quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

SMS 439. Fome, apenas isso

1 dezembro 2011

As notícias da fome, depois da fome envergonhada e contida, começam a chegar à praça pública. E quando tais notícias chegam à praça pública, mal vai a coisa. As cantinas das escolas básicas e secundárias têm tapado muita necessidade e nas casas de cada um só Deus sabe o que por lá vai. O mal chegou à universidade, sabendo-se agora que muitos estudantes, isolados das famílias e dependendo dos cêntimos daqui e dali, chegam a situações de carência alimentar extrema. O que podem fazer? Pouco. Estender a mão à caridade pública nas esquinas de Faro? Quem acredita? Poucos acreditarão até porque um qualquer estudante nessas circunstâncias não é propriamente elemento de bando romeno organizado. E basta noticiar essa realidade para a resolver? Não basta. É preciso dar-lhe solução, inventariar as situações de modo a que cada um dos necessitados não se sinta tingido na sua dignidade pois a fome, em gente honesta, é mal que se sofre pela calada até quase ao limite de cair para o lado.

Muitos dos pequenos roubos que jamais constarão nas queixas de esquadra, muitos dos pequenos assaltos que não entram nas estatísticas dos que apenas avaliam a realidade pelos números a grosso e não pelas causas (então, polícias a falarem de estatísticas!), e muita da agressividade que campeia nas relações do dia a dia, têm a sua origem em situações de fome. Ou pelo desemprego, ou pela brutal interrupção de esquemas pelo Estado, ou, no caso dos estudantes, pelo dilema que se lhes coloca entre estudar ou entrar na vida, a explicação está aí. As polícias podem andar atrás dos autores de furtos mas não andam atrás da fome, não podem prender a fome e entregá-la ao tribunal da área. A fome é um ladrão que escapa a tudo e até rouba a dignidade e sensatez de quem tem fome.

É claro que os municípios, entidades do Estado comprometidas, organizações cívicas, e, no caso, a própria universidade, já deviam ter-se sentado à mesa para formularem o problema, a extensão do problema e encontrar a melhor solução possível. Não apenas um município mas todos porque o problema é comum e a fome pode residir num deles mas atuar no outro. Cada um agir por seu lado pode resolver situações pontuais e redundar em prestígio ou reconhecimento social, o que não deixa de ser perverso. O problema é do Algarve e a fome que há nas outras regiões não desculpa que não se encare o facto para cá do Vascão até às moradias da Quinta do Lago. Mas possivelmente cada um está à espera do outro, ninguém sabendo por onde começar solidariamente, até porque nem para encarar um flagelo que afeta toda a região existe Algarve. Infelizmente, o Algarve, cada vez mais, é apenas uma maneira de dizer. Esse é o nosso pior défice e nem a fome envergonhada ou já pública, a pobreza extrema e uma multidão carente mas calada, faz abrir os olhos. Vamos voltar às filas dos pobres que se faziam no final das missas dos anos 40 e 50 do século passado, a pedir “um pãozinho para o pobrezinho”, ou já se esqueceram disso?

Carlos Albino
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Flagrante património: O fado chega a património imaterial da Humanidade, processo bem conduzido e justificado. Sagres que poderia e deveria ser património da mesma Humanidade, foi para o lixo. Muita culpa do Algarve e de muitos algarvios de sofá. Ou como observava Aleixo, de muitos doutores com a mosca pousada na cabeça.

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