quinta-feira, 31 de março de 2011

SMS 406. Lamentável espetáculo

31 março 2011

Obviamente que o caso da presidência do turismo é um caso político. Não vale a pena assobiar para o lado. Por uma questão política ou de arranjo político, António Pina foi levado a interromper o desempenho como governador civil, transitando para o turismo que era, por assim dizer, uma prateleira dourada e aparentemente local para não provocar incómodos. Acabou por não ser assim, resultando neste lamentável espetáculo. E é lamentável não porque António Pina tenha reentrado e o outro ex-vice saído, ou porque a assembleia do turismo tenha acreditado que era uma assembleia deliberativa e que o turismo era uma “entidade” da região, ou porque o ministro Teixeira dos Santos, que veio ajudar à festa, se tenha esquecido que é mais ilegal um militar no ativo ser governador civil por conveniência do que um aposentado desempenhar funções públicas sem a inconveniência da boa remuneração – o caso é lamentável porque deu azo a mais uma cena de judicialização da política.

A incapacidade do sistema político em resolver os seus conflitos internos pelos mecanismos habituais, ou seja pela vontade consolidada e formulada no quadro dos partidos ou pelas práticas democráticas das instituições, ficou exposta com a transferência para os tribunais e com as denúncias cruzadas dos adversários. Transfere-se para o tribunal como se um caso político fosse mero caso de formalidade, de procedimento administrativo ou de direito ferido! E o que se espera por regra com esse tipo de iniciativa? Espera-se obviamente a exposição judicial do adversário, e que, qualquer que seja o desenlace, ele seja enfraquecido ou mesmo liquidado politicamente. É isso e não vale a pena disfarçar, porquanto a questão de fundo, pelo que toda a gente já percebeu mas alguns disfarçam, é a de se saber se o presidente do turismo algarvio deva ser ou não um comissário governamental, acrítico e obediente à linha, a troco da função e do salário de prestígio social que ela traduz tanto que força ao apego do poder.

Tratando-se de um dos postos decisórios mais emblemáticos da região, a judicialização do diferendo político no turismo é deveras lamentável, e se a democracia fosse pessoa, ela seria com isso uma pessoa humilhada, como já o tem sido nos arranjos para o governo civil, para os “lugares elegíveis” das listas de deputados, para... cala-te boca e ponto final parágrafo, porque a “sociedade civil” do Algarve também gosta muito do ponto final parágrafo, pois, se não gostasse, o caso do turismo nem sequer tinha começado: a ordem democrática tem uma ordem, e há gente fora da ordem que já está a brincar demais aos jogos infantis de poder.

Carlos Albino
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    Flagrante epílogo de história infantil: E foi assim, meus meninos, que o príncipe decidiu não fazer a sua lua-de-mel no Algarve para não tomar partido...

quinta-feira, 24 de março de 2011

SMS 405. Obrigado

24 março 2011

Chegou a hora dos agradecimentos a todos os ilustres democratas por dá cá aquela palha:

  1. Obrigado, porque acreditámos que iriam concretizar ou pelo menos abrir caminho para a regionalização, e nada, nada fizeram por isso, antes pelo contrário, liquidaram as amostras, aumentando as mordomias e mantendo as anomalias.
  2. Obrigado, porque acreditámos no vosso discernido planeamento casado com os ecologistas do mesmo género quanto a uma auto-estrada mais a sul para proteger 17 caracóis e 16 consultadorias dissimuladas, e além disso para a região ficar supostamente com uma solução substitutiva da 125, e vê-se como se ficou com um completo enxerto a sul e outro inominável enxerto para caracóis e consultadorias.
  3. Obrigado, porque a segurança é um facto: a GNR atende as vítimas a tal ponto que as vítimas nem querem incomodar mais, a PSP é luxo citadino aqui e além, e todos sabemos que os tráficos de droga e de seres humanos (clandestinos, mendicidade, prostituição) desapareceram do nosso mapa.
  4. Obrigado, porque temos, até que enfim, não apenas um ou aquele tal e único prometido, mas vários hospitais centrais.
  5. Obrigado, porque temos o tal turismo sustentável, integrado, dinamizador da economia e da capacidade produtiva regional, que nem vale a pena explicar mais, porque arrumamos os quartos, alugamos umas camitas paralelas, vendemos uma peças de artesanato da China e uns lenços com chaminés estampadas, e já é muito para uma população que está sem tempo para jogar golfe com os buracos nos paraísos fiscais.
  6. Obrigado, é claro, por, à exceção de um ou dois deputados que mexem, mal se dar conta de que temos deputados, e quando se dá conta, é para a contemplação do estuário do Arade, a descoberta de que a cortiça nasceu anteontem em São Brás, ou para crónicas que, mutatis mutandis, podem ser lidas em Malmö, no condado de Borsod-Abaúj-Zemplén ou em Gijón, mudando o que deve ser mudado...
  7. Obrigado, porque houve de facto muito evento agenciado e agendado mas quanto a estruturas culturais, práticas rotinadas e coisas que fiquem – pouco ou nada, e o pouco tem sido à custa de autarquias que podem ter visão ou de associações e grupos que fazem das tripas coração. Obrigado, por tanto evento.
Há mais uns 85 obrigados a endereçar aos ilustres democratas, mas sete a sete é quantidade bastante...

Carlos Albino
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    Flagrante obrigado final: Ao ministro António Mendonça que explica tudo bem e dialoga ainda melhor. A si próprio e consigo próprio. Que desapontamento.

quinta-feira, 17 de março de 2011

SMS 404. E se houver eleições?

17 março 2011

Com o significado da manifestação em Faro, sabendo-se o que se sabe do interior de cada partido (situação quantitativa e qualitativa, capacidade de mobilização, níveis de liderança e de ideias) e com mais umas achegas daqui e dali (convocação contra as portagens, mais proximamente), é óbvio que o prognóstico para o Algarve entra pelos olhos, caso sejam convocadas eleições antecipadas. Sobretudo a manifestação de Faro foi um sinal muito forte e uma advertência clara sobre a situação incomportável a que o Algarve chegou, a tal região que pelos critérios europeus acriticamente acolhidos é já de uma riqueza tanta que não tem direito a nada, a nenhuma compensação, a nenhuma exceção, a nenhuma consideração. E se houver eleições antecipadas, o castigo pelo voto a quem dele beneficiou ascendendo ao poder, deverá ser inevitável e talvez sem precedentes nestas breves décadas de democracia. Os sinais que têm vindo a ser dados dão conta de que as pessoas estão fartas dos que fazem das funções ou cargos elegíveis meras peças de profissionalismo político, calculista, frio e seguindo o estilo do jogador de poker, as pessoas estão fartas dos que fazem dos cargos públicos a que ascendem por nomeação, exercícios de mordomia dada como virtude não justificada, e finalmente as pessoas estão fartas de chorar às escondidas, de sofrer envergonhadamente, de engolir em seco a hipocrisia e as palavras enganosas dos melíferos distribuidores de promessas, como fartas estão do fundamentalismo islâmico em que se converteram os centros de emprego no numerador com os déspotas oportunistas das empresas de ocasião no denominador. Para não se falar na corrupção, na insegurança, na saúde que fique afetada acima da constipação.

Creio que haverá partidos que já deviam ter feito uma revolução dentro de si próprios e que, se não a fizeram até este momento, é já tarde para evitarem o pior, se houver eleições. Há cinco, sete ou mesmo dez anos, com duas ou três larachas bem montadas e com um ou dois artistas de alto gabarito, a paisagem regional era dominada satisfatoriamente e caso não fosse, a culpa era do artista convidado. No Algarve de 2011, nada disso – já ninguém vai em larachas.

Carlos Albino
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    Flagrante objetivo de algo em algo: É óbvio que a Via do Infante é a única via transversal do Algarve. Não tem alternativa. E os que assim pensam não são propriamente uma meia-dúzia de insatisfeitos, como alguns dizem só para Lisboa ouvir, na mira de algo em algo.

quinta-feira, 10 de março de 2011

SMS 403. Carnaval, modelo esgotado

10 março 2011

Muitos assim pensam, mas nem todos dizem em voz alta que o modelo destes carnavais está esgotado. Como se fosse um país tropical, desfilam nestes três dias umas raparigas contratadas com umbigo à mostra, anel no umbigo e uma pétalas a tapar o bico dos seios, a desafiar frio de rachar, em cima de carros alegóricos que estão longe do que seja alegoria, sendo apenas ingénuos resultados de raciocínios analógicos, ainda assim a civilizar manifestações de barbárie recalcada a que se chama alegria e brincadeira mas que é, de modo geral, alegria triste e brincadeira sem sentido.

Dá pena ver essas raparigas dos trópicos, com sorriso forçado e, sem dúvida à espera do cheque – não têm nada a ver com a terra, seja esta lá do Norte ou cá do Sul. Até nas terras, como no caso de Loulé, onde o carnaval já foi verdadeiro teatro de rua espontâneo, colocando-se em corso, o que, por certo durante séculos se fazia de forma dispersa e com excessos, os três dias deixaram de ser de mascarinhas, de festa cruzada, de crítica e representação cénica popular numa apoteose de flores de papel, música de bandas e grupos, para dar lugar a um impossível Rio de Janeiro sob nuvens de inverno que é estação de quando o sol é uma sorte. E assim se apagou uma tradição de séculos e se foi diluindo o pouco que o corso dela ainda foi conservando. A agravar, o êxito aparente dos desfiles tropicais mas grotescos embora iluminados por efémeras estrelas de telenovela de fatela pagas a peso de ouro apenas para que alguma televisão também efemeramente ajude ao prestígio falso de três dias, foram sendo imitados por todos os lados, perdendo-se em muitos casos a noção da saloice atroz e com cada carnaval assim estar a matar o outro e todos em conjunto acabarem por matar o que devia ser festa, divertimento e manifestação de alegria coletiva que deixou de ser – ficam os retratos e vídeos das criancinhas que mal percebem o porquê dos trajos ao lado de adultos sorumbáticos e com fatos de ir à missa.

Digo já que esta crítica não tem nada a ver com moralismos, muito menos com os resultados de bilheteira que são escassos e não dão para cobrir o que a casa gasta – até defendo que o carnaval seja o momento de oportuno para desafio da falsa moral e dos falsos moralistas. É apenas para dizer com franqueza que o modelo deste “carnaval global” e que ou é igual em todo o lado ou não passa de imitação amacacada, está esgotado e caso queiram que o carnaval continue, algum esforço tem que ser feito para ir às origens e adaptá-las ou inseri-las na modernidade. Isso é trabalho para equipa onde esteja o antropólogo cultural, o homem de teatro e, claro está, um animador cultural encartado ou a sério e não mascarado. Não é show que se encomende a uma agência de shows. E numa região de turismo como é o Algarve, pelos carnavais que por aí houve, é caso para se adaptar com as devidas consequências aquele dito segundo o qual em casa de ferreiro, espeto de pau.

Carlos Albino
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    Flagrante constatação: O bem precioso que é o Pátio de Letras, em Faro – pelo ambiente, pelas iniciativas, pelo ar que se respira e pela constatação de que os milagres são feitos com coisas simples e na simplicidade mas, e aqui está o mas, com insinuante inteligência.

quinta-feira, 3 de março de 2011

SMS 402. De novo a região-piloto...

3 março 2011

Não é difícil perceber que, neste momento de afogadilho, a regionalização não se afigura como coisa prioritária aos olhos do cidadão comum. A discussão dura há 35 anos e já deu para verificar que a regionalização é bandeira agitada quando se almeja tomar conta das rédeas do poder central mas que rapidamente a mesma bandeira é colocada a meia haste, ou mesmo dobrada no armário dos símbolos a evitar, quando esse poder central fica nas mãos. Além disso, para o quadro ficar melhor pintado, aqueles mesmos que, por via de ténue descentralização ou de mera desconcentração de pequenos poderes deveriam ter provado as vantagens da administração de proximidade e nesse sentido exercido pedagogia, antes pelo contrário, arvoraram-se em chefes de esquadra desmedidos, ridículos e ciosos das mordomias que usufruíram com ares de ministros de segunda, ou mesmo até em alguns casos lamentáveis por aí começaram a desfilar como títeres locais de novo tipo e com seu chicote provinciano próprio de telenovela importada do nordeste, desacreditando pouco a pouco a bondade da regionalização e colocando-a na categoria mental dos conceitos que são de temer. Em todo o caso, a regionalização é assunto que por aí está a ser retomado com a sugestão de se ir devagar, devagarinho, e de se começar o processo com uma ou duas regiões-piloto, com a do Algarve naturalmente à cabeça. A vingar a ideia, volta-se assim à estaca zero e, diga-se de passagem, voltar à estaca zero 35 anos depois, já é um grande avanço... Mas duvido que a ideia ganhe o necessário consenso – as mordomias ficariam reduzidas a metade e isso pesa, aliás, é o que tem pesado desde há 35 anos.

Carlos Albino
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     Flagrante lógica: Pelo que se sabe, obviamente que António Pina deveria regressar à chamada Entidade Regional de Turismo do Algarve...

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

SMS 401. Os números do setor e do segmento

24 fevereiro 2011

Não incomoda mesmo nada que, para uns tais efeitos estatísticos, o turismo seja setor e que, para outros tais, seja segmento. O que incomoda é o jogo de números ora a bem do setor e mal com os segmento, ora a bem do segmento e mal com o setor. Parece uma brincadeira em três atos. Precisamente na véspera da abertura da bolsa de turismo de Lisboa, são revelados pelo Banco de Portugal os dados do turismo relativos a 2010, garantindo-se que o setor registou o melhor resultado de sempre, com as receitas a subirem mais de 10 por cento, num total de 7.611 milhões de euros.Além disso, mais se garante: que britânicos e franceses continuam a liderar os gastos em Portugal, seguindo-se espanhóis e alemães; que os angolanos entraram no ranking e que os chineses aumentaram em 75 por cento as compras em território português; que ouros mercados mais cresceram, como nos casos do Brasil e dos EUA, tudo a subir, tudo a crescer, parece que estamos salvos. E tanto mais que logo se espalhou a conclusão de que o êxito do setor foi tal que nem o “mau desempenho” da Madeira foi sentido no segmento.

É claro que será uma visão infantil e irresponsável ver as estatísticas de um setor sem as ligar com as dos outros segmentos, mas, mesmo centrando as atenções no segmento do setor que é como no Algarve isso desgraçadamente se vê, é legítimo perguntar: então, com tanto êxito, porque razão o segmento despediu tanto no setor? E porque motivo tantos trabalhadores do setor foram empurrados do trabalho estável para as bolsas de emprego temporário que os exploram indecentemente? E porque fecharam tantos hotéis do segmento para sugestiva remodelação do setor? E quais as causas da taxa record de desemprego do Algarve que está praticamente na dependência total do setor? Há muitas, muitas mais perguntas possíveis, mas a bota não bate com a perdigota.

Carlos Albino
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    Flagrante democracia direta: A dos partidos que substituíram secções e núcleos por crónicas, e a dos autarcas que em vez das respostas adequadas em assembleias municipais preferem fazer colunas de 600 caracteres e responder aos munícipes: “Já escrevi sobre isso, não vou repetir!”. Um exemplo para o norte de África.

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

SMS 400. São Lourenço da Poesia

17 fevereiro 2011

Outrora Ermida de São Lourenço dos Matos, depois e agora Igreja Matriz de São Lourenço de Almancil, é um lugar de culto e não só – é um lugar culto, jóia inestimável de Almancil e sítio que obriga à recordação quem por lá passe. As imagens andam pelo mundo, fascinam, atraem, cativam e mesmo quem não queira ou resista recolher-se, recolhe-se e medita mesmo que não medite em nada, porque aquilo provoca o êxtase do olhar e até o ar que se respira é um ar que não se sabe se é azul decifrável se é aquele dourado que apenas algumas palavras têm em comum com o sonho, a ideia e o pensamento. Ou seja: está ali a Poesia e pensa-se. Daí que não me custe, nalgum intervalo de culto, admitir que São Lourenço, sem prejuízo dos Matos ou de Almancil, possa ser São Lourenço da Poesia. Ainda que numa só noite de Agosto, ou de Julho ou mesmo de Setembro. Não sei, mas vejo ali o lugar perfeito para que a Poesia aconteça com a sua arte gémea, a Música sem que qualquer das gémeas esteja ao fundo da outra. Ou seja: nem Poesia com Música ao fundo, nem Música com Poesia a sair dos fundos. As duas, num momento. Um Acontecimento, instante que seja, de Poesia e Música. Da Música haveria que falar com Osvaldo Ferreira, da Poesia admitir-se-ia convocar para o pensamento inicial, um intróito de António Ramos Rosa, um credo de Gastão Cruz, uma consagração de Nuno Júdice, um pax tecum de Casimiro de Brito, uma aliança de civilizações de Abú Ibne Isa Cutair e uma partilha fraterna de António Aleixo, havendo ainda tempo para um ofertório de João de Deus e um rito de conclusão de João Lúcio, não sendo sacrilégio associar a presença e voz da poetisa alemã nascida na Roménia, Herta Müller, Nobel de Literatura de 2009. Por exemplo, para os devidos efeitos de Acontecimento marcante. Quem, sendo culto, não iria, ou tudo não faria para ir a São Lourenço da Poesia? É apenas uma ideia, uma sugestão. O lugar é sagrado, como se sabe, mas isso não destoaria da sagração. Voltarei ao assunto, mas creio que não será necessário traduzir por miúdos o requerimento. Ali, é um dos melhores lugares e mais belos do mundo.

Carlos Albino
    Flagrante luva branca: Sim, ali em Almancil, com Poesia e Música em dia bem combinado, até Guimarães ficará mais povoado… Basta querer.

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

SMS 399. Abriu-se um grande parênteses

10 fevereiro 2011

Dizem os dicionários que o parênteses é um sinal usado em matemática para significar que as operações indicadas dentro dele se devem considerar efetuadas. Fora da matemática, o entendimento geral é que tais operações não são as efectuadas mas as suspensas, pelo que, tudo o que ficar entre parênteses, está suspenso. E, não tenhamos dúvidas de que, salvo esta ou aquela pequena coisa, foi aberto para o Algarve um grande parênteses. A ligação ferroviária de alta velocidade Faro-Huelva? Suspensa, claro. E o turismo pelas contas mal feitas e irresponsáveis por quem não quer ver que a oferta não é grande espingarda em comparação com a concorrência? Suspenso. E a reposição da RTA como era? Tão suspensa que nem é reclamada. E a regionalização? Suspensa e, mais, sem existir já é culpada... E a extinção desse cargo inútil que é o do governo civil? Suspenso. E a racionalização de meios e recursos por tanta direção regional que nem é direção nem regional, cheirando a mordomias, tal como tantas empresas municipais outras que tais? Essa racionalização está suspensa, outras racionalizações não... E um debate a sério sobre se vale a pena o Algarve ter os oito deputados que tem, mais de metade dos quais nem sente e os da outra metade já se esqueceu a não ser aí nuns almoços de anúncios e lanches de promessas misturadas com encómios que entram por um ouvido e saem pelo outro? Debate mais que suspenso, postergado. E quanto a medidas também a sério, portanto credíveis, de combate e prevenção da criminalidade e não para inglês ver? Mais que suspensas. E quanto a Hospital Central? E quanto a..., a..., a... Se o Algarve viveu durante séculos e séculos entre parênteses, não é agora que isso vai deixar de acontecer.

Carlos Albino
    Flagrante vendaval: Ali na Costa Vicentina onde, apesar de ser em grande parte Algarve, o governo diz que não quer ver aí o Algarve repetido...

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

SMS 398. O desânimo é o pior

3 fevereiro 2011

Nada disso, o deixar cair os braços é o pior. O desânimo e o desalento foram os inventores dos becos sem saída e nisso tiveram a ajuda dos artistas do fogo de artifício, aqueles que atiram para o ar ideias que estoiram muito e rilham na noite mas que se dissipam rapidamente, não se sabendo até onde a cana caiu. É verdade que estamos a pagar os custos do apagamento do Algarve e por certo mais custos iremos pagar, mas o pior é deixar cair os braços. E que apagamento foi esse? Apagou-se a representação cívica da região fora do seu território como se a representação política (deputados, um outro ministro de vez em quando, algum secretário de estado) fosse suficiente e até segundo alguns com ideia errática de democracia, como se isso fosse conflituante – e foi assim que se deixou cair a Casa do Algarve em Lisboa tal como se atirou para o fundo do cesto todas as Casas do Algarve. Apagou-se o Congresso do Algarve cuja evolução lógica deveria ser, não tanto o folclore e vaidades misturadas com analfabetismos que perderam a vergonha, mas uma ligação profunda com as universidades e institutos superiores da região, fomentando a criação de centros de estudos, observatórios, organizações cívicas, estruturas de promoção das atividades da região sem dependências do Estado e dos acólitos da missa oficial, pois claro – o esforço e por certo o entusiasmo dos promotores foi enorme e sério, mas com o delirante apagamento da região isso acabaria por ser água a sumir-se pela areia. Mas o mais triste é que o apagamento do Algarve foi tão longe como foi, com a colaboração dos próprios algarvios, numa espécie de estratégia suicidária política e cultural coletiva. Temos muito bom mas o muito bom que aqui temos, nem uma nem duas vezes, foi humilhado dentro da nossa própria casa, a troco de umas vénias a gente que as não merece e que sempre que abre a boca ou mexe os olhos, aparentemente em nome do Algarve, até arrepia.

Carlos Albino

    Flagrante múmia paralítica: É que não há uma palavra que dê confiança e, enfim, alguma esperança às populações diariamente acossadas pelos assaltos, roubos, crimes, violência de toda a ordem, na falta de patrulhamento, de polícia de proximidade e de justiça sem medo.

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

SMS 397. Do Vascão para cima


27 janeiro 2011

Há evidentemente uma ou outra boa nova, como, por exemplo, na área da indústria de pescas, em Olhão. Mas é caso isolado, infelizmente. O turismo vai como se sabe, com o mercado temporário de emprego a fazer, aqui e ali, o inimaginável, sem que os trabalhadores possam dizer ui ou mexer uma palha. A agricultura, depois das ondas de pilhagens a vivendas, sofre agora os assaltos – roubam tudo nas hortas, desde as culturas aos fios de cobre. O comércio aguarda o verão porque a esperança é a última morrer. Os serviços gerem dívidas na maior parte dos casos. Os bancos hipotecam, enquanto outros, fazendo contas de tudo isto é passageiro, vão apostando na imobiliária enquanto também os bancos não hipotecam – na verdade, há por aí betão que ninguém acreditaria que se vendesse e está todo vendido, embora também haja cada vez mais casas fechadas ou à espera de um desejadissimo aluguer para férias. Algumas câmaras vão dando emprego e ainda bem, os burocratas locais rezam a Deus para que a crise não os surpreenda e lá vão cumprindo as suas rotinas, agora, com mais algum temor no atendimento, não pelas eleições igualmente locais que possam afetar o chefe, pois as eleições no calendário mental estão ainda longe, mas porque nunca se sabe se a pouca sorte dos outros lhes bate à porta. Já se viu que, quando não há dinheiro, batatas. Nas cidades e vilas, cada um mete-se nas suas casas à espera do outro dia, passando o tempo com a ajuda da telenovela, da notícia do crime que cada um também segue com imensa emoção quando as coisas acontecem longe ou o mais longe possível. A vida associativa está confinada a umas bolsas de entusiastas e a parte mais ativa está associada a almoços ou jantares de confraternização. Os líderes políticos da região, não apenas pelo episódio lastimável das portagens em que não souberam impor-se a vários níveis, vão fazendo as suas declarações, despachando os requerimentos que podem, dando entrevistas e animando os militantes, mas já devem ter percebido que o ambiente está morno e sem entusiasmo porque também não há crença, não há golpe de asa e não há discurso galvanizador, por um lado porque programas e projetos que ainda há pouco tempo subiam no pau da bandeira, agora caducaram no prazo de validade como os iogurtes, e por outro lado, não se podem iludir a si próprios sobre o poder que está lá em cima, ou seja do Tejo para cima, ou para maior rigor, do Vascão para cima. A culpa não será totalmente deles mas a responsabilidade é.

Carlos Albino

    Flagrantes conclusões: Sim, será despropositado misturar, mas também não se pode separar. Para quê meter a cabeça na areia?

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

SMS 396. Presidente ou Residente da República?


20 janeiro 2011

Estamos à beira de mais uma eleição, desta vez presidencial. Cada um pensa o que pensa e legitimamente expressa o que entende expressar, não hesitando eu em expressar que nunca assisti a um pleito de nível tão baixo – baixo nos discursos, nas ideias, nos confrontos de programas ou projetos e, pior que tudo isso, também quanto a perfis de personalidade a coisa foi igualmente baixando, baixando e baixando de tal forma que fui forçado a interrogar-me se afinal estamos a eleger um Presidente da República ou mais um Residente da mesma República, o mais alto residente, por certo, a juntar-se a outros residentes. Nunca assisti a uma coisa destas e nunca pensei que isto fosse possível acontecer.

Ao desapontamento com os deputados, sobretudo com a safra das últimas legislativas, junta-se assim um desapontamento maior e de efeitos incalculáveis numa democracia que obviamentre deve e tem que ser repensada antes que o bem coletivo da liberdade de escolha a troco da responsabilidade de compromisso dos escolhidos se acabe ou se interrompa, ou, pior que tudo, se deteriore transformando-se num sistema de faz de conta que é democracia mas não é. E mais do que poderes do Presidente, número de deputados ou quem é quem que é eleito, o que me preocupa seriamente é a própria democracia e o seu rumo, o que tem obviamente tudo a ver com a qualidade, elevação e interesses abertos e não camuflados dos seus protagonistas. Ora uma democracia para escolher camuflados é coisa que colide com o sonho da sã convivência, da crítica serena e da domesticação de egoísmos e prepotências.

Nós, todos, para além dos autarcas que se cruzam com os eleitores nas ruas e que têm olhos, elegemos o Presidente e deputados – nada mais, porquanto o primeiro-ministro é um corolário. Com os deputados, as suspeitas acabaram de vez nas últimas eleições, pois, pelo que temos visto e comprovado, os eleitos, em vez de representarem os interesses das populações locais que os elegeram perante o governo e no parlamento, o que estão deveras a fazer é representarem os interesses do governo e do parlamento junto dos locais, invertendo o contrato eleitoral. E nisso, os partidos em cujas listas os mesmos deputados foram eleitos, em vez de pedirem ao governo e no parlamento apoio para as populações, o que fazem é pedir o apoio às populações para o seu governo (uns), para as expetativas calculadas de governo (outros) e para os seus interesses no parlamento (todos, à exceção dos que dificilmente escapam do labéu do oportunismo e do aproveitamento de circunstâncias). No Algarve, esta falácia levou à imposição de “representantes” que pouco ou mesmo nada têm a ver com os que deviam ser representados, e alguns no meio deles ou atrelados a eles, portanto sem grande voz ativa mas que até têm a ver com os representados, ou se calam ou não sobem, nesta lógica em que a representação política se converteu em emprego político e os empregados fazem carreira. Isto não é apenas mau para democracia – é péssimo, porquanto nenhuma democracia resiste com empregados residentes na política. A política não é isso, não se fez para isso.

Mas, enfim, fora os deputados, a gente acostumou-se a sentir no Presidente um garante e um reduto de confiança, mesmo que o eleito não fosse o que nós mais gostaríamos. E o que não é apenas mau, é péssimo, é que também o Presidente seja um Residente. A eleição que, em princípio, se consuma no domingo, sobretudo pelos episódios inesperados dos últimos dias, é um mau augúrio e a prova provada de que a democracia tem que ser e deve ser repensada. Repensada por todos nós eleitores que não somos empregados políticos pois as águias não geram pombas.

Carlos Albino

    Flagrante prognóstico: Comenta-se nos círculos de assaltantes bem informados, que vão ver que há forças policiais mais do que suficientes até para impor as portagens na 125 quanto mais na Via do Infante.

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

SMS 395. Não somos donos nem senhores

13 janeiro 2011

O Turismo (com letra maiúscula) foi lançado no Algarve, para o Algarve e com o Algarve, como uma atividade sustentável e para dar sustentabilidade à região que muitos sonharam que viesse a ser Região com letra maiúscula. Decorridas décadas, o turismo é uma atividade com letra minúscula embora esmagadora da região que ficou assim, com letra minúscula, agora por isto, depois por aquilo e sempre porque, não tanto o Estado mas os que se foram tornando profissionais do estado e em grande parte sem serem estadistas, janais quiseram perder o abecedário das maiúsculas do centralismo cego, da burocracia estulta e do sistema de mordomias em que a política se converteu, enchendo de bolor a democracia, o tal bolor que é o pai do autoritarismo e que faz filhos até dizer basta sem que os democratas disso se dêem conta. E na hora da desgraça, ou da fatalidade que ronda a desgraça, que é também a hora dos acertos de contas irracionais e a hora em que também todos julgam perceber de tudo e cada um mais do que os outros, os que beneficiaram ao longos dos anos dessa ilusão alimentando-se dela como as cigarras de verão – cantaram muito e humilharam as formigas, como na fábula – calam-se agora, na vaga esperança de que a tempestade passe, porque se passar retomarão a atividade de sempre - cantar muito. Pois houve um erro estrutural na região, um tremendo erro e que foi o de se ter “programado” o desenvolvimento do Turismo sem o pressuposto da eficaz e efetiva integração na região – os hotéis pousaram como se fossem aviões e, como tal, também preparadinhos para levantar voo, a agricultura ficou espatifada a troco de um prato de lentilhas, as pescas estão nas lonas e so mar é rico é para os nadadores-salvadores precários, a indústria é escassa, o artesanato ficou nos resquícios depois de vinte anos com as chaminés moldadas em Leiria, os serviços vivem do que uns 400 mil residentes podem pagar se receberem de quem pousou, o Estado alegremente cobrou que se fartou sem reinvestir proporcionalmente no local da cobrança, as grandes superfícies têm as caixas registadoras no Algarve mas a contabilidade lá em cima, por aí adiante, para não falar do regabofe dos dinheiros a fundo perdido, dos subsídios não escrutinados, dos planeamentos cozinhados, da imobiliária selvagem, dos negócios dos paraísos fiscais lançando isto aqui para o inferno fiscal, etc. E sendo assim, se o Alberto João Jardim fosse de Monchique, nestas circunstâncias, pouco mais seria que um Luís Filipe Madeira e sucedâneos, e se o Carlos César fosse de Tavira duvida-se que ganhasse alguma vez a câmara de Faro como Macário Correia ganhou. E temos dito. Não somos donos e senhores dos destinos da terra, nem tínhamos que ser, mas a sustentabilidade poderia não ser hoje uma figura de ficção. Como é. Estamos nas mãos dos operadores que operam e dos ilusionistas que fazem truques.

Carlos Albino

    Flagrante Prémio SMS 2010 de Jornalismo: Precisamente no Dia de Reis deste 2011, decidiu o júri atribuir o prémio que não dá ouro, nem prata, nem sequer incenso, mas dá gosto e honra, ao jornalista Nuno Couto, por acaso do Jornal do Algarve. E com isto, uma homenagem à juventude que prossegue a chama de fazer do jornalismo não uma causa com segundas intenções mas uma defesa do interesse público. Prossiga Nuno Couto, que o José Barão, se fosse vivo, dir-lhe-ia o mesmo ou melhor. Nuno Couto junta-se assim a Idálio Revez (2005), a Carlos Branco ((2006) e a João Prudêncio (2007), porquanto o júri decidiu não atribuir os prémios relativos a 2008 e 2009, por falta de ouro, de prata e até de incenso.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

SMS 394. Para 2011, que, que e que…


6 janeiro 2011

1 – Que vós, lá no vosso alto império, fundamentadamente peçam sacrifícios mas não mintam.
2 – Que o povo queira um mundo a sério mas não coma de boca aberta, feche a televisão quando cheira mal e leia livros com princípio meio e fim. Há livros que salvam.
3 – Que o poder político não seja disputado por quem anda com o rei na barriga.
4 – Que os candidatos que se perfilam para as autarquias não tenham nada a esconder e apresentem curriculum limpo e sem omissões.
5 – Que os juízes deixem de ter saia larga e aos costumes digam alguma coisa.
6 – Que o Allgarve perca o l, que as rádios locais deixem de ser grafonolas do catrapum pum pum ou extensões de discoteca, e que os cantores pimba deixem de ser as meninas dos olhos das câmaras ricas do litoral.
7 – Que o príncipe de Inglaterra venha passar a lua de mel ao Algarve e faça cá o principezinho que sirva de argumento para a restauração da dignidade perdida da saudosa Região de Turismo cuja extinção deixou isto sem rei nem roque ou num arremedo.
8 – Que as pessoas no Algarve possam deitar-se e acordar na mesma cama sem que três ladrões lhes entrem pela casa durante a noite.
9 – Que todos os estrangeiros se integrem sem que haja necessidade de um Sarkozy a cada esquina com desejo de expulsão e que os ciganos ao menos respeitem os semáforos.
10 – Que todos os que vão passar estes 365 dias no Algarve sejam Algarvios e seja esse o estado de alma.

Carlos Albino

    Flagrante pergunta pública: Mas por onde e como começou o escaravelho da palmeira?

quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

SMS 393. O problema está no próximo

30 dezembro 2010

É que, quanto a mensagens, o país não tem razão de queixa – somos um povo rico em mensagens. É do chefe de estado, é do primeiro-ministro e de alguns ministros e, em tática antecipação de todos eles é a mensagem do titular do governo civil, é a mensagem do cardeal antes do bispo ou do arcebispo antes daquele, é do presidente da câmara, é do regedor, é do líder de oposição (desta vez, como nos velhos tempos das conversas em família – lembram-se? -, com lareira atrás), é mensagem lustrosa do homem da empresa pública impressa em papel couché, por certo com motivos para se sentir num estado dentro do estado, enfim, as mensagens partem de onde menos se espera, do chefe do futebol que lê mal o que outro lhe escreve, ao chefe de escuteiros. Ainda não agora, mas pelo andar da carruagem, pouco falta para o arguido célebre ir com todas as honras à televisão comunicar a sua mensagem, ou até mesmo para o delinquente que escapou por um triz nos entrar casa adentro com cara do próximo santo feito pelo papa pois neste país basta não ter sido condenado para um algum camelo artista passar pelo fundo da agulha com uma tremenda e esmagadora lição de nora. Portanto, estamos ricos em mensagens, embora de toda essa montanha de prosa do final do ano, a rigor apenas interessam duas: a do Presidente da República que é escolhido, e a do Primeiro-Ministro que é eleito – daí, as maiúsculas que se lhes destinam.

É claro que as mensagens do Chefe do Estado e do Chefe do Governo – continuamos com maiúsculas – tiveram a sua piada. A do primeiro porque é escolhido; a do segundo porque é eleito. Não está aí o problema. Quanto ao primeiro que é escolhido, ele sabe que não pode falar de Natal sem ter em conta o denominador comum e que também não pode falar do Ano Novo alheio ao máximo divisor comum – é uma questão de fazer bem as contas. Quanto ao segundo que é eleito, também não há grande problema sabendo ele que cada mensagem tanto pode equivaler a queimar os últimos cartuchos como também a preparar o próximo foguetório – é uma questão de jogo.

Então onde está o problema? O problema, voltando às minúsculas, está no próximo chefe de estado que não deve estar longe do escolhido e do próximo chefe de governo que, em democracia, está sempre perto de ser eleito. Pelo que ouvimos e sabemos, resumindo e concluindo, para pior já basta assim. Estamos feitos.

Carlos Albino

    Flagrante momento de serenidade: O do concerto do Ano Novo da Orquestra do Algarve, desta vez no Casino de Vilamoura. Obrigado ao maestro Osvaldo Ferreira e obrigado a todos os músicos, do primeiro violino até aos da percussão, lá atrás, que nós, os espetadores, estamos fartos de ser os bombos da festa.

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

SMS 392. Anónimos e cobardes

23 dezembro 2010

Deus não foi totalmente previdente na escolha do local e do momento para o seu filho humano nascer – escolheu um estábulo e não esperou pelo século XXI, fez mal. Assim, deixou que o diabo faça nascer não apenas um mas os seus milhares de milhares de filhos nesse local que onde tudo o que apareça fica aparentemente eterno – a internet. E aí temos os diabos à solta, sob anonimato e cientes da impunidade, atacando sem fundamento seja quem for. Insultam, caluniam e mentem sem consequências. Sabem que a justiça não lhes pode bater à porta, ou que, quando pode, demora dez anos a subir o degrau da soleira; sabem que a delinquência impera tornando os delinquentes solidários entre si por questão de sobrevivência, e sabem que a cobardia já quase tornou num valor moral, tanto que é pela cobardia que exibem que a maior parte desses diabos chega a usufruir de consideração pública e até de prestígio.

Bem vistas as coisas, esses pobres diabos não fizeram mais nada na vida do que roubar, aldrabar e fugir em algum momento em que prevejam acerto de contas. Mas agora que a internet proporciona a qualquer ladrão arvorar-se em figura proba e que faculta a qualquer delinquente fazer de juiz aparentemente imparcial, aí temos esses filhos do diabo a vingar o facto de algum bem ter nascido num estábulo e sobre palhas.

Sem que a gente proba disso se tenha dado conta, esses diabos instalaram já um clima de guerra civil, matando à queima-roupa quem lhes descubra o rabo-queimado de mafarrico. O que tais diabos conseguem fazer já está a ultrapassar as marcas, mas é o que querem: fazer da vida dos outros: um inferno.

Carlos Albino

    Flagrante postal de festas: Bom Natal para todos os leitores

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

SMS 391. O escaravelho da palmeira


16 dezembro 2010

Os estragos deste bicho estão à vista, o leitor sabe do que se trata. Por mais antiga que seja a árvore, por mais robusta que pareça e por mais amores que tenha coberto no jardim público ou confrontos que tenha testemunhado sem olhos na avenida da terra, aquele animalzinho ataca, mina num mundo que ele constrói no meio de um barulho arrepiante para nós, os humanos, mas que para ele é a sua música clássica.

Por regra, esse bicho adota a designação de dinâmico, veste como qualquer pessoa que se preze, percebe das causas e dos efeitos da crise pátria, entra nos cafés quase sempre sorridente com bom dia para a direita e boa tarde para a esquerda, enfim, é um senhor, mesmo que em criança, mexido como sempre foi, sentisse o tom pejorativo do que o pai ou mãe, vendo-o desmedidamente irrequieto, lhe dizia – “Moço! Até pareces um escaravelho!”.

Quando a idade lhe dá carapaça retirando-lhe o líquido viscoso de larva, é então que ele se dedica à sua principal missão e que foi sempre a mesma: roer o tronco onde se encontra alojado.

Se está num partido, rói para ocupar o espaço dos outros e sugar a melhor seiva porque a estratégia do escaravelho não é o bem comum e muito menos o interesse público. A sua estratégia é alimentar-se o melhor possível e saltar sobre qualquer outro escaravelho que lhe apareça, julgando-se nisso genial e imensamente protegido. Pois se rouba, mesmo que o assalto seja contra o colega do tronco, ele sabe que isso fica no segredo da palmeira, tão certo que está que nenhum veneno lhe interrompe a existência, seja esse veneno administrado pela calda da justiça ou pela desinfestação do voto. Contra ele, o escaravelho sabe que todos os esforços são inúteis, além de dispendiosos e que ninguém o pode enxotar.

Mas, desmiolado como esse bicho é, ele não se apercebe que as ramadas da palmeira secam, a árvore morre e com ela também fina os seus dias de escaravelho e a sua missão de roer. Tanto barulho no tronco para nada.

Carlos Albino
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    Flagrante post it: Agora que os partidos, mais ou menos, já se preparam para abrir caminho aos candidatos que vão ocupar o lugar dos presidentes de câmara em último mandato legal, será aconselhável que escolham gente com mãos limpas e sem passado confuso . O povo pode não ter ou perder a memória mas tem lembrança.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

SMS 390. O que mais choca nisto tudo

9 dezembro 2010

Sim, por entre tantas dívidas, e depois de tantas receitas, o que mais choca é a dívida de diálogo, a dívida de explicação, a dívida de consideração. Dívida política do eleito para com o eleitor, dívida cívica do nomeado para com o administrado, dívida anímica do que vive dos dinheiros públicos para com o contribuinte, dívida usurária do poder central para com cada um dos deveres regionais ou locais, como se queira. Nenhuma destas dívidas se justifica com a dívida pública. E isto que se diz não se aplica apenas às portagens – aplica-se à segurança, à saúde, ao ensino, à política ambiental, à cultura, à defesa das atividades económicas da região, por aí afora, com a sobranceria a servir de pesponto e alinhavo em muita casaca ou vestido de carapau de corrida que se intrometeu nesta democracia que devia ser estimada e não é.

É chocante que perante os argumentos da região quanto à Via do Infante e quanto à estrada 125, o ministro das Obras Públicas não tenha vindo ao Algarve assumir, explicar, ouvir, debater, rebater. Choca que um eleito para ser responsável e para representar, tenha chegado a firmar em comunicado para efeitos de Lisboa, que as portagens são apenas contestadas “por uns quantos insatisfeitos”. Choca que face à situação dramática da segurança, o ministro da Administração Interna só venha ao Algarve para inaugurar uma pen drive, cumprimentar a governadora civil e meia dúzia de graduados, pois quanto ao resto cada um que se governe e que as forças de segurança, sem meios, sem recursos e sem ancoragem, se amanhem no balcão de atendimento a que cada vez menos as vítimas recorrem. E por aí fora.

A metáfora que ocorre para descrever este dia a dia de sobranceria que mina a democracia julgando-se eterna e auto-suficiente, tem muito a ver com o escaravelho da palmeira ou com a formiga branca, esses bichos que, depois da distração vital de comerem tudo, acabam vítimas de si próprios. Fica para a semana o apontamento precisamente intitulado “Os Escaravelhos da Palmeira”...

Carlos Albino

    Flagrante imaginação: Essa, a do convite ao príncipe britânico para uma lua-de-mel no Algarve. Ao menos houvesse a certeza prévia da aceitação, como mandam as regras para quem não quer fazer papel de ingénuo. É que um príncipe daqueles fazer uma lua de mel com tais efeitos não é propriamente o mesmo que entrar num concurso da TVI...

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

SMS 389. Eles perdem a razão esta noite

2 dezembro 2010

Quando a anterior ministra da Educação humilhou os Professores, fui dos que se insurgiram contra essa perversão política, sem deixar de reconhecer aí pelo meio alguns (poucos) pretextos da governante em algumas (também poucas) situações de manifesto abandalhamento – também não era por via da humilhação que tal mal se curava. Continuo a pensar da mesma forma quer perante a perversão política quer face ao abandalhamento, pois é sempre abandalhamento qualquer divórcio da Sociedade.

Naturalmente que aos intelectuais ou aos que fizeram dos livros a vida, e do ensino uma missão como numerador e profissão como denominador, não se exige que encham o Estádio Algarve e gritem contra o árbitro num afamado Benfica-Cachopo, como também ninguém esperará que sejam os magalas recrutados à força em Albufeira, os nómadas da Andaluzia, ou ainda os calceteiros marítimos de offshore e os canalizadores aeronáuticos que dão em gestores públicos quando falhada eleição os subtrai de emprego político, ninguém espera que essa gente do subterfúgio componha a sala algarvia, qualquer sala onde se ouça alguém que seja referência do pensamento, da arte, da história, da economia ou da ciência. Aí, nessa sala, seria de encontrar e até se exigiria encontrar como mancha predominante da assistência, não os putativos assessores mentais da ex-ministra mas, sim, os Professores, sobretudo os da terra e arredores. Infelizmente, ocorra isso na sala nobre de Portimão e as presenças são quinze exceções e já é bom; em Lagos são onze dos cinquenta que deveriam estar; em Tavira, sempre a meia-dúzia; em Lagoa, ficam no Carvoeiro; em Silves, os sete da simpatia circunstancial e, com sorte, mais sete arrastados; em Olhão, quem não vai descarta-se sempre com a tal desculpa que os caixeiros-viajantes de outrora usavam para a noite fora de casa; e até em Faro, santo deus, se não há convite personalizado e confirmado, as altas importâncias ficam nas pantufas, pois na sala, dos cento e vinte e quatro aguardados, é o quarteirão do costume.

Dir-me-ão uns que isto acontece por efeito do “desenraizamento”. Outros, que foi falta de “comunicação”. Outros ainda, que os “bilhetes” são caros. E poucos, lá confidenciam num assomo de sinceridade que o “evento” coincidiu ou com o Benfica-Cachopo, o Cachopo-Sporting ou o Porto-Coiro da Burra.

Não vale a pena bater mais no ceguinho: a ausência dos Professores dos atos culturais públicos, por mais piedosas que sejam as desculpas, é a prova de que não há Vida Cultural, pois não há vida cultural e cultura viva com os Professores divorciados da Sociedade e à margem de tudo o que aconteça fora das escolas – ou seja, que não sirva para curriculum e prejudique o conforto da pantufa.

Sejamos claros: se alguma coisa cultural de importante ocorrer esta noite, seja em Lagos, no Coiro da Burra, em Tavira, no Cachopo que é prova dos nove, ou nessa prova real que é Faro, e os Professores em peso lá não estiverem, eles perdem razão esta noite.

Carlos Albino

    Flagrante México in Algarve: O México não tem culpa, mas três encapuzados, nesta segunda-feira, entraram pelo snack-bar em zona rural, raptaram um homem, obrigaram-no a entrar para o seu furgão de distribuição de cigarros que roubaram, abandonando o infeliz em sítio ermo. Dois soldados da GNR à paisana presenciaram a ação mexicana e ninguém levantou um braço, e para quê se a justiça existe? Voltámos ao Remexido do século XIX, já nem é necessário recriação teatral.

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

SMS 388. Uma enorme desconfiança


25 novembro 2010

A comunicação social está cheia de assaltos, crimes violentos e relatos da ladroagem à solta mas o que se escreve, filma e descreve está longe de transmitir a imagem real do que as pessoas sentem e temem. Na verdade, por cada casa que ainda não foi assaltada, há cinco ou seis à volta que foram – há zonas do Algarve onde isso já entrou na rotina e onde novidade será não ter havido assalto a vivenda ontem ou anteontem, seja casa de rico, de pessoa modesta ou manifestamente pobre. Não há escolha, em certas ondas de assaltos que pela frequência, métodos e seleção de alvos, tudo leva a crer que partam de bandos organizados, sem que polícias e tribunais dêem sinais de capacidade e eficácia de combate.

E, sobretudo nas zonas rurais que são também as mais indefesas, há um crescendo de pessoas que cada vez mais estão convencidas de que as forças da ordem são inoperacionais e que haverá uma razão para que assim se pense. É verdade que os agentes até podem estar no terreno e acorrem com rapidez à chamada, mas o resultado é zero – passada uma semana ou mesmo um ou dois dias, lá vem outro assalto mais à frente ou mais ao lado.

A desconfiança aumenta sobretudo quando a lei parece estar a proteger mais os criminosos do que as vítimas e quando a máquina da justiça parece estar vocacionada para descobrir as escapatórias que ilibam aqueles a quem uma sociedade normal exige que sejam alvo de castigo e sujeitos de recuperação ou reinserção. E maior é a desconfiança quando os processos ilibatórios até beneficiam agentes da autoridade apanhados em falso, como por estes dias foi noticiado a propósito de um caso de droga. A desconfiança é enorme, não vale a pena pintar a manta e, segundo parece, há falta de voz de comando, falta essa que a sobranceria não compensa nem resolve.

Carlos Albino

    Flagrante escaravelho: Continuem a deitar abaixo as alfarrobeiras plantando palmeiras e outras asneiras que os escaravelhos agradecem...

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

SMS 387. Sim, deputados. Ponto final.


18 novembro 2010

Todos assistimos com estupefacção ao caso do despedimento dos 336 trabalhadores da Groundforce no aeroporto de Faro, alegadamente responsáveis por metade do défice de exploração da empresa que vai na ordem dos 20 milhões de euros. De um dia para o outro, muita gente no Algarve passou a conviver com a inquietação do que pode acontecer também de um dia para o outro, inquietação essa que, numa economia regional frágil e sem variedade nas dependências, facilmente pode resvalar para o pânico, sabida como é a situação nas pequenas empresas de comércio e serviços.

Era de esperar que os deputados que se instalaram em S. Bento com os votos dos algarvios e para os representar, acorressem ao local desse sinal de desastre social e se movimentassem, se informassem, questionassem, explicassem, enfim, representassem. E o que aconteceu? Posso estar enganado mas parece-me a mim e a muito mais gente que a apenas Mendes Bota e Cecília Honório se dirigiram ao local das preocupações, com o número dois da lista de eleitos pelo PSD a dirigir um requerimento ao ministro das Obras Públicas, além de posição pública. Não se exigindo a João Soares ou a Bacelar Gouveia tal incómodo, se Miguel Freitas fez alguma coisa não se notou nada e não é para ações discretas que um deputado é eleito – para isso é-se ministro, pelo menos, ou então deputado do CDS.

Dirão alguns que possivelmente, caso estivesse o PSD no governo, os passos dados por Mendes Bota seriam protagonizados por Miguel Freitas, mas o tempo que passa não se compadece com este tipo de jogos florais ou de conjeturas perversas. Não é por se pertencer à cor do governo que não se vai ao local das preocupações nem por se estar na oposição que tal local é politicamente atraente. Um deputado é para representar quem o elege e os que o elegem sabem desde há muito e não é por calculismo político que é nas horas más que se conhecem os amigos e que os amigos se provam.

Custa-me constatar e ter de dizer que os deputados eleitos pelo Algarve, na hora que passa, não têm feito o que deles se esperaria, sobretudo os do PS.

Carlos Albino
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    Flagrante originalidade: Essa, a da oferta de 60 gravatas de cortiça à cimeira da NATO pela Pelcor de São Brás, já que, quanto a cortiça, muitos dos chefes de estado e de governo só a conhecem das rolhas que usam nos ouvidos...

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

SMS 386. Deputados. Quantos e quais


11 novembro 2010

Volta e meia, aí vem a polémica do número de deputados e do formato das listas. Até agora todos temos votado confiadamente em função do sagrado princípio da proporcionalidade entre listas partidárias enquanto os diretórios partidários, grandes e pequenos, têm afastado a hipótese de experiência dos círculos uninominais que a maior parte dos eleitores nem sabe o que são.

E por efeito desta rotina, os resultados estão à vista – os candidatos a deputados são aqueles que os diretórios centrais dos partidos querem por conveniência do momento, porquanto cada vez com mais custo aceitam as propostas das bases partidárias, estas, por sua vez também, cada vez mais acríticas e gradualmente com menor expressão qualitativa. E é assim que um círculo como o de Faro tanto faz que tenha seis, sete, nove ou vinte deputados, pois na verdade não se dá por eles a não ser por alguma passeata ou jantarada e muito menos se dá por aqueles cabeças de lista impostos pelos diretórios e que além de não serem da região nem a conhecerem, também não se interessam por ela nem têm que se interessar já que a função de deputado se converteu em emprego político de carreira, o que, julgam muitos, seria impensável numa eleição uninominal.

Na verdade, ao deputado eleito por lista partidária basta-lhe saber “gerir bem o posto”, bastando para isso uns comunicadozitos a tempo que não incomodem muito Lisboa mas que também acalmem os do burgo, uns retiros calculados e intervalados com umas cronicazitas, uns telefonemas aos chefes locais e o controlo das bases que também nada custa controlar quando se tem poder e se pode marchar majestaticamente com essa efémera unção eleitoral.

Todavia, parece que o prazo de validade deste esquema – esquema que deveras mina e corrói a democracia – está a terminar, desconhecendo-se que esquema que lhe possa suceder ou se cada vez a mais eleitores lhes interessará sequer debater que esquema suceda. Tal esquema de representatividade adulterada se é que não é mesmo traída, não pode durar muito e caso sobreviva demasiado tempo isso será sinal de que a democracia está ligada à máquina, o que não augura nada de bom. E neste âmbito, o Algarve tem aguentado de tudo mas não é difícil constatar que está deveras estragado, não digo que não tenha remendo. Sendo assim, que enorme saudade de Almeida Carrapato.

Carlos Albino
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Flagrante verdade: Faro é Faro.

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

SMS 385. Gente nossa lá fora


28 outubro 2010

Temos pouca gente lá fora, mas não nos devemos esquecer dela. Claro que há muita, muitíssima gente nossa lá fora, mas a gente a que me refiro é a que ascendeu a cargos internacionais ou de representação do estado, por carreira e mérito, e não pelo jogo político que nas mais das vezes é pura combinata.

Acaba agora de ser eleito presidente do conselho consultivo dos procuradores-gerais do Conselho da Europa, João da Silva Miguel, ali de Querença, e que é o representante de Portugal no Eurojust. À gente que temos lá fora em postos, cargos ou funções de alto nível, junta-se assim ao embaixador Américo Madeira Bárbara, representante permanente de Portugal junto do Conselho da Europa, em Estrasburgo, diplomata de carreira nascido naquele país aparte que fica entre Messines e Alte que também pode ser Silves. O embaixador Madeira Bárbara, antes de Estrasburgo, chefiou a missão diplomática portuguesa em São Tomé e Príncipe, e foi cônsul-geral em Boston, encarregado de missão para a CPLP, representante permanente adjunto na FAO e diretor dos serviços jurídicos do MNE. Além disso, o até agora homem discreto de Querença, na lista da nossa gente junta-se também ao embaixador Luís Filipe Castro Mendes, ainda embaixador de Portugal em Nova Deli e que em breve vai assumir a chefia da missão de Portugal junto da UNESCO, em Paris, mas que apesar de nascido em Idanha a Nova e depois andado pelos Açores, Chaves e Leiria, se considera algarvio pela direta ascendência e sobretudo pelo estado de alma – é filho do saudoso magistrado Afonso de Castro Mendes que colaborou neste mesmo jornal em anos que já lá vão. Além disso os que associam o nome do embaixador Luís Castro Mendes a títulos de livros de poemas como O Jogo de Fazer Versos, Os Dias Inventados, Correspondência Secreta, Outras Canções, Viagem de Inverno, Seis Elegias e Outros Poemas, Recados, Modos de Música... não se enganam. Luís Filipe Castro Mendes pertence à fina-flor da poesia portuguesa contemporânea, na qual ele inscreve sem dúvida aquela inconfundível meridionalidade que igualmente perpassa nas obras de Nuno Júdice e Gastão Cruz. Serve isto para dizer que Luís Castro Mendes é nosso.

Chegou a hora de ouvirmos mais cá na terra, esta nossa gente que sabe. Porque quanto a vê-los, só não os vê quem não é de cá ou está de passagem mesmo que naquelas “passagens definitvas”...
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Flagrante certificado: Mas José Sócrates e Passos Coelho precisam de explicadores sobre o Algarve? Mas que ideia é essa, Miguel Freitas?

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

SMS 384. Por favor, não brinquem


21 outubro 2010

O momento que passa é grave e o mínimo que se pode esperar dos políticos responsáveis (sobretudo os eleitos e os nomeados) é que não brinquem às escondidas. Responsáveis de partidos, deputados e decisores, todos têm, nas presentes circunstâncias, o dever e a obrigação de serem claros e de irem diretos ao assunto, com seriedade perante quem os elegeu e com respeito pelos administrados. Portanto, se é do Orçamento de Estado que se fala, não falem da fé, da esperança e da caridade como nos sermões morais; e se é do PIDDACC, não falem dos vinhos de areias. Não elegemos folgazões, elegemos deputados. Julgo que todos ganharemos com o fim das brincadeiras e do andar-se às curvas no discurso e no debate político faz de conta. E se quem deve não pode ter voz, diga que está rouco ou que pura e simplesmente não quer ter voz, mas não se ande a fingir por aí que se fala como se a suposta assembleia dos que ouvem fosse uma assembleia de pacientes papalvos.

Deploravelmente, o debate das implicações do Orçamento para o Algarve e o escrutínio sobre se a região está a ser ou não tratada com exceção sediciosa, está aquém do que se poderia esperar. Pelo menos até agora, dois ou três comunicados e duas ou três crónicas em jornais parece que arrumaram o assunto, os deputados eleitos pelo Algarve obviamente que vão votar com toda a disciplina pela qual os respetivos estados-maiores os vinculam, enquanto no terreno os da oposição fazem o seu esperado papel e os afetos ao poder se baixam na trincheira tal como os soldados mentalmente reservados que não querem entrar na guerra em que têm que estar, nem perder a próxima – sobretudo não perder a próxima.

Os do poder, encolhem-se, vão para as metáforas e apelos morais que já poucos suportam, e, longe da realidade ou apenas enfronhados na realidade que é a sua realidade pessoal, esquecem-se de que o Algarve precisa de ter voz não lhe bastando ter boca e que os militantes de um partidos não são deputados dos eleitores da área. Por sua vez, os das oposições obviamente que cumprem o seu papel com a vida muito mais facilitada do que quando eram poder antes de serem revezados ou porque, se nunca estiveram no poder, também nada têm a perder com a boca a fugir para a facilidade. É claro que aqueles que sabem que uma democracia, nestas circunstâncias, perde qualidade, têm a obrigação cívica de advertir antes que seja tarde - «Por favor, não brinquem». E sobretudo, para os que não são, não brinquem aos algarvios.

Carlos Albino
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Flagrante ironia do destino: No cartaz que acompanhou a construção do Estádio Algarve, bem se podia ler: «Construímos vitórias”. Nem se conseguiu o empate.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

SMS 383. Os carris do czar…


7 outubro 2010

Conta-se que os bolcheviques, nos calores da revolução russa de 1917, arrancaram os carris construídos pelo czar apenas porque, por isso, seriam caminhos-de-ferro czaristas, e que, com o mesmo ferro refundido e no mesmo traçado, reconstruíram caminhos-de-ferro então sim caminhos-de-ferro revolucionários… Vem isto como exemplo de quanto a irracionalidade pode ir longe e até ao inimaginável, não sendo coisa própria ou exclusiva de ditaduras – nas democracias também há indícios ou mesmo práticas próximas do ridículo dos bolcheviques. Sim, é à Via do Infante que nos queremos referir.

Pelo noticiário quotidiano mais recente, por aí surgiu uma associação de utentes com certidão de nascimento contra as portagens e porque algum dos promotores, como consta, é do Bloco de Esquerda, logo todos os membros presentes de tal associação e todos os futuros até à quinta geração serão forçosamente dos carris desse partido. Depois, foi o PSD da região a demarcar-se da respetiva direção nacional que impôs ao governo do PS a condição de “ou todos ou ninguém”, e em protesto claro contra as portagens, insurgiu-se contra aproveitamentos partidários mas apoiando os protestos, pelo que remeteu o ferro para a “sociedade civil” que é aquela coisa onde a política não tem código postal e, como se sabe, é tão nómada como uma tribo cigana. E estava a desenhar-se esse quadro, quando o PS da região que nos últimos dois anos tem tido pesadelos com a questão, surge a dizer, por um dali, que o partido não pode ir a reboque do PSD, mas acolá a ter de considerar como "legítimo" o protesto mas que "não alinha num protesto do BE", que, segundo o mesmo PS está a "instrumentalizar" a insatisfação de alguns…

Afinal qual é o problema? O problema da Via do Infante será apenas o de que o PSD não quer que o BE proteste ou se intrometa no protesto que deve ser da “sociedade civil”? Consistirá esse problema apenas em que o PS não sabe como protestar sem que o faça ao lado do PSD, ou seja em “sociedade civil”, ou se deve ter o seu próprio protesto não alinhando em outro qualquer protesto, fazendo excursões às obras da 125 a norte de Faro como se o resto fosse paisagem para a “sociedade civil”? E será assim tão grande problema para a Via do Infante, o BE não perder a ocasião para mobilizar apartidariamente contra o PS e contra o PSD, já que o PCP disse em junho, e parece que mantém, que os protestos devem chegar exatamente “ao PS e ao PSD”? Ou seja, o problema dos algarvios quanto a portagens na Via do Infante será o de que todos têm de protestar como que uma obrigação e para não ficarem mal no filme, e portanto cada um arrancando os protestos dos outros para reconstruir o mesmo protesto, com o mesmo ferro e no mesmo traçado dos carris do czar?

Mas porque é que um protesto, se é protesto legítimo, não há-de ter gente do PS, do BE, do PCP, do PS ou seja de quem for que não esteja seja militante de partidos ou tenha sido e já não é? E o que é isso de “sociedade civil”, como se esta fosse a da gente pura e não contaminada pelos partidos? Haverá? E será conveniente que volte a haver uniões nacionais dessas entre anónimos de trazer por casa, consoante as conveniências, já que não somos assim tantos e os que somos, mais ou menos conhecemo-nos todos uns aos outros?

Os partidos da região, mais uma vez, estão a falhar. O PS da região parece que não aprendeu com as últimas eleições, com os seus poucos deputados eleitos ou repescados a atirarem os foguetes e a apanharem as canas, com a demonização do “aproveitamento partidário”; o PSD da região parece que não percebeu que não tem peso específico nos órgãos nacionais decisores do partido, fazendo-se ouvir sem receio do sotaque sulista; o BE parece que também não percebeu que as boleias na A 22 não resultam; o PCP e o CDS pouco podem fazer, a não ser comunicados. E essa falha dos partidos será dramática se o protesto, qualquer protesto, for por acaso inorgânico, espontâneo e incontrolável – o que é sempre lícito admitir sobretudo quando os partidos não formulam com rigor, isenção e seriedade o problema, antes de pregarem a solução ou, mais grave ainda, antes de cada um, arremedo de czar ou bolchevique apalhaçado, impor a sua solução com a exclusão das soluções dos outros.

Carlos Albino
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Flagrante emoção: A de ouvir os Artista de Minerva a executar o hino nacional, em Loulé, em uníssono com as bandas de todo o país.

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

SMS 382. Região-piloto?


30 setembro 2010

Volta a falar-se da região-piloto que naturalmente será o Algarve, pensam uns tantos. Já esteve na constituição, de lá foi retirada sem grandes protestos dos deputados pelo Algarve de então, agora pretendem alguns que isso volte a ser colocado na lei fundamental, embora não se saiba se os decisores do Norte vão tratar das regiões como trataram das portagens: ou há regiões para todos, ou não há para ninguém... Falar da reintrodução da região-piloto na constituição, é pouco, para não dizer que não é nada. Já lá esteve e viu-se no que resultou. Com que objetivos, alcance e meios? Qual o calendário? Será “piloto” de quê? Sobre tudo isto, há por aí umas declarações vagas que não dão para se perceber bem as intenções políticas para se regressar à bandeira da região-piloto. Mas que convicções são essas que assim de um momento para o outro levaram a retomar um projeto com que se enganou o Algarve, há uma vintena de anos, quando o Algarve por acaso até tinha ainda alguns algarvios e não apenas gente que vem para aqui para fazer carreira que noutras paragens lhe estaria vedada?

Na verdade, com a crise que para aí estalou, é difícil admitir que o estado proceda à regionalização, ou que a queira mesmo. Primeiro, por falta de vontade, e segundo por falta de recursos. À falta de vontade do estado soma-se a corda que se foi dando aos municípios, com cada câmara a considerar-se “governo local” sem nada pelo meio antes do governo central, e com os representantes que fazem as assembleias municipais a graduarem-se em deputados... Daí que muitas câmaras e assembleias pensem que a regionalização já está feita com os municípios, sobretudo nas áreas de controvérsia geográfica que é a única coisa que o Algarve não conhece. E quanto a recursos, não vale a pena espalhar ilusões porque é preciso dinheiro, bastante dinheiro, para manter as instituições necessárias para uma regionalização a sério, dinheiro que não cai do céu – o problema não é fazê-la, é mantê-la, e a Madeira e os Açores fazem o que fazem, esticando a corda, porque estão rodeados de mar por todos os lados e por vezes não têm a consciência de que aquilo não é bem o Kosovo, mas que são duas excelentes regiões-piloto, lá isso são.

Sendo assim, é lícito admitir que a nova revoada da região-piloto é mais uma vez, um expediente para aqueles que em última análise partilham a decisão política, fugirem à questão, evitarem o problema e contornarem airosamente a solução, mantendo tudo como está mas com outro nome “salvador” para a região que fizer de “piloto”... Ora se uma região-piloto do Algarve for para legitimar as mordomias que já conhecemos com a atual desconcentração de serviços e que não é mas do que desconcentração (subserviente lá para cima e prepotente para os cá de baixo), então – não, obrigado.

Carlos Albino

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Flagrante divertimento: Muito divertimento com as ideias de André Jordan...


quinta-feira, 23 de setembro de 2010

SMS 381. Instalada a confusão


23 setembro 2010

Com as portagens na Via do Infante, obviamente. Vai ser a grande confusão. Prevejo e oxalá me engane, porque o Algarve evita sempre levantar ondas, e, como está provado, mesmo quando lhe dói, come e cala, o que também não é nada bom. A solução encontrada foi do género daquela que, para curar a dor de cotovelo a uns quantos, se tivesse de criar uma dor de cotovelos geral, para todos mesmo para quem não andou ou não quis andar à cotovelada. Tem sido dito, e com verdade, que a Via do Infante não tem comparação possível com as auto-estradas do Norte e do Centro e que, em algumas áreas são um enxame. Além disso, também foi já dito que a velha EN 125 não tem possibilidades de “requalificação” e se nesta se insistiu levando-a avante, foi no interesse exclusivo de empresas projetistas e construtoras, para ganharem algum com umas rotundas aqui, umas voltas ou reviravoltas acolá, mais uns troços que destroçam além ainda mais o que destroçado está. A 125 está praticamente toda urbanizada e ocupada, como estrada só existe no mapa pois no terreno é uma grande rua com travessas, alguns becos e milhentos enfiamentos inomináveis para urbanizações de casinhotos. É certo que a 125 liga terra a terra ou localidade a localidade, mas a cada ligação dessas corresponde uma ratoeira à entrada e outra à saída, além das armadilhas pelo meio, e tanto assim é que já tiveram que colocar em extensas áreas, separadores que nem nas auto-estradas existem, verdadeiramente uns muros de Berlim separando populações, interesses, vizinhanças e serviços e que nem acessos novos em redor e na proximidade evitaram e evitam... Requalificar a 125 como estrada é deitar dinheiro à rua, como estão a deitar, e o resto se verá – cada câmara isoladamente agradece tal requalificação (sempre é mais uma obra) mas numa perspetiva de região, a requalificação é um desastre. A Via do Infante, além de ter sido construída e em grande parte paga como toda a gente sabe e como o estado parece não se recordar, é de facto a única estrada longitudinal de que o Algarve dispõe, e tanto assim é que não é apenas uma nem duas mas várias são a localidades algarvias cujos acessos foram planeados e construídos em função dessa única via, como se a 125 não existisse, porque deveras já não existe como estrada longitudinal da região – não é alternativa.

E assim sendo, parece que vamos ter confusão.

Carlos Albino
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Flagrante sorte: Na verdade foi uma sorte não termos sido literalmente passados a ferro, em Lagoa, por uma Toyota Hiace em alta velocidade, sob a arcada do Convento de São José, eram 20 e 45...


quinta-feira, 16 de setembro de 2010

SMS 380. O Luar de Quarteira


16 setembro 2010

Com certeza que é um monumento efémero mas tem dia marcado em agosto, aquela Lua Cheia de Quarteira que risca o mar, suaviza o espírito e irmana os olhares. Não há luar como esse, o de Quarteira. Não há. Ver aquela mesma lua mais a um lado à esquerda é como um crente ir a Meca e ficar desapontado, e vê-la mais a outro lado à direita é como um descrente regressar de Roma ficando na mesma – Quarteira é o local exato para se nascer e morrer por uns instantes com aquela luz atravessando o mar e o corpo. Há uns anos, nesse dia previsto, pedi ao poeta Nuno Júdice que me transmitisse o que lhe ia na alma e o que por lá ia está gravado em pedra na Praça do Mar – belo poema que até a Lua por certo já leu. Pois todos os anos, nessa noite que o calendário confirma, lá estou e se a Lua der voltas certas e a Terra não desacertar, em 2011 lá voltarei a estar. Habituei-me a esse monumento efémero desde que aprendi a soletrar, e todos os anos, por essa noite, lá vai mais um papel para a arca sobre essa dádiva de luz que vem oferecida em silêncio do outro lado da terra. Este ano, aconteceu uma espécie de oração que não pede nada e que não resisti a ler em voz alta, no extremo de um molhe, mas foi assim:

Avé Lua Cheia de prata,
que o penhor é connosco,
manuscrita pareceis vós
com todos os caracteres
e manuscrito é o fruto
do Vosso ventre, essa Luz.

Canta Lua, nesse apogeu,
cantai por nós, observadores,
agora e antes que, sem sorte,
uma nuvem Vos corte.
Além.

Carlos Albino

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Flagrantes demissões & exonerações: Recordam-se? Ainda há pouco tempo toda a gente se demitiria e exonerava e que faria isto e mais aquilo, se houvesse portagens na Via do Infante. Chegou a hora e dão o dito pelo não dito. Fazem-me lembrar o tal herói que prometia vencer batalhas com uma faca de cana…