quinta-feira, 25 de novembro de 2004

SMS 81. Duas coisas para registo

25 Novembro 2004

1. Pugna. A primeira coisa que pode e deve ficar registada foi dita por Mendes Bota, agora de regresso à liderança do PSD/Algarve: «Queremos obter, finalmente, uma eleição directa por sufrágio universal para a Junta Metropolitana do Algarve. Esse é um objectivo político: mudar a legislação, para que dentro de poucos anos seja possível eleger o presidente da região do Algarve». Apesar de Mendes Bota reduzir a Regionalização a essa eventual eleição directa – como se a regionalização fosse apenas um sufrágio festivo, o que será o mesmo que exigir a uma banda filarmónica que seja orquestra sinfónica – essa promessa de pugna do regressado líder social-democrata é para registar. Daqui a algum tempo valerá a pena recordar…

2. Jamila. A segunda coisa para registo, enfim, é proveniente da eurodeputada do PS, Jamila Madeira que sugeriu e pelos vistos convenceu a Comissão do Desenvolvimento Regional do Parlamento Europeu – 51 elementos do PE presididos pelo espanhol Gerardo Quecedo, portanto com direito a festa especial em Vilamoura – para uma reunião no Algarve, até lá para Março. Muito provavelmente os eurodeputados terão tempo escasso para se comoverem com o facto dos critérios estatísticos virem a sacrificar o Algarve em matéria de apoios da EU (pelas estatísticas os Algarvios estão ricos!), certamente ficarão comovidos com o estado em que ficou a Serra do Caldeirão, reconhecerão por certo que a água escasseia, e maravilhados ficarão com os colonatos turísticos da beira-mar e pelas falésias fora. Mas é bom que os eurodeputados desçam à terra e que por ora se registe a intenção. Pouco antes de chegarem, diremos o bom e o bonito.

Carlos Albino

quinta-feira, 18 de novembro de 2004

SMS 80. Pensar já no Presépio talvez seja o melhor...

18 Novembro 2004

Enquanto os estados-maiores dos partidos pensam nas listas para as autárquicas que onde se vende mais gato por lebre, eu prefiro começar a pensar já na construção do presépio doméstico de 2005. Como sempre, uso as belas pedras exóticas da Tôr guardadas de um ano para o outro, as delicadas figuras de barro artesanais, engendro umas coisas com água, lá vou buscar o moinho algarvio, o castelo sem dúvida muito menos parolo do que o de Paderne, uma azenha simulacro da que que já existiu na Goncinha – tudo a valer e mexer, caminhos de areia, enfim, o sonho, o mito e a procura de conforto íntimo que tanto mais conforto será se houver partilha com queira ver. Tudo para desarmar depois, é certo, mas vale a pena. Portanto, enquanto o PS parece que quer repetir o pior dos tempos que precederam o tempo desse frustrante Guterres e enquanto do PSD chegam sinais de que poderá ser reposta uma das piores cenas que Cavaco percebeu possivelmente melhor do que ninguém, por estas semanas, até Natal, vou pensar no Presépio. A preceito. Convido os leitores a fazerem presépios também a preceito. Talvez seja melhor pensarmos no Menino do que nas velhas ratas sábias de sempre.

Carlos Albino

quarta-feira, 10 de novembro de 2004

SMS 79. Antígona para cabeça de lista

11 Novembro 2004

Slogan da campanha. Grande noite a que tive em Faro, no Teatro Lethes. Descontados alguns pormenores por certo corrigíveis, a Antígona encenada por Luís Vicente tem o meu voto: escolho-a para cabeça de lista. Em boa hora, o grupo de teatro ACTA que, para fazer isso mesmo – Teatro –, tem sido um grupo de heróis lutando contra a falta de meios, a falta de instalações e a falta de apoios firmes e decididos (têm-se visto gregos…), propõe aos Algarvios este monumento do pensamento político, construído por Sófocles há 26 séculos mas porque é mito – um dos mitos mais inquietantes que a Humanidade já produziu até hoje – está actual. A discussão entre Creonte e o seu filho Hémon é um diamante de arte política que apenas o teatro pode encastoar precisamente no ouro do mito. «Haverá muralha que proteja a cidade do perigo que dentro dela se engendra?» é a pergunta que o Corifeu dirige a Creonte mas que a Antígona, quer se candidate contra os Crente locais em Olhão, Loulé, Portimão, Silves ou São Brás e em Vila do Bispo, pode converter em slogan da sua campanha, mas que também pode usar com eficácia caso concorra em Faro, Albufeira, Tavira ou Lagos e mesmo em Aljezur ou ainda em Alcoutim, por aí fora, onde também não faltam Creontes mais ou menos disfarçados. Vejam a peça, vejam como a aparentemente frágil Joana Sá se agiganta no papel e assume a denúncia da morte que se pratica onde a morte não se vê – foi o que lhe disse no final da peça, a seco. E aplaudam Luís Vicente que, em Faro, está para o Teatro como o maestro Álvaro Cassuto está para a Música. Oxalá que os deixem fazer escola, gerar excelência, fomentar paixão. Gostaria de ver filas enormes de gente a comprar bilhetes para a Antígona, para indagar com inquietação a diferença entre um crime santo e uma piedade ímpia – que é o que está em questão na peça de Sófocles.

Carlos Albino

sexta-feira, 5 de novembro de 2004

SMS 78. Que haja bom senso em Faro e arredores

4 Novembro 2004

Realismo. Faro não tem já condições para durante o ano de 2005 ser uma Capital Nacional da Cultura, tal como inicialmente o projecto foi delineado e politicamente decidido, após a experiência de Coimbra. A avaliar pelo que veio a lume, o novo presidente da Comissão Organizadora, Rosa Mendes, não tem nada nas mãos com fôlego, com princípio, meio e fim – pelas suas palavras, não tem alinhamento. E do anterior presidente, António Lamas, não se sabe o que ficou feito em cinco meses, tempo que já era pouco para uma cidade que, contrariamente a Coimbra, pouco tem ou nada mesmo tem, não por culpa própria mas pelo desprezo secular que o poder central tem soberanamente destinado a todo o Algarve – aliás, com o que, por exemplo, fez e continua a fazer em Sagres apenas tem anavalhado a Cultura. É verdade que a ministra Maria João Bustorff anunciou em Setembro passado que a programação de Faro irá ser apresentada no Carnaval de 2005 e que os «acontecimentos» começarão na Páscoa incidindo em cheio no Verão… Mas para comparar, também é verdade que Coimbra como «capital da cultura» em 2003 se apresentou logo em Outubro de 2002. E é Coimbra! Haja bom senso, decoro e elevação de espírito – Faro deveria desistir do projecto de Capital, substituindo-o com realismo por coisa mais adequada, com designação mais abonatória e à escala – uma Festa da Cultura, o que já não seria mau, para não dizer engenhoso. Rosa Mendes pode obviamente organizar uma boa festa, mas não tem condições para organizar uma capital cultural do País. Com realismo, Rosa Mendes poderá fazer apenas uma boa festa cultural.


Sim, é humilhante. Porque Faro, como Capital Nacional da Cultura acabou. Por dois motivos. Em primeiro lugar porque não conseguiu congregar os espíritos e convocar os pesos-pesados da Cultura Nacional implicados de alguma forma com o Algarve e com a meridionalidade. E depois porque o mundo da Cultura a sério quando desconfia que as misérias de organização se apelintram na Política e nos interesses ou jogos da Política, por regra não querem casamentos com o Espectáculo artificialmente imposto ou com uma agenda salvadora de espectáculos que é o recurso da cultura off shore. E essa história de remeter Faro para os rápidos meses de Verão, para a animação turística e para inglês ver, é humilhante. Faro e o Algarve mereciam, merecem e merecerão mais. Sabemos como Faro e o Algarve poderiam afirmar-se culturalmente e agigantar-se sem favores e com excelência. Assim, não. É humilhante admitir-se que o Ano Cultural de Faro tenha apenas dois meses e meio, e que, pelos vistos, face à escassez de indígenas mesmo esses dois meses e meio tenham que ser pensados em função do «mercado turístico», da «animação turística» e das camas. Naturalmente que o Turismo deveria ser uma componente da Capital Nacional da Cultura e não uma finalidade, porque o Turismo não é um colégio, é um recreio onde qualquer brincadeira tem que dar lucro. Que haja bom senso em Faro e arredores. No ridículo já se caiu ao confundir-se espavento com Cultura. Se tivessem feito a Coimbra o que fizeram e fazem a Faro, tenho a certeza que aquela gente teria a coragem de dizer, alto e bom som, o que em Faro cala e consente. É demais!

Rectificação: Na SMS da semana passada, não foi lapso que é sempre a desculpa de mau pagador, mas um engano – trocámos o nome do maestro Armando Tavares Belo pelo do maestro Ivo Cruz. Claro que era mesmo Tavares Belo! Que saudades dele temos.

Carlos Albino