quinta-feira, 2 de agosto de 2012

SMS 473. Doutores da mula ruça

2 agosto 2012

Dentro daquela lógica segundo a qual tudo o que não é proibido é lícito, pelo que com toda a esperteza haverá que aproveitar os buracos, as lacunas e os alçapões da lei, algumas universidades e institutos superiores sobretudo privados que nos públicos ainda há um certo pudor mas pudor apenas, cá vai disto, fizeram fornadas de licenciados nisto e naquilo, alguns com o canudo à velocidade da luz pelo expediente das equivalências, outros pelo facilitismo de provas, outros ainda, certamente por genialidade hereditária, porque nasceram ensinados. Quanto ao estudo, nada; quanto à investigação, zero; e quanto ao que mais importa que é o quadro mental que só uma universidade pode e deve dar, uma nulidade. Naturalmente que os ditosos licenciados do pé para a mão ficaram muito felizes no dia da bênção das pastas, ufanos a gabarolas se começaram a autojustificar com novos cartões de visita ostentando o título académico em brilhante relevo, mas a sociedade ficou mais pobre com cada um de tais doutores da mula ruça.

E tinha que dar nisto. Concederam-se alvarás para o ensino superior como se os critérios fossem quase os mesmos para quem abre uma mercearia – não vendem feijões, vendem diplomas. Em alguns dessas escolas entra o pior que o ensino secundário debita e que não tem entrada em mais nenhum lado. Os professores ditos titulares são low cost e assinam de cruz, tudo o mais possível dentro da tal lei cega para o que à evidência é ilícito. E os chefes de tudo isto, no seu conjunto, mais não formam que uma tribo nómada que tal como a maior parte das tribos nómadas, vivem da apanha da alfarroba que não lhes pertence ou da venda de berbigão e amêijoa em época de apanha proibida, com bastantes autarquias, de norte a sul, a curvarem-se respeitosamente perante tal saber e até a canalizarem orçamento apreciável em nome do chamado prestígio local que foi o que esteve na base do erro.

É claro que, com os anos, a falange dos licenciados por equivalências e facilitismo acabaria por formar uma corporação de interesses e é por isso que, sempre que estala algum caso necessariamente badalado, os da corporação ficam mais caladinhos que os ratos, porque, lá no fundo, sabem muito bem que o seu cartão de visitas tem um erro e que a bênção de pastas foi um regabofe. Um enorme erro que é uma afronta para universidades a sério e para quem a sério por elas passou com a consciência de que uma sociedade não vai a lado nenhum com ilícitos, mesmo que os ilícitos sejam paulatinamente esquecidos pela lei, porque se por ela forem estimulados, que a Sicília nos desculpe, mas essa sociedade iria dar no que a Sicília é emblema.

Carlos Albino
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Flagrante bom momento: O da exposição de pintura de Graça Morais, no Convento de Santo António (Loulé).

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