quinta-feira, 1 de maio de 2008

SMS 260. Pequenos horizontes e falta de rasgo, de visão

1 Maio 2008

Já nos esquecíamos daquela Capital nacional da Cultura em Faro, e da modestíssima verba para isso destinada que nem dava para mandar cantar quem tivesse os olhos abertos. Também nunca se esperou que alguma vez, ou por iniciativa do Algarve, ou por vontade política do governo ou conjugadamente pelas duas partes, o Algarve que, embora não queira, não deixa de ser uma cidade com várias freguesias, beneficiasse de uma candidatura a Capital Europeia da Cultura polarizada em alguma dessas freguesias. O Algarve, em matéria de cultura contenta-se com pouco, e basta pouco (o acrescento de um «l» traidor no nome histórico da região transformando-o em «programa») para se autoconvencer que já é muito. E até nem se importa que seja o ministério da Economia a dar cultura, habituado que está à pobre economia e desinteresse político do ministério da Cultura.

Claro que não se deve invejar o que Guimarães conseguirá para 2012, como Capital Europeia da Cultura, e com Guimarães a região Norte e até a Galiza – só para equipamentos novos e renovação urbana, Guimarães vai dispor de 70 milhões de euros e 25 milhões para a programação cultural, além de que as estradas 125 da zona há muito que estão requalificadas. Guimarães conseguiu, parabéns porque fez por isso, muito embora vá dispor, ao que se sabe, de 111 milhões de euros, tanto quanto só a Casa da Música no Porto, que fica a 55 kms de Guimarães. Não é Guimarães que está em causa, o que está em causa e se põe em causa é a falta de iniciativa, ausência de rasgo, bloqueio de visão larga, amorfia de projecto, bloqueamento de olhar de longo alcance, carência de raciocínio superior e alheamento de pugna pela excelência por parte do Algarve que não é uma entidade abstrata, um fantasma que corre em Albufeira e dorme no Caldeirão, uma alma satisfeita se os hotéis de sete estrelas estão repletos mas insatisfeita se o dinheirinho não pinga para os pequenos horizontes. Para quê mais cultura a não ser a de freguesia?

Carlos Albino

      Flagrante bom comportamento: O da Administração Regional de Saúde do Algarve que, garante quem representa quem recebe, pela primeira vez em 30 anos tem as contas em dia com os 15 laboratórios clínicos privados da região que atendem cerca de 300 mil doentes por ano.

quinta-feira, 24 de abril de 2008

SMS 259. Jardim à parte

24 Abril 2008

As grosseiras e insistentes tiradas de Alberto João Jardim, pelos vistos já toleradas ou temidas pelos mais altos dignitários do estado, não ajudam em nada a caminhada que muitos partilham ou desejam no sentido da regionalização. Entende muita gente que tais tiradas não são «um estilo próprio», como o Presidente da República sugeriu, são reveladoras de uma forma indescritível de estar na política e, dentro da política, de estar no uso devido das capacidades críticas. E o que leva a tais tiradas não é de forma alguma «um exemplo supremo na vida democrática do que é um político combativo», como Jaime Gama fez render, é a transubstanciação do pior que o combate político pode colocar na hóstia da vida democrática, mas sempre possível numa ilha e por um ilhéu que se julga o centro do mundo, mas beneficiando na Madeira, como em nenhum outro território, das bordas periféricas da regionalização.

Estaria o País mal e sem destino, se em cada casa que não seja recife, cada rua que não seja ilhéu, cada cidade que não seja ilhota, cada região que não seja ilha, esse «estilo» e esse «exemplo supremo» fossem seguidos na política do recife, do ilhéu, da ilhota e da ilha. Primeiro, porque esse protótipo de Jardim instala o medo na sociedade – uma regionalização, de que a Madeira e os Açores são exemplos com expressão política por benefício constitucional e consenso nacional, não é um instrumento para roer a corda, roendo cada vez mais até parecer Kosovo doméstico sem o assumir por falta de coragem final, mas roendo sempre num malabarismo de excepção sediciosa em que vale tudo – da falta de educação elementar às grandes tiradas próprias de feiticeiro ou chefe que só por essa via amedronta a tribo a si sujeita ou de si refém. No entanto, o medo desse chefe de tribo ainda se tolera e até se ajeita ao folclore político que precisa de feiticeiros - o problema é quando, ou se do medo se passa à fase da imitação, e por aí se começa a pensar que cada rua deve ter o seu Jardim, e que para se ser chefe de ilhota se tenha de ter aquele «estilo próprio» e seguir aquele «exemplo supremo».

É oportuno que se diga que, para obterem a mera autonomia administrativa sem expressão política, as regiões portuguesas não precisam de Jardim – devem até manter esse estilo e exemplo de Jardim à parte. Tal estilo e tal exemplo inviabiliza o mínimo passo, não pelo medo do protótipo, mas pelos imitadores.

Carlos Albino

      Flagrante acordo: Para encurtar caminho, a partir da próxima SMS passaremos a redigir, com muito agrado, já pelas regras do novo Acordo Ortográfico.

quinta-feira, 17 de abril de 2008

SMS 258. Diplomacia municipal…

17 Abril 2008

Um acordo de geminação de um município isolado, pouco ou nada conta para o panorama do intercâmbio internacional de uma região, mas o total dos 26 acordos (por entre os 600 de todo o país) que os municípios algarvios mantém com autarquias estrangeiras, enfim, se forem ou fossem levados a sério, já são alguma coisa ou pelo menos dá para começar alguma diplomacia municipal.

Infelizmente nem todos esses acordos têm expressão política – além dos que estão desactivados porque morreram à nascença, alguns desses acordos são do reino do folclore e vivem aos soluços, outros não passam de manifestações episódicas de caridade oca, outros são oportunidade de convívio, de excursões mais ou menos bem sucedidas e salvam-se poucos como acordos de cooperação descentralizada e de relações autárquicas internacionais pautadas por propósitos de qualidade e excelência.

Olhando de relance esta incipiente «diplomacia municipal» do Algarve, não é difícil concluir que ela depende em muito do voluntarismo de presidentes de câmara, de simpatias sem sustentação por parte de grupos da terra ou, pura e simplesmente, de uma atracção pelo exotismo. Exceptuando um outro fenómeno de negócios em vista mas em acções casuísticas, não há uma estratégia delineada de cada município e muito menos uma estratégia concertada entre os municípios, que envolva diversas parcerias, designadamente da área económica, cultural e educativa. Por isso também nenhum município sentiu ainda a necessidade de criar um departamento de relações internacionais, pois para quê?

Vivemos metidos na concha e se a concha se abre é para excursões. É muito pouco, ou nada, para diplomacia municipal.

Carlos Albino

      Flagrante contagem decrescente: Para as eleições de 2009, europeias (soi-disant), legislativas e autárquicas. Quem quer ganhar e não está no poder tem que dizer em breve; quem está no poder, tem que deixar sugerido.

quinta-feira, 10 de abril de 2008

SMS 257. Atenção às diferenças

10 Abril 2008

Por via das escolas chega o primeiro grande sinal de um Algarve diferente, radicalmente diferente daquele que duas gerações conheceram – é um Algarve mais multi-cultural, muitíssimo mais pluri-étnico e manifestamente inter-nacional, com o hífen desta última palavra a acentuar o seu significado original. As estatísticas, apesar de desfasadas e de não poderem retratar com rigor a realidade continuadamente movediça, já tinham dado esse sinal, mas sem suscitarem a urgência de medidas ou a premência de reflexão sobre o modelo organizativo da sociedade em que cada cultura, etnia e nacionalidade se foi arrumando mais ou menos pacificamente, cada uma prosseguindo as suas regras, os seus hábitos e gostos que, vistos de fora, até têm sido apreciados nuns casos como saudável folclore, ou como bitola exemplar noutros casos de comunidades estrangeiras tradicionalmente portadores dos estandartes de civilizações supostamente mais avançadas, mas que têm mantido equilíbrio entre excessos de sobranceria e manifestações de tolerância convivencial. Mas quando tudo isto chega à escola – havendo escolas com dezenas, largas dezenas de etnias e nacionalidades transportando culturas díspares – há que repensar o modelo, não pelo receio de que os factos nos ultrapassem mas para se construir uma sociedade sem receios.

Sobretudo, as políticas locais que já não podem ser mono-culturais – a língua aprende-se, a cultura não. Tais políticas, cada vez mais, e mais aqui do aqui ali, têm e devem ser mais pluri-culturais, devem atender cada vez mais aos factores inter-religiosos (questão que até há pouco quase não se colocava), tendo alguns municípios que criar departamentos especializados de acompanhamento e apoio, e não apenas iniciativas casuísticas e pontuais, algumas no patamar de caridade.

Carlos Albino

      Flagrante falta de pontualidade: A da Mãe Soberana de Loulé, com quase duas horas de atraso no programa, num total desrespeito numa manifestação que para além do legítimo culto, expressa inestimável denominador de convivência humana que é sua mágica e estima.

quinta-feira, 3 de abril de 2008

SMS 256. Camaroeiro de votos

3 Abril 2008

O governo já começou com o corte de obras no Algarve, e começou pelo elo que lhe parece ser o mais fraco – Guterres já tinha feito o mesmo que Durão Barroso agradeceu. E tinha que ser.

Para satisfazer o imenso cardápio de reivindicações para a Região Oeste (não foi acaso que a isso fizemos referência na SMS de 7 de Fevereiro), em compensação da perda de um aeroporto que nunca existiu, e para outras obras de vulto que o calendário eleitoral aconselha sem adiamentos noutras zonas de simpatia do país, olhando para o mapa, o que é que o Algarve conta? E o que conta no Algarve? Ou por que insondável motivo conta?

É isso que o ministro Mário Lino, para já, deveria vir explicar, se é que pode explicar, ou seja necessário explicar, porquanto a região ficou docemente pacificada ou inoculada com o assunto da requalificação da 125 que se julga ser o remédio para todos os males, e, não só remédio mas também razoável ou mesmo eficaz camaroeiro para apanha de votos. É o que vai ser, porque a quebra de compromissos já entrou nos hábitos da política. E assim vai tomando perversa força aquela pergunta retórica – «Desde que não mexam no meu quintal, que me interessa que mexam no quintal dos outros?». Perversa porque, algum dia, verão que estão todos no mesmo quintal. E então será tarde para dar conta do engano e justificar os desenganos.

Carlos Albino

      Flagrante dúvida: Mas então as comissões concelhias dos partidos não são capazes de escolher listas sem sondagens? E isso faz-se por sondagens ou por critérios, condições e perfis que é o que justifica partidos numa democracia?


quinta-feira, 27 de março de 2008

SMS 255. Autoridades cheias de vento

27 Março 2008

O título deste apontamento, que também só poderia ficar pelo título se fosse entendido à primeira vista, resume a perplexidade e a impotência dos cidadãos que assistem, dia a dia, anos a fio, à forma como funcionários autárquicos se julgam imunes à lei e impunes às infracções. Entre outros de vária ordem (desde o atendimento à prestação de serviços) damos um exemplo que denota a mentalidade: um pouco por todo o lado estacionam as suas viaturas privadas em locais interditos para esse fim, colocam no vidro dianteiro o cartão autárquico, desafiando polícia de giro ou guardas de ronda, e desafiando de tal modo que chegam a discutir em directo com comandantes de posto desautorizando polícias e guardas, como se tais funcionários infractores fossem autoridades acima das autoridades. Já me certifiquei dessas situações que são de pasmar, tratando-se afinal de autoridades cheias de vento.

Compete aos presidentes de câmara e às próprias câmaras, é claro, cortar cerce os abusos destes funcionários que logo à partida põem em crise os códigos de conduta que, presumo, juram cumprir no contrato de função pública. Tais actos de excepção sediciosa contra regulamentos gerais ou locais, a serem tolerados, põem em cause, num primeiro passo, as autoridades de vigilância e num passo seguinte a própria autoridade política.

Mas se o caso fosse apenas o do estacionamento de viaturas, tudo ficaria resumido a essa afirmação espúria de território, que, como se sabe, faz parte dos instintos primários. Só que o caso não fica por aí, chega à própria relação com o cidadão que muitas vezes fica sem palavra, ou pela vizinhança com o infractor (no Algarve, todos os mundos são pequenos…), ou, mais grave, pelo receio de represálias que para serem eficazes são discretas (no Algarve, chama-se a isto navalhada nas costas).

Ora, muita gente teme a regionalização precisamente por admitir, por essa via, a multiplicação das autoridades cheias de vento, dada a experiência já colhida nas autarquias onde o poder político manifesta lassidão e permissividade – em parte porque porção de tais funcionários até formam ou condicionam a clientela eleitoral, pelo que se julgam, também eles, investidos de maiorias, sendo pior nos casos das maiorias serem absolutas.

Há que pôr travão nisto. Aliás, os presidentes de câmaras têm a obrigação de pôr travão nisto.

Carlos Albino

Flagrante Positivo & Negativo: Positivo - o relançamento do Festival Internacional de Música do Algarve. Negativo – a teimosia em designar-se por Allgarve um programa de animação que até é aceitável para Colónia de férias.

quinta-feira, 20 de março de 2008

SMS 254. Sete pequenos desabafos

20 Março 2008

  1. À falta de melhor, leio diariamente El Mundo e El País, para ficar a saber dos dois lados. E sobretudo, pelo que vou lendo da Andaluzia, vou também sabendo do que não se diz nem possivelmente se poderá dizer do Algarve.

  2. Muito divertida a crescente institucionalização do provincianismo no Algarve, com alguns políticos a fazerem do Algarve o seu quintal. Pelo menos, na Andaluzia não há disto.

  3. Todavia, muito mais divertida é esta história da atrasadíssima requalificação da Estrada N.º 125 quando já se devia era estar a pensar na requalificação da Via do Infante…

  4. Metaforicamente, o conceito de complexo de Édipo, é visto como amor à mãe e ódio ao pai, até porque o mundo infantil resume-se a essas figuras parentais ou aos seus representantes. Também há o complexo de Electra, para o outro género. Para alguns dos nossos provincianos e complexados protagonistas, esses dois conceitos têm uma nova e única designação: portagens.

  5. Perante o mapa dos postos de comando do Algarve, que à evidência contraditam qualquer agenda para a regionalização, sem dúvida há que concluir que o Algarve não passa de uma colónia de férias e oportunidades. Aqui, o rei não vai nu, anda em férias. Não falemos das cunhas.

  6. É deveras uma cena medieval quando se vê um delegado popular, um representante pelo voto, um deputado eleito em sufrágio transformar-se em arauto do poder, montado em seu corcel.

  7. Ainda bem que o Vaticano esclareceu – aquilo que foi anunciado como sendo os novos pecados do século XXI, afinal não são pecados e muito menos mortais. Se fossem, 99% de arautos e 83% dos provincianos não se livrariam do inferno; a 125, mesmo requalificada, seria uma mera estrada dos diabos, e a Via do Infante seria mera ligação entre inferno e purgatório com portagens, porque já não passa disso mesmo sem elas.

Carlos Albino


Flagrante decisão: Numa clara imitação de práticas presidenciais, de governos e agora do governo civil de Faro, vamos promover as «SMS abertas».

quinta-feira, 13 de março de 2008

SMS 253. A técnica do erro

13 Março 2008

Ninguém se livra de fazer erros ou cometer erros, voluntária ou involuntariamente. O ser humano, por natureza, é uma máquina de fazer erros, mas o que o faz elevar-se dessa natureza, é precisamente tomar consciência do erro e analisar as causas que estiveram na base da decisão errada. E então quando se tem poder e uma decisão errada afecta os cidadãos que delegaram esse poder, essa responsabilidade de análise do erro torna-se em dever de quem erra – dever público, e em direito de quem delega o poder – direito a que, nas sociedades democráticas e sem os tiques do autoritarismo, se chama escrutínio no interesse público. Infelizmente, entre nós, acontece o contrário – teme-se o escrutínio, diaboliza-se o escrutínio.

Ora, desde governantes a chefes políticos do beija-mão ou da contra-mão, passando pela enorme fila de líderes que por aí há – eles são líderes partidários, líderes de balneário, líderes empresariais, líderes associativos, líderes de pacotilha, líderes de gangs, líderes religiosos, líderes da noite, líderes locais, sei lá!, até há quem me diga que já há líderes de opinião! – toda esta gente é levada a julgar que os parentes caiem na lama, ou que ficam diminuídos no poder, se reconhecerem o erro que sabem ter cometido na decisão. Toda essa gente até fomentou – com êxito, diga-se - uma espécie de cultura de imunidade no erro, como se líder fosse apenas aquele que nunca dá o braço a torcer. Por isso, não se dão ao trabalho de verificar se há equívocos na teoria utilizada, se quem aconselha não usa raciocínio errado e com água no bico, se os dados usados não estão errados ou não foram recolhidos com pressupostos errados, pelo que não admitem quando erram e instalam a patética regra do Eu tenho poder, estou aberto a todas as críticas, mas não estou errado. Que patética abertura!

Parafraseando aquela conhecida sabedoria chinesa, é caso para se dizer que quando se aponta para o erro, o idiota olha para o dedo.

Vem isto a propósito de educação, saúde, analfabetismo iluminado, segurança, regionalização, provincianismo autárquico, e, enfim, vem a propósito de muita governança que se mantém à custa das sabidas clientelas que, essas sim, conhecem as técnicas do erro melhor que os seus líderes, e tantos são estes que inviabilizam a formação de um escol que é aquilo de que o Algarve mais precisa. Sim senhor, precisa de escol, escol que não há. E não há porque os líderes que nunca erram e as clientelas que dominam a técnica do erro, inviabilizam esse escol, vendo nele o inimigo público.

Carlos Albino

Flagrante insistência: Nos postos de comando do Algarve, devem estar por princípio algarvios. Há limites até para os empregos políticos e aquele «sentir-se algarvio» não basta, pelo menos enquanto cheira a desculpa de funções.

quinta-feira, 6 de março de 2008

SMS 252. Mau serviço cívico

06 Março 2008

Li agora afirmações de Miguel Freitas (na revista Algarve Mais) sobre o movimento cívico Regiões Sim e noto também agora o grande reboliço noutro movimento cívico que se intula Não Apagem a Memória mas que começa logo como se chamasse Liquidem a Inteligência Rapidamente. Afirmações do líder regional do PS e reboliço, têm um traço comum.

Peguemos no que está mais perto do que é importante, as afirmações de Miguel Freitas, que lança a seguinte pergunta cuja resposta é obviamente uma insinuação: «Digam-me uma coisa que o PSD tenha feito na região em 2007, a não ser que o movimento Regiões Sim agora tenha substituído o PSD/Algarve». E logo a seguir, Miguel Freitas afirmou, segundo o entrevistador, com voz firme: «É verdade que 90 por cento dos associados do movimento são militantes do PSD, mas isso é outra questão. Se é por aí que medimos o trabalho do PSD, então tudo bem. E dos outros, nem vale a pena conversarmos».

Não vou gastar dois segundos sequer sobre o que significa a referência a esses tais outros (os 10 por cento, certamente) a quem Miguel Freitas não concede conversa, nem um segundo sequer sobre como é que ele conseguiu ter a trabalhadeira de verificar a ficha política de cada cidadão que aderiu a esse movimento cívico (independentemente de cada cidadão aderente ter ou não partido, ou de saber se o outro aderente tem ou não) para, com voz firme, o líder do PS/Algarve declarar aquela sua verdade atemorizadora, e que é atemorizadora pelo manifesto exercício de diabolização inquisitorial que eu esperava de muita gente mas não de Miguel Freitas, com esta ligeireza.

Vamos ao que importa.

Conforme o calendário, queixam-se os partidos políticos de que a sociedade civil não se organiza ou não sente necessidade de impulsionar movimentos de intervenção cívica, transversais e plurais. Ora, pelos exemplos que temos vindo a registar e onde o de Miguel Freitas enfileira, os responsáveis por esta situação são os próprios partidos, porquanto mal surja um movimento cívico transversal e plural, os partidos, cada um por si, tentam capturar tais movimentos para o seu controlo. E quando não conseguem capturar, insultam o movimento argumentando que este foi capturado pelo outro.

Quando, à evidência, o movimento cívico é plural e transversal, cada partido cria uma suspeita de que existem forças espúrias no movimento, e a sociedade civil que já está amarfanhada pelo estado (estado que não é o governo, como na confusão lançada pelo regime autoritário), fica atónita e por certo incapaz de impor aos partidos que recolham à sua dimensão.

A não ser que se volte a pensar que um movimento cívico não deve ir além dos chás de caridade, de debates sobre o sexo dos anjos ou de marchas de cidadãos civicamente fardados atrás de bandeiras irracionais, obviamente que um movimento cívico tem na base uma intervenção política de qualquer matiz e aos aderentes não se lhes deve exigir que sejam quimicamente puros de partidos ou que devam respeitar quotas libertas da impureza partidária.

Miguel Freitas prestou um mau serviço cívico, e sobre os 10 por cento da sua boa consciência nem vale a pena conversarmos. Os outros 90 por cento, é outra questão.

Carlos Albino


Flagrante palavra: Revivalismo, o dos avozinhos do regime autoritário que por aí circulam como teóricos da democracia.

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

SMS 251. Os cães

28 Fevereiro 2008

Em conveniente declaração prévia, digo já que nada tenho contra os bichos e que até gosto de bichos, mas há limites. E o limite está quando por aí vemos muito homem-cão a passear cão-homem, sem se saber muito bem se o dono é o cão ou será o homem, pois a exibição do luxo dessa propriedade é recíproca e provoca idênticos dejectos, cada parte a julgar que faz boa figura – o cão treinado para mostrar que o dono é homem, e o homem mostrando a felicidade de que o cão é dono.

Não vou falar dos episódios trágicos que há muito tempo deviam ter terminado de uma vez por todas se as autoridades tivessem autoridade, usassem a autoridade ou tivessem meios para exercer a autoridade – na verdade, é impossível colocar atrás de cada homem-cão uma autoridade que impeça a luxuosa transformação em cão-homem daquilo que é apenas cão e que os donos exibem como se fosse homem mas a que a lei exige açaime e corrente.

Por outras palavras, também no Algarve não há controle do que rigorosamente se chama posse responsável dos cães, até porque, havendo muitos cães-homem e outros tantos homens-cão, são incontroláveis os cães que são donos do homem, mesmo que tais cães não tenham cão. E até podem dizer que isto é uma metáfora, mas que não é indicador de riqueza e de qualidade de vida no Algarve, ah, lá isso é que não é, mesmo que a Universidade da Beira Interior, já agora, também inclua esse item de genes agressivo, pois o provincianismo também é cão sem açaime.

Carlos Albino

Flagrante esclarecimento: É expectável que nos postos de comando do Algarve, por princípio, devam estar algarvios o que não difícil de definir, e não tanto interessados em negócios algarvios. Só uma agenda para a desregionalização é que leva a fechar os olhos a isso.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

SMS 250. A prioridade da Escola

21 Fevereiro 2008

Claro que só num país da cauda do mundo é que responsáveis políticos se atrevem a dizer em ar de descoberta, com êxito e impunidade política, que devemos dar prioridade à educação e à escola… Então não foi dada? Não deveria essa prioridade ter sido dada há muito, ser há muito um dado adquirido e ter entrado já na rotina do orçamento e da política? Essa conversa que, no século XIX, era a conversa normal dos países mais avançados da Europa, se ainda serve de conversa e bandeira política em 2008, é porque o País tem as suas bandeiras do ensino em meia-haste à porta das suas escolas, por maior que seja a boa-vontade de um escol de professores em disfarçar ou remediar esse ar de luto da educação.

Num balanço destas décadas de democracia que já vai em tantas décadas como as do puro regime autoritário, custa constatar como o Estado tratou os professores como bombeiros voluntários, protegido (ele, o Estado) sem dúvida por uma minoria de beneficiados bombeiros excepcionais. E custa verificar como o mesmo Estado converteu os professores, de modo geral, em tribo nómada, a saltarem de terra em terra, muitas vezes sem tempo sequer para armar a tenda, submetendo-os portanto a uma cultura de tenda que também não deixa de gerar zelosos interesses. Foi deveras um milagre que a escola, de quando ou quando, pela abnegação de alguns professores (e não por vontade expressa do Estado) tenha cumprido algumas das suas missões, ou conseguido ligar-se, aqui e acolá, à comunidade que serve, da qual deveria ser motor e não apenas piquete para apagar fogo posto.

Carlos Albino


Flagrantes nomes de escolas: Diz-me como te chamas, dir-te-ei quem és… E há cada nome!

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

SMS 249. Apenas para agradecer

14 Fevereiro 2008

Não é tarde nem cedo – agradeço. Quando muitas câmaras algarvias continuam perdulariamente a promover ou elas próprias a editar livros sem escrutínio de qualidade apenas porque nome feito dá nome e não se passa disto, tenho de agradecer a Maria Aliete Galhoz, a Isabel Cardigos e a Idália Farinho, o trabalho de pesquisa sobre o património oral do concelho de Loulé. Trabalho que já deu dois volumes, um primeiro sobre contos (2005), um segundo sobre romances (2006), e aguarda-se por um terceiro, sobre orações. Conto do povo, romances do povo e orações do povo, precise-se. É que há por aí muita coisa publicada que se diz de cultura popular, mas que mais não é do que cultura contra o povo. Há uma minoria de povo que é anti-popular, sobretudo quando essa minoria pavoneia ignorância como sendo sabedoria, e exibe cópia ou arremedo como sendo matéria genuína e herança de gerações.

A tradição cultural oral do Algarve, sem dúvida, sofreu uma fortíssima ruptura no século XX, cujas causas estão inventariar com precisão mas que se suspeitam – há instituições responsáveis pela decapitação desse património. Grande parte dessa tradição perdeu-se, pouco ficou – basta tentar saber como Aleixo e com ele ou como ele os poetas populares cantavam e competiam, para se perceber como pouco da tradição ficou. Ora, ir à busca do pouco que resistiu, com aquele rigor que apenas é possível obter quando se tem humildade académica, é o que está patente nos volumes já publicados (com excertos em CD) sobre o património oral de Loulé – é um trabalho sério. Não é tarde nem cedo, obrigado Aliete Galhoz, obrigado Isabel Cardigos, obrigado Idália Farinho.

Carlos Albino

Flagrante pergunta: Há um ambiente esquisito, não há?

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

SMS 248. Algarve ou figura de estilo?

7 Fevereiro 2008

Os autarcas da Região Oeste apresentaram ao Governo uma apreciável lista de contrapartidas como forma de compensar o chumbo do aeroporto na Ota. A lista é extensa e vai desde redes de lojas da “terra e do mar”, de “espaços urbanos da cultura, criatividade e conhecimento” a carta regionais (social, educativa e desportiva), passando por eixos viários estruturantes, agência regional do ambiente e energia, projecto digital, observatório das dinâmicas regionais, sistemas de gestão autárquica, um Polis regional, a requalificação do linha ferroviária do Oeste, marinas na Nazaré e em Peniche, centro de investigação, qualidade e certificação de produtos regionais, um pólo tecnológico, um hospital, um aeródromo em Torres Novas, requalificação da lagoa de Óbidos e valorização das termas das Caldas, entre o mais, designadamente infraestruturas rodo-ferroviárias que aproximem a região do futuro aeroporto, por certo em Alcochete, um pólo turístico e «montagem de um sistema de governança regional”. É claro que, se por não ficarem com o aeroporto os autarcas do Oeste exigem isso, é de crer que se tivessem ficado com o aeroporto exigiriam o mesmo ou talvez mais… O não-aeroporto é um pretexto e o aeroporto pretexto seria, porque o Oeste tem lobby influente na política – no governo, no parlamento, por dentro dos partidos e por fora, no poder e na oposição – e quando se trata de defender a região, toca a reunir.

Não é censurável, antes pelo contrário é de elogiar a força anímica e organizadamente reivindicativa dos autarcas e agentes do Oeste – é até coisa de meter inveja noutras regiões onde o medo de perder empregos políticos (se não é isto, parece) dita a submissão dos pretextos e a canonização política de interesses que dependem de centros decisão que, na verdade, estão fora da terra e exportam a grande massa de benefícios para fora da terra, sem contrapartidas de maior.

Imagine-se o que o Algarve não deveria reivindicar por não ter o que deveria ter. Mas onde é que está aqui a garra do Oeste, para não falar das garras mais a norte e até já da garra alentejana? Aliás, pouco falta para que os próprios comandos do Algarve não estejam todos nas mãos de gente que o Algarve distraído adoptou, ou que com muita e interessada atenção adoptou o Algarve. Tanto faz, embora muitos teimem em acreditar que o Algarve não será apenas uma figura de estilo.

Carlos Albino

Flagrante provérbio: Com papas e bolos, se enganam os tolos.

quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

SMS 247. Duas ou três coisas

31 Janeiro 2008

Primeira coisa - Li com atenção o que Miguel Freitas afirmou sobre a pobreza no Algarve, pois há que ler com atenção aquilo que um dirigente político do Algarve afirma quando chega de longe. Enfim, admitiu Miguel Freitas que «há apesar de tudo alguma pobreza escondida na região»… Aquela palavra «alguma» é de facto de quem chega de longe ou está longe. É claro que com um raciocínio de indicadores, não é preciso estar no nordeste algarvio ou entrar nos T -1’s da periferia de Faro, do centro de Quarteira ou dos ex-clandestinos de Portimão para, enfim, lá se admitir que «há apesar de tudo alguma pobreza escondida»… Aquele «apesar de tudo» é de facto de quem reduz a realidade que entra pelos olhos da cara, aos indicadores. É claro que isto fica bem para estagiários de sociologia verdes em matéria de indicadores, fica mal para um dirigente político, para mais do PS, daquele algum PS que apesar de tudo estimo.

Segunda coisa – Também registei que José Sócrates atacou a oposição que critica os exageros da ASAE argumentando que esta ASAE «está a ser atacada como um partido político» por aquela mesma oposição. Assim não se chega a lado nenhum se o primeiro-ministro ataca os partidos como se estes fossem as ASAE’s da democracia. É claro que, assim também, todos os exageros e desvarios, quer os das ASAE’s da oposição, quer os do partido policial das actividades alimentares e não alimentares, justificam-se perversamente. Fiquemos por aqui, nesta matéria.

Terceira coisa – Como sabem, gosto de tertúlias e que as tertúlias existam. Cada tertúlia é sempre um pequeno passo na cabeça de cada um mas um grande passo para a humanidade. Não assisti mas sei que esta semana, na tertúlia matinal do Café Delfim (Loulé), depois de um muito perorar e ficar calado, alguém sai com esta: «Abriu a boca e deixou falar a consciência». Não é assim Miguel Freitas? Não é assim José Sócrates?

Carlos Albino

Flagrantes exonerações: Correia de Campos, depois de tudo na saúde (e que não foi pouco), e Isabel Pires de Lima, depois de tudo na cultura (que foi demais), foram exonerados pela ASAE do primeiro-ministro que deixou falar a consciência. Como a tertúlia do Café Delfim tem razão!

quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

SMS 246. Assim, a ferro e fogo, não dá

24 Janeiro 2008

Não se contesta que, alguma vez, tivesse que existir no País uma «autoridade administrativa nacional especializada no âmbito da segurança alimentar e da fiscalização económica» e que no exercício da sua missão, tal autoridade se regesse «pelos princípios da independência científica, da precaução, da credibilidade e transparência e da confidencialidade». Nesses termos, a ASAE foi inicialmente saudada pela generalidade dos cidadãos, e mesmo quando alguns excessos da autoridade foram sendo conhecidos, muitos continuaram a dar-lhe o benefício da aceitação – era compreensível que, nesse período inicial, a ASAE, melhor, alguns agentes da ASAE, por suposta verdura, cometessem o pecado mortal bem próprio dos funcionários portugueses sedentos de afirmação ou inseguros da eficácia da sua voz de comando, ou seja, o pecado mortal de ser mais papista que o papa.

Só que a ASAE, pelo que nos chega do noticiário quotidiano, continua com actuação desmedida, desproporcionada e, nalguns casos até (como no caso das chouriças de Querença), com actuação anedótica.

Em vez de optar pela persuasão, pela prevenção e pela instrução pública no que se impõe, em tantos casos, como regras mínimas de civilidade, a ASAE entra a ferro e fogo, criando uma imagem pública oposta à que a ASAE deveria ter, ou ir conseguindo ter, por cultura democrática.

Não é a brandura na aplicação da lei, ou que não leve a lei à letra, que se defende ou se reclama da ASAE. O que se reclama é que exerça a autoridade sem autoritarismo, ou sem o exagero autoritário que as forçadas letras da lei legitimam . Competindo à ASAE a avaliação e comunicação dos riscos na cadeia alimentar, tendo a responsabilidade de disciplinar o exercício das actividades económicas nos sectores alimentar e não alimentar, designadamente através da fiscalização e da prevenção do cumprimento da legislação, os fins para os quais tal autoridade foi criada ficam desvirtuados se actuar ou surgir perante o cidadão apenas como polícia de choque. Assim não dá.

Carlos Albino

Flagrante “TGV” Faro-Huelva: Supostamente está marcado para funcionar em 2018 – faltam apenas dez anos – mas disso, ao que se saiba, nem uma palavra de Sócrates-Zapatero.

quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

SMS 245. Avisos de Espanha

17 Janeiro 2008

Enquanto os jornais portugueses se entretinham nas primeiras páginas com a contagem de baldes nas prisões, com as dúvidas do homem-lobo em submeter-se a uma operação ou não e com um tal jogador romeno de que ninguém tinha ouvido falar mas vem salvar um grande clube, a imprensa espanhola destacava nas mesmíssimas primeiras páginas a decisão dos tribunais do país vizinho em mandar demolir meio milhar de edifícios na costa cantábrica, enquanto mais 400 no município de Piélagos, junto ao parque natural de Liencres, estão pendentes de recursos (para esta urbanização fez-se engolir um monte…). O governo regional da Cantábria declarou-se já incapaz de executar as sentenças de demolição e percebe-se porquê: a UE ainda não criou fundos estruturais para corrigir as asneiras de políticos aliados a investidores sem escrúpulos e, aqui para nós que ninguém nos ouve, Bruxelas não se comove com as brincadeiras escolares de arquitectos risonhos.

Estamos em crer que, não agora mas daqui a dez, vinte anos, ou quem sabe se não será mais cedo, daqui a cinco anos, no Algarve também irão ocorrer demolições decretadas por tribunais (que, para que haja esperança, também terão a sua evolução nos alicerces) ou decretadas por futuros governos (se o sistema democrático não criar regimes de interesses, no que alguns ingénuos nunca acreditaram que viesse a acontecer). E onde é tais demolições irão ocorrer? É preciso dizer?

E sobre algumas «urbanizações» que, junto de povoações consolidadas, estão a surgir com desmedido volume e com traça à maneira e estilo dos bairros operários de Manchester nos finais do século XIX, havemos de falar.

Carlos Albino

Flagrante doença: A saúde regional, como se viu e ouviu, está mesmo doente e, além disso, com falta de civilidade, incapacidade de diálogo e sem a tolerância a que a democracia obriga e faz condição.

quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

SMS 244. Prémio SMS de Jornalismo: João Ventura, pela Atlântica

10 Janeiro 2008

Ouvido o júri, acate-se a decisão: o Prémio SMS de Jornalismo 2007, é atribuído a João Ventura, alma e artífice da revista Atlântica, pérola de jornalismo cultural, pérola ímpar no Algarve. João Ventura conseguiu erguer uma obra de onde se perscruta o mundo das ideias e das belas letras tal como apenas é possível num promontório – abertura ao mundo, gente de diferentes países na panorâmica até aos confins do debate e da divulgação, modernidade, e, sobretudo, um salto sobre o provincianismo mental. A revista Atlântica lá vai navegando à bolina desde 2004 e oxalá que continue a navegar. O Algarve, muito para além de elites, precisa de escol e o trabalho de João Ventura vai nesse sentido – a criação de um escol, quem diria, a partir de Portimão. Se, por acaso, passasse pela cabeça de Manuel da Luz, o presidente daquela visivelmente abastada autarquia, patrocinar uma reunião geral dos colaboradores da revista Atlântica, isso não seria apenas uma reunião na foz do Arade, seria já um congresso internacional de ficcionistas, poetas, ensaístas e ofícios correlativos de que o mundo e o Algarve, que está nesse mundo, tanto carecem, porque são todos pensadores e poucos deles fadistas sem noções de solfejo. João Ventura merece o nosso reconhecimento, pelo que não lhe falte meios e condições para continuar a obra.

João Ventura, nestes reconhecimentos de mérito que se decidem anualmente no Dia de Reis, junta-se assim a João Prudêncio (2007) que, por deliberação infeliz, foi substituído na Lusa/Algarve tal como se substitui num prato de bacalhau o grão por ervilhaca (fica o prato intragável), a Carlos Branco (2006) e a Idálio Revez (2005).

Carlos Albino

Flagrante dito e redito: « (…) o Algarve, que vale muito para a economia do país, pouco conta politicamente. Nada de importante é decidido na região. E os algarvios têm muita responsabilidade nisso. É por isso que não existe uma «visão» integrada do desenvolvimento turístico sustentável da Região.» – Vítor Neto, in Observatório do Algarve.

quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

SMS 243. Conversa entre 2007 e 2008

3 Janeiro 2008

Ano Novo (sabendo menos que uma criança de 10 anos) : – Este Algarve em que acabo de entrar é uma região ou um apêndice da Costa da Caparica?
Ano Velho (com cara de caso) : – As diversas políticas dizem que é uma região… Pelo que senti cheguei à conclusão de que nem era uma região, nem uma Caparica, e que era somente um paraíso de interesses.
Ano Novo - Esses interesses são públicos ou privados?
Ano Velho - Fiquei sem compreender. Por umas vezes os públicos são privados e outras vezes os privados são públicos. E quando não parecem nada, chamam a isso finanças locais.
Ano Novo - Mas, oh Ano Velho, pelo menos há líderes, um líder da região?
Ano Velho - Há vários, Ano Novo, pelo menos quatro. De vez em quando os jornais dão conta da sua existência sobretudo se estão na oposição e é quanto se sabe da sua vida pública.
Ano Novo – E esses líderes lideram?
Ano Velho - Lideram, como quando se descreve aquela praça de Faro: «No centro está um obelisco», mas pouca gente sabe o que representa o obelisco.
Ano Novo - Desculpa a minha ignorância mas há um Povo Algarvio?
Ano Velho - Claro que há.
Ano Novo (preparando o fogo de artifício) Esse povo é mudo e pacífico, ou mostra indignação por dá cá aquela palha?
Ano Velho (fugindo para Marrocos) Pelo que sei, apenas se revolta quando há tentativas de decretar portagens para a Via do Infante ou quando esticam linhas de alta tensão sobre as casas. De resto é um povo de bom senso, conformando-se cada um com o seu obelisco.

Carlos Albino

Flagrante hábito já: O Concerto de Reis no Teatro das Figuras, domingo. Temos maestro.

quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

SMS 242. É claro que a solidariedade não tem regras de mercado

27 Dezembro 2007

Vou falar do caso para haja um rebate de consciência, mas não vou citar nomes de responsáveis, nem de instituições, nem do local para que o rebate se dê atempado. O caso é este: um bom homem legou a sua bela residência a uma instituição de solidariedade, e hoje, quando por ela se passa, a memória do generoso homem é lembrada até porque a moradia é sede de uma outra instituição de solidariedade com obra meritória e por todos reconhecida – ninguém assobia para o lado. Só que a instituição de solidariedade que recebeu o legado, alugou o edifício por umas centenas de euros à instituição de solidariedade que a usa e dela precisa para prosseguir os valores que seguramente devem ter estado no espírito do homem que doou a bela moradia. Ora a instituição inquilina vê-se e deseja-se para pagar a renda à instituição que por definição é solidária mas que não deixa de ser senhoria. Penso eu, e muita gente, que se o homem que bondosamente legou a sua casa regressasse à Terra, não cobraria um cêntimo à instituição que efectivamente usa e precisa da casa para fins sociais. Ou, se mesmo não regressando a este mundo, tivesse voz que se ouvisse, diria à instituição senhoria de um património que lhe foi dado por solidariedade, que a solidariedade paga-se com solidariedade e que a solidariedade não tem que seguir as regras de mercado para não se negar a si própria. Uma instituição de solidariedade relacionar-se com outra, também de solidariedade, voltando costas ao comodato a que moralmente estaria obrigada a conceder à outra, é mais ou menos o mesmo que supostamente surpreendermos um pobre a cobrar juros a outros pobres por empréstimos de dinheiros obtidos exclusivamente por esmola, continuando tal pobre banqueiro à esmola para engrossar os proventos da onzenaria… Ou não será?

Carlos Albino

Flagrante dever da quadra: Votos de Feliz Natal e Bom Ano Novo a todos os leitores que acompanham estes apontamentos há 242 semanas.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

SMS 241. Uma brisa de presépios

20 Dezembro 2007

São oito os presépios armados em áreas de serviço da rede de auto-estradas da Brisa, portanto o Algarve não conta, muito embora a Via do Infante não esteja nas mãos do rei Herodes. Os de Almodôvar e Aljustrel são os que mais perto estão cá da terra, mas há também os de Santarém, Leiria, Penela, Cantanhede, Trofa e Barcelos. Os presépios estão a votos e até dia 24 e conforme o presépio vencedor, o município da área ganhará um mini-bus para transporte de passageiros. É uma boa prenda e trata-se de uma boa ideia porque, para além de recolocar honra e dignidade na velha tradição portuguesa do Presépio, é uma daquelas simples e fáceis iniciativas que estão na linha da recuperação da sensibilidade e do humanismo perdidos. Naturalmente que muito gostaria que o rei Herodes não tomasse a Via do Infante e mais gostaria que os municípios do Algarve olhassem para a bela tradição dos presépios como coisa de eleição – o presépio é um dos poucos traços de união entre crentes, não crentes e indiferentes. Sobretudo os municípios que estão a promover a importação de tradições que em nada nos dizem respeito, como o dia das bruxas, fazendo aqui o mesmo ou coisa semelhante que outrora se promovia em Angola - forçar os meninos negros a dançarem o vira do Minho ou o fandango... Vem na mesma linha.

Carlos Albino

Flagrantes omissões: É claro que, nos convites para o meu presépio, houve três esquecimentos perdoáveis, mas a eurodeputada Jamila Madeira também está convidada para ver aquele bom mundo – a sua persistência e tenacidade acabaram por se impor como boa estrela política quando a julgávamos apenas atrelada aos reis magos. E por razões de proximidade, convites também para Seruca Emídio e José Apolinário.

quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

SMS 240. Assessor e presidente de Junta

13 Dezembro 2007

Com citação de caso concreto, perguntam-me se um presidente de junta de freguesia pode desempenhar simultaneamente as funções de assessor de presidente de câmara, em regime de permanência. Pelo que sei, não pode, além de que, por questão de transparência política, não deveria, sobretudo se a assessoria funções de consultor envolver matérias que no Algarve são explosivas como as do urbanismo e da pólvora de pedreiras. É verdade que há um parecer de organismo provincial a dizer que não há incompatibilidade com o mandato, mas que ou é parecer coxo, ou é mais uma daquelas muletas de conveniência. Para o caso concreto que me contam e que confirmei ser verdade, vale a jurisprudência do Supremo, pareceres da Procuradoria que por regra não coxeiam e também um acórdão de tribunal do norte que apreciou matéria idêntica. Tal acumulação não implica a perda de mandato na junta (não é um caso de incompatibilidade de cargos políticos mas de incompatibilidade de funções) pelo que um presidente de junta que seja assessor de presidente ou de vereador de câmara, não perde o mandato autárquico mas tem que se demitir do cargo para que foi nomeado com devolução dos dinheiros recebidos.

O infractor do caso concreto que tome providências quanto antes, porque é muita massa e não dá para brincadeiras, sobretudo em vésperas de Natal.

Carlos Albino

Flagrante estado de alma: O conforto de espírito por armar o Presépio na tradição herdada de meu pai – em pedra, com água e movimentos. Para além das crianças que conheço e das que me dão a conhecer, estão convidados, para uma vista de olhos, os deputados pelo Algarve designadamente Jovita Ladeira, Mendes Bota e Hugo Nunes. A casa não é grande, mas gente de boa vontade cabe toda.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

SMS 239. Presentes de Natal

6 Dezembro 2007

Antes que os produtos se esgotem, prepararemos os seguintes presentes para a governadora civil e para os 16 presidentes das câmaras algarvias:

Governadora Civil – um GPS para não se perder até à Guarda
Albufeira – Manual de Construção sobre o Mar
Alcoutim – um cêntimo do Orçamento de Estado
Aljezur – luvas de boxe para combater o isolamento
Castro Marim – uns binóculos
Faro – o fim das dores de cabeça
Lagoa – tabuletas e rotundas
Lagos – que o nível do mar não suba
Loulé – pazes com Quarteira
Monchique – mais uns pelouros
Olhão – um caíque a sério, caramba!
Portimão – um TGV, já agora…
São Brás – uma segunda freguesia
Silves – remédio para a lagarta da laranja
Tavira – o Hino do Algarve revisto e aumentado
Vila do Bispo – que o Instituto do Património tenha bom feitio
Vila Real – uma viagem a Cuba

Carlos Albino

Flagrante falta: A da celebração dos 50 anos dos males e omissões da RTP.

quinta-feira, 29 de novembro de 2007

SMS 238. Estamos governados

29 Novembro 2007

Os seis deputados do PS entenderam proclamar que, em matéria de investimentos da administração central para 2008, o Algarve «não tem razões de queixa». Não sei se falaram para os eleitores que representam, se para o governo que devem ou deveriam escrutinar, independentemente da simpatia política, ou se falaram apenas porque tinham que dizer alguma coisa fosse o que fosse. Em todo o caso foi uma proclamação perigosa, embora politicamente confortável para os próprios.

Naturalmente que o Algarve tem sobejas razões de queixa em matéria de transportes e vias públicas (não basta requalificar a 125 e sabe lá Deus quando!), de segurança, de saúde, de educação, de cultura, de ambiente, de requalificação urbanística… por aí fora. Mas, uma coisa é dizer-se que não há dinheiro ou que o dinheiro é pouco, outra é representantes afirmarem numa democracia representativa que não há razões de queixa, assim mesmo, como quem diz sem rei nem roque – porque não te calas?

É muito preocupante, para não dizer que é de mau tom, que representantes façam o papel de delegados. Mau prenúncio para a noção de Algarve e de representação do Algarve.

Carlos Albino

Flagrante adopção: A ligação das 2500 lâmpadas de Natal no Refúgio Aboim Ascensão, às 16 horas e 45 minutos de sábado, 1 de Dezembro, em Faro. É de ver porque significa muito.

quinta-feira, 22 de novembro de 2007

SMS 237. Os médicos, desta vez, têm razão

22 Novembro 2007

Muito breve e em poucas palavras – os médicos que apresentaram demissão de chefias do Hospital Central de Faro têm razão. E independentemente de terem razão, é chocante a forma como os responsáveis pela saúde no Algarve geriram o problema, a denotar que o complexo da maioria absoluta também já vem fazer aqui turismo de Inverno.

É claro que falar verdade da questão da saúde no Algarve – que está numa lástima – não é contribuir para o alarmismo e insegurança, pois os doentes e os que dos cuidados médicos necessitam, já há muito estão alarmados e inseguros. Para nada serve abafar a verdade da questão e rejeitar saber qual é problema pois os algarvios, sobretudos a vasta camada dos mais pobres e remediados, há muito sentem a dor da verdade para a qual uma democracia sadia tem cura ou pelos menos dispõe da terapêutica das práticas democráticas e que foi o que não se verificou. O que se verificou foi a pesporrência que é a cólica da democracia. Os médicos até podiam por hipótese não ter razão, mas não a atitude de quem tem poder e é responsável público não pode ser aquele “ai!” que dá conta de haver cólica.

Numa região onde as manifestações consolidadas de crítica política são escassas e até mal vistas (voltou-se a identificar a crítica como sendo coisa “contra a situação”…) é natural que responsáveis com poder se sintam confortados com a impunidade. Duvido que este tipo de comportamento se altere nos próximos tempos, até porque quem mais precisa tem medo e cala-se – cala-se é a palavra.

Os médicos, a bem da verdade, mais não fizeram do que se descartarem das responsabilidades pelo caos da saúde no Algarve e que não pode ser iludido pelo argumentário dos que comem estatísticas ao pequeno-almoço, ao almoço e ao jantar, sabendo-se que a estatística, sobretudo a da saúde que reduz algarvios a números, é profissão muito mais velha no mundo que a outra. E está tudo dito.

Carlos Albino

Flagrante actor: Correia de Campos

quinta-feira, 15 de novembro de 2007

SMS 236. Como cão por vinha vindimada

15 Novembro 2007

Nesta terça-feira, os algarvios que se sentem afectados pelo traçado de linhas de alta tensão, manifestaram-se em Lisboa às portas da REN, e fizeram bem.

Duvido, duvido mesmo se José Penedos estará a falar verdade e certo quando afirma que a REN, nos traçados das linhas eléctricas, fala com as autarquias envolvidas e com os proprietários dos terrenos afectados, além de que tem equipas no terreno «a falar com as pessoas, a dar informações e a negociar». Admitindo que fale verdade ou convencido desta, não sei se fala certo. Sabemos, desde há muito, que os electricistas plantam caixas onde querem e passam fios por onde lhes apetece ou convém, como se os fios fossem cães a passar por vinha vindimada. É claro que esta REN não será directamente responsável por tudo o que foi feito no passado, nem por tudo o que feito nas ruas de cidades e vilas onde os electricistas das câmaras dão nota da mesma cultura da REN e da mãe que a gerou, e que é uma cultura de desprezo pela estética e pelo bem-estar público, porque a cultura eléctrica é pura e simplesmente chegar ao contador de quem afinal paga.

E assim é que linhas de alta tensão passam exactamente sobre telhados de casas rurais, havendo, em tais casas, coincidências que José Penedos não deveria descartar num ponto de vista de saúde pública. Mas, independentemente dos legítimos receios em matéria de saúde, convenhamos que, olhando para montes e vales em pleno mapa turístico do Algarve, é demais. São fios eléctricos para ali, de telefones para além, cruzando-se uns sobre os outros, postes encavalitados sobre postes uns para Norte, outros para Este, sem respeito pela paisagem, em travessias sem respeito por nada, como se o País fosse dos fios e não os fios a servir o País, e no caso do Algarve, como se o Algarve fosse todo ele uma herdade de pecuária.

Porque uma coisa é José Penedos a olhar para as suas linhas no mapa aberto sobre a sua enorme secretária, respeitando e bem, segundo diz, até vestígios arqueológicos, outra coisa é olhar-se para as mesmas linhas na paisagem real e sobre as casas e corpos de cada um, onde a gente viva não é mero e menosprezível vestígio.

Carlos Albino

Flagrante cena de desenvolvimento: Com o encerramento da fábrica de Loulé será que o turismo deixou de consumir cerveja, ou anda outro negócio atrás disso?

quinta-feira, 8 de novembro de 2007

SMS 235. Quando os pais borram o estatuto

8 Novembro 2007

Um pouco por todo o Algarve, é inacreditável o que se passa à porta das escolas, à hora da saída de aulas. Toda a gente quer recolher o menino ou a menina com segurança e rapidez, o que não se recrimina. Só que a onda de egoísmo que submerge a sociedade – diríamos até, de egoísmo fundamentalista que não deixa de redundar mais dia, menos dia em terrorismo social – tem infelizmente, em muitos desses pais descarados protagonistas, transformando espaços que deviam ser de alegria e confiança no futuro, em espaços de atropelo, de manifestações provincianas de comodismo e de militante desdém pelo outro. Naturalmente que o assunto raramente é caso de polícia porque talvez esse enxame, no seu conjunto, mande na polícia, controle a polícia ou talvez mesmo atemorize a polícia. Mas as cenas repetem-se todos os dias, havendo motivos para pensar que esse sindicato de egoístas vai à escola menos por zelo pelos filhos e mais por aquilo que o egoísmo fundamentalista já transformou em norma e que é o «estatuto social». Esta semana foi-me dado comprovar, numa escola da capital, que muita dessa gente vai por estatuto e para mostrar estatuto, o que só é possível mostrar exactamente junto das grades da porta de saída, uns sobre os outros, e todos encavalitados com os seus estatutos a ocuparem a via pública à espera que os respectivos filhos entrem para esses territórios soberanos em que os egoísmos andam sobre rodas. Na verdade, com um imenso parque de estacionamento vazio mesmo à frente dos olhos, andar vinte, cinquenta metros a pé acompanhando os filhos, seria caso de perder estatuto… Ora, pais destes, não frequentando a escola, só estragam a Escola, e, aqui para nós, borram o seu próprio estatuto.

Carlos Albino

Flagrante coisa positiva: O portal-piloto Algarve Digital, embora tenha muita parra e pouca uva em função da prioridade que foi a alma do projecto – um ponto de encontro, inteligível para os utilizadores, entre a administração central e autárquica (sic).

quinta-feira, 1 de novembro de 2007

SMS 234. Listas

1 Novembro 2007

Porque dois ou mesmo três anos, politicamente, é um ar que se lhe dá, sente-se já os movimentos, melhor, a movimentação para as listas, onde presunção e água benta cada um toma a que quer. Para o comum dos mortais, as eleições (legislativas, autárquicas) ainda vão longe, mas para os imortais da política, a coisa está perto ou na hora de «não perder o comboio». Alguns, fartos de serem autarcas ou vendo num assento parlamentar a coroa de louros a que se julgam com direito, posicionam-se – não dizem que querem, até dão ar de desdém, mas quem desdenha quer comprar. E os que por enquanto vão estando assentados, sabem também que entraram na última fase da «consolidação do lugar», pois não anda longe de verdade que um assento parlamentar é a coisa que, no País, tão rapidamente aquece como arrefece. Portanto, nada de irritar os chefes partidários e, pelas diversas vias, «chegar ao povo» a fim de se obter, a tempo, a chamada legitimidade de consideração. É claro que será dispensável referir os presidentes de juntas que palpitam uma hipótese na vereação ou, casos mais raros, os vereadores falhados que almejam ao menos uma junta para ressarcimento dos desastres.

Nada contra isto – é normal numa democracia. O que não é normal é que aos movimentos dos que têm apetite por elegíveis lugares de poder, não correspondam movimentos de ideias e debates, sobretudo corajosos, sobre as questões de interesse geral e do bem comum. As ideias, como as temos sentido, não passam, umas, de ideias parasitas e asseptizadas dos programas partidários, outras, de ideias adventícias do chefe respectivo cujo nome, amiúde, invocam em vão, designadamente daquele chefe próximo ou distante de quem, quer se queira ou não, dependerá a formação das listas. Por isso, impera a manha. Parece silêncio mas não é – é manha. Ora, uma democracia de manhosos, pode ser muito popular, mas é contra o povo. E quem se pica, alhos mordica.

Carlos Albino

Flagrante economia regional: É mais difícil encontrar uma empresa algarvia entre as mil maiores empresas do País, do que uma agulha no palheiro.

quinta-feira, 25 de outubro de 2007

SMS 233. O que é inacreditável

25 Outubro 2007

1 – Inacreditáveis as notícias que chegam de Alvor. Ou as autoridades ambientais e autoridades conexas esclarecem de uma vez por todas o que está a acontecer na Quinta da Rocha e agem sem delongas, ou mais ninguém de boa-fé definitivamente acredita em leis, planos, redes e ordenamentos do território. As notícias de Alvor dão conta apenas de um fio da meada. Há muitos outros problemas aqui e ali geridos pela calada ou, pior do que isso, geridos com «engenharia política» e com o «controle de impacto» na sociedade – os prevaricadores, dissimulados ou não, sabem que esta, a sociedade algarvia está dividida em comarcas de interesses, subdividindo-se as comarcas em regedorias de manha. Não são todos, oxalá até que seja uma minoria, mas há gente que opera no Algarve ostentando gloriosamente o bilhete de identidade de investidor turístico, passeando-se depois com métodos, procedimentos e objectivos próprios de invasor bárbaro. E o que vai arrepiando é que aquilo que era manifestamente bárbaro há dez anos, hoje é tolerado pela lei e enquadrado na lei.

2 – Aos bárbaros, obviamente, não lhes interessa os Algarvios, porque até desejariam um Algarve sem Algarvios, ou com o mínimo possível de Algarvios. Sem regras ou contornando as regras, os bárbaros negoceiam o Algarve retalhado fora do próprio Algarve – daí odiarem a Regionalização da qual fogem como diabo da cruz. Os resultados dessa perversa pose de conquista em que as pessoas não contam e que em muito determinou aquilo a que seraficamente chamados de Política Turística, contando apenas o negócio, e com a qual alguns algarvios têm ingenuamente colaborado a bem da avença, tais resultados estão à vista e são dramáticos: o risco de pobreza pirou no Algarve entre 1955 e 2000 (dados conhecidos) de 15 por cento para 25 por cento, ainda que o PIB regional tenha aumentado – sendo este PIB o turismo (com a neve do golfe incluída) e não já a alfarroba e amêndoa ou a pesca e conserva. O risco da pobreza é um indicador fundamental do desenvolvimento e esse risco no Algarve retalha o peito. É de suspeitar que a situação tenha piorado, e muito, desde 2000 a esta parte – basta andar por entre a pobreza envergonhada ou que por aí se esconde até ao último momento de dignidade possível. Nenhum bárbaro, dos muitos que temos, se envergonha disso, como comprovam algumas esmolas que dão.

Carlos Albino

Flagrante advertência: As represálias de professores sem escrúpulos sobre professores escrupulosos, estão a exceder as marcas… Algum dia, isto virá ao de cima.

quinta-feira, 18 de outubro de 2007

SMS 232. Exemplo. Continuem porque fazem falta

18 Outubro 2007

Definem-se como «uma equipa multidisciplinar que pretende intervir na sociedade algarvia, quer pela via da opinião escrita, quer pela realização de estudos e debates, mesas redondas e outros eventos que permitam reunir ideias e gerar massa crítica numa região com carência de interventores e de agitadores de opinião». E por isso têm porfiado, aqui e ali, desde 2001 até agora, sob a designação de Vialgarve – há seis anos, portanto, que se esforçam por rasgar no arenoso chão mental algarvio aquilo a que Sérgio chamava as Avenidas Largas da Crítica – a sua carta de princípios está muito próxima dos preceitos sergianos, e, com esta, já estarei a meter-me onde não sou chamado. As suas ideias e propostas têm já título de residência permanente nos arquivos de vários jornais e, avaliando bem o acervo, os que têm transportado a olímpica chama da Vialgarve merecem-me profundo respeito – são um exemplo, continuem porque fazem falta. Não conheço ninguém do grupo, nem é preciso, mas é como se os conhecesse de sempre – os que amam o Algarve são todos primos à distância.

Carlos Albino


Flagrante despiste: Se para requalificar a 125 não for promovido um debate público regional que não é o mesmo que somatório de duvidosas ideias de dubitativa meia dúzia de autarcas que raramente têm uma dúvida.

quinta-feira, 11 de outubro de 2007

SMS 231. A começar por este equívoco…

11 Outubro 2007

A propósito de deputadas e deputados do Algarve, o que mais se ouve dizer é que «representam o Algarve e não fazem nada», também que «falam do Algarve porque os seus estão no poder», ou ainda que «só agora falam porque estão na oposição» … É claro que sempre há um ou dois representantes que lá fazem requerimentos, perguntas a ministros, enfim, sempre é um ar de «representação da região», muito embora o interesse principal seja o de que jornais e rádios da redondeza dêem conta de que «o deputado algarvio requereu» ou que «a deputada algarvia perguntou», o que não deixa de ser uma prova política de vida que faz bem de vez em quando fazer, caso a política seja uma espécie de pensão. Para esta mesma prova, não todos mas alguns, preferem publicar artigos de tese ou de antítese, ou então «visitas ao local». E não se sai daqui porque há um tremendo equívoco, melhor, há uma cultura política de equívocos que leva ingénuos a considerar cada deputado ou deputada como voz da região, impulso ingénuo esse que se compreende porque o Algarve não tem voz política e bem dela precisaria.

E porquê?

É evidente que os deputados, por força do seu estatuto, logo à cabeça «representam todo o País, e não os círculos por que são eleitos.» O estatuto, ao explicitar que não representam o círculo que os elegeu, diz tudo. E os deputados falam do círculo ou das coisas do círculo é porque o partido tolera isso ou isso lhe convém, conforme as circunstâncias. O resto é conversa sendo raros os que se atrevem a pôr em risco a reeleição pelo círculo que acabam por não representar ou por não poder representar por força do estatuto, ainda que contraditoriamente o mesmo estatuto obrigue os mesmos deputados ao dever de «assegurar o indispensável contacto com os eleitores». Esta estranha indispensabilidade tem muito a ver com o equívoco.

Daí que tenha de ser um retirado de São Bento, Luís Filipe Madeira, em declarações ao semanário Sol (Helena Pereira, 5/Outubro) a dizer em letra grada que não viu «passos em frente no sentido da descentralização» e que «existem é órgãos desconcentrados que são governados pelo telefone». Algum deputado do PS ou que o círculo elegeu pelo PS seria capaz de dizer isto? Se calhar, será o próprio PS do Algarve que está a ser governado pelo telefone. Continuem assim que vão bem e longe, porque, sob outra forma e sofisticação, repetem-se os erros dos políticos algarvios da I República e que foram erros dos políticos algarvios e não tanto da I República.

Carlos Albino

Flagrante comparação: A política algarvia está para a música clássica assim como a filarmónica de Paderne está para Orquestra do Algarve.

quinta-feira, 4 de outubro de 2007

SMS 230. Pires de Lima, a Isabel

4 Outubro 2007

Na entrevista ao Expresso (Nuno Saraiva, 29/Setembro), a ministra da Cultura anuncia a requalificação da Fortaleza de Sagres. Isabel Pires de Lima mais não diz, mas o propósito da requalificação já é um bom sinal.

Na verdade, tal como ficou das últimas intervenções impostas, Sagres resultou numa vergonha, em cinco atropelos e em sete insultos, em que manifestações secundárias de adolescência arquitectónica e visões corporativistas do passado se cruzaram ou casaram com comunhão de adquiridos. Assim, é oportuno perguntar-se o que vai significar essa requalificação da Fortaleza anunciada pela ministra. Significa isso demolir o que deve ser demolido, refazer o que deve ser refeito, procurar o que está escondido e acautelar o que se vê à vista desarmada? Significa isso abrir de novo uma discussão pública serena e crítica sobre o dossier de Sagres, no que tem de património e de simbólica acumulada desde insondável antiguidade? Requalificar o quê, como, para quê e com quem? São perguntas que ficam no ar, mas só o facto de as perguntas voltarem a ser feitas dá mérito à ministra – discutir Sagres e tentar decifrar os muitos enigmas do Promontório é deveras um imperativo que Isabel Pires de Lima actualiza, a nosso ver com justificada nobreza, na agenda da política de Cultura.

É claro que, à partida, deveria ser elaborado um livro branco sobre o Promontório Sacro sem lendas, recuperando-se, entre o mais, todo o trabalho da comissão liderada por Romero de Magalhães, a propósito da gesta gorada da candidatura a património mundial. Embora com perdas irreparáveis, há tempo para recolocar a dignidade em Sagres. Ironiza Nuno Saraiva que «Pires de Lima bem podia ter como cognome Isabel, a ambiciosa». Se a ambição da ministra for a de retirar Sagres da lista de enxertos, então que se reconheça o legítimo direito ao cognome, pois há muito a requalificar politicamente no Algarve da Cultura ou na Cultura do Algarve, como se queira.

Carlos Albino

Flagrante falta de espaço: Para se falar da
magnífica obra arquitectónica de Gonçalo Vargas, na ilha da Deserta/Barreta, 24 páginas seriam poucas mas duas linhas bastam para chamar a atenção.

quinta-feira, 27 de setembro de 2007

SMS 229. Um pacote de açúcar

27 Setembro 2007

Tomei a bica e, como habitualmente, guardei o pacote de açúcar no bolso – o açúcar apenas tira o sabor do café. Depois deste ritual atravessei de carro a cidade, era já meia-noite e começaram as pequenas aventuras numa terra como sempre sem vigilância aparente e sem sistema de prevenção mínima que seja. Mesmo em frente dos Paços do Concelho, jovens em grupo urinavam em competição, parados na travessia de peões em porco desafio. Metros à frente, uma rapariga desenraizada não pela cor mas pela educação insultava gratuitamente quem passasse. Pelo lado direito, um homem já entradote pastava o seu belo e enorme cão parando extasiado com os dejectos que o bicho aliviou, e pelo lado esquerdo uma mulher de meia-idade era puxada por quatro cãezinhos cor de anjo mas que também faziam as porcarias que leva Deus a castigar os anjos do paraíso que façam o mesmo impondo-lhes patas em vez das asas. E nesse pequeno trajecto, com automóveis amontoados sobre os passeios como se não houvesse nem rei nem roque, ainda vi gente a escarrar para o chão, um outro a tentar acertar com uma lata de coca-cola num candeeiro, e ainda uma moto em alta velocidade a fazer cavalinho, seguida por uma outra de quatro grossas rodas de escape aberto, além de que de um primeiro andar alguém atirou para a rua um saco de lixo que se estatelou no chão espalhando vidros e por certo odores. Se todos os dias e todas as noites, isto acontece nesta terra, e se o que acontece nesta terra ocorre também pelo Algarve a fora, então, como se diz no circo, excelentíssimos senhores e excelentíssimas senhoras, isto se não é o inferno, parece.

Quando cheguei a casa, tirei do bolso o pacote de açúcar e li por curiosidade uma frase que lá estava impressa num evidente propósito da multinacional do pacote em divulgar os Direitos Humanos. Isto mesmo: «O indivíduo tem deveres para com os outros, para com a comunidade, fora da qual não é possível o livre e pleno desenvolvimento da sua personalidade».

Nem com açúcar isto vai – os poderes públicos voltaram costas à educação cívica, as polícias apenas aguardam as queixas e alguma coisa de positivo que se faz nas escolas em matéria de civilidade e integração não chega à sociedade cujas “forças vivas” apenas têm interesse em beber o café com açúcar, com muito açúcar, mesmo que percam o sabor do café e não o sabor do voto.

Carlos Albino

Flagrante paraíso fiscal: Pagar ou receber a
dinheiro vivo, num enorme contributo para a transparência dos
impostos.

quinta-feira, 20 de setembro de 2007

SMS 228. O eclipse dos políticos

20 Setembro 2007

O fenómeno não é típico do Algarve, ocorre um pouco por todo o País – os políticos entraram em eclipse e o Algarve não foge à regra. Parece até que um político não é o que faz política reportando anseios da sociedade, expondo ideias para o mundo avançar e propondo soluções para que o nivelamento da cultura e da civilização se faça por cima e não por baixo como cada vez mais acontece. Hoje o político não é o que faz política mas, apenas quase, o que tem um bom emprego político, ou por via de eleição já de si manhosa, ou por via de nomeação que normalmente coloca bem os perfis de capataz – há excepções, claro, mas que confirmam a regra.
Naturalmente que não se nega haver quem julgue que os outros acreditam que fazem política e não que estejam de alguma forma a defender o emprego, surgindo todos os dias, se estão na oposição, com pequenos protestos, com reivindicações de esquina e acaloradas defesas do óbvio, ou, se estão na caleira do poder, com servis apoios a decisões autoritárias, com agradecimentos próprios de afilhados e até mesmo, se o escândalo da medida tomada se revelar incontornável, com amanteigamento de resoluções perversas ou calando-se até que a borrasca passe. Todos eles, no entanto, têm um objectivo comum: serem notícia, aparecerem nos jornais e com isso darem sobrevivência política ao nome, o que está longe do fazer política mas perto do jogo em que a política se converteu,

É claro que neste eclipse, não há ideias consolidadas, não há projectos de sociedade, não há propostas de soluções para os problemas colectivos e muito menos há a vontade de identificar os problemas que é por onde a política começa. Como dizia o velho pensador de Marmeleite que morreu sem deixar obra publicada, contra isto, batatas.

Carlos Albino

Flagrante conta: Se cada português paga mensalmente 36 euros à RTP de mão beijada, os algarvios pagam por ano dois milhões de euros – compensa com o que a RPT faz no Algarve quando não há raptos no litoral e incêndios no Caldeirão?

quinta-feira, 13 de setembro de 2007

SMS 227. O caso de Verão

13 Setembro 2007

Pois o caso de Verão foi sem dúvida o caso de Madie – não foi necessária uma reunião crucial da presidência da União Europeia para que televisões e imprensa internacional se lembrassem cá da terra por melhores motivos. Aliás é de crer que nenhuma reunião europeia sob presidência portuguesa contou ou possivelmente contará noutras bandas com tal permanência e insistente alvoroço aqui apenas centrado no caso de uma criança, muito embora ali na Emergência Infantil de Faro cada uma das dezenas e dezenas de crianças, muitas delas salvas por uma unha, justificasse uma migalha de atenção para o que ninguém muito menos Deus quer, mas que força a que um homem sonhe e a obra nasça todos os dias.

Quero com isto dizer que, somando as milhentas suspeições às centenas de investigações e à grossa recolha de fundos por um só caso que apenas Deus sabe, foi pena que o acaso ou o destino não tivessem levado Madie para o acolhimento perfumado do Refúgio Aboim Ascensão onde a filha dos MacCann estaria melhor do que onde está, além de que os quase dois milhões de euros dos donativos, se também lá chegassem para serem adoptados, não iriam ao fundo.

Carlos Albino

Flagrante peça de estimação: A chave da igreja da Praia da Luz, Ámen.

quinta-feira, 6 de setembro de 2007

SMS 226. Branco é, Loulé o pôs

6 Setembro 2007

Não foi um ovo de Colombo, mas ficou de pé. A Noite Branca de Loulé fez pública prova de que o bom gosto associado ao bom senso tem sempre êxito nem que seja no meio do gelo do pólo Norte ou nas águas mais isoladas do Atlântico. Provou aquela gente de Loulé que com imaginação e postura elevada, não é apenas a tradição e muito menos decreto ou devaneio de ministro que comanda o calendário da convivência humana – sem grande espalhafato conseguiram o milagre de um mar de gente vestida de branco (a única norma imposta) a passear a alegria pela noite fora sem que seja para passear o cão, e, enfim, a oportunidade do comércio mostrar o bilhete de identidade que tem no incontornável mundo das trocas onde quem compra e quem vende deve ter rosto, sendo já um achado encontrar um riso próximo do laivo de felicidade no rosto de quem vende ou de quem compra. Dizem-me que foi um ensaio, um primeiro ensaio, e que para o ano há mais. Que assim seja e que em algum canto se ouça um acordeão que quando é bom tem muito de jazz – foi a única coisa que faltou mas pouca gente deu pela falta.

Carlos Albino

Flagrante expectativa: Pelo balanço rigoroso do programa Allgarve.