A palavra dívida arrumou-se ao lado de outras palavras de consolo
ou tristeza nacional e que são mais três ou quatro. Palavra que, pelo desmedido
abuso político com que é manuseada, acabou por fazer que todo um povo se sinta
punido por ter praticado coletivamente algum enorme crime contra a República
Portuguesa, contra a Europa e contra o Mundo.
Primeiro, pelas artes
matreiras alojadas na política, com uns tais artistas a resumirem a a
política ao combate contra outros artistas, ocultou-se ou dissimulou-se que o
aumento sem precedentes da dívida foi fundamentalmente devido à crise
internacional que marcou o ano de 2008. Depois ninguém quis esclarecer bem qual
a parte do endividamento externo público, a parte do endividamento externo
privado e, muito em especial, a parte o endividamento do setor empresarial.
Apenas se disse claramente que o povo teria que assumir que a dívida é
insustentável, para além de duradoura, ficando na glória quem melhor
conseguisse ou consiga nque o povo aceite uma culpa que não tem. E vieram os
cortes a torto e a direito, na saúde, na educação, nas reformas, nos salários,
cortes em tudo para todo o povo castigado. Longas explicações cifradas
acompanharam e vão continuar a acompanhar este magistério de que as televisões
se encarregam.
Por via da invocação
em vão do santo nome da dívida, parece que chefes e candidatos a chefes
querem inscrever os seus nomes (de preferência um só) no rol histórico dos
homens que reabilitaram o País. Não ouvem ninguém, só eles sabem, curiosamente
estando cercados ou mesmo tutelados pelos grandes responsáveis pela falta de
previsibilidade das causas efetivas da dívida, senão até responsáveis pelo
caminho direto para a crise, com o beneplácito que deram à prolongada especulação
financeira a que se atrelou a enorme rede de interesses que cavou o poço da
crise e, paradoxalmente, acabaram por beneficiar e beneficiam da dívida. Daí
que não queiram ouvir falar de reestruturação da dívida, que não queiram ouvir
falar de crescimento e de respeito pelas normas constitucionais, que apenas
abstratamente concordem que tal reestruturação deva ocorrer no espaço europeu.
O poço da crise é-lhes vantajoso e a dívida assumida pelo povo dá-lhes vantagem
nas colunas do desemprego que é um grande mercado de recrutamento, nas colunas
do trabalho barato e inseguro, por aí fora.
Como o que tem havido
por aí não leva a nada, antes tudo se agrava cada vez mais até porque o
tempos dos homens que sozinhos reabilitam países já passou (parece que passou,
nunca se sabe) e se não passou termina sempre mal, é claro que, no mínimo, o
que se impõe é que, no decisivo nível de representação nacional, haja debate
que leve à preparação, em prazo útil, das melhores soluções para a
reestruturação da dívida. É o que consta numa petição pública que acabo de
assinar.
Carlos Albino
Carlos Albino
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Flagrante política cultural : Pintura de campanários.
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