quinta-feira, 30 de junho de 2016

SMS 673. Não teremos Algarvexit

30 junho 2016

O que se temia está a acontecer. No dia seguinte ao 24 de Junho, um pouco por todo o Reno Unido, assiste-se a manifestações xenófobas desabridas e revelam-se rancores racistas até agora mantidos em silêncio, lá onde havia um certo fair play ou pelo menos uma tolerância educada. É a prova de que o tom dos políticos, as suas frases, as suas promessas, as suas mentiras e as suas verdades agem sobre a conduta das populações. A prova de que o discurso político solta efeitos imitativos que se reproduzem como as imagens em espelhos paralelos, efeitos que se propagam e expandem em progressão geométrica. Nada de pior poderia acontecer, no momento em que do outro lado do Atlântico uma figura como Donald Trump anda à solta pelas pradarias dos Estados Unidos, ateando o ódio. É caso para reflectirmos, para percebermos quem somos e em que lugar nos encontramos.

Os portugueses não são nem racistas nem xenófobos, ou pelo menos não o são numa escala percetível que nos coloque entre os povos intolerantes perante a diferença étnica e cultural. O facto de nos adaptarmos a todas as latitudes da Terra, e o termos feito ao longo dos séculos, sem dramatismos, leva-nos a aceitar o reverso, a aceitar no estreito rectângulo onde vivemos, pessoas provenientes de todas as latitudes e todas as culturas. O Algarve, como se sabe, no sul desse rectângulo, funciona como uma espécie de resultado de todas as somas dessa cultura, mais do que tolerante, pacífica. Podemos ter muitos defeitos, mas o convívio de igual para igual é a nossa marca de água local. Por outro lado, a comunidade britânica residente, à exceção de esporádicas manifestações de altivez, acessos de arrogância imperialista que por vezes acontecem, vive e convive entre nós, respeitando-nos, compreendendo-nos, trocando connosco o que têm de melhor. São bons visitantes que escolheram a nossa terra como segunda pátria. Bem-vindos sejam. Neste momento, porém, o que se desenha no horizonte não está ausente de nuvens. A descida da libra, e todas as alterações que se avizinham, pode criar dificuldades aos britânicos e consequências para nós. Por eles e por nós, devemos estar preparados. Porém, se algum estremecimento vier a ocorrer, que ele nunca provenha de ressentimentos, vingança xenófoba, incompreensão pelas diferenças. Os motivos que levaram os britânicos a votarem o Brexit não serão por certo aqueles que moverão a população do Algarve eventualmente afetada. Na nossa região, por certo, por nossa vontade, sentimento, e conveniência, nunca haverá Algarvexit. Essa palavra não existe no nosso dicionário latino. Mas que sejam os próprios ingleses residentes na região ou passantes, a concluir que a lição não é apenas para inglês ver.

Carlos Albino
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Flagrante miopia: Depois dos fracos e escassos resultados de Faro Capital da Cultura e da tontearia do Allgarve, um terceiro programa que se anuncia como que caído das nuvens, sem se ouvir ninguém e como que outorga do poder central como se a Cultura tivesse que ter sazonalidade, sugere todos os elementos para falhar. Insiste-se na muita parra e pouca uva. As instituições e pessoas de referência da região deviam ter sido ouvidas. Assunto para desenvolver.

quinta-feira, 23 de junho de 2016

SMS 672. Educação ou temperamento?

23 junho 2016

Se queremos estar em paz connosco próprios, devemos evitar discutir como se define o comportamento de um povo. Esse é um assunto inquietante porque nunca se chega à conclusão sobre se se trata de um modo de agir fruto de um temperamento, isto é, o resultado de uma formação orgânica, e pensamos nos genes, no território, na direcção do vento, na incidência do sol, e até na água que bebemos, ou, se pelo contrário, as atitudes cívicas dependem de factores culturais, como sejam a História e a Educação. Para nosso sossego, preferimos sempre por optar pela segunda via. A crença em que a Escola, as Instituições e a Política podem alterar para melhor os comportamentos humanos, fazem-nos acreditar que não só a melhoria é possível, como o ritmo da mudança pode ser acelerado se nos empenharmos nesse sentido. É o que parece ter sido tentado ao longo das últimas décadas. Mas o sucesso, que é algum, ainda é muito limitado. O povo não é uma abstracção, é o somatório de actos individuais, e quando descemos aí, percebemos que o povo, o nosso povo, no sentido mais lato, aquele que engloba as classes altas e as ditas baixas, mantêm os antigas estigmas de lentidão e falta de iniciativa absolutamente assustadores.

Os exemplos colhidos do quotidiano são gritantes. Basta sair de casa e confrontarmo-nos com os serviços públicos. Um exemplo? A Estrada 125 está em obras, a zona de intervenção não é extensa, os nós em causa são simples de ultrapassar. Então porque se formam filas de carros, com pessoas ao volante que não sabem para onde ir, nem com quem falar? Experimentem a querer informar-se junto de um dos muitos agentes da GNR que estão parados junto ás obras. Eles acabam de chegar de terras estranhas ou longínquas, e por isso não conhecem o assunto e apenas dizem para seguir as setas. Ou então dizem que não têm alternativa e rolam o braço para que se acelere, e se avance em frente. Ou então não conhecem o piso e estão ali deslocados de outros serviços. Se perguntamos porque não existe um croqui, uma indicação mais precisa, o agente limita-se a dizer – “Vá ao posto e faça queixa”. E continuam a fazer com o braço aquilo que a seta faz - “Vá em frente”. E em frente, vamos dar ao lugar oposto para onde queremos ir.

Muitos parabéns a esta ajuda. Estamos no centro do centro de uma região turística de excelência, consideramos. Este mesmo desmazelo justifica que o poder central nos ignore, e que as petrolíferas queiram abrir poços no Algarve. Eles sabem com o que contam – com pessoas que estendem o braço para dizerem de olhos fechados pela força do sol – “Olhe, vá em frente”. Até José Hermano Saraiva considerava que o problema deste povo consistia na coexistência de élites corruptas e populações passivas. Se passarem pela 125, e mergulharem no caos do trânsito, em vez da queixa junto do comando da GNR, sugiro que chamem uns quantos agentes da polícia de Espanha ou do Reino Unido. Talvez eles não se limitem a levantar o braço como autómatos. Talvez se tenham informado dos circuitos alternativos e sintam que é bom cumprir por iniciativa própria. Quanto nos falta para chegarmos lá?

Carlos Albino
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Flagrante reforço: Na caça à multa e com partes gagas. Claro que qualquer polícia inglês, espanhol ou francês sabe que não pode mandar parar sem motivo aparente ou fundamentado. 

quinta-feira, 16 de junho de 2016

SMS 671. Jóia da coroa

16 junho 2016

Não é preciso dar muitas voltas para se perceber que a Universidade do Algarve precisa de ser rodeada de mais cuidados. Acessos, envolvência, sinalética, o próprio território universitário, etc., merece melhores olhos. Qualquer coisa, muita coisa está mal à vista desarmada por aquelas bandas. Não digo que seja laxismo, mas parece; não digo que seja lassidão, mas tudo leva a crer que é isso; não digo que seja uma espécie de desprezo, mas parece que, nas Gambelas, a universidade para ali está atirada para um retiro e que, na Penha, para ali está arrumada numa espécie de bazar labiríntico. É claro que, quer num sítio quer noutro, a coisa nasceu e possivelmente cresceu mal, designadamente quanto ao urbanismo que só não entra pelos muros porque tem que haver espaço para a carreira do pachorrento autocarro que serpenteia como que num sacrifício para ligar Faro aos confins do seu mundo. Não é preciso discorrer muito para se concluir que se cometeram erros insanáveis para que a Universidade do Algarve se abrisse aos olhos num cenário digno, adequado e estimulante, com profunda e evidente ligação à cidade que lhe serve de cama.

Por dentro da universidade, a coisa diz respeito à própria universidade, às circunstâncias de crise, às derivas da política geral, enfim, a tudo o que vai bater com o orçamento de um Estado que, em matéria de universidades, também se tem revelado excelente pai para umas e mau padrasto para outras. Mas por fora, a coisa diz respeito a quem desde há muito já devia ter reconhecido a universidade como a jóia da coroa do Algarve, se é que ainda o Algarve esteja coroado onde deve ser coroado - em Faro e não propriamente no Cachopo.

Repensar as ligações dos espaços universitários com a cidade anfitriã; repensar traçados de acesso ou pelo menos melhorar as condições de circulação; repensar a iluminação; repensar o ambiente físico de acolhimento; estimular serviços e atividades que se compaginem com a instituição, independentemente do que no seu interior ocorra, enfim, há um sem número de iniciativas que deviam ser tomadas, algumas com imediata urgência.

Nisto, Faro tem responsabilidades.

Carlos Albino
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Flagrante policiamento: Com certeza! Depois da Guardia Civil, polícias ingleses e franceses a patrulhar o Algarve. Mas quem patrulhará os polícias, a não ser Capacetes Azuis?

quinta-feira, 9 de junho de 2016

SMS 670A política também tem a sua 125…

14 junho 2016

Quer nas curvas mal desenhadas para a direita, quer nos enfiamentos mal assinalados à esquerda, quer ainda nos casos da condução ao centro nas retas com lombas imprevisíveis, a política algarvia assemelha-se à 125 no seu pior, quando menos se espera. A maior parte dos desastres, é da culpa exclusiva de quem conduz sem a exigível carta ética ou com carta ética caducada. E em alguns casos, os acidentes até seriam evitáveis se, independentemente de carta ou não, o condutor político aceitasse regras básicas, tais como usar óculos na eventualidade de falta de acuidade visual, tomar vitamina A ou comer muita cenoura na circunstância de incapacidade de resistência ao deslumbramento, ou ainda não ingerir poderes alcoólicos. Além disso, cuidados especiais para os que andam na política em duas rodas e não distinguem piso molhado de piso seco, ou andam a 180 com pneu já furado.

Vem isto a propósito do episódio da exoneração do presidente da CCDRA. Foi um desastre evitável. Como aqui se escreveu e se reafirma, essa condução tinha que ser interrompida por inabilitação de carta. De carta ética, não mais. Dirigir regionalmente um partido altamente interessado na corrida das autárquicas e ao mesmo tempo gerir o combustível para abastecer os motards municipais litigantes, além de poder dar a alguns água com açúcar em vez de gasolina, seria contribuir para que o hospital de Faro deixasse de se dedicar à saúde e passasse a ser hospital autárquico em 2017 e hospital político a qualquer hora inesperada, dada a qualidade dos condutores da 125 da política.

Aliás, uns tantos por aí disseram, escreveram e repetiram que a exoneração do condutor da CCDRA foi motivada por “pressão do PS” ou “autarquias do PS”, tanto faz. Nas circunstâncias similares de falta de carta, qualquer agente de trânsito não fecharia os olhos a falso testemunho ou a qualquer explicação dolosa do condutor. No caso, a questão é de carta ética, obrigatória seja o condutor do PSD, da CDU, do BE ou do PS, já que o CDS não tem condutores na nossa 125 metafórica mas apenas alguns mecânicos.

Resumindo e concluindo: foi bem exonerado e devia ter pedido a demissão atempadamente. Ganharia pontos na carta, em vez de os perder.

Carlos Albino
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Flagrante prestação de informação: O novo presidente da CCDRA deve informar com rigor quais os subsídios e apoios concedidos em 2015 e 2016, designadamente na área da comunicação social. Primeiro, a lista de quem é de quanto; depois diremos porquê.

quinta-feira, 2 de junho de 2016

SMS 669. Eles sabem manobrar o tempo


Não quero utilizar uma célebre frase de Millôr Fernandes que, em apenas algumas palavras, resumia a diferença da manobra do tempo entre o agir dos que se julgam sábios e o agir daqueles que ingenuamente tomamos por imbecis. Nada disso. Apenas vou parafrasear a sentença dizendo-a em modo suave – Enquanto os líricos discutem na incerteza, os interesseiros assaltam de surpresa.

É precisamente na diferença da função desse intervalo, esse enquanto de que falava Millôr, que estou a pensar, decorrida uma semana após a discussão em torno das concessões para prospecção e exploração de petróleo e gás natural no Algarve. Ao longo de oito dias, os líricos apresentaram argumentos, manifestos, mostraram-se unidos, enraivecidos, invencíveis do ponto de vista da razão, e agora estabelece-se uma pausa durante a qual cada um pensa que isto não vai por diante, que seria uma loucura, e porventura um crime. E como ninguém embarcará numa loucura, e muito menos publicamente perpetrará um crime, podemos dormir descansados.

Não é verdade. Não podemos dormir descansados. Este tempo, o tempo do intervalo durante o qual pensamos que a causa absurda está vencida, por parte dos líricos, é um tempo de trabalho afanoso das partes dos interessados. Enquanto nós dormimos, há quem não durma. Do outro lado, há quem se rodeie de engenheiros prontos a esburacar na terra como se não houvesse pessoas, professores universitários prontos a criarem documentos lógicos que nem tratados de Descartes, como se não houvesse outras lógicas que não as da oportunidade imediata e só para alguns, advogados que invocam leis de há vinte anos, como se o mundo entretanto não tivesse mudado e as leis gerais hoje não fossem outras. Pior do que isso, enquanto nós dormimos, descansados pelo nosso efeito retórico, e pelo nosso movimento musculado, e fazemos uma pausa, os interessados em transformar um património público em património privado, só mesmo para alguns, há quem espalhe panfletos, dê entrevistas, vá junto das populações, e diga que os desempregados de agora, com o petróleo e o gás natural, terão emprego num futuro próximo. Há quem espalhe a falácia de que somos egoístas, queremos andar de carro, mas não queremos contribuir para a produção de gasolina. Isto é, há quem esteja disposto a misturar todas as causas, retirar-lhes o seu contexto e subverter os tempos, e não durma por isso, enquanto os líricos estão dormindo. Por acaso, esta noite, eu estava acordado e vi chegar a notícia de que deputados e especialistas dos Estados Unidos, México e Colômbia estão a relacionar os recentes sismos ocorridos nos seus países com a exploração dos hidrocarbonetos nas imediações, ali vastas. Como se vê, coisa simples.

Carlos Albino
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Flagrante comparação: O que a Escócia recebe, nada perdendo, absolutamente nada, e a suja percentagenzita que querem dar ao País, perdendo o Algarve quase tudo (será o “turismo da alforreca”, e como se sabe, nenhuma alforreca se instala no Conrad).