionamento de duração limitada. Mas para quê tanto trabalho se as próprias câmaras em obras novas procedem ao rebaixamento de passeios em frente de casas de habitação ou de estabelecimentos comerciais como se ali estivessem ainda as tais garagens para os condóminos ou arrendatários?

É claro que o caso do Artigo 50.º e das respectivas placas que se adquirem como uma pilha AAA na loja do chinês, não é um caso grave mas é uma metáfora do que acontece em tantas outras matérias onde leis e regulamentos muni pais são aplicadas como antigamente os fatos eram feitos à medida do corpo. Quase sempre à medida do corpo dos chico-espertismo que é uma epidemia para a qual, segundo parece, não há vacina. A lei do ruído, por exemplo, onde a prova dos nove dá sempre aquele erro que cheira a compadrio para as câmaras.

Carlos Albino

    Flagrante orçamento: Pois claro, o Orçamento de Estado é uma lástima no que diz respeito ao Algarve. Mendes Bota tem razão. Eu não gostaria que tivesse mas tem. A reclamada região é tratada como enteada e não admira porque o Algarve se calou o Allgarve. Para quê mais?