quinta-feira, 24 de abril de 2008

SMS 259. Jardim à parte

24 Abril 2008

As grosseiras e insistentes tiradas de Alberto João Jardim, pelos vistos já toleradas ou temidas pelos mais altos dignitários do estado, não ajudam em nada a caminhada que muitos partilham ou desejam no sentido da regionalização. Entende muita gente que tais tiradas não são «um estilo próprio», como o Presidente da República sugeriu, são reveladoras de uma forma indescritível de estar na política e, dentro da política, de estar no uso devido das capacidades críticas. E o que leva a tais tiradas não é de forma alguma «um exemplo supremo na vida democrática do que é um político combativo», como Jaime Gama fez render, é a transubstanciação do pior que o combate político pode colocar na hóstia da vida democrática, mas sempre possível numa ilha e por um ilhéu que se julga o centro do mundo, mas beneficiando na Madeira, como em nenhum outro território, das bordas periféricas da regionalização.

Estaria o País mal e sem destino, se em cada casa que não seja recife, cada rua que não seja ilhéu, cada cidade que não seja ilhota, cada região que não seja ilha, esse «estilo» e esse «exemplo supremo» fossem seguidos na política do recife, do ilhéu, da ilhota e da ilha. Primeiro, porque esse protótipo de Jardim instala o medo na sociedade – uma regionalização, de que a Madeira e os Açores são exemplos com expressão política por benefício constitucional e consenso nacional, não é um instrumento para roer a corda, roendo cada vez mais até parecer Kosovo doméstico sem o assumir por falta de coragem final, mas roendo sempre num malabarismo de excepção sediciosa em que vale tudo – da falta de educação elementar às grandes tiradas próprias de feiticeiro ou chefe que só por essa via amedronta a tribo a si sujeita ou de si refém. No entanto, o medo desse chefe de tribo ainda se tolera e até se ajeita ao folclore político que precisa de feiticeiros - o problema é quando, ou se do medo se passa à fase da imitação, e por aí se começa a pensar que cada rua deve ter o seu Jardim, e que para se ser chefe de ilhota se tenha de ter aquele «estilo próprio» e seguir aquele «exemplo supremo».

É oportuno que se diga que, para obterem a mera autonomia administrativa sem expressão política, as regiões portuguesas não precisam de Jardim – devem até manter esse estilo e exemplo de Jardim à parte. Tal estilo e tal exemplo inviabiliza o mínimo passo, não pelo medo do protótipo, mas pelos imitadores.

Carlos Albino

      Flagrante acordo: Para encurtar caminho, a partir da próxima SMS passaremos a redigir, com muito agrado, já pelas regras do novo Acordo Ortográfico.

quinta-feira, 17 de abril de 2008

SMS 258. Diplomacia municipal…

17 Abril 2008

Um acordo de geminação de um município isolado, pouco ou nada conta para o panorama do intercâmbio internacional de uma região, mas o total dos 26 acordos (por entre os 600 de todo o país) que os municípios algarvios mantém com autarquias estrangeiras, enfim, se forem ou fossem levados a sério, já são alguma coisa ou pelo menos dá para começar alguma diplomacia municipal.

Infelizmente nem todos esses acordos têm expressão política – além dos que estão desactivados porque morreram à nascença, alguns desses acordos são do reino do folclore e vivem aos soluços, outros não passam de manifestações episódicas de caridade oca, outros são oportunidade de convívio, de excursões mais ou menos bem sucedidas e salvam-se poucos como acordos de cooperação descentralizada e de relações autárquicas internacionais pautadas por propósitos de qualidade e excelência.

Olhando de relance esta incipiente «diplomacia municipal» do Algarve, não é difícil concluir que ela depende em muito do voluntarismo de presidentes de câmara, de simpatias sem sustentação por parte de grupos da terra ou, pura e simplesmente, de uma atracção pelo exotismo. Exceptuando um outro fenómeno de negócios em vista mas em acções casuísticas, não há uma estratégia delineada de cada município e muito menos uma estratégia concertada entre os municípios, que envolva diversas parcerias, designadamente da área económica, cultural e educativa. Por isso também nenhum município sentiu ainda a necessidade de criar um departamento de relações internacionais, pois para quê?

Vivemos metidos na concha e se a concha se abre é para excursões. É muito pouco, ou nada, para diplomacia municipal.

Carlos Albino

      Flagrante contagem decrescente: Para as eleições de 2009, europeias (soi-disant), legislativas e autárquicas. Quem quer ganhar e não está no poder tem que dizer em breve; quem está no poder, tem que deixar sugerido.

quinta-feira, 10 de abril de 2008

SMS 257. Atenção às diferenças

10 Abril 2008

Por via das escolas chega o primeiro grande sinal de um Algarve diferente, radicalmente diferente daquele que duas gerações conheceram – é um Algarve mais multi-cultural, muitíssimo mais pluri-étnico e manifestamente inter-nacional, com o hífen desta última palavra a acentuar o seu significado original. As estatísticas, apesar de desfasadas e de não poderem retratar com rigor a realidade continuadamente movediça, já tinham dado esse sinal, mas sem suscitarem a urgência de medidas ou a premência de reflexão sobre o modelo organizativo da sociedade em que cada cultura, etnia e nacionalidade se foi arrumando mais ou menos pacificamente, cada uma prosseguindo as suas regras, os seus hábitos e gostos que, vistos de fora, até têm sido apreciados nuns casos como saudável folclore, ou como bitola exemplar noutros casos de comunidades estrangeiras tradicionalmente portadores dos estandartes de civilizações supostamente mais avançadas, mas que têm mantido equilíbrio entre excessos de sobranceria e manifestações de tolerância convivencial. Mas quando tudo isto chega à escola – havendo escolas com dezenas, largas dezenas de etnias e nacionalidades transportando culturas díspares – há que repensar o modelo, não pelo receio de que os factos nos ultrapassem mas para se construir uma sociedade sem receios.

Sobretudo, as políticas locais que já não podem ser mono-culturais – a língua aprende-se, a cultura não. Tais políticas, cada vez mais, e mais aqui do aqui ali, têm e devem ser mais pluri-culturais, devem atender cada vez mais aos factores inter-religiosos (questão que até há pouco quase não se colocava), tendo alguns municípios que criar departamentos especializados de acompanhamento e apoio, e não apenas iniciativas casuísticas e pontuais, algumas no patamar de caridade.

Carlos Albino

      Flagrante falta de pontualidade: A da Mãe Soberana de Loulé, com quase duas horas de atraso no programa, num total desrespeito numa manifestação que para além do legítimo culto, expressa inestimável denominador de convivência humana que é sua mágica e estima.

quinta-feira, 3 de abril de 2008

SMS 256. Camaroeiro de votos

3 Abril 2008

O governo já começou com o corte de obras no Algarve, e começou pelo elo que lhe parece ser o mais fraco – Guterres já tinha feito o mesmo que Durão Barroso agradeceu. E tinha que ser.

Para satisfazer o imenso cardápio de reivindicações para a Região Oeste (não foi acaso que a isso fizemos referência na SMS de 7 de Fevereiro), em compensação da perda de um aeroporto que nunca existiu, e para outras obras de vulto que o calendário eleitoral aconselha sem adiamentos noutras zonas de simpatia do país, olhando para o mapa, o que é que o Algarve conta? E o que conta no Algarve? Ou por que insondável motivo conta?

É isso que o ministro Mário Lino, para já, deveria vir explicar, se é que pode explicar, ou seja necessário explicar, porquanto a região ficou docemente pacificada ou inoculada com o assunto da requalificação da 125 que se julga ser o remédio para todos os males, e, não só remédio mas também razoável ou mesmo eficaz camaroeiro para apanha de votos. É o que vai ser, porque a quebra de compromissos já entrou nos hábitos da política. E assim vai tomando perversa força aquela pergunta retórica – «Desde que não mexam no meu quintal, que me interessa que mexam no quintal dos outros?». Perversa porque, algum dia, verão que estão todos no mesmo quintal. E então será tarde para dar conta do engano e justificar os desenganos.

Carlos Albino

      Flagrante dúvida: Mas então as comissões concelhias dos partidos não são capazes de escolher listas sem sondagens? E isso faz-se por sondagens ou por critérios, condições e perfis que é o que justifica partidos numa democracia?