quinta-feira, 29 de abril de 2010

SMS 360. Dependentes da sorte


29 abril 2010

Aí temos o Anuário Financeiro dos Municípios relativo a 2007, portanto, com as antenas viradas para antes da crise. O anuário dá obviamente uma ideia mas é já uma ideia ultrapassada – a generalidade das autarquias cuja eficiência financeira em 2007 podia ser vista com conforto, hoje estão desgraçadas ou à beira da desgraça, e as que já nessa data estavam desgraçadas, hoje mais desgraçadas estão ou mesmo perto da falência. No caso do Algarve, o anuário diz aquilo que a gente já sentiu nas ruas e que fez parte das conversas de responsabilidade, quanto a resultados económicos das autarquias ou mesmo quanto a rankings de eficiência financeira.

Nos 30 municípios (grandes, médios e pequenos) com maiores resultados económicos a nível de país, Loulé surge à cabeça, à frente de Braga, Loures, Oeiras e Sintra, seguindo-se em 5.º lugar Albufeira., com Tavira em 20.º, Lagos em 27.º0. E nos municípios com menores resultados económicos, lá surge Portimão em 5.º lugar e Olhão em 27.º. Quanto à eficiência financeira, por entre os 50 melhores municípios registam-se igualmente as presenças de Albufeira, Lagoa, Lagos, Loulé, Tavira e Vila Real de Santo António. Dá portanto uma ideia mas válida para 2007, mas em três anos tudo mudou radicalmente quanto a lógicas de prosperidade, de liquidez, de receitas de impostos e de independência financeira. Por exemplo, em 2007, Loulé surgiu como o município do país com o maior peso de receitas provenientes de impostos, à frente de Cascais, Lisboa e Oeiras seguindo-se Portimão em 5.º e Albufeira em 6.º, mas hoje já não se sabe se é assim. Aliás, até pode ser assim mas tudo está diferente, pelo que pensar nos números de 2007 é um exercício do passado e, em certo sentido inútil, porque não se vive apenas de autarquias, mas sobretudo de empresas ou de empresas que estejam longe da falência. Com uma rapidez impressionante, a crise tornou efémero qualquer prestígio de desempenho local e mostrou como o Algarve está apenas à mercê do acaso e apenas dependente de uma sorte que não domina e na qual não pode interferir.

Carlos Albino

    Flagrante temor: O do fecho de jornais locais no Algarve, a seguir à redução de periodicidade, depois do fracasso quase geral das rádios locais.

quinta-feira, 22 de abril de 2010

SMS 359. A liberdade


22 abril 2010

E mais uma vez chegamos a um momento do calendário em que parece ser ritual obrigatório dar vivas à liberdade. Na verdade, a conclusão a que podemos chegar após estes anos todos de vivas, não é alarmante para o único modo de jornalismo que vale a pena – o independente. Lá por isso, não devemos adormecer ou viver distraídos. O país tem estado imune a autoritarismos ou a cerceamentos mais ou menos explícitos de liberdade de informação e opinião, não só reagindo ao mínimo sinal ou indício disso como também recriminando faltas de responsabilidade ou manipulações abusivas – está provado que todos queremos ser livres e que gostamos muito de ser livres, mas importa saber se isso basta, ou se basta sentir isso apenas em abstrato.

No que particularmente diz respeito ao Algarve, que não tem televisão própria, onde se lê pouco (muito pouco), e com as rádios a subsistirem por artes mágicas, há liberdade, como diria La Palisse, porque também não há motivos para não deixar de haver – e se damos vivas por isto, damos vivas por pouco. Sem televisão regional, sem jornais suportados por alguns bons (mas bons) milhares de leitores e sem rádios de referência no plano informativo, em suma com o mundo comunicacional a revelar uma forte dependência da única agência noticiosa que opera e da papelada oficial, podemos dar vivas à liberdade, todos os vivas, mesmo que distraídos não demos conta que pouca imprensa pode fiscalizar e pouca rádio pode escrutinar, não havendo mais nada, à exceção dos sites e blogues que obviamente podem desenvolver atividade próxima ou parente da profissional mas não se lhes exigindo isso. É nestas circunstâncias que não deixa de causar arrepios quando se ouve responsáveis regionais, ao mesmo tempo que dão vivas, a declarar publicamente que o papel da imprensa não é o de fiscalizar mas apenas o de noticiar, como se a pouca ou quase nula fiscalização incomodasse. E causa arrepios porque tais responsáveis deveriam sim é sublinhar o enorme e escandaloso défice informativo e comunicacional na região, reclamando medidas e programas para o debelar. Se o tivessem feito já, então sim, ninguém duvidaria dos seus vivas à liberdade.

Tais responsáveis deveriam incomodar-se com o facto da liberdade de informação e de opinião significar pouco mais que uma dúzia de pequenos e débeis jornais resistentes a barrigas de aluguer, e que outros tantos postos de rádio feitos muitas vezes com heroicidade igualmente resistente a rebuçados de falsa economia, reproduzam os éditos emanados dos gabinetes, gabinetes estes que também dão vivas à liberdade, e não se saindo daqui porque as agendas municipais fazem o resto.

Carlos Albino

    Flagrante insegurança: Regressa a onda de assaltos a pessoas e residências, sobretudo nas zonas rurais. Há qualquer coisa que está a falhar e os bandidos sabem disso.

quinta-feira, 15 de abril de 2010

SMS 358. Lá para cima e ilhas adjacentes


15 abril 2010

Com toda a franqueza, esperava-se que, desta vez, alguém do poder autárquico Algarve fosse nomeado para integrar a delegação portuguesa ao Congresso dos Poderes Locais e Regionais do Conselho da Europa. E se não fosse como membro efetivo, pelo menos como suplente. Mas nada disso aconteceu, pelo que na última sessão plenária em Estrasburgo (17 a 19 de março) por entre os 14 elementos da delegação portuguesa, do Algarve, nada. Como há muito tempo acontece, o que de resto vem na lógica de se te substituído a antiga expressão de Portugal continental e ilhas adjacentes pela de Portugal lá de cima e regiões adjacentes, com o Caldeirão-Monchique a definir o que está em cima e o que está em baixo.

Nomeada para exercer mandato até 2013, a delegação integra para a Câmara das Regiões 4 elementos efectivos da Madeira, Açores, Região Centro e Junta Metropolitana do Porto, com 3 suplentes (novamente Madeira, Açores e Junta do Porto), enquanto na Câmara dos Poderes Locais lá estão 3 efetivos, autarcas das câmaras de Sousel e Beja, e outro da freguesia de Oliveirinha, com 4 suplentes, igualmente autarcas das câmaras de Miranda do Corvo, Caminha e Alcanena, mais um da freguesia de Torgueda.

Na anterior delegação, há dois anos, já tinha sido assim e disso demos conta na SMS 265 (junho de 2008). Para a Câmara dos Poderes Locais para lá foi gente da Covilhã, Sousel, Cabeceiras de Basto, Leiria e Torres Novas, além das eternas presenças dos eternizados fregueses de Oliveirinha e Torgueda que já devem conhecer melhor Estrasburgo do que o próprio presidente da República, e para a Câmara dos Poderes Regionais para lá foram pontuar o óbvio Carlos César, obviamente Alberto João Jardim, mais, dessa vez a Junta Metropolitana de Lisboa, com substitutos também da Madeira, dos Açores, mais um da junta do Porto e outro ainda da junta de Lisboa...

É claro que, como em tudo o que existe em Estrasburgo, quem lá está ou para lá vai pode fazer muitas coisas e também pode não fazer rigorosamente nada ou fingir que faz muito e nada fazer – tem havido de tudo e o próprio Algarve tem tido vários desses exemplos que vão da formiga trabalhadora à cigarra fanfarrona. Mas não é isso que está em causa. Independentemente de quem lá está, o que é chocante é a sistemática marginalização do Algarve em estruturas de representação política regional, paradoxalmente sem grande contestação regional ou local. O que quer isto dizer que alentejanos do Algarve, beirões do Algarve, transmontanos do Algarve e demais marroquinos de Oliveirinha e da Torgueda se sentem bem representados no congresso do Conselho da Europa afinal pelos seus verdadeiros conterrâneos porque o país desde há muito voltou a ser o Lá de Cima e Ilhas Adjacentes, como se viu nas listas para as legislativas, para o Parlamento Europeu e como se tem verificado para os mais importantes cargos políticos regionais que não sejam ONG’s ou IPSS.

Carlos Albino

    Flagrante reparo: Ainda mal se sabia se a SMS da passada semana teria mais um ou dois leitores do que o habitual, e eis que nos chega um e-mail com isto: “Apenas para informar que os títulos: Olhão Fez-se a Si Próprio, por António Rosa Mendes, tenho-o em Estante desde 10 de agosto de 2009, e que O Convento da Graça, por João Miguel Simões, tenho-o em Estante desde 9 de fevereiro de 2009.” Já nos tinham assegurado que, em matéria de livros, no Algarve, todos os caminhos não vão dar a Roma mas à Livraria Simões, em Faro, que nos endereçou o e-mail e fez prova dessa verdade.

quinta-feira, 8 de abril de 2010

SMS 357. Amor e conhecimento


8 abril 2010

Falando de livros, nota-se à evidência uma onda de edição no Algarve, apadrinhada sobretudo perlas câmaras, e que vai da monografia em particular à poesia em geral. Esqueçamos por ora as motivações e custos dessa relativa febre editorial, mas não é difícil notar que a generalidade da produção, se de monografia de trata, não vai além da reedição e aumento da lenda por vezes com aparato académico, e se é poesia, muito do que por aí se publica não vai além do verso rimado ou então da metáfora de umbigo. As edições são, por regra de escassa tiragem, de modo que os livros dão para familiares e amigos do autor, ficam uns quantos na biblioteca em descansada memória, e ainda há outros tantos para visitantes dos paços do concelho que os recebem de presente, agradecem com um sorriso mas que na generalidade nem folheiam. O fenómeno não é específico do Algarve, grassa pelo país fora, e algumas embora poucas empresas da capital até se especializaram no negócio, ou na indústria, como se queira. É claro que nesta torrente se confunde o que tem valor e o que seguramente é dispensável, porquanto há obras preciosas que se perdem no meio de outras cujo número as submerge e faz eclipsar. Além disso, a excessiva municipalização da edição e no que esta passou a significar no que toca a apoios acríticos à edição, impede a afirmação ou até mesmo a tentativa da iniciativa privada nesse domínio em que a independência do poder e dos interesses de afirmação política é garante de liberdade e competitividade quanto à criatividade intelectual. E é pena pois o amor à terra não se justifica sem o conhecimento da terra, e quanto a conhecimentos ninguém pode dar o que não tem.

Mas calma! Nem tudo é mau, há bastante de proveitoso e até mesmo de altamente proveitoso. Exemplos? Há mais, mas dois bastam. Um, é o belo livro de António Rosa Mendes - “Olhão fez-se a si próprio”. Outro, é o da lição que João Miguel Simões dá com “O Convento da Graça”, o daquelas ruínas de Loulé. Corri livraria atrás de livraria à procura desses dois títulos que me faltavam na estante e de que tinha referências bastantes para apetecer, mas apenas recentemente por obra de meros acasos os livros vieram-me parar às mãos. Li-os e sem dúvida que estão perfeitamente na linha do conhecimento da terra como condição do amor à terra. São duas obras em que se aprende o Algarve, independentemente dos pretextos locais de Olhão ou de Loulé. Duas obras de grande qualidade, cabendo dizer, neste breve apontamento, Obrigado António Rosa Mendes! E obrigado João Miguel Simões!

Carlos Albino

    Flagrante dúvida: Será que todos os municípios têm a consciência de que devem respeitar a inter-religiosidade, a diversidade religiosa e que não podem afirmar-se, directamente ou indirectamente, como confessionais? Há dúvida nisso.

quinta-feira, 1 de abril de 2010

SMS 356. Avestruzes


1 abril 2010

Anda por aí muita avestruz. Vêem o desemprego que no Algarve é do pior que o país apresenta, e não só enterram a cabeça na areia como querem que os outros à viva força imitem as avestruzes, não sendo nem querendo ser bichos que tais. Vêem a insegurança com o aumento da criminalidade a fazer notícia diária em cada terra, mas, com a cabeça metida lá bem para o fundo da cova de conveniência, argumentam com as estatísticas do ano passado para este ano ou com as comparações de queixas no período homólogo como se as pessoas acreditassem ou tivesse que acreditar nessa palraria artificial. Vêem o turismo a cair em quantidade e em qualidade com perda de mercados, mas adiam formular o problema e encontrar solução, com promessas de mirabolantes promoções supostamente salvadoras e com anúncios de mercados alternativos que não passam de miragens. Vêem a agricultura como está, e ainda falam do golfe como o ouro que se pode encontrar em toda a região. Vêem as pescas como estão, mas disso pouco mais conhecem ou querem conhecer que a peixaria bem provida da grande superfície ali ao lado. Vêem o grosso das escolas secundárias a primarizar-se e o que há de universidades a secundarizar-se, mas vão de vento em popa como se fossem elites do pensamento em veraneio e sem que uma única vez na vida se incomodem com o facto do Algarve não ter um escol digno deste nome e digno dessa função. Vêem que o Algarve não beneficia de uma estratégia cultural traçada com princípio, meio e fim, mas o que lhes importa é que o Olhanense se mantenha, o Portimonense suba e o Teatro das Figuras se encha com a misericórdia de deus, até porque o Dia de Portugal já vai ser em Faro. Com tanta avestruz, como é que neste areal não volta a ter êxito apenas quem seja acrítico e os idealistas não passem de uns fracassados?

Carlos Albino

    Flagrante pedido: Temos em mão um livro inédito com 837 quadras em que “alpista” rima com “sacrista” e “manta” com “sacripanta”... Qual é o município que quer apoiar a edição desta manifesta e genuína cultura popular?