quinta-feira, 25 de janeiro de 2007

SMS 194. Um bem inestimável

Esclarecimento (29/Janeiro) . A publicação deste apontamento na edição semanal do Jornal do Algarve com a habitual afixação nesta página, suscitou reparos por parte de bom número de leitores, de que estaríamos a rubricar a campanha em que Luís Villas-Boas se empenhou para o referendo do dia 11 de Fevereiro, porquanto é mandatário de um movimento que pugna pelo «não». Todavia, tal como Villas-Boas fez questão em esclarecer que a sua intervenção nessa pugna não vincula a sua qualidade de responsável pela Emergência Infantil mas tão só «a de cidadão», igualmente este apontamento se circunscreve ao papel que, até agora, ele tem desempenhado no Refúgio Aboim Ascensão e não mais. Naturalmente que não nos revemos na argumentação de Villas-Boas face ao referendo, e oxalá que a posição liderante «do cidadão», por ser liderante, não prejudique a imagem de confiança institucional que se tem depositado no carisma da Emergência.

Carlos Albino



25 Janeiro 2007

Quem viu nascer naquilo que era um pardieiro de Faro, um mundo em que a criança desvalida, abandonada e tantas vezes recolhida no lixo é rei, tem que indeclinavelmente fazer a pergunta – quem sonhou isto, quem fez isto? Teimoso como todos os visionários e inquieto como todos os humanistas de rasgo, Luís Villas-Boas deu esta semana prova cabal, perante todo o País, que não apenas a sua obra mas ele próprio, é um bem inestimável de Faro e do Algarve. É um bem de Faro porque, numa capital a que Apolinário acrescentou sem grande espalhafato o epíteto, e julgo que obra ou projecto de cidade solidária, Luís Villas-Boas ergueu um verdadeiro monumento do afecto em coerência com a sua firme convicção de que a democracia dos afectos salva regimes que parecem perdidos – perdidos pela forma como o egoísmo, a prepotência e a vaidade do poder volta a assaltar o Estado faltando apenas, para que a demolição seja perfeita, uma polícia de opinião. E é um bem do Algarve porque, ele espalhou pelo mundo e com continuado direito a assento em fóruns internacionais, a imagem mais digna e mais nobre que uma região pode exibir – a de modelo na protecção da criança. O pardieiro onde Luís Villas-Boas conseguiu isto, tinha – todos nos recordamos - a cor da ferrugem, uma cor de óxido de ferro semelhante ao que as prisões mais tenebrosas costumam ganhar com os anos. Hoje, o magnífico Monumento do Afecto que Faro possui tem a cor de rosa rainha e qualquer um de nós, porque no fundo temos todos um pouco de criança perdida, se lá entramos, sentimo-nos bem – essa criança perdida que existe no nosso fundo ainda que não sintamos, sente-se bem ao lado de todas aquelas crianças perdidas e por entre as quais Luís Villas-Boas parece ser a única que se achou. É um bem inestimável.

Carlos Albino

Flagrante contraste: As mulheres que, ao longo de séculos, foram supliciadas e mandadas queimar vivas pela Inquisição Católica (nomeadamente algarvias, há um trabalho notável de Graça Ventura descrevendo casos destes) e a falta de memória dos que por obrigação deviam ter moral e peso na consciência, tendo em conta o 11 de Fevereiro.

quinta-feira, 18 de janeiro de 2007

SMS 193. Obrigado, Orquestra!



18 Janeiro 2007

Muito se riu Sousa Cintra quando me ouviu dizer a Mendes Bota que estava perdoado de todos os pecados pela sua iniciativa de propor ao Presidente da Assembleia da República o Concerto do Ano Novo com a Orquestra do Algarve. E o caso não era para menos. A Orquestra do Algarve surpreendeu quem, na Sala do Senado, nada percebesse de música ou desta tudo perceba ou julgue perceber. E surpreendeu pelo programa, pela execução e, sobretudo, pela dignidade, discrição e seriedade artística (sim, porque na Arte a seriedade é fundamental). Diga-se, sem qualquer favor, que as Quatro Estações do jovem compositor Cristóvão Silva , em estreia absoluta, foi uma dádiva caída do céu.

Mais se diga que o clarinete de Fausto Corneo e este mesmo que deixa em dúvida se é uma entrega total ou se é uma imolação sacrificial ao instrumento, fascinou e encheu o Senado de humanidade – não por Weber, mas por ele, Fausto Corneo. E na sinfonia N.º 2 de Schubert, não foi só a Orquestra, foi com esta ou por ela, sem dúvida o maestro Cesário Costa que se revelou em força, em sensibilidade e em vivência, naquele rastro indelével que Álvaro Cassuto construiu a partir do zero. Como é que Mendes Bota não haveria de ficar ali perdoado de todos os seus pecados?

Obrigado, Orquestra do Algarve, porque mostraste o teu valor e forçaste-me a dizer a Mota Amaral que «os Açores têm a autonomia que o Algarve não tem mas não têm Orquestra», ao que ele, risonho, respondeu - «Lá chegaremos!» com réplica minha «Também lá chegaremos à autonomia, se os políticos algarvios solfejarem melhor...»

Moral da história: Mendes Bota, desta vez, solfejou bem. Que é o que tem faltado a Macário, na matéria musical...

Carlos Albino

Flagrante contraste: O que o Ministro António Costa diz (ou gosta que digam por ele) e a situação arrepiante dos meios, esquema e condições da segurança no Algarve.

quinta-feira, 11 de janeiro de 2007

SMS 192. Prémio SMS de Jornalismo: João Prudêncio

11 Janeiro 2007

E mais uma vez, no dia dedicado aos Magos, a decisão tornou-se inapelável: o Prémio SMS de Jornalismo 2006 foi atribuído ao Jornalista João Prudêncio, responsável pelos serviços noticiosos da Agência Lusa no Algarve. Ponderado, criativo, intelectualmente inquieto e incapaz de vender a alma por qualquer dessas mordomias caladas que minam como cancro a comunicação social, João Prudêncio é um jornalista de fibra, acutilante, e fez-se algarvio por opção porque o algarvio não nasce, faz-se quando o quer ser – muitos nascem isso mas desfazem o que com eles parecia ter nascido. Além disso, com a atribuição deste prémio ao Jornalista João Prudêncio sugere-se também um reconhecimento aos serviços noticiosos regionais da Agência Lusa, quer os serviços de texto quer os de reportagem fotográfica. Na verdade, alguém que saiba a sério e não a brincar fazer um jornal, mesmo que estivesse na Antárctica, isolado naqueles catorze milhões de quilómetros quadrados que rodeiam o Pólo Sul, apenas com a Lusa faria um jornal de distribuição gratuita para os pinguins, e sem Lusa os pinguins tornar-se-iam relutantes à leitura e possivelmente mais iliteratos do que são e mais longe dos acontecimentos ao pé da porta do que deveras estão. Mas, aparte este pormenor que gela a alma, a honra e a homenagem vai para João Prudêncio que se tornou num jornalista de fibra.

João Prudêncio junta-se assim a Carlos Branco (2006) e a Idálio Revez (2005) na lista de premiados, que não é muito grande mas já comporá melhor a mesa para um confirmado almoço com o Governador Civil de Faro, António Pina, havendo justificadamente lugar para o Presidente da Câmara de Faro, José Apolinário, e para o Reitor da Universidade do Algarve, João Guerreiro, sendo a comida apenas um mero intervalo - o importante será debater-se a situação do jornalismo profissional no Algarve que continua a não ser brilhante.

Carlos Albino

Flagrante contraste: Jornais fecharem ou na corda bamba no pavor do fim do porte pago e a arte do dinheiro que faz proliferar os jornais de distribuição gratuita ou que ainda têm preçário para enganar a vista.

quinta-feira, 4 de janeiro de 2007

SMS 191. Comboios feios, porcos e maus

4 Janeiro 2007

Inacreditável esta CP. E inacreditáveis estes comboios feios, porcos e maus. Fui levar um familiar à Estação de Loulé que, para já, não é um modelo de asseio e muito menos de cuidado apesar de se situar no coração turístico de excelência (Vilamoura, Vale do Lobo e, enfim, Quinta do Lago) – uma oliveira para ali deixou cair no chão os frutos a que Deus a obriga e a CP nem uma vassoura possui para limpar aquela modorra, e os galhos de uma velha amendoeira também espreitam à altura da cabeça um candidato ao serviço se urgências. Mas lá chegou o comboio, um pendular. O meu familiar entrou para a carruagem e por mais que me esforçasse não conseguia vislumbrá-lo pelos vidros que, numa primeira impressão pareciam fumados, mas numa segunda impressão logo vi que não tinham esse luxo – era pura e simplesmente porcaria acumulada, e de tal forma porcaria, que dava para observar qualquer eclipse do sol. Tentei limpar com um lenço de papel o suficiente para fazer adeus, e o papel, num único raspão, ficou tão preto como se tivesse apanhado fuligem de chaminé. Procurei o funcionário da estação, apresentei-lhe a amostra, falei da oliveira e do perigo da amendoeira e, ele, mecanicamente solícito, entregou-me logo um impresso de reclamações, como se o impresso limpasse e a reclamação fosse varrer e cuidar da estação. Posteriormente voltei à estação por duas vezes apenas para verificar o que aconteceria com outros comboios, não tivesse eu tido o azar de encontrar uma excepção – mas não, era sempre a mesma porcaria do pendular que lá seguia viagem com o azul, com o intercidades, com a CP feia, porca e má. Nos tempos do carvão e do diesel, enfim, compreender-se-ia um descuido. Agora não – a CP não tem desculpa. Inacreditável.

Carlos Albino

Flagrante contraste: A Orquestra do Algarve e uma Orquestra no Algarve a provocar saudades, grandes saudades do maestro Álvaro Cassuto.