quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

SMS 549. Praxes e desvarios

30 janeiro 2014

Pelo que se sabe, no Algarve, onde há uma universidade pública e institutos superiores privados, não há a registar casos em que as praxes académicas resvalaram para o desvario. Pelo que nos toca, até agora, apenas há a registar casos de vítimas algarvias noutras paragens. Justifica-se uma reflexão. Claro que nada há contra praxes ou contra quaisquer iniciativas que tenham relação direta e útil com a inserção na vida e ambiente académico. A questão coloca-se quando tais praxes e iniciativas se tornam em violação dos direitos humanos, que são direitos inalienáveis e dos quais, mesmo com consentimento, alguém pode abdicar.

Ora, quando se julgava que tortura, tratamentos cruéis ou desumanos e ofensas à dignidade das pessoas, especialmente os tratamentos humilhantes e degradantes, apenas poderiam ocorrer por arbitrariedade dos Estados, em prisões ou nos patamares policiais e judiciais, eis que algumas praxes, com a cobertura jubilosa de universidades, se transformaram precisamente em exercícios de pura selvajaria e sadismo. O Estado Português ratificou o corpo principal das convenções contra a tortura e tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes, assumindo a responsabilidade da sua prevenção, designadamente nos locais onde se encontram pessoas privadas de liberdade, como é o caso em que os territórios de algumas dessas praxes se converteram, como verdadeiros espaços de execução extra-judicial. Assim sendo, não é apenas em casos em que há mortes que o tema é relevante. É sempre. O Estado é responsável, competindo-lhe, além do desenvolvimento de programas de educação, conjugar medidas legislativas, administrativas e judiciais, na prevenção e na repressão dos talibãs de trazer por casa. E as universidades que cobrem tal folclore de sadismo não devem limitar-se a promover "inquéritos" quando há mortos. A proibição de tortura e de outros tratamentos cruéis ou desumanos e ofensas à dignidade das pessoas, especialmente os tratamentos humilhantes e degradantes, é reconhecida como norma consuetudinária no estudo do Direito Internacional Humanitário Consuetudinário, e mal está uma universidade, seja ela pública ou privada, quando desconhece isso, quer passar ao lado disso ou quando julga que pode sacudir isso do capote.

Não é mal de agora. As praxes académicas são tão velhas como a abolida Inquisição. As duas "festas" andaram historicamente uma ao lado da outra, uma a sério e com supliciados a sério, sobretudo em Lisboa e Évora, outra a brincar e com supliciados a brincar, com capital em Coimbra. À nascença, as praxes imitaram, umas satiricamente, outras zelosamente, rituais e vestimentas dos autos de fé, com o mesmo sermão inicial, procissões dos condenados e suplícios. Todos temos visto os "praxados" vestidos de sambenitos amacacados, com "máscaras de infâmia" igualmente amacacadas, submetidos a um “inquisidor-mor” amacacado, por aí fora. A coisa pode dar para a brincadeira, e ser vista com óculos de tolerância, mas tem estado à vista desarmada, que a coisa tem resultado em exercícios histéricos de delinquência, com tratamentos violentos, humilhantes e degradantes. Quanto a praxes, é das violações dos direitos humanos que compete tratar e prevenir. Essa é a linha divisória.

Carlos Albino
________________
Flagrante erro e desfeita: A transferência da gestão dos portos de Faro e Portimão para… Sines. Nem dá para acreditar. Mais uma. Qual será a próxima?

Sem comentários: