quinta-feira, 6 de março de 2008

SMS 252. Mau serviço cívico

06 Março 2008

Li agora afirmações de Miguel Freitas (na revista Algarve Mais) sobre o movimento cívico Regiões Sim e noto também agora o grande reboliço noutro movimento cívico que se intula Não Apagem a Memória mas que começa logo como se chamasse Liquidem a Inteligência Rapidamente. Afirmações do líder regional do PS e reboliço, têm um traço comum.

Peguemos no que está mais perto do que é importante, as afirmações de Miguel Freitas, que lança a seguinte pergunta cuja resposta é obviamente uma insinuação: «Digam-me uma coisa que o PSD tenha feito na região em 2007, a não ser que o movimento Regiões Sim agora tenha substituído o PSD/Algarve». E logo a seguir, Miguel Freitas afirmou, segundo o entrevistador, com voz firme: «É verdade que 90 por cento dos associados do movimento são militantes do PSD, mas isso é outra questão. Se é por aí que medimos o trabalho do PSD, então tudo bem. E dos outros, nem vale a pena conversarmos».

Não vou gastar dois segundos sequer sobre o que significa a referência a esses tais outros (os 10 por cento, certamente) a quem Miguel Freitas não concede conversa, nem um segundo sequer sobre como é que ele conseguiu ter a trabalhadeira de verificar a ficha política de cada cidadão que aderiu a esse movimento cívico (independentemente de cada cidadão aderente ter ou não partido, ou de saber se o outro aderente tem ou não) para, com voz firme, o líder do PS/Algarve declarar aquela sua verdade atemorizadora, e que é atemorizadora pelo manifesto exercício de diabolização inquisitorial que eu esperava de muita gente mas não de Miguel Freitas, com esta ligeireza.

Vamos ao que importa.

Conforme o calendário, queixam-se os partidos políticos de que a sociedade civil não se organiza ou não sente necessidade de impulsionar movimentos de intervenção cívica, transversais e plurais. Ora, pelos exemplos que temos vindo a registar e onde o de Miguel Freitas enfileira, os responsáveis por esta situação são os próprios partidos, porquanto mal surja um movimento cívico transversal e plural, os partidos, cada um por si, tentam capturar tais movimentos para o seu controlo. E quando não conseguem capturar, insultam o movimento argumentando que este foi capturado pelo outro.

Quando, à evidência, o movimento cívico é plural e transversal, cada partido cria uma suspeita de que existem forças espúrias no movimento, e a sociedade civil que já está amarfanhada pelo estado (estado que não é o governo, como na confusão lançada pelo regime autoritário), fica atónita e por certo incapaz de impor aos partidos que recolham à sua dimensão.

A não ser que se volte a pensar que um movimento cívico não deve ir além dos chás de caridade, de debates sobre o sexo dos anjos ou de marchas de cidadãos civicamente fardados atrás de bandeiras irracionais, obviamente que um movimento cívico tem na base uma intervenção política de qualquer matiz e aos aderentes não se lhes deve exigir que sejam quimicamente puros de partidos ou que devam respeitar quotas libertas da impureza partidária.

Miguel Freitas prestou um mau serviço cívico, e sobre os 10 por cento da sua boa consciência nem vale a pena conversarmos. Os outros 90 por cento, é outra questão.

Carlos Albino


Flagrante palavra: Revivalismo, o dos avozinhos do regime autoritário que por aí circulam como teóricos da democracia.

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