quinta-feira, 1 de novembro de 2012

SMS 485. Divórcio com o eleitorado

1 novembro 2012

A palavra divórcio é adequada ao caso, embora deputados e eleitorado nunca tenham casado. Não é todos os anos que um país inteiro toma conhecimento de um Orçamento de Estado de desfazer os ossos, como não é coisa rotineira que uma região ou círculo com seus eleitores pode ver desmoronar-se programas e projectos em que se empenhou e e que acreditou. É verdade que o debate foi nacional, ou seja, foi um debate entre os diretórios partidários, com avanços ou recuos em função das fatias do bolo da democracia (caso do acordo para as autárquicas entre dois desses partidos), mas nada justifica que os deputados se tenham refugiado na toca ou se tenham tornado anónimos, portanto sem nome e sem cara.

No caso do Algarve, é para todos, sejam quatro ou três mais um, dois apenas ou um. Não basta um comunicado apaziguador dos militantes, ou de resposta a facção interna, ou ainda para mostrar serviço a Lisboa. Muito menos basta uma croniqueta, dessas que mal começam, sabe-se logo como acabam. Os deputados do círculo, todos por um ou um por todos, deveriam ter tomado posição pública sobre assunto da mais elevada importância para indivíduos, empresas e instituições da região. O normal é que cada um desse a cara, mostrasse a boca e olhasse olhos nos olhos os eleitores que o elegeram, muitas vezes sem hesitações, outras por arrasto da figura de proa.

Nunca escondi que sou crítico deste Orçamento – pela sua filosofia, pela garotice na condução do processo, pelas intenções escondidas e pelas omissões graves sobre a causa da crise e desta emergência com impunidade para os reponsáveis. Isso não quer dizer que apenas seja bom ou correto quem partilhar da mesma opinião. Nada disso! E no caso dos deputados do Algarve, esperava, sempre esperei que tivessem ido a Lagos, a Tavira, a Silves, a Portimão ou a Faro que apenas fosse, explicar o sim ou o não. Não basta Lisboa dizer que não, para isentar os deputados regionais da explicação, como não basta Lisboa decretar a disciplina de voto para os dispensar da prova pública de que têm um voto de consciência. Não o fizeram, ficaram-se pelo comunicadozito ou por um textozito com fotografiazita, e assim deixaram provado que o divórcio com o eleitorado ainda lhes dá o que resta do casamento: o ordenadozito.

Carlos Albino 
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    Flagrantes monumentos: Sobretudo igrejas, é verdade que abertas para glória dos turistas que estão lá nas alturas tais como santos e anjinhos, mas perante as quais os vivos dão com os narizes nas portas.

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

SMS 484. Falemos então dos passarinhos…

25 outubro 2012

Segundo parece o debate sobre o Orçamento e a região (região, por assim dizer) não pegou. Nem quanto ao papel dos nossos deputados (nossos, por assim dizer) que no mínimo teriam a obrigação de explicar um sim ou um não, sem se abrigarem nas desculpas da disciplina partidária ou no argumentário da salvação da pátria que naturalmente não existe sem as regiões atentas ao seu futuro como também a democracia não existe sem os círculos eleitorais com eleitores providos de memória e de responsabilidade quanto ao futuro. As próprias alas regionais dos partidos parecem atadas, uma por um motivo, outra por alguma razão de cálculo, e enquanto o barulho de minorias a todo o pretexto faz o seu trabalho de amedrontamento. A nosso política regional, segundo parece, esgota-se no registo acrítico a nomeação deste para aqui e daquele para ali, no porto de pesca que precisa disto, no município que precisa daquilo, e no que fulano disse sobre algo em geral, cicrano sobre nada em particular e beltrano repetiu sem se aperceber que repete o mesmo há anos. A única universidade pública da região pode estar em risco, mas ninguém toca no assunto como se o problema fosse apenas um problema corporativo das Gambelas e não da região. O turismo pode continuar a viver ou a sobreviver como se estivesse num mundo aparte e do Algarve só precisasse gente para as limpezas, para os balcões de receção e um ou outro quadro mas reduz-se a mera questão de estatística, porque quanto a inserção numa política de desenvolvimento regional, só por tabela. A saúde pode ter gravíssimos problemas mas a época baixa não faz subir ao alto o diagnóstico político do assunto. A pobreza e a miséria bate cada vez mais à porta com a enorme legião de desempregados e outra ainda maior de sub-empregados a que se juntam os explorados até ao tutano e o feche em catadupa de mini-empresas, mas não interessa, diz-se que é da crise e basta para se encolher os ombros. Por aí afora. E ai de quem pensa e escreve que alguma coisa está mal na banda que passa, que alguma coisa está mal quando a política se resume ao combate e aos preparativos do combate para ocupar postos e assentos de comando ou de babugem da nomenclatura política, que alguma coisa está mal quando, nos sítios e com gente própria não se discutem as questões de fundo para a região. Região esta que está politicamente amorfa, não sendo o barulho nas ruas que, só por si, lhe dá vida. O barulho é um sinal mas algo está mal quando o sinal não provoca reflexão, busca de soluções e projetos políticos concretos que denotem a existência de quadro mental nos arautos. Quem pensa e escreve colocando algum dedo na ferida, gera equívocos, equívocos que incomodam sobretudo aqueles que desejariam que apenas se escrevem crónicas sobre os passarinhos que fazem os seus ninhos, coitadinhos, felizes com seus filhinhos nos beirais dos telhados.

Carlos Albino
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    Flagrante caso: O da criança de Carlos Albino que comprovou o enorme défice de informação do Algarve e no Algarve. É o pior dos défices.

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

SMS 483. O voto dos representantes, irá representar?

18 outubro 2012

Aqui temos, desta vez, um fantasmático Orçamento de Estado que, para um Algarve com o maior nível de desemprego do país, autarquias nas lonas, empresas fechadas, turismo com coração aqui mas carteira lá fora, insegurança até dizer basta, portagens coloniais, agricultura grandemente desfeita e pescas metidas a pique, para este Algarve, o Orçamento que se apresenta irá ser como que um exército de invasores a matar sem dó nem piedade e a pilhar tudo o que luza. Se no tempo das vacas gordas, o Algarve foi tratado com os pés, agora que nem é sequer já de vacas magras mas de esqueletos de vacas, o Algarve é atirado para o fundo do mapa ou mesmo dele retirado. A falha imperdoável do governo em honrar compromissos eleitorais e o seu fracasso em atingir metas traçadas somado ao fraco valor político e técnico de ministros-chave, gerou a desconfiança geral do país, e, aqui no canto do mapa, criou aos algarvios um sentimento de que estão indefesos e de que não há ninguém que os possa e queira defender. Há discursos que são já tardios e por isso ineficazes; e há prosápias que tentam justificar o não feito pelo prometido, e também por isso que não geram convicção em ninguém.  E quanto ao Orçamento, de uns, umas quantas generalidades de circunstância, circunstância de oposição, e de outros, o silêncio, moita-carrasco, agachem-se soldados na trincheira enquanto houver tiros lá em cima.

Quanto aos nove deputados eleitos pelo Algarve, claro que seria de esperar que tivessem tomado a posição de votarem contra este Orçamento tal como ele se apresenta para a região e para os algarvios. Ou então que tivessem dito que se revêem nele, que o apoiam e que, enfim, receberam o mandato dos algarvios para tal fim. Tenham essa coragem, como os deputados da Madeira sem rodeios a tiveram, ou como os dos Açores, à sua maneira (que aqui entre nós é como que à maneira de Monchique ou de Querença, ou seja, com toda a manha) já a expressaram telegraficamente. Pois eles, os nove deputados, representam o quê e quem? Representam as direções partidárias ou representam os eleitores algarvios?

Acaso esses nove deputados reuniram-se com associações empresariais e sindicais, com instituições regionais, com autarquias, enfim, com cidadãos em reuniões abertas, pelo menos nas 16 sedes concelhias, e não apenas com sequazes, sejam estes seus discípulos de aldeia ou seus mestres de escritório? Sendo tais nove deputados os legítimos representantes dos algarvios, com que fundamento eles vão dar um voto favorável ou contrário a este Orçamento de Estado que vai afetar as vidas de todos os eleitores que representam e sem os quais eles não seriam o que são nem estariam onde estão? Vão votar por essa tal disciplina partidária que tem  matado as raízes da participação política, ou vão votar em representação do Algarve, sem medo de que o denominador comum seja o máximo? Ou têm medo, paradoxalmente, até de declararem que vão votar a favor desta obra que, sem medo, aqui se deixa claro, é iníqua além de errada com erros crassos? Digam.
(Os 9 deputados eleitos pelo Algarve, neste mês de outubro, no seu conjunto já deviam ter feito 27 contactos com o eleitorado algarvio nas três segundas-feiras que passaram, pois para isso têm as segundas livres. Mas fizerem esses 27 contactos ou fizeram 27 fins-de-semana prolongados?)
Carlos Albino
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    Flagrante afronta: O propósito de encerrar a Fundação António Aleixo, é uma afronta. Seria interessante saber quais foram os meninos de coro que fizeram o estudo em que o governo se baseou para decidir infantilmente. É uma afronta para Loulé e para Quarteira e uma afronta dessas é uma afronta ao Algarve.

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

SMS 482. Assim, por exemplo...


11 outubro 2012

O PCP viu subir recentemente ao plenário parlamentar o seu projeto de resolução sobre “Dinamização da atividade portuária como instrumento de desenvolvimento económico da região algarvia”, subscrito entre outros pelo deputado Paulo Sá, um dos nove eleitos pelo Algarve. O projeto de resolução foi votado no dia 28 de setembro, sendo rejeitado (votos contra do PSD e CDS, favoráveis do PCP, BE e PEV e abstenção do PS). Não interessa para aqui avaliar tais votos e tal abstenção, mas o texto do projeto, a sua eficácia política, alcance, viabilidade e adequação. Sem dúvida que temos ali uma razoável descrição dos três portos comerciais e de outros três de pesca, mas, chegados ao ponto das recomendações ao governo, estas não passam do elenco de reivindicações que é normal encontrar-se em programas eleitorais. Não é que as reivindicações não sejam pertinentes e justas – no caso dos portos algarvios até são uma coisa e outra -, só que figurando num projeto de resolução apenas se justificam com prévia e sólida negociação política ou com a certeza e segurança de eficácia da iniciativa. E se assim não for, é atirar barro à parede e adiar mais uma questão como foi o caso. A partir do parlamento, quem está na oposição e sobretudo em nome de uma região politicamente frágil, pode tentar mas não pode obrigar o governo a fazer o que este não quer fazer mesmo que possa, e, além disso quer se esteja na oposição ou do lado do poder, também não deve confundir iniciativas parlamentares com cardápios eleitorais apenas para satisfazer um diminuto número de militantes. Faltou qualidade, clarividência e oportunidade política ao projeto do PCP, mas quem perdeu não foi o PCP que nunca esperou ganhar a votação mas apens fazer trabalho de casa, quem perdeu foi o Algarve que, mais uma vez viu adiada, senão enterrada por muito tempo, a discussão dos seus portos comerciais e de pesca, matéria em que todos os governos têm andado a brincar. Mas se os governos podem brincar aos algarves como têm brincado, já os deputados da região, sejam eles do PCP, do CDS, do PSD, do BE ou do PS,  poder podem mas não devem jogar às manecas no parlamento. Pode ser divertido, mas é politicamente primário.

Carlos Albino
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Flagrante pergunta: Com essa retirada do helicóptero do INEM para Beja, não compreenderam que para este governo, o Algarve não está no mapa e que os algarvios são uns sub-alentejanos?

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

SMS 481. Deputados e proximidade


4 outubro 2012

Temos no parlamento, como se sabe, nove deputados ativos, 4 do PSD, 2 do PS, 1 do CDS, 1 do BE e 1 do PCP. É claro que a atividade parlamentar se mede pela qualidade e adequação das iniciativas legislativas que apresentam, pelo teor das intervenções, pelo impacto dos requerimentos ao governo e pelas repercussões das perguntas que formulam sobretudo aos ministros.  Além disso, para o perfil de cada deputado também conta o nível de trabalho em comissões, o valimento das deslocações que fazem, os dotes que comprovam possuir quando são eventualmente nomeados como relatores e também a perspicácia  e grau de conhecimentos que revelam nas audições em que circunstancialmente são envolvidos. O registo de tudo o que fazem vai constando exemplarmente no site oficial da Assembleia da República onde só não constam porque não podem constar podem constar, os resultados ou a eficácia política da atividade de cada deputado em S. Bento, sendo esta uma matéria do partido a que pertencem e em última análise aos cidadãos que os elegeram e não andam distraídos. Mas isso é S. Bento, havendo outra bitola para avaliação dos eleitos. É a bitola da sua proximidade com os eleitores e para tal têm tempo reservado.

Olhando bem para essas duas facetas do conjunto que o Algarve despachou para S. Bento, de modo geral o panorama é politicamente pobre para não dizer paupérrimo.

No que toca à azáfama em Lisboa, pode um ou outro apresentar um comboio de iniciativas legislativas, mas não passam de iniciativas de paus mandados, com a assinatura para fazer número; pode este ou aquele invocar um sem número de perguntas e de requerimentos, só que, além de impacto político escasso ou nulo, a grande percentagem de tais perguntas sem resposta e de tais requerimentos que nem aquece nem arrefece o requerido, não ultrapassa matéria própria de assembleia de freguesia soando a ridículo e a reles interesse eleitoraleiro numa Assembleia da República – só falta aparecer um requerimento para a substituição da lâmpada de 25W naquela rua sem nome do Cachopo . E quando se trata de intervenções de fundo em plenário, é a voz do dono conforme o chefe do momento. 

No que toca à proximidade com os eleitores, está à vista desarmada. Claro que um u outro deputado de vez em quando toca nas grandes causas mas pegando-as de cernelha se são afetos ao poder ou fazendo pegas de caras desajeitadas se são da oposição. Por isso mesmo, a proximidade fica-se nas pequenas causas e, nestas, ou é encenação montada para se ser visto, e não para ouvir, indagar e auscultar quem tem razões fundamentadas dando-lhes seguimento, com vista à iniciativa legislativa, ao requerimento doa a quem doer ou à pergunta com resposta polticamente obrigatória e rápida, dando prova de que um deputado em Lisboa, seja ele do partido do poder ou da oposição, não é um verbo de encher e um pobre sortudo que veio da província e já tem mais do que esperava ou contava ter pelo que convirá não descarrilar.  

Carlos Albino
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    Flagrante défice mental: Corre nos círculos bem informados, que foi a troika que obrigou o governo a inaugurar a escola de Martinlongo, 13 anos depois de estar a funcionar em pleno, pois o facto de uma coisa abrir sem ser inaugurada e ser inaugurada para continuar aberta, contribui para o agravamento do défice mental.

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

SMS 480. Pequeno aviso, grande advertência

27 setembro 2012

As manifestações de 15 de setembro foram uma surpresa para todos: os que, desta ou daquela maneira, a promoveram não contavam com a grandeza da adesão, e os destinatários do protesto (poder e partidos que o suportam) também faziam outras contas. Assim foi em todo o país, não sendo o motivo de alegrias mas de tristeza e repulsa pela falta de palavra política e pelo abuso político. E no Algarve, que sofre o maior desemprego, sente a maior insegurança do país e engole o maior desdém do governo por uma região, onde também se registou uma das maiores provas públicas de sempre (em Faro, Portimão e Loulé) também há conclusões a tirar, quer pelos promotores, quer pelos destinatários.

Quanto aos promotores, não só não podem nem devem ir além do que a manifestação foi – inegavelmente um estrondoso protesto cívico –, como também terão de concluir que os que encheram as ruas não foram atrás da folclorada, ou seja, não foi uma manifestação de tachos e caçarolas, foi uma manifestação de almas doídas e de protesto contra a política que rasga compromissos, oculta entendimentos e e que em vez de entregue a gente madura e séria, parecerá entregue a adolescentes tardios e a rapazolas. Portanto, os promotores não podem pensar em cantar hinos do tipo de até à vitória final, porque a esmagadora maioria dos que foram para as ruas não o fizeram para cantigas – foram para a rua não como um meio mas como um fim.

Quanto aos destinatários, nenhum deles pode deixar-se tentar pela ideia de que o alvo dos manifestantes foi o vizinho do lado, e não é só o poder ou os partidos do poder que, numa prova de inteligência e sobrevivência política, podem e devem tirar ilações, mas também os da oposição. As manifestações excederam em muito as contas porque as pessoas não se sentem capazmente representadas como as fizeram acreditar que estavam no atual sistema político. As vozes que elegeram para as representar ou lhes soam a engasgadas, ou engasgam-se por comprometidas, ou até mesmo correspondem a bocas que politicamente nada valem ou valem menos que uma casca de amêndoa e nem para espantalhos de pardais servem. Foi para estes mesmos destinatários – todos, sejam os do poder esquecidos já do que prometeram quando eram oposição ou os da oposição que julgam que toda a gente se esqueceu das fanfarronices de antes de ontem – que a manifestação algarvia foi também um pequeno aviso e uma grande advertência.

Pequeno aviso - o de que a sociedade não está cega, surda e muda. Grande advertência - a de que haja uma mudança de práticas políticas para que eventuais avisos seguintes não sejam maiores ou, para além de inorgânicos, incontroláveis frutos do desespero que já é um grande pomar.

Carlos Albino
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    Flagrante antevisão: Possivelmente as próximas autárquicas não vão ser como até aqui – coisa controlada quase exclusivamente pelos partidos. Assim por exemplo, um reconhecível ladrão que se atreva a concorrer...

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

SMS 479. As pessoas não aguentam

13 setembro 2011

Coincidiu que a democracia em Portugal se converteu em rotina precisamente quando a Europa entrou na nossa rotina. E assim foram sendo eleitos primeiros-ministros em função dessas duas rotinas coincidentes, cada qual eleito por dizer cobras e lagartos do anterior e quanto mais melhor mesmo que de forma perversa, explorando a esperança dos eleitores e quase por regra abusando da sua crença. Cada eleito, até este último inclusive, foi-se apresentando como salvador da pátria e do mundo, fama essa que também por regra foi durando seis meses, quando muito um ano, período esse durante o qual também foi tolerável que cada novo eleito atribuísse ao deposto o mal e a caramunha.

Só que os eleitores foram assistindo até à exaustão, a este jogo do empurra e das ambições, estado de exaustão em que a maioria dos votam hoje se encontra. O eleitor está exausto dos que prometem uma coisa e fazem outra completamente diferente ou que executam o que juraram nunca fazer; está exausto dos jogos para atingir apenas o poder e depois mantê-lo ao serviço de quem está por trás do reposteiro e que nunca soube estar noutro sítio; está exausto dos que ganham as pessoas com a cantiga de que primeiro estão as pessoas mas que rapidamente escolhem as pessoas para o tiro ao alvo; está exausto dos escândalos de toda a ordem e cujos autores por aí andam com caras de anjinhos como se nada tivesse acontecido; e já está tão exausto que não diz sequer que está exausto, ficando o eleitor pura e simplesmente calado, sem acreditar seja em quem for e sem esperança. E então o que resta? Resta um terreno propício para o exercício autoritário do poder, sem oposição que seja capaz de o fazer tremer, e rodeado de clientelas que sugam o Estado como a formiga-branca suga a madeira de cuja ação só nos damos conta quando estala a pintura. Ora, deixando-me de abstrações, tenho que dizer que, depois dos outros três que emigraram, assim se chegou a Pedro Passos Coelho que está a estalar a pintura, porque as pessoas estão exaustas e não aguentam mais.

Carlos Albino
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    Flagrante irresponsabilidade: A de decapitar direções próprias das escolas, deixando-as ao deus dará ou ao sabor dos dedos de quem recebeu o telecomando.

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

SMS 478. Quarteira perdoa


6 setembro 2012

Durante anos e anos, Quarteira foi usada como símbolo do desvario urbanístico e do caos imobiliário em todas as crónicas e croniquetas. Até o projeto turístico do Alqueva chegou a ser apresentado como um paraíso onde o erro de Quarteira não teria lugar. Gente que nunca pôs os pés em Quarteira ou que apenas por lá esteve de passagem há trinta anos, ainda hoje, quando lhes dá jeito meter na prosa um exemplo do inferno, lá recorrem ao símbolo que se lhes meteu na cabeça como um quisto. Ora, não é assim. Quarteira não é propriamente um milagre das rosas mas para quem conheceu a terá ainda como póvoa de pescadores, depois a viu crescer desnorteada, assistiu ao enorme esforço de requalificação e hoje a vê como uma cidade esplendorosa com o mar por vizinho à mão como poucas, só pode concluir que se não houve milagre, parece. Na verdade, contrariamente ao que diz o poeta, ali em Quarteira Deus quis outra coisa, o Homem corrigiu e a obra nasceu. O longo passeio público marítimo, o conhecido calçadão, é a qualquer hora dádiva da natureza e milagre de convivência humana; nas avenidas que deram novo traçado à terra respira-se paz; o que era alto ficou disfarçado e o que sempre foi baixo ficou integrado; desapareceram os apartheids, o apartheid dos ricos a poente e os apartheids dos pobres e remediados , de tal forma que se a justiça social não fosse perturbada pelos diabos que Deus quis com o rei na barriga, ali o Homem parece sempre sonhar e a Obra sempre a nascer. É uma cidade esplendorosa, símbolo de um Portugal corrigido pela determinação, generosidade e visão de poderes eleitos.   É uma terra onde se pode ir e estar. Há poucos exemplos de milagres como o de Quarteira, apetecendo dizer à cidade: “Quarteira perdoa a quem não te viu como estás e que fala de ti não sabendo como és. Perdoa.”

Carlos Albino
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Flagrante geografia política: Para este governo, o Algarve não deve já constar no mapa do País.




quinta-feira, 30 de agosto de 2012

SMS 477. Na hora que passa

30 agosto 2012

Devia o Algarve ter, nesta hora que passa, um canal de televisão adequado aos interesses regionais, pelo menos uma estação de rádio de referência obrigatória, jornais que espelhassem a região de forma que tanto o poder como as oposições sentissem e de vez em quando até temessem, e, claro, devia ter também intervenção nas redes sociais e quejandos, que desse vida e debate à política, à cultura, às atividades económicas, por aí fora, e desse conta de uma sociedade que não está dormente. Mas o panorama é como o de uma terra que não pertence a um país nem quer ou nem pode ter voz própria. As televisões, a pública e as privadas, apenas se lembram do Algarve ou por esmola ou por desgraça, e a ideia de um canal regional foi sonho gorado de há muitos anos; as rádios locais que se aguentam são gira-discos; os jornais nacionais que têm o seu mercado, uns só registam o crime e o último desastre na 125 e quanto maior melhor, outros, enfim, lá vão publicando uns faits divers ou notícia tardia de algum clamor; os jornais da terra que de modo geral fazem das tripas coração para se manterem com os senhores do turismo a fazerem-lhe figas, ou se entretêm em cotoveladas desnecessárias e ridículas, são acríticos e fortemente dependentes da produção noticiosa cozinhada lá em cima ou dos press-releases das conveniências de cá em baixo, pois até as agências funerárias anunciam os mortos privativos do negócio por fotocópias coladas nas paredes e, pelos vistos, isentas de taxas como na selva; e quanto às redes sociais também na generalidade a atividade não passa dos namoros sem namorado e da fotografia do umbigo, pelo que algumas coisas sérias e até bem feitas, se perdem no espaço e apenas uma ou duas dúzias as seguem, sem impacto social, portanto. E para mudar este panorama não há milagres nem decretos nem posturas municipais – a coisa tem que partir da terra e só pode partir da terra se houver interesse e empenhamento da sociedade. Sem esse interesse e sem esse empenhamento, batatas.

Na hora que passa, o Algarve devia ter voz própria, uma vozinha que o País sentisse mesmo que ao de leve. Ora, uma voz própria não cai do céu, nem alguma vez ela será possível com cegos, surdos e mudos que tinham a obrigação e condições de ver, de ouvir e de falar. E fico por aqui.

Carlos Albino
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Flagrante património: A Sé de Silves coberta de telha vermelha é o mesmo que um bispo lá celebrar missa de Natal com equipamento de ciclista do Tavira.

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

SMS 476. Essa palavra generosidade


23 agosto 2012

Não é falta de tema, nunca houve tanto tema, mas ocorre falar dessa palavra generosidade em política que é coisa tão necessária ter ou dar a entender que se possui, que não há ladrão, corrupto u calculista que se meta na vida pública que não comece por enganar meio mundo tudo fazendo para se mostrar homem generoso, ou, já agora, mulher generosa. Se conseguir a fama da generosidade, o ladrão, o corrupto ou o calculista acertou na tecla e com isso dá o primeiro passo para uma carreira paradoxalmente impoluta. Já o político que nunca tenha roubado nem alguma vez tenha sujado as mãos com tráfico de influências, se não tiver essa fama está desgraçado, mesmo que jure pelas esquinas que foi sempre e será sempre generoso. Ou seja, todos, do ladrão ao impoluto, reconhecem e sabem que em política a generosidade é uma qualidade imprescindível mas a coisa só se complica quando a fama não corresponde aos factos. E complica-se de tal modo que o ladrão que tenha conseguido a fama de generoso a ponto de ninguém acreditar que não o seja mesmo que os factos digam o contrário, esse pode continuar a roubar ou preparar-se para roubar muito mais que cada roubo surgirá aos olhos da opinião pública como ato de generosidade. E isto porque entre o ladrão e o impoluto há uma grande diferença: o ladrão sabe pintar a manta e o impoluto não sabe nem quer saber que a manta tem que ser pintada. Se houvesse espaço para desenvolver esta ideia da generosidade que em política parece ser não sendo nada disso, até poderíamos dizer que o ladrão, na ânsia de granjear a fama de generoso, é em tudo mais coerente que o impoluto. O ladrão é de uma coerência extrema em mostrar-se generoso, dos pormenores ao geral, até porque a sua generosidade não obedece a princípios. Já o impoluto é um incoerente na matéria, acreditando em nome dos princípios que a sua generosidade fala por si, esquecido de que a generosidade nunca fala e se falasse ninguém acreditaria nela. Não há espaço para desenvolver a ideia, mas ainda cabe dizer que a falta de liderança política na região ou em cada partido da região (não confundir chefias com lideranças) tem muito a ver com falta de generosidade dos políticos cuja fama de generosos, se é apenas fama, não os salva. E é este o problema do Algarve. Não há generosidade e quando ela parece que existe, não passa de mera fasquia comum aos que, por cultivada coerência, sabem roubar, e aos que, por inadvertida incoerência, jamais querem roubar e nunca roubaram.

Carlos Albino
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Flagrante pergunta: A de Mendes Bota ao governo, sobre o prolongado encerramento da Pousada de São Brás, encerramento esse que é ais um exemplo de como o turismo no Algarve é tratado com os pés.

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

SMS 475. Forças vivas?

16 agosto 2012

Outrora tínhamos as forças vivas que ora apareciam nos momentos solenes ora elevavam a voz quando o interesse geral ou o bem comum para isso as empurravam para não fazerem figura de forças mortas. Tínhamos as forças vivas do Algarve e também as forças vivas de cada terra, forças vivas essas que englobavam não só quem tinha e exercia poder mas também todos os que de algum modo tinham influência e cuja opinião contava. E agora? Nem forças vivas, nem forças mortas. É verdade que elegemos deputados que aproveitam o melhor possível o seu tempo em Lisboa para a chamada carreira política e que de vez em quando lá se lembram da terra também pela chamada fidelidade aos eleitores; é também verdade que temos autarcas agora com mandatos contados e que deixam de o ser quando começam a ter alguma força; é ainda verdade que temos uma nomenclatura de chefes regionais nomeados para isto e para aquilo e que andam ou têm que andar nos carris se é que querem também fazer carreira de funcionários. Fora disto, ficam os bombeiros, os músicos da Orquestra do Algarve, um ou outro carola de rancho folclórico ou mesmo algum artista de fogo de artifício e ainda as agências funerárias que dão as notícias dos mortos por fotocópias coladas nas paredes. A única universidade pública não conseguiu ter voz marcante e esperançosa sobre as grandes questões da região, as poucas escolas privadas de ensino superior vendem o produto o melhor que podem e pelo mundo das escolas secundárias e básicas as exceções confirmam a regra de mundos à margem do mundo quando não interesses corporativos tocados.

É claro que a democracia fez-se para eleger poderes de decisão e de representação mas também para dar mais vida às forças vivas, o que não acontece nem há meio de acontecer porque ninguém quer e caso alguns poucos o tentem ficam paradoxalmente isolados por um clima montado de suspeições partidárias, ficando a participação e mobilização cívica e torno das grandes causas regionais completamente bloqueadas. Portanto, restam as praias e fazer o maior dinheirinho possível em julho, agosto e setembro em que o sol é de facto a força viva mas não tem voz.

Carlos Albino
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Flagrante desdém: Dos governantes responsáveis pela matéria nem uma palavra sobre o 31das portagens na Via do Infante e sobre o pandemónio da 125 que nenhuma “requalificação” pode salvar. Já não apenas desconsideração, é desdém.

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

SMS 474. Medo da praça pública

9 agosto 2012

Claro que cada partido organiza festas, grandes ou pequenas, de expressão nacional ou de interesse meramente local, onde, quando e com quem muito bem entender. O certo é que, à maneira das religiões, os grandes partidos também têm, cada um, a sua santa festividade anual e o verão proporciona às mil maravilhas que o padroeiro da circunstância apareça a céu aberto, sendo verdade que foi o PSD a iniciar essa tradição no já longínquo ano de 1976, num pinhal próximo do aeroporto de Faro, local cujo nome – Pontal – haveria de carimbar a festa para todo o sempre, vá ela para onde for. Em 2005, o Pontal foi já na doca de Faro e em 2006 transferiu-se para o Calçadão de Quarteira, continuando Pontal. É um símbolo desse partido e à exceção de Manuela Ferreira Leite ausente em 2009, todos os líderes foram afinando os seus discursos de poder ou de oposição para o almejado Pontal, inspirados pelo impulso inicial de Francisco Sá Carneiro, com a garantia de títulos de primeira página e presenças de rádios e televisões. E foi assim que vimos desfilar bronzeados Pinto Balsemão, Cavaco Silva, Fernando Nogueira, Marcelo Rebelo de Sousa, Luís Filipe Meneses, Marques Mendes e, já em 2010, Pedro Passos Coelho quando ainda prometia muito na oposição sabendo então o mesmo que, no poder, hoje sabe, ou não tivesse dito à época que estava pronto a governar com o FMI. Mas, enfim, foram festas a céu aberto, mesmo sem o pinhal que deu origem e nome.

No próximo dia 14, o Pontal deixa esse céu aberto e muda-se para edifício coberto, o Aquashow de Quarteira, alegadamente por “redução de custos e facilidades logísticas”. A festa deixa portanto a praça pública e entra para ambiente fechado, com lugares marcados, entradas controladas, ar condicionado e tudo debaixo de olho. Como se disse no início cada partido organiza as suas festas onde, quando e com quem muito bem entender, mas um Pontal assim, visto de fora, não deixa de sugerir um clima de “claustrofobia democrática” como diria Paulo Rangel, ou seja, o medo da praça pública, contrariamente ao que o PSD habituou o país desde esse 1976, naquele tal pinhal, onde, segundo se conta, um comunista assumido, presente na festa, se dirigiu a Sá Carneiro com um copo de vinho na mão e lhe disse: “sou comunista e vim aqui porque tenho admiração por si e por isso vou brindar à sua saúde”. E o que fez Sá Carneiro? Tirou o copo da mão do homem e bebeu o resto do vinho… Foi assim que o Pontal se transformou em símbolo e, por este caminho ou por tais “facilidades logísticas”, ainda se transforma em salão de chá, com a política fervida como folhas de tília. Medo? Medo de quê e de quem? Do vinho que resta?

Carlos Albino
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Flagrante animação: O turismo, com a inflação da música pimba e festivais de cantores reles, não vai longe.

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

SMS 473. Doutores da mula ruça

2 agosto 2012

Dentro daquela lógica segundo a qual tudo o que não é proibido é lícito, pelo que com toda a esperteza haverá que aproveitar os buracos, as lacunas e os alçapões da lei, algumas universidades e institutos superiores sobretudo privados que nos públicos ainda há um certo pudor mas pudor apenas, cá vai disto, fizeram fornadas de licenciados nisto e naquilo, alguns com o canudo à velocidade da luz pelo expediente das equivalências, outros pelo facilitismo de provas, outros ainda, certamente por genialidade hereditária, porque nasceram ensinados. Quanto ao estudo, nada; quanto à investigação, zero; e quanto ao que mais importa que é o quadro mental que só uma universidade pode e deve dar, uma nulidade. Naturalmente que os ditosos licenciados do pé para a mão ficaram muito felizes no dia da bênção das pastas, ufanos a gabarolas se começaram a autojustificar com novos cartões de visita ostentando o título académico em brilhante relevo, mas a sociedade ficou mais pobre com cada um de tais doutores da mula ruça.

E tinha que dar nisto. Concederam-se alvarás para o ensino superior como se os critérios fossem quase os mesmos para quem abre uma mercearia – não vendem feijões, vendem diplomas. Em alguns dessas escolas entra o pior que o ensino secundário debita e que não tem entrada em mais nenhum lado. Os professores ditos titulares são low cost e assinam de cruz, tudo o mais possível dentro da tal lei cega para o que à evidência é ilícito. E os chefes de tudo isto, no seu conjunto, mais não formam que uma tribo nómada que tal como a maior parte das tribos nómadas, vivem da apanha da alfarroba que não lhes pertence ou da venda de berbigão e amêijoa em época de apanha proibida, com bastantes autarquias, de norte a sul, a curvarem-se respeitosamente perante tal saber e até a canalizarem orçamento apreciável em nome do chamado prestígio local que foi o que esteve na base do erro.

É claro que, com os anos, a falange dos licenciados por equivalências e facilitismo acabaria por formar uma corporação de interesses e é por isso que, sempre que estala algum caso necessariamente badalado, os da corporação ficam mais caladinhos que os ratos, porque, lá no fundo, sabem muito bem que o seu cartão de visitas tem um erro e que a bênção de pastas foi um regabofe. Um enorme erro que é uma afronta para universidades a sério e para quem a sério por elas passou com a consciência de que uma sociedade não vai a lado nenhum com ilícitos, mesmo que os ilícitos sejam paulatinamente esquecidos pela lei, porque se por ela forem estimulados, que a Sicília nos desculpe, mas essa sociedade iria dar no que a Sicília é emblema.

Carlos Albino
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Flagrante bom momento: O da exposição de pintura de Graça Morais, no Convento de Santo António (Loulé).

quinta-feira, 26 de julho de 2012

SMS 472. Combustíveis

26 julho 2012

Os testemunhos são muitos. São lesados a dizer, são mecânicos de saber e experiência insuspeita a confirmar, e, já agora, é a nossa triste e dispendiosa estreia na matéria – há combustíveis adulterados à venda no Algarve, com alguns postos a fazerem referência do mal. Como e quando os combustíveis são adulterados, quais são os intervenientes, qual o grau de responsabilidade de quem está no circuito do dolo, e se isso acontece sempre ou é coisa esporádica, não sei. O que sei é que há motores de carros, uns novos em folha outros nem isso, que ficam arrumados por aquela causa sem que muitos dos lesados tenham meios de defesa e de prova. Também sei que em determinados postos que ostentam marcas de bandeira há aparentemente controle dos combustíveis despejados nos depósitos e que são selados, noutros não – dependem do mercado e dos preços que também aparentemente facilitam certas promoções que acabam por sair caras para o consumidor crédulo, demasiado confiante ou sem alternativa para o abastecimento. O certo é que, pela experiência contada, há já os chamados “postos malditos” dos quais, quem sabe, foge. Hoje a história contada é dali, amanhã é de acolá, sendo certo que, com a adulteração, alguém enriquece com o esquema. Esquema que é crime e que justifica a intervenção de autoridades e instituições de defesa do consumidor que devia m passar os postos de abastecimento a pente fino. Por mim falo – depois do que aconteceu, estou inseguro sempre que preciso de abastecer no Algarve e muito agradeceria que, à semelhança das bandeiras azuis a garantirem a qualidade das praias, os postos com combustível de qualidade certificada tivessem uma bandeira de qualquer cor, fosse verde, amarela ou branca, o que quiserem, mas uma cor que indicasse que por ali não há ladrão. Na verdade, isto já é demais. É que para além dos assaltantes de postos que são notícia todos os dias, temos agora os postos que assaltam sem que sejam notícia. Acabem com isso porque as oficinas estão cheias de motores espatifados, uns logo, outros lentamente, com cada vez mais gente a apontar o dedo à ferida mas só alguns a poderem apresentar queixa formal. Na maior parte dos casos, a culpa é do diabo e há que encolher os ombros. Mas isto tem que ser dito e ficar em letra de forma.

Carlos Albino
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Flagrante incêndio: Então isso ardeu e de que maneira e a explicação é só do vento e do calor? Como foi possível isso chegar tão longe?

quinta-feira, 19 de julho de 2012

SMS 471. Caso Macário

19 julho 2012

Obviamente que o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de terminando a perda do mandato autárquico de Macário Correia por violação do PDM em Tavira, tinha que ter repercussões políticas, como repercussões tiveram a recusa dos termos do acórdão e o anúncio de recurso por parte do visado. O caso coincidiu com condenações do tribunal de Lagos aplicadas aos presidentes da Câmara e da Assembleia de Aljezur (José Amarelinho e Manuel Marreiros) a perda dos respetivos mandatos também por violação do PDM, caso este que ainda está para dar. E como se não bastasse, no primeiro caso, a notícia correu praticamente colada à das opções de reforma e pedido de subvenção vitalícia de Macário Correia, mais um ou dois processos já no consulado em Faro, suficientes ingredientes para um refogado populista do acórdão, com as repercussões também políticas que tais refogados, se não sugerem, provocam..

Perante isto, o que se esperava? Como aqui se escreveu telegraficamente na semana passada, “muita gente, no lugar de Macário Correia, já tinha tomado uma decisão”. Com isto se pretendeu dizer que Macário Correia, das duas uma: ou acatava o acórdão e assunto arrumado, ou não acatava, como não acatou, mas com explicação política dessa decisão ao nível das repercussões políticas do caso e não com base em dúvidas ou subterfúgios legais ao nível do acórdão que anda por ali à volta de minúcias deveras irrelevantes e que bem lidas só colocam mal um Supremo Tribunal. Pelas minúcias, o Supremo bem poderia determinar a perda de mandatos a 89,5 % aos autarcas de norte a sul, para não falar dos das ilhas adjacentes, pelo que não se compreende como se decide por um acórdão que transparece como mero ato de exceção aparentemente filada por algum interesse difuso com emprego no Ministério Público.

Embora todos lhe devam cumprimento, um PDM não é um Deus mas não compete a um Supremo Tribunal dar a explicação política de como os diabos tecem, nuns casos a torto, noutros a direito. Isso competiria a Macário Correia, como também, nos casos de Aljezur competiria a José Amarelinho e Manuel Marreiros a explicação política por todos os meios das sentenças que os visaram.

Sendo assim, precisa-se, muita gente no lugar de Macário Correia já tinha tomado a decisão de explicar politicamente esse assunto que é o de se invocar o nome do Deus PDM em vão, atacando o problema nas causas e não como advogado em causa própria. O caso Macário nada tem a ver com o do isaltinismo nacional, é um caso político ou um episódio político de uma questão política de fundo, e é como tal que deveria ter sido tratado.

Carlos Albino
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Flagrantes contas: As portagens ao longo da Via do Infante são mais de metade das portagens Algarve-Lisboa… E é de ver as filas de estrangeiros nas estações dos CTT a fazerem o pagamento com base em fotos das matrículas tiradas pelo telemóvel. Levam i ideia de um país credível.

quinta-feira, 12 de julho de 2012

SMS 470. Voltamos a Sagres

12 julho 2012

Sim, voltamos à questão de Sagres, essa grande área marcante em todos os sentidos – pela História e restos da História, pelo Símbolo que é descontadas as moças que o nacionalismo autoritário engendrou, pelo ponto de deriva do planeta que quem lá chega sente que sempre foi e é. Não vamos retomar os argumentos que aqui, há uns anos já, aflorámos no sentido de uma iniciativa que, com peso e medida, conduzisse Sagres a Património Natural ou mesmo a Património da Humanidade. Nem vamos reabrir polémicas com meia dúzia de académicos diletantes e outra meia dúzia de políticos de ocasião que, de uma forma ou de outra, alcandorados nas mordomias nacionais a pretexto da UNESCO, interromperam uma campanha defensável, justificável e necessária, metendo-a na gaveta. Retomamos o tema de Sagres porque é chocante a forma como todo o chão de Sagres está na omissão da promoção da Região, sendo o seu emblema mais nítido e sendo o cinema natural, direto e vivo que o mundo culto, curioso e ávido de emoção com as surpresas que o planeta oferece, mais procura, visita e leva de recordação. Não vamos aqui repetir que o promontório há milénios conhecido como Promontório Sacro, bordejado por várias civilizações que se aventuraram à travessia de terras e mares, palco de santos e de piratas, de fábulas e de gestas inquestionáveis, recanto que não deixa nenhum poeta insensível e até esmagado, área em que a terra parece desabar mas não desaba e em que o mar parece gigantescamente domesticado mas não está, não vamos repetir o que Sagres contém de conhecido, de comprovado, de sugerido e de desafiante para quem queira pegar nos fios daquela meada com seriedade intelectual e sem aqueles corporativismos do saber que, por definição, também têm as suas cátedras de fatela.  Voltamos a Sagres porque para alemães que sejam, japoneses que cheguem de máquinas a tiracolo, norte-americanos que por lá passem tentando perceber o desconhecido, franceses, ingleses, por aí fora, enfim, todos aqueles que pela lógica da batata de alguns que tutelam a matéria são reduzidos a esse rótulo humilhante de “mercado turístico”, e não mais do que isso como se fossem rebanhos a sair do aeroporto de Faro, Sagres não é explicado ou é vaga e corriqueiramente explicado, e passa apenas como mero ponto interessante de excursão pífia a sítio ermo com farol e uns enfadonhos documentários da macaca. Ou seja: Sagres não é o ex-libris da região algarvia, peça obrigatória do seu cartão de visitas, marco indelével da história do país e passada larga da própria Europa.  E devia ser tudo isso se tivéssemos um Senhor Turismo a sério casado com uma senhora séria chamada Dona Cultura.

Carlos Albino
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Flagrante corolário: Muita gente, no lugar de Macário Correia, já tinha tomado uma decisão. Na capital da região, porque como dizia genialmente José Apolinário “Faro é Faro”, e na AMAL que anda com retrato muito desfocado.

quinta-feira, 5 de julho de 2012

SMS 469. Jurem, a bem de todos

5 julho 2012

A crise portuguesa começou por ser uma crise de ética. Falta de ética lá em cima, aí pelo meio e cá em baixo. E quando vai chegando o momento em que os partidos têm de decidir quais os candidatos que irão apresentar nas próximas eleições autárquicas, com uma apreciável renovação por força da lei que impede terceiros mandatos consecutivos para os presidentes dos órgãos executivos (presidentes das Câmaras Municipais e das Juntas de Freguesia), impõe-se que se chame à responsabilidade da escolha, não os eleitores mas os partidos. O problema é que não são poucos os lados em que não há muito por onde escolher, pelo que quem chega à chefia local dos partidos é praticamente o chamado “candidato natural”. E conforme a simples grandeza do mesmo partido ou a capacidade artística deste para a propaganda, assim também as probabilidades de eleição independentemente da competência efetiva e do perfil ético do candidato. Para um segundo, ou para o agora impossível terceiro ou quarto mandato, as provas sobretudo de ética terão sido mais ou menos dadas, com o eleitor a poder conceder, pelo voto, reforço de benefício ou punição. Para os casos de estreia, ninguém sabe o que daí possa sair, pois debaixo de uma pedra pode sair um lagarto.  Ora, nesta fase de escolha, os partidos são inegavelmente responsáveis pelas opções que preparam para apresentação aos eleitores. Por isso devem escrutinar rigorosamente os nomes, para que não nos venha a sair na rifa democracia alguém de quem todos se arrependam e, pior, de quem tenham vergonha. Meio-caminho andado seria que cada um dos candidatos, antes de aparecer em comícios na praça pública, pudesse prestar dentro do seu partido o seguinte juramento: “Juro, por minha honra e à prova de bala, que nunca roubei nada, que não estou a roubar e que não me preparo para roubar no exercício das funções às quais me candidato, pelo que podem piamente confiar em mim”. Todos os candidatos que os partidos por aí preparam, designadamente os elegíveis, serão capazes de fazer este juramento?

Carlos Albino
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Flagrante penitência: Os governantes que venham ao Algarve para o bronzeamento, deviam ser obrigados a fazer um trajeto integral da estrada 125 e, depois, confessarem-se em Vila Real de Santo António ou em Lagos para sentirem bem a penitência que o padre lhes daria .

quinta-feira, 28 de junho de 2012

SMS 468. Os partidos cá na casa

28 julho 2012

Quem se apresenta para a liderança regional do PS diz que pretende o seu partido “aberto à sociedade” e que para tanto promete tomar iniciativas. Por outro lado, os restantes partidos que conseguiram eleger deputados pelo Algarve e que por isso são de referência no jogo democrático do poder, já perceberam no terreno que a sociedade se desinteressou da política. Não é que a sociedade tenha fechado as portas, mas o clima é descrença mas algum entusiasmo e até de festa fica confinado a militantes e alguns interessados em benefícios do poder, sobretudo a curto prazo, como é o caso das corridas para as autárquicas. É claro que o protagonista do PS se encarou a realidade que o cerca e que não se explica apenas porque o PS não tem o poder que desejaria ter obtido em eleições, e os restantes protagonistas só por enorme distração e autismo é que não se apercebem ou fingem não se aperceber de que a sociedade em geral, aquela sociedade que ciclicamente de uns tantos em tantos anos delegam em representantes a palavra e a iniciativa política, essa sociedade está de braços caídos, descrente e até estupefacta pela forma como a palavra delegada e a iniciativa de representação caem rapidamente em saco roto. E pior ainda, pelo facto do exercício democrático no Algarve não ter colocado peso e influência, voz autorizada e força moral inquestionável em nome da região nos centros de decisão do Estado. Ou seja, se a política fosse atletismo, até poderemos ter vencedores regionais no salto em altura mas não temos campeões nacionais.

E a responsabilidade por isto? Claro que essa responsabilidade não é dos eleitores já de si castigados por erros que não cometeram e muito menos compreendem na sua verdadeira extensão, causas e jogadas de alto gabarito. A responsabilidade é dos partidos que se fecharam à sociedade ou que à sociedade, por autismo, justificam omissões de palavra e de iniciativa de forma que a ninguém convence mas que, civilizadamente, os militantes toleram por conveniência, uns, por sobrevivência em pequenos postos de comando, outros. Gostaria de dar nomes a isto mas dar nomes a isso, numa sociedade cujo problema maior é o dos seus partidos estarem fechados e confinados a confrarias de poder efémero, não seria contribuir para uma chamada à razão por parte dos partidos responsáveis pelas águas paradas do charco.

Lá chegaremos às autárquicas em que poucos poderão suceder a si próprios. Fica para a próxima.

Carlos Albino
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Flagrante desastre: A promoção turística do Algarve, cá dentro e lá fora, é uma infelicidade pegada, um revés, uma fatalidade, um fracasso. Não pega.

quinta-feira, 21 de junho de 2012

SMS 467. Como é que isto pode andar?

 21 julho 2012

Histórias diversas ouvidas de vários empresários sobre umas ditas inspeções de segurança no trabalho dão-nos conta de como quem deveria orientar, ajudar e compreender se pode transformar em policiazinho autoritário, indo além do seu sapato. Entram em instalações e, em vez de verificarem o que está bem ou mesmo o que poderia estar melhor sendo aceitável como está, não, procuram uns pequenos pormenores sem importância para ensaiarem discurso de repressão, de admoestação e de ameaça, e, mais ridículo, sem olharem para o ar de veraneio com que se apresentam. E é assim que, o cidadão responsável por uma empresa e contribuinte pontual, em vez de ver em cada inspetor ou inspetora de segurança um agente de colaboração, cortês e minimamente culto (culto, no sentido de compreender as coisas) passa a vê-lo como um elemento hostil, indesejável, implicativo ou como se esse trabalho de serviço público fosse um exercício de poder. E, naturalmente, são poucos os que usam do protesto no receio de que para a próxima seja pior…

Não está em causa o zelo pela promoção da segurança, higiene, saúde e bem-estar no trabalho e, muito menos a função de tais agentes no sentido do desenvolvimento e da consolidação de uma cultura de segurança nos locais de trabalho. Esse é um objetivo defensável, e basta ler a lei, mesmo em diagonal, para se perceber que se trata de uma conquista da sociedade. O que está em causa são os procedimentos, o fundamentalismo das atitudes e o extremismo na invocação de regulamentos gerais. Foi assim nos momentos iniciais da ASAE que entrou a matar, e é assim com as milhentas espécies de inspeções e inspetores que por aí abundam e entram pelas empresas adentro com ar de quem vai à caça. Foram-me narrados episódios, aqui do Algarve, que só não são cómicos porque só dão tristeza num país que, na crise que vive, se empata a si próprio por obra e sem graça de intermediários da autoridade pública que julgam, no seu afã, que ter autoridade e exercê-la, é ser títere, pequeno títere, diga-se.

São clássicas as histórias de norte-americanos que começando por vender sumo de limão de porta em porta, após cinco, seis anos, constroem grandes empresas e marcas de renome mundial, e não é que nos EUA não haja inspetores de segurança e higiene… Aqui, isso seria impossível, porque num dia seria o obstáculo da alínea d) do n.º 43 do regulamento A, no dia seguinte  seria a línea k) do n.º 5 da portaria B, e, além da letra ou do espírito da letra legal, seria tudo levado ao extremo por uns agentes mal saídos inteletualmente do falhanço no acesso a um politécnico de província.

Como é que isto pode andar, com esta gente que tem vergonha de andar fardada mas que, sem qualquer vergonha, dá ordens infantis como no jogo das manecas e com sandálias ipanema enfiadas nos pés?

Carlos Albino
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Flagrante constatação: Quebra de 60% no trânsito da Via do Infante, aumento da sinistralidade na 125 que nem é estrada, são uns remendos em via sem condições. Politicamente é o autoritarismo de uns e o servilismo de outros, no seu melhor. 

quinta-feira, 14 de junho de 2012

SMS 466. GNR e semi-empregados

14 julho 2012

1. Comecemos pelos semi-empregados.   Referimos na semana passada situações em que empregadores sem escrúpulos têm apalavrado acordos com desempregados inscritos nos centros de emprego pagando a estes apenas a diferença entre o subsídio e o ordenado mínimo, obrigando-os a situações de continuada clandestinidade para que não percam o referido subsídio e a trabalhar às escondidas. “E é se queres…” – acrescentarão. Pois bem. O ministro da Economia acaba de anunciar como uma grande medida de combate ao desemprego nada mais do que a legalização desse expediente que certamente estava fugir às malhas de qualquer fiscalização e controle. Portanto, contrariamente à propaganda feita, não é verdadeiramente uma grande medida. Trata-se apenas de fazer a vontade dos que estão a explorar uma verdadeira situação de mercado de escravos e que, assim, já podem fazer com legalidade formal o jogo imoral que têm feito até agora. Não está em causa, a este propósito, discutir ou avaliar a qualidade e a preparação dos trabalhadores que em muitos caos deixa também muito a desejar. O que está em causa é deixar-se bem claro que a generalização do semi-emprego não resolve em nada o problema do desemprego que no Algarve é dramático. Não resolve nem atenua, antes pelo contrário  dá força moral aos empregadores oportunistas e sem escrúpulos.

2. Quanto à GNR. Por diversas vezes temos destacado nestes apontamentos, com muito agrado, o perfil dos novos agentes da GNR e a forma como começaram a proceder com lhaneza nos contactos com os cidadãos (e já agora contribuintes). Mas parece que essa onda de cortesia e ar civilizado passou. Volta a cultura da caça à multa, das fiscalizações sem razão ou motivo aparente, da afirmação destemperada da autoridade a qualquer hora do dia e da noite, e seja onde for. Aconteceu-me, um dia destes, no centro de uma cidade deste Algarve, que mal estacionei o carro para me dirigir a um multibanco às duas da manhã, uma patrulha da GNR vem desalvorada e sem uma boa noite sequer, diz-me o agente “Vai ser fiscalizado!. E fui. Documentos, sopro no balão, tempo perdido para os agentes e para mim que àquela hora era o único a circular na artéria principal da cidade. Bem tentei puxar conversa para obter explicação  para uma tal ação intempestiva sem motivo aparente e sem corresponder a um qualquer plano seletivo, preventivo ou intimidatório para apanhar suspeitos aleatoriamente. Foi o silêncio, partiram sem uma palavra. Mas quem dá ordens destas aos agentes da GNR? Não percebem que assim se pode ir quebrando a confiança que se estava a ganhar nos agentes de segurança que em vez de gastarem o cérebro na desarticulação da bandidagem que é muita, se entregam a essa atividade desprestigiante da caça à multa?

Carlos Albino
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Flagrante noção de Natureza: A ministra da Agricultura e Etc,. Assunção Cristas, revelou publicamente que, este ano e pela primeira vez, deixa de fazer férias integrais no Algarve porque a família está farta de praia e sol, repartindo-as com o Alentejo “para contacto com a Natureza”… É óbvio que o Alentejo é belo mas custa a acreditar que a ministra venha ao Algarve e não contacte com a Natureza pelo que para esse contacto tem que ir para o Alentejo. Mas então a ministra vem ao Algarve e não contacta com a Natureza que só tem disto, da serra ao litoral? Que diabo de Algarve é esse? Para uma ministra fica mal sugerir que o Algarve não tem Natureza…

quinta-feira, 7 de junho de 2012

SMS 465. Mercado de escravos

7 julho 2012

Para além do desemprego no Algarve ser o mais elevado do país, proliferam por aí procedimentos ilegais e práticas dolosas que fazem dos desempregados um verdadeiro mercado de escravos. As notícias que nos chegam daqui e dali, vindas de gente credível, apontam nesse sentido, valendo-se os exploradores das situações de extrema fragilidade e vulnerabilidade de quem está no desemprego e explorando até ao inimaginável as nuances da sazonalidade do emprego. Em alguns casos comprovados, chega-se ao ponto de se impor trabalho clandestino limitando-se o pseudo-empregador a pagar pela calada a diferença entre o subsídio de desemprego e o ordenado mínimo nacional, contra o silêncio do trabalhador. E não vamos falar de casos verdadeiramente aberrantes envolvendo empresas de contratação temporária que, pelos vistos, entraram em força na indústria hoteleira e que não se estão a dar mal, parecendo até que descobriram petróleo.

Por um lado, os desempregados, pela natureza das circunstâncias em que se encontram, não denunciam as situações de que são vítimas junto seja de quem for. Por outro lado, a fiscalização parece que visa muito mais os desempregados só por serem beneficiários de algum subsídio, que os empregadores desonestos e exploradores não apenas da desgraça alheia mas também do próprio Estado.

Em séculos passados, funcionou em Lagos um Mercado de Escravos onde a força de trabalho era vendida por valores que dependiam do estado dos dentes, dos músculos dos braços e dos nervos das pernas de quem estava acorrentado à espera de comprador, e o comprador era facilmente reconhecido pela cara de desdém pelo próximo e pelo chicote na mão… Hoje, os compradores não têm chicote, alguns até têm cara de anjinhos incapazes de fazerem mal a uma mosca, mas sem que a sociedade saiba e o Estado adivinhe, no outra lado da rua da cada centro de emprego instalaram o seu mercadozito de escravos. É evidente que se reclama mão forte para estes mercadores da crise. São crápulas.

Carlos Albino
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Flagrante TSF: Grandes anúncios da estação de rádio TSF para uma festa montada em Faro “junto à marina”. Marina? Será que faltará já muito pouco para que a bela Doca de Faro se transforme em porto oceânico? Nem tanto ao mar, nem tanto à terra…

quinta-feira, 31 de maio de 2012

SMS 464. Querença e basta

31 maio 2012

Aldeia que é uma pérola encastoada no anel do primeiro dedo que a serra algarvia mostra, Querença subiu ao noticiário quotidiano por bons motivos. Nem sempre é assim, ou melhor dizendo, quando se fala no País de uma aldeia do interior algarvio, por regra, é por assalto e facada em ancião estrangeiro, incêndio em sete propriedades ou inauguração de lar de idosos ou de creche por Sua Excelência que por vezes é a pior das catástrofes. Apesar da presença de um secretário de Estado (oh, céus!) no cerimonial da apresentação de resultados do projeto pioneiro com universitários para revitalização daquela porção de mundo que se chama Querença mas que também se podia chamar Presépio Encantado, o festejo não chegou a catástrofe. O secretário de Estado foi com as duas mãos cheias de nada e ganhou mais com Querença do que Querença, ou aqueles nove jovens que fizeram, no fundo, a redescoberta da pólvora, ganharam com ele. Não é que o secretário de Estado tenha discursado mal, falou até bem, só que foi lá de mãos a abanar, sem nada para dar, ou seja, foi lá como um secretário sem Estado. Ora, se o nome de Querença foi ouvido ou soletrado em todo o País, não foi por essa visita que até poderia ser uma catástrofe de propaganda, mas esse nome foi soletrado e ouvido pela experiência pioneira de caçar saberes rurais que o elitismo velhaco desacreditou, de replantar culturas já a finar na memória coletiva e de património natural já quase todo desidratado, para dar a essa aldeia novos horizontes que, tal como a experiência provou, são possíveis. Transformar uma aldeia de rotinas em comunidade criativa não é assim tanto milagre como Jesus a transformar 280 litros de água em vinho, mas é dar um destino, um bom destino, a gente conformada com o acaso, com o entusiasmo a andar de camioneta mas a esperança a andar de burro. E também porque a universidade foi aos montes e não os montes à universidade, Querença pode vir a ser um caso, um grande e sério caso, numa sociedade que perdeu a memória, e se envergonha ou a levaram a envergonhar-se de algumas das suas tradições marcantes, nomeadamente atirando para o lixo a aba cultural que falta e sempre faltou ao Turismo. Ninguém sabe, nem os próprios sabem como se chamam os habitantes de Querença, todos eles nascidos com o traço da prudência extrema perante opostos, do silêncio medidor de qualquer ruído por pequeno que seja, da arte de cavar uma trincheira em qualquer diálogo seja este com amigo ou adversário. Secularmente conservaram e aprimoraram esta cultura, não são muitos, não chegam a dois mil mas são de Querença e basta.

Carlos Albino
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Flagrante e longa explicação: Este apontamento refere-se, para quem não sabe, ao projeto “Da Teoria à Ação – Empreender o Mundo Rural”, iniciativa de nove meses da responsabilidade da Fundação Manuel Viegas Guerreiro e da Universidade do Algarve e que, traduzindo nós, visou a convivência ou cruzamento entre o conhecimento superior da população e o conhecimento básico dos académicos… Ou seja, daquela cultura popular que não é contra o povo, pois 99 % do que por aí corre como sendo cultura popular, é mesmo contra o povo.

quinta-feira, 24 de maio de 2012

SMS 463. O Algarve desapareceu para o governo

24 maio 2012

Não é que a presença do primeiro-ministro, de ministros ou de secretários de Estado resolva os problemas do Algarve e dos algarvios, e muito menos será o caso da ausência de tais provocar uma crise de soberania no território, mas nota-se que o Algarve, para estes atuais governantes, só conta para banhos, como para os anteriores só contava para umas sessões de propaganda com anúncios de medidas para nada ou para muito pouco. Com este governo, para além do pouco que ficou na memória, umas três ou quatro pesquisas no Google dão a ideia de como o Algarve desapareceu da agenda política de Lisboa.

Experimente-se colocar no Google as palavras “primeiro-ministro + visita + Algarve” e os resultados que surgem à cabeça referem-se a visitas de Sócrates em 2009 e em 2007, e logo uma outra de Durão Barroso, em 2003 (!), às zonas algarvias mais afectadas pelos incêndios desse ano... Caso se pesquise por “ministro + visita + Algarve”, por aí aparece o ministro da Saúde, Paulo Macedo, em agosto do ano passado. Quanto ao resto já se refere ao anterior governo, sendo algumas de tais visitas para esquecer pelas promessas incumpridas e pelas considerações de verbo de encher. E caso ainda se tente pesquisar por “secretário estado + visita + Algarve”, os resultados são igualmente escassos. Por aí consta a visita do secretário de Estado Adjunto da Economia e do Desenvolvimento Regional, António Almeida Henriques, a 4 de maio, no âmbito do programa «Empresas à Sexta no Algarve» e para uma reunião com presidentes de câmara, em Faro. Para além disto, a visita (21 de janeiro) do secretário de Estado da Agricultura, José Diogo Albuquerque, a qual, segundo comunicado oficial, se destinou “exclusivamente” ao contacto com os novos dirigentes da direção Regional de Agricultura e Pescas do Algarve, e antes desta visita, uma outra, em dezembro de 2011, do secretário de Estado da Solidariedade e da Segurança Social, Marco António Costa, que por aí, entre outras coisas, foi inaugurar um centro católico intitulado “Três Pastorinhos”, como em todo o sempre Suas Excelências gostam de inaugurar qualquer coisa no Algarve. Aliás, antes de se decidirem por uma visita ao Algarve, a pergunta da praxe no gabinete é: “E há qualquer coisa que possa ser inaugurada para esses pastorinhos algarvios?” Fora destas aparições pouco mais há de governo presente no Algarve. Sim, por aí tivemos a secretária de Estado Turismo, Cecília Meireles, por duas vezes (outubro de 2011 e em abril), e pelas duas vezes a dizer banalidades e coisas óbvias, muito obrigado.

É de esperar que, em agosto, as revistas sociais e alguns pacóvios cá da terra dêem conta da vinda a banhos do primeiro-ministro nas dunas, de ministros nas falésias e de secretários de Estado nas arribas, entrando brancos e saindo bronzeados. Tem sido sempre assim nos últimos dez, vinte anos. Para o poder, o Algarve é algo muito útil entre duas braçadas no mar, se sabem nadar, ou para duas fotos sociais em calções às florinhas, caso tal vida privada seja surpreendida a esticar-se na areia. Para além disto, o Algarve desapareceu e, segundo parece, continuará desaparecido das preocupações do governo e da agenda política dos governantes. 

Carlos Albino
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Flagrante arma branca: Claro que, tal como a imprensa regional algarvia toda ela está, fica mal que jornais em crise ataquem outros com navalhadas nas costas. Uma coisa é a livre crítica de ideias, o legítimo escrutínio de opiniões e o desejável confronto de interpretações. Outra coisa muito diferente é o uso de arma branca, o que é próprio de salteadores. Fica mal e fiquemos por aqui.

quinta-feira, 17 de maio de 2012

SMS 462. Tenhamos esperança. Mas como?

17 maio 2012

Razões e motivos para vermos tudo negro, não faltam por todo o lado e em todos os cantos.   As poucas coisas que ainda nos salvam ainda são alguns jardins verdes, as ruas relativamente varridas além de que ainda não se formaram duas enormes filas de pobres esfarrapados e descalços às portas das igrejas a entoarem de mão estendida “dê um tostanito, que Deus lhe pague”, que era o que se ouvia nos anos 50 e 60 e que das poucas coisas que a ditadura não conseguiu proibir que os pobres dissessem em voz alta. Mas não estaremos longe desse cenário se nada for feito para as pessoas e, à semelhança da Índia mais atrasada, se transformar a nossa sociedade em duas castas – a casta dos gestores e a casta dos geridos, como as revistas ditas sociais já vão dando conta e pelos vistos com o apoio dos desgraçados ou perto disso. Todos sentem que cidades e vilas estão em decadência, que a partir das 20 horas parece haver um apagão em todas as ruas, que todas as horas são horas de ladrões e bandidos, e que o medo ocupa o quarto de hóspedes em todas as casas porque ninguém se sente seguro como o órgão oficial do crime diária e acriticamente vai dando conta como se fosse um relato da bola, e pelos vistos para gáudio dos criminosos que assim podem avaliar a gratuita repercussão dos seus feitos.

É claro que é urgente, é preciso uma palavra de esperança. Essa palavra só pode partir das instituições e é até obrigatório que parta delas e, à cabeça, das instituições políticas. E no Algarve, como região cultural (não é mais que isso e cada vez menos é isso), aí é que a porca torce o rabo. Localmente há instituições, boas ou más, eleitas ou não, mas há (câmaras, misericórdias, postos da GNR, grupos de teatro amador, etc...) mas a nível de Algarve que instituições há que possam dar uma palavra de esperança e se lhes exija isso?  Há algumas, com certeza mas fora do terreno político (a universidade, por exemplo) e será aconselhável que não as liquidem como aconteceu com o Governo Civil extinto e, para o que era, bem extinto, mas sem nada que lhe viesse a ocupar a função de cabeça ou guia da região, independentemente do que a lei lhe atribuía. O erro do governo não foi em extinguir mas em não ter recolocado em algum lado o papel da única instituição a quem regionalmente se exigiria uma palavra de esperança nas horas que passam. Além do governo, quando desce ao Algarve, não ser capaz de uma palavra de esperança sólida e não dessa pomada populista, cortou o que ainda assim fingia ser a boca da região. Mais grave, cortou essa veleidade da região ter boca, uma simples boca que gargantas há muitas mas são absolutamente dispensáveis.

Carlos Albino
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Flagrante harakiri: Com a informação algarvia generalizadamente em crise, a concorrência desleal e os ataques sórdidos, traduzindo para japonês, significam literalmente "cortar a própria barriga" mas, no caso, sem honra.

quinta-feira, 10 de maio de 2012

SMS 461. Lições daqui, dali e dalém

10 maio 2012

Pelo que acaba de acontecer em França, pelo que quase pela certa se aproxima na Alemanha, pelas voltas que a Itália e a Espanha deram mais as que se prevêem (não fica por ali), vendo com serenidade as reviravoltas na Grécia, e avaliando também estes últimos anos dos nossos concidadãos portugueses que são como de costume (o dito pelo não dito, a manha, a grande sinceridade no circunstancial e silêncio fúnebre quanto ao essencial – o que é típico dos aldrabões sorridentes), vem a propósito o que Thomas Jefferson, o terceiro presidente dos Estados Unidos, disse: “Um homem honesto não sente prazer no exercício do poder sobre os seus iguais”. Seja ele Presidente da República, Primeiro-Ministro ou chefe de autarquia, os mandatos  são missões a que alguns cidadãos se submetem muitas vezes a contragosto e em prejuízo das suas atividades privadas. Não são eleitos para serem reis temporários e quando deixam o comando da República, do governo ou da terrinha, voltam a ser cidadãos comuns, ou seja, são promovidos a povo. E assim sendo, estando nos comandos, não merecem mais consideração que um cidadão comum. Merecem consideração e ponto final, pelo que é inútil a qualquer deles convencer-se de que é “líder”, ou “guia”, enfim alguém pré-destinado e superior aos cidadãos comuns. A conquista do poder, seja este o poder nacional ou o poder local, não confere ao homem que a isso ascende, se é honesto, o estatuto de iluminado, passeando-se com prazer e permitindo-se rasgar promessas com as quais foi eleito e a pôr de lado compromissos com os quais levou os seus concidadãos, pelo voto, à crença de uma sociedade mais justa e de procedimentos mais limpos. A ausência de tais reis temporários é o principal fundamento de uma República e a coerência entre palavras e atos é o principal pilar do sistema democrático, pelo que um eleito, a partir do momento em que é eleito torna-se num servo do povo, devendo obediência aos cidadãos. E é isto que tem sido posto de lado aqui, ali e além, por alguns que, quer a nível nacional quer a nível local, têm reduzido a conquista do poder, qualquer que seja o nível de poder, a mero resultado de operações de marketing e de propaganda ululante, quando não de embuste público, numa total contradição com o que uma República é, e, pondo em crise o que um sistema democrático deve ser, decretam pelo prazer e pela conveniência de interesses difusos contra os quais não levantam um dedo.

Carlos Albino
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Flagrante copo: A propósito da iniciativa “Vinhos do Algarve em Lisboa” ( Sala Ogival da ViniPortugal no Terreiro do Paço, 18 e 19 de Maio), um ditado que assenta bem: mais vale um copo de vinho que 100 verdades… Excelente iniciativa a sugerir que numa mesa do Algarve, haja vinho do Algarve.

quinta-feira, 3 de maio de 2012

SMS 460. Protagonismos e pouco mais

3 maio 2012

Sim, inteiramente de acordo quanto a listas únicas nas autarquias. Não se entende que uma dada força política possa concorrer à assembleia municipal e não tenha que disputar a câmara. Se não pode concorrer por impossibilidade de formar lista, o que fará tal força na assembleia a não ser um exercício de espírito de contradição ou de pacto com a força que mais convirá ao interesse? E se não quer concorrer à câmara, porque é que concorre apenas à assembleia a não ser por birra, por ânsia de protagonismo ou para afirmação de algum interesse escondido? E, um a força ou um partido, concorrendo a câmara e assembleia, para quê em listas separadas, cada qual com sua cabeça de lista, podendo acontecer, como já aconteceu, que um cabeça de lista do mesmo partido da outra cabeça possa fazer campanha contra o correlegionário?

Caso vinguem as listas únicas para câmaras e assembleias, só há que lamentar que o modelo chegue tarde à democracia local. As forças cívicas organizadas, caso não queiram alinhar ou integrar-se em partidos e relativamente a estes reclamem independência, não podem nem devem contribuir para que a discussão política e o escrutínio do poder local se transforme num mero espetáculo de bota abaixo ou de encómios de arreata por via de atores independentes que tantas vezes representam o que não sabem nem querem saber e que de independência não têm nada e que andam por aí a negociar o seu papel de empecilhos quando não empecilhos perversos. Um movimento cívico, se quer fazer civismo, não precisa de veranear numa assembleia municipal a fingir de partido ou como se fosse partido. Se o movimento cívico quer mesmo fazer política, para o que terá toda a legitimidade, deve ser consequente e concorrer simultaneamente ao lugar onde a política local se executa – a câmara – e ao lugar onde as regras são votadas e as decisões escrutinadas – a assembleia. Um movimento cívico não pode ser um movimento de ressabiados, como por regra tem sido na prática, pelo que a democracia local não pode estimular o ressaibo. Pelo contrário, deve retirar estímulo a tais atitudes de parasitarismo do poder. E tal como não se justifica que a uma força que não concorra à câmara lhe seja facultada a possibilidade de um lugar na assembleia, assim também não se justifica que candidatos vencidos, sejam eles provenientes de partidos ou de movimentos, fiquem nesse triste papel de vereadores sem pelouro que é o equivalente ao papel do morto na missa de corpo presente e que, por ser morto, obviamente se abstém em tudo e, pior, se revela incapaz de confidenciar aos vivos onde tem a alma... Um vereador da oposição, o que é isso? Quem ficou na oposição deve assumir o lugar de oposição que a assembleia lhe reserva.

Carlos Albino
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Flagrante lei natural: Ensina a mãe-natureza que jamais um burro se pode licenciar em cavalo e que jamais um cavalo pode evoluir para mestre-burro.