Vou falar do caso para haja um rebate de consciência, mas não vou citar nomes de responsáveis, nem de instituições, nem do local para que o rebate se dê atempado. O caso é este: um bom homem legou a sua bela residência a uma instituição de solidariedade, e hoje, quando por ela se passa, a memória do generoso homem é lembrada até porque a moradia é sede de uma outra instituição de solidariedade com obra meritória e por todos reconhecida – ninguém assobia para o lado. Só que a instituição de solidariedade que recebeu o legado, alugou o edifício por umas centenas de euros à instituição de solidariedade que a usa e dela precisa para prosseguir os valores que seguramente devem ter estado no espírito do homem que doou a bela moradia. Ora a instituição inquilina vê-se e deseja-se para pagar a renda à instituição que por definição é solidária mas que não deixa de ser senhoria. Penso eu, e muita gente, que se o homem que bondosamente legou a sua casa regressasse à Terra, não cobraria um cêntimo à instituição que efectivamente usa e precisa da casa para fins sociais. Ou, se mesmo não regressando a este mundo, tivesse voz que se ouvisse, diria à instituição senhoria de um património que lhe foi dado por solidariedade, que a solidariedade paga-se com solidariedade e que a solidariedade não tem que seguir as regras de mercado para não se negar a si própria. Uma instituição de solidariedade relacionar-se com outra, também de solidariedade, voltando costas ao comodato a que moralmente estaria obrigada a conceder à outra, é mais ou menos o mesmo que supostamente surpreendermos um pobre a cobrar juros a outros pobres por empréstimos de dinheiros obtidos exclusivamente por esmola, continuando tal pobre banqueiro à esmola para engrossar os proventos da onzenaria… Ou não será?
Carlos Albino
Flagrante dever da quadra: Votos de Feliz Natal e Bom Ano Novo a todos os leitores que acompanham estes apontamentos há 242 semanas.
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