quinta-feira, 28 de agosto de 2003

SMS 16 - Muita parra e pouca uva

28 Agosto 2003

1 - Agradeço imenso ao deputado José Apolinário a gentileza de ter enviado o relatório-síntese supostamente da actividade dos quatro parlamentares eleitos no Algarve pelo PS, ou melhor e para ser mais preciso, dos três eleitos pelo PS e de mais um para o PS que ninguém viu por cá mesmo que a Região tivesse ardido toda. Gostaria que os restantes quatro do PSD - porque não há mais - fizessem o mesmo no que toca ao Algarve.

2 - Cumprido o agradecimento, vamos à matéria do relatório. Salta dali aos olhos uma fácil colectânea de conhecidas reivindicações locais, muitas delas tão velhas que já têm barbas e outras tão gastas que não há meio de deixarem de ser bandeira dos que se revezam na oposição, numa espécie de reposição política do Senhor Feliz e do Senhor Contente.

3 - Para além das 200 perguntas ou requerimentos que garantem, e acredito, terem apresentado ao Governo (até estranho que não tenham despachado 1675 perguntas ou mesmo 8965 requerimentos porque perguntar é fácil e requerer muito mais), o relatório de José Apolinário fala do trabalhoso interesse dos deputados por 15 ligações rodoviárias, sete portos de pesca ou de recreio, quatro hospitais, quatro esquadras de polícia ou quartéis da GNR, três barras e duas passagens de nível. E ainda tiveram tempo e forças para se interessarem por uma ponte, um projecto urbanístico, um teatro, um achado arqueológico, um pólo universitário, uma escola de hotelaria, um tribunal, um estádio, um INEM, um centro emissor, um Metro de Superfície e por pouco não chegavam a Marrocos e se interessavam por uma palmeira, um camelo, um tijolo de mesquita em Fez, uma tâmara de Marraquexe e já agora a árvore que falta plantar em frente da minha terna casa de Loulé.

4 - Ah! Já me ia esquecendo, também se interessaram pela elevação de Odiáxere a vila e promoveram a excursão de 400 algarvios até às galerias de S. Bento o que, apesar de tudo, é um acto politicamente mais limpo do que essa peregrina ideia das juntas de freguesia algarvias, num gesto de duvidosa religiosidade, organizarem e promoverem excursões a Fátima como se fossem paróquias.

5 - O relatório das «actividades parlamentares» fica por aí como se um deputado fosse um «autarca» de primeira grandeza ou um «porta-voz» dos autarcas de segunda que não raro também falam como se fossem Deputados de primeira. É que no relatório e por certo também nas actividades, não há uma palavra para os assuntos fundamentais, estratégicos e da verdadeira Política na pureza desta palavra se é que ela ainda é pura. Ora, sabemos todos que um deputado é muito mais do que um compadre de presidente de junta e, naturalmente, muito menos que um enteado de Chefe de Estado por mais que deste seja predilecto a desfavor dos filhos naturais. Mas também não é um presidente simultâneo e ambulante das 16 câmaras algarvias e claro que também não será um fiscal de obras ministeriais andando de concelho em concelho com o livro de ocorrências em punho. Um deputado transporta ou deveria transportar uma Ideia, um Projecto, uma Estratégia, um Rumo de Valores, e é ou deveria ser a superior afirmação da Política. E isto é que não há meio de se ver. É um mal que vem de há muito e não há meio do mal acabar porque aqueles que optaram pela profissão de políticos, são esses os primeiros a confundir Ideia Política com chicana, Discurso Político com circunstancial tagarelice populista e Estratégia Política com colectânea de reivindicações, pelo que nada custa aceitar que perguntem e requeiram até sobre a tâmara de Marraquexe. Muita parra e pouca uva.

Carlos Albino

quinta-feira, 21 de agosto de 2003

SMS 15 - O Problema do Algarve

21 Agosto 2003

Em escassos dias deste Agosto, coleccionei uma boa trintena de episódios que me dão conta de que o Problema do Algarve não é só de infra-estruturas, de planeamento, de projectos, de engenharias financeiras, de freguesias que querem ser cidades e que mal são cidades querem ser concelhos ou, entre muitas outras questões, muito menos será da falta de navegabilidade do Arade, do Gilão e já agora da Ribeira de Alte. Estes serão meros problemas compreensivelmente atrelados à pedincha da UE que já deu tantas piscinas em vez de virtuais plantações de melão e tantos jeeps em vez de máquinas agrícolas dadas nos formulários como imprescindíveis para o «projecto». O grande Problema é de Estrutura, sim, de Estrutura Mental. Dos trinta episódios, escolho apenas sete. Aqui vão um a um:

1 – Fogos. Era meia-noite. No eirado de onde se avista a faixa apresepiada do barlavento e com o bico da Foia como manso limite da terra, via-se perfeitamente a linha trágica dos incêndios e se não se ouvia, pressentia-se a dor e os gritos de desespero de todos os que tiveram no fogo o pior dos ladrões. Ora, naquele preciso momento em que as labaredas estavam às portas de Silves e o governo decretava estado de calamidade para grande parte do Algarve, eis que nas bandas de Albufeira surge um vistoso fogo de artifício. Fogos de todas as cores, foguetório, uma festa! Não se chama a isto falta de Estrutura?

2 – Quarteira. Boa e digna Feira do Livro onde não se sabe se o artesanato é engodo para os livros ou os livros engodos para o artesanato. A organização destinou dois quiosques à Junta de Freguesia de Quarteira. Esperava eu que a Junta aproveitasse a oportunidade para mostrar o que a terra vale, o que tem, o que significa, o que deseja, enfim, que desse um sinal de que os quarteirenses não são como os búzios que só têm um pé para andar. Pois bem, um dos quiosques nem abriu, ficou vazio e o outro, foi subalugado a uma casa de bolos! Nada tenho contra os bolos a não ser quando são em demasia pois com papas e bolos se comem os tolos. Mas quando uma Junta entrega o mandato à doçaria, não se chama a isto falta de Estrutura?

3 – Urbanidade. O Homem é poderoso no Algarve e ocupa um dos cadeirões do poder regional. Digamos até que se não é o rei, parece. Chegou acompanhado da mulher. Eu estava numa das mesas da acolhedora esplanada das Portas do Céu, com três amigos de longa data. O que faz o Homem? Puxou uma cadeira, ocupou o lugar nobre da mesa, começou a falar, a falar e a falar mas nem uma com licença, nem um bom dia, nem um desculpem... E o que fez a Mulher? O mesmo. Claro que, passado um bom período de indulgente benefício da dúvida, cumprimentei apenas os meus três amigos que não sendo reis são fidalgos da urbanidade, levantei-me, deixei o Homem poderoso a perorar à vontade, afastei-me daquele Urbanidade. Quando um Poder destes é assim na vida, não se chama a isto falta de Estrutura?

4 – A condutora da Goncinha. À saída de Loulé para Faro, numa estreita e perigosa estrada tipo caminho-de-cabras de fazer desmaiar o Euro 2004, uma rapariga consegue fazer ao mesmo tempo o seguinte: falar pelo telemóvel preso entre o ouvido e o ombro, segurar o cigarro ao canto da boca, meter uma mudança forçada, fazer manobras de volante mal se aproximou de uma lombas artificiais e nem sei onde ela foi buscar a mão com que simultaneamente a tudo isto ajeitou a longa cabeleira que lhe entrava para os olhos... Resultado: uma travagem brusca, uma guinada torta e, pasme-se, como só então se apercebeu que não nasceu com mãos para tanta coisa, lançou o cigarro aceso pela janela da direita, para as bermas onde o restolho seco confina com a apreciável vegetação da Goncinha. Caso a rapariga não seja uma bombeira à paisana, não se chama a isto falta de Estrutura?

5 – O inglês reformado. O fleumático cidadão, leitor permanente de livros e que fez do Algarve segundo berço, pagou sempre pontualmente a caixa postal privativa que mantém na Estação de Correios. Por desleixo do responsável, o registo de pagamento não foi feito e cortaram-lhe sem aviso, sem apelo nem agravo, o lugar das correspondências e o inglês deixou de receber o cheque mensal da reforma. Levou três meses para resolver a situação, com o Chefe dos Correios a dizer que não e ele a dizer que sim exibindo o recibo de pagamento. Sem o seu dinheiro mensal certo, ficou com uma depressão, naturalmente. Para ele, uma Estação de Correios parece-lhe uma esquadra da Guarda Islâmica do Irão. Não se chama a isto falta de Estrutura?

6 – Mártires da Pátria. Andou muita gente por aí preocupada pelo Poço de Boliqueime voltar a chamar-se Fonte. Pois ali bem perto, a um carreiro íngreme que não tinha nome, a junta local entendeu chamar-lhe Rua dos Mártires da Pátria. Mesmo que num carreiro, fiquei curioso por esta tardia homenagem ao General Gomes Freire executado no Forte de S. Julião da Barra e aos seus companheiros enforcados no Campo de Santana e que por isso mesmo se chama Campo dos Mártires da Pátria. E fiquei curioso porque quando uma junta de freguesia revela conhecimentos, ainda que mínimos, da História Portuguesa, merece também no mínimo, curiosidade. Só que foi tudo por água a baixo quando verifiquei que a intenção foi prestar uma homenagam aos soldados mortos no Ultramar. Para aquela gente Mártires da Pátria do século XIX ou Combatentes do Ultramar do século XX, é tudo a mesmo coisa. Não se chama a isto falta de Estrutura?

7 – Fiscais. Os fiscais municipais são uma obra-prima. Alguns conseguem construir vivendas mais esplendorosas que os GNR de Albufeira, ganhando até menos que estes... Como o fazem, não sei, mas corre à boca calada por todo o lado que o regime de compensações informais a troco do olho fechado para obras ilegais, é um costume, pelos vistos incontrolável. Mas eu verifiquei com os meus próprios olhos, nestes dias, várias «obras» de bradar aos céus, na área de Loulé. Desde muros erguidos sem as regras da lei, até armazéns a abrir portões pela estrada dentro e casas acrescentadas, ampliadas a triplicar sem exibição do cartaz de licenciamento camarário, sei lá, é um regabofe. Os fiscais passam e fecham os olhos. Apenas os abrem selectivamente, como a Guarda Islâmica do Irão. Não se chama a isto falta de Estrutura?

Carlos Albino

quarta-feira, 20 de agosto de 2003

SMS 14 - Quem não deve, não teme

14 Agosto 2003

O regime democrático tem ou deve ter um credo inicial: a Transparência. Sem transparência ou com transparências apenas para inglês ver, a situação de liberdade alimenta o diz-se, diz-se, o boato, a inverdade e, por resvalo, tudo o que bate à porta da calúnia e da difamação. Vem isto a propósito do que cidadãos eleitos ou nomeados para relevante cargos públicos deviam impor a si próprios: a regra de divulgarem, em boa hora, os seus currículos profissionais e académicos, de forma exaustiva e sem hiatos. Currículos na íntegra porque quem não deve não teme. As instituições públicas regionais, as autarquias, os serviços estatais desconcentrados ou regionalizados têm lugares na Internet e é aí que deveriam constar os currículos profissionais e académicos de eleitos e nomeados. E nada melhor que alguém com responsabilidades começar por dar o exemplo, como é o caso do Presidente da RTA, instituição emblemática e em certo sentido lugar-chave de poder no Algarve. Gostaria imenso que o senhor Helder Martins divulgasse o seu currículo exaustivo, precisamente para dar exemplo. Que tornasse público o que estudou, a formação complementar que obteve, as empresas que serviu de quando até quando, se apenas em Portugal ou também no estrangeiro, enfim, a sua experiência profissional completa. Tudo colocado à vista desarmada. Em democracia, um cidadão que aceita ser eleito ou nomeado para um cargo de relevante interesse público, não deve evidentemente temer que o seu passado seja escrutinado, fornecendo ele próprio os dados sem omissões. Esta é até a melhor defesa para o eleito ou para o nomeado, antecipando-se eventualmente a alguém que malevolamente faça o currículo por ele mas mal. A Transparência (assim mesmo com letra grande) deve imperar. Aprecio imenso as «mensagens» que os presidentes de câmaras dirigem aos seus munícipes, aprecio imenso que alguns até digam que são casados e têm um número tal de filhos, aprecio muito mais que digam que são militantes deste ou daquele partido desde o ano tal com desempenho deste ou daquele cargo dentro do dito partido ou como corolário da filiação e registo com enorme satisfação que digam qual é a sua profissão. No caso das Câmaras Municipais aprecio imenso esses rasgos de sinceridade mas isso não basta, e muito menos basta quando se trata de funções que implicam o Algarve e os algarvios no seu todo. Os nossos vizinhos Espanhóis, para não falar do que se passa em toda a Europa organizada, já aprenderam há muito essa regra da Transparência, usando a Internet não tanto para plantar flores mas para ajudar a árvore da democracia a crescer e a enraizar-se. Tem portanto a palavra o senhor Helder Martins, o eleito mais recente de uma instituição do maios peso.

Carlos Albino

SMS 13 - Essa história da RTA

7 Agosto 2003

Custa-me aceitar que, depois desse enorme estendal de buscas na RTA, com apreensões de discos rígidos e com uma caterva de suspeitas atiradas para o ar, mas sobretudo depois da seta atirada certeiramente ao peito de Paulo Neves, que não haja, decorrido este tempo, nada de concreto, que não haja um indício, um sinal sequer de justificação da gravidade que levou à intervenção a qual, tal como foi dito pelos responsáveis, nem podia ser antes, nem depois. Mas porque não antes ou porque não depois? Naturalmente que os algarvios sérios e honestos que felizmente são muitos, muitos mesmo embora calados, ficaram em estado de choque com o sucedido, tanto mais que a operação e a forma como foi suportada pelo zelo matreiro próprio da divulgação sediciosa que não se livra da fama de ter sido concertada, determinou incontornavelmente os resultados da eleição da liderança da RTA. Naturalmente que os algarviotes, que apesar de poucos são bastantes para influenciar perversamente a coisa pública (por isso é que são algarviotes) devem estar a rir-se a bandeiras despregadas. E felicissimos, então, devem andar os algarviões, um reduzido número, um grupo quase insignificante mas que está para o Algarve como a pneumonia atípica está para Singapura (por isso é que são algarviões). Mas agora um pouco à distância dos acontecimentos, parece que, mais uma vez, o segredo de justiça (tão machão mas impotente) se casou com a justiça do segredo (aparentemente virgem mas mais sabida que a cobra reputada de Eva), sabendo-se que, em Democracia e num Estado de Direito, desse casamento só pode resultar geração irremediavelmente estropiada ou meia dúzia de siameses unidos monstrusosamente pela cabeça como um molho de rabanetes. Faltaram dois votos a Paulo Neves. Pelo que me dão como certo, a história da RTA já terá resultado num arguido que não é Paulo Neves e, ou redondamente me engano, ou andará muito perto da verdade a sugestão de que os dois votos que lhe falharam, foram precisamente o do segredo de justiça e o da justiça do segredo. Se assim for, que Paulo Neves conte comigo como testemunha.

Carlos Albino

quinta-feira, 31 de julho de 2003

SMS 12 - A Justiça de Loulé tem saia de 7.032 Kms!

31 Julho 203

Num processo dito «urgente» fui, com muita honra, testemunha de um cidadão íntegro porque fora vilmente ofendido e infamemente prejudicado (crime de imprensa por atentado ao bom nome e imagem pública). Por força da lei, o processo deveria ter decorrido em metade dos prazos, mas levou cinco anos. Depois do arrastamento do caso por três anos, por grave erro de apreciação dos factos por parte do juiz de Loulé, começou enfim a saga do julgamento. E fui sendo notificado em Lisboa para comparecer, como testemunha, naquele tribunal judicial, com desmedidas ameaças caso faltasse injustificadamente: ora era a multa até aos velhos 160 contos, ora era a ordem da minha comparência sob custódia... Foi assim que andei em bolamas de Lisboa para Loulé, por treze vezes, para julgamentos falhados, em cada um deles com horas e horas à espera que o juiz chegasse do pequeno almoço, que o juiz comunicasse depois do almoço, que o juiz mostrasse que era meretissimo afinal simultaneamente em Ourique e em Loulé com as respectivas ajudas para o jantar. Por treze vezes, fiz o trajecto para nada e passaram mais dois anos, num processo a que a lei impõe celeridade. Em 17 de Maio de 2000 fui remetido para 6 de Junho, deste dia o julgamento saltou para 29 de Novembro, depois para 11 de Janeiro de 2001, seguiu-se 21 de Fevereiro, tudo então remetido para 20 de Setembro, foi marcada nova data para 13 de Novembro, aqui aprazou-se 3 de Dezembro que, em cima da hora, «ficou sem efeito» remarcando-se 7 de Dezembro que, também no próprio dia, voltou a ficar «sem efeito» para valer 10 de Dezembro que igualmente não valeu, pois virou a página do calendário para 2002 e lá fui eu de novo a caminho da Justiça de Loulé em 18 de Janeiro, sem adivinhar que lá teria de voltar a 28 para então ouvir uma rapariga, verde em leis mas com cara de pelourinho, a instar-me para ser rápido porque tinha que ir almoçar… Foi então que me interroguei sobre se teria valido a pena vencer os 293 quilómetros entre a minha residência em Lisboa e o digno tribunal para colaborar com a Justiça. Feitas as contas, com as treze idas e vindas, a saia da justiça de Loulé ficou com medida registada: 7.032 quilómetros. Quem acredita numa justiça destas com saia tão larga? Ninguém. Há pouco, um amigo meu que integra o Conselho Superior de Magistratura disse-me, a propósito: «O problema é que há justiça que é caso de judiciária e judiciária que é caso de justiça». Dá que pensar.

Carlos Albino

quinta-feira, 24 de julho de 2003

SMS 11 - Jardim das tabuletas

24 Julho 2003

Tudo serve. É uma tira de papelão (com mais garatujas que letras) atado a um semáforo do cruzamento de estradas, é um pedaço de tábua (que fora antes tampo de uma mesa) atado a uma árvore com arames, é um metro de plástico (desses, do lixo) armado em faixa... Tudo serve. E até há quem vá directo às paredes, aí escrevendo, às esconsas da noite, o que de dia surpreendentemente todos têm que ler. As tabuletas, desde a «çardinhada» no tal restaurante até à «noite expectacular» no dito bar com a «selebrada artista acurdeonista» enchem estradas e ruas a cada esquina. A somar a isto, há coisas mais elaboradas, saídas de tipografias, com ar de bem feitinho e que se colam labregamente umas sobre as outras em tudo o que seja sítio. Para cúmulo, ainda há as agências funerárias que por aí andam a pôr fotocópias pelas paredes com os mortos e até missas de sétimo dia, não tanto por atenção à dignidade dos mortos mas para reforçar o negócio dos enterros por entre a forte competição em matéria de funerais. Tudo isto se faz sem regras, cada um faz o que lhe apetece, numa espécie de civilização do feio, do sujo, do abjecto e da indignidade. Tenho andado por muitos lados, nunca vi igual. Nem no México, nem em Marrocos, nem no Irão, muito menos em Malta. E que tentem fazer isso em Espanha, em França, na Alemanha ou na Itália... Por todo o lado civilizado, quem queira fazer propaganda tem lugares certos: os jornais e as rádios locais ou regionais, onde a publicidade tem regras. Câmaras Municipais e Juntas de Freguesias têm culpa, enormissima culpa por este Algarve estar convertido num sórdido jardim de tabuletas. Há muita postura que não se aplica não pelo receio de perder votos mas pelo favor ao compadre. É um regabofe. Quando terminará? Será bom que termine.

Carlos Albino

terça-feira, 22 de julho de 2003

SMS 10 - Cinco liras na avançada...

17 Julho 2003

Ter ou não ter «cinco violinos» parece ser o problema número um daquela cultura nacional confinada à bola que não deixa de ser a cabeça mais redonda que anda pelo chão... A fórmula vem de longe, dos anos 50 do século passado, impondo-se como sinónimo do melhor que há para atacar com êxito e, sem desprimor, com os pés. Ora o Algarve que não tem «violinos», felizmente tem liras - instrumentos obviamente mais divinos, muito embora não dêem para os grandes negócios imobiliários da música de violino para certas autarquias. Como não se sabe qual das liras é melhor a outra, serve a ordem alfabética: António Ramos Rosa, Casimiro de Brito, Gastão Cruz, Nuno Júdice e Teresa Rita Lopes. Desafio seja quem for a provar-me se Portugal tem noutro sítio melhor avançada de Poetas Vivos do que esta. Não tem.

Carlos Albino

segunda-feira, 14 de julho de 2003

SMS 09 - A detestável balcanização do Algarve

10 Julho 2003

Nos termos e pelos processos usados pelos que reivindicam novos concelhos neste Sul a que chamamos Região não sendo, é lícito perguntar a quem interessa uma balcanização do Algarve. Até é de menor importância, no caso em que a polémica mais se agudiza, se os de Loulé estarão mais próximos de serem bósnios ou se os de Quarteira são parentes dos sérvios, sendo eles, afinal, todos desta nossa paradoxal Croácia: rica no Litoral, remediada no Barrocal e paupérrima sem dúvida na Serra. A noção de cidadania envolve, por definição, a noção de solidariedade e é isso que não se detecta. Foi um erro crasso, ter-se impedido a criação da Região do Algarve - o único Concelho que verdadeiramente nos interessaria - tal como tem sido crasso erro manter-se a instituição das Freguesias no estatuto de menoridade ou secundarização política, sem competências e, em certos aspectos, sem a dignidade da representação que têm. A ambição de ser concelho surge assim como que querer ser balcânicamente um «Estado independente», supostamente livre de qualquer canga e sobranceria. Só que a balcanização do Algarve apenas será conseguida pelo preço de muitas e óbvias subserviências. O custo da não-Região, está à vista. O Algarve perde. Pensem bem.

Carlos Albino

quinta-feira, 3 de julho de 2003

SMS 08 - Estradas sem história

3 Julho 2003

É claro que não deixa de ser comovente que se escreva «Via do Infante» com caracteres góticos (nem a 20 à hora se decifram) e que por lá se meta a martelo um astrolábio, mas não haja lugar para o perfil daqueles barquinhos (os caíques) que tanto jeito fizeram ao D. Henrique, ou mesmo para um figo torrado que, como se sabe, foi fundamental para a aventura marítima. Todavia, é inacreditável que quer a Via do Infante quer o troço (ou entorse) que vem lá de cima, atravessem o Algarve como se o Algarve não tivesse história, sabendo-se que a referência à História é um dos poucos expedientes que, no espírito que viaja à velocidade legal, pode travar a velocidade dos loucos da frente e dos loucos que vêm de trás. Há o desvio para Silves, mas nem uma placa que assinale monumentos nacionais ou património classificado. Para Loulé, Faro, Olhão, Tavira e por aí adiante, nada também. Para o outro lado que é Lagos e dá rumo para Sagres, também nada de história... Inacreditável a cultura do betão.

Carlos Albino

quinta-feira, 26 de junho de 2003

SMS O7 - Líderes algarvios?

26 Junho 2003

Não é líder quem quer, mas sim quem tenha uma ideia salvadora ou que, para esse golpe de asa, conte com o apoio de um escol ou uma elite de pensamento, e, sobretudo, quem nas coisas sérias não faça rir. Pelo cimo dos partidos no Algarve temos visto desfilar ora uma gente cinzenta que é a cor do oportunismo, ora, com mais continuidade, uns apenas funcionários da política, zelosos mas criptogâmicos*, ora ainda – fugazmente como os cometas - uns indivíduos para quem a liderança não passará da pura afirmação do seu ego desde o Guadiana até ao Promontório de Sagres passando pelo Coiro da Burra. Daí que, por muito que nos custe, o Algarve não tem uma estratégia assumida e mobilizadora (depende das tácticas, como o turismo, por exemplo) porque também não tem elites de pensamento, não tem escol e não tem líderanças e líderes a sério. Tomar-se consciência disto já é bom começo para um futuro diferente. O que requer a humildade de que cinzentos, funcionários e cometas estão desprovidos.

* Incapazes de criar

Carlos Albino

quinta-feira, 19 de junho de 2003

SMS 06 - Portas do Céu, bonito

19 Junho 2003

Há em Loulé um peculiar parlamento. Encontram-se todas as sextas-feiras, à hora do almoço, vai para a casa dos 20 anos, à volta de uma enorme mesa redonda, armada para o efeito, nas Portas do Céu, nome da história local com origem inconfundivelmente judaica. Não é um grupo fechado, senta-se quem quer ouvir, falar e sobretudo ver. Há gente de todos os partidos, gente sem partido e até gente contra partidos. Discutem tudo, desde as questões nacionais às internacionais e, claro, os temas quentes «da terra». Quase sempre há um convidado especial, pessoa de referência. Tudo começa às 13 horas mas às 14 e 30, a mesa volta a ser desarmada. Uns chamam-lhe «grupo de pressão», outros, os que preferem andar no mar alto sem fundo, chamar-lhes-ão «línguas do mundo». Na verdade, são apenas gente serena e, diga-se para registo, gente com elevado sentido de cidadania. É mesmo bonito.

Carlos Albino

quinta-feira, 12 de junho de 2003

SMS 05 - Arma de destruição maciça

12 Junho 2003

Verdade. Grande empório turístico, envolvido num eterno nem ata nem desata com o «concelho mais rico do Algarve», a propósito de um dos habituais contenciosos entre apetites imobiliários e legalidade, dirigiu-se a uma das principais bancas de advocacia em Lisboa (com nomes eticamente sonantes da deontologia dos advogados) sabem para quê? Para a elaboração de um parecer sobre como contornar a legalidade que a autarquia teimava impôr e bem segundo parece. Ao que se chegou! Saber de leis e de direito já não serve apenas para fazer valer a Legalidade e realizar a Justiça, mas também para concretizar com êxito a ilegalidade. Chama-se a isto contribuir para o Estado de Direito, não é? As autarquias onde impera a rectidão (escasseiam mas existem ainda, acreditemos) seguramente têm que ter mais e melhores instrumentos de defesa. E digamos frontalmente que o saber contornar a legalidade tem sido no Algarve uma arma de destruição maciça.

Carlos Albino

quinta-feira, 5 de junho de 2003

SMS 04 - Os quatro modelos

5 Junho 2003

Pois que modelos no Algarve de 2003? À cabeça, Tavira. Macário Correia, pacientemente, com rigor, tornou Tavira numa cidade linda, sem inciativas pirosas, sem o folclore lambujado que se diz popular mas que é sordidamente contra o povo. Alcoutim, depois. Médico que teima (e bem) em ser dos primeiros românticos no Algarve do século XXI, Francisco Amaral é uma campanha de saúde e tirou muitas cataratas àquela esquecida parte do Guadiana. Quem não veja bem, mesmo sem óculos, não hesitará em ver um modelo na praia fluvial que é milagre no pauperrimo nordeste algarvio. Seguidamente, Olhão. Francisco Leal, cultivador nato da seriedade, colocou Olhão nos antípodas de Felgueiras (há muita Fátima aqui por perto), tirou-lhe o mau cheiro, fez da cidade um magnífico sítio para viver. E há ainda Vila do Bispo. A batalha de Gilberto Viegas pela classificação de Sagres como património mundial da UNESCO, porque tem razões de sobra para isso, cai deveras no goto. Honra aos que fazem bem.

Carlos Albino

quinta-feira, 29 de maio de 2003

SMS 03 - O dicionário de Albufeira

29 Maio 2003

Faz bem o Presidente de Albufeira, Desidério Jorge da Silva, combater o analfabetismo público, embora se duvide da eficácia das multas. Depois de tanto tempo ter-se fechado os olhos, melhor solução seria tapar as asneiras até correcção adequada. Quem, à boa boa fé, encomenda quadros publicitários e por estes paga bom dinheiro a «gabinetes de imagem» e a «empresas de comunicação», não tem a maior responsabilidade na matéria. Os responsáveis por estes gabinetes é que, devendo saber escrever, estão obrigados a entregar trabalho limpo. Mas o que decidirá o Presidente de Albufeira se alguém apanhado em flagrante analfabetismo, invocar que usou como «instrumento de trabalho» esse glossário do disparate por aí entronizado como «Dicionário do Falar Algarvio», para justificar que escreveu «mõ» em vez de homem, «sàbenete» em vez de salmonete, ou ainda «mantéga» em vez de manteiga? A última multa devia ir já para essa recolha analfabeta e a primeira para os decisores públicos que até a oferecem como imagem de sabedoria da região...

Carlos Albino

quinta-feira, 22 de maio de 2003

SMS 02 - A fundação fantasma

22 Maio 2003

Nem se sabe por quais motivos (mas adivinha-se) achou-se um incauto empresário na obrigação de entregar volumoso donativo para uma fundação que, volta e meia, até chegou a ser bastante badalada no Algarve. A cópia do cheque, datado quase sobre a hora do euro ter valor corrente, não engana: 10 mil contos endossados à fundação, levantados e certamente reciclados. Só que, desde os momentos de entusiasmo nesse gesto altruista, bem se tem esforçado o empresário em obter o documento justificativo do donativo, na esperança do legalissimo abatimento nos impostos. Em vão! E bem pode esperar todo um século porque, após consulta exaustiva, a dita fundação nem sequer como intenção consta no Diário da República . É o que se chama uma fundação fora de série como fora de série é, por certo, o ilustre fundador.

Carlos Albino

quinta-feira, 15 de maio de 2003

SMS 01 - Para bons entendedores

15 Maio 2003

Segurança, saúde, corrupção e justiça. São quatro palavras que estão na base de histórias que, todos os dias, se contam pelo Algarve fora. Há falhas de vigilância e de prevenção do crime de bradar aos céus. Há centros de saúde que matam com uma morte que não se vê mas que decorre sempre de uma prepotência tanto maior quanto mais frágil, fraco e menos influente for o cidadão. A burocracia (sobretudo autárquica) é rápida na proporção da velocidade do pagamento informal. E nos tribunais - santo Deus! - a justiça não passa muitas vezes de uma estagiária da arbitrariedade. Semana a semana, vamos tentar deslindar porque é que, afinal, o cidadão não par ticipa. Sempre em mensagens curtas porque para bom entendedor... o conhecimento das provas basta.

Carlos Albino