Sempre que há eleições, quando chega a hora de prestar contas ou de
prometer mundos e fundos na mira de novo contrato de representação, os
“interesses do Algarve” são elevados a categoria de causa e mal de quem não
pugne por tais interesses, mesmo que os não especifique. Mas afinal o que são
ou quais são em concreto os interesses do Algarve que sejam assim tão
diferentes dos interesses do País? Caso sejam interesses deveras do Algarve, a
sua consideração deveria ser transversal a todos os partidos e cada força
política organizada na região deveria apresentar, antes de mais, a sua
formulação própria dos problemas que tais interesses suscitam, e, depois, a
solução que também autonomamente preconizam, propondo ao eleitorado a escolha
dos representantes (eram oito, passam a ser agora nove) que defendam tais
interesses e se comprometam a não os deixar cair em cesto roto. Numa democracia
madura, sadia e que funcione, será assim. Caso a democracia não funcione, a
representação acaba por se transformar num equívoco perigoso ou até mesmo num
exercício inútil e desencorajante.
À falta de reflexão consolidada e em tempo, ou por efeito da rotina
espúria que transforma a representação em emprego político, prémio por bons
serviços ou direito adquirido por carreira, os interesses do Algarve são
alinhados à última hora em função de carências gerais mais ou menos evidentes,
mais ou menos sentidas, mais ou menos localizadas. E isso, quando a definição
do que sejam tais interesses não fica ao arbítrio de cada líder circunstancial,
da sua capacidade imaginativa ou da sua verve interventora. Naturalmente que o
elenco de carências, da saúde aos transportes, da educação à agricultura, de
alguma indústria às pescas, por aí fora de setor em setor, será coisa que se
prende mais com o bem comum do Algarve e este bem comum em pouco diferirá do
bem comum do País – o elenco de carências não é suficiente, e está longe de
poder recortar aquilo que se poderá considerar como interesses do Algarve,
interesses tais que sejam sentidos por todos os algarvios e só por estes. Por
hipótese, por esta ordem de ideias, até de pode admitir que na verdade o
Algarve não tenha interesses, um único interesse que seja – tenha apenas
carências, carência de um porto de pesca, de uma barra, de mais uns quilómetros
de ferrovia decente, enfim, de uma lâmpada na esquina à saída de Portimão ou um
centro de congressos no Cachopo. Pois carências sempre haverá.
Só que ao longo do tempo, bem ou mal definido, parece que tem
havido um interesse claro e inequívoco: o interesse na regionalização, o
interesse num modelo de administração autónoma e participada diretamente pelos
administrados, e que, paradoxalmente custe menos ao Estado, ao mesmo tempo que
se apresente como alavanca para mais riqueza – riqueza geral da região e
obviamente riqueza para o Estado. Esta não é uma carência, é um interesse. Pode
haver mais interesses, mas esse é sem dúvida um interesse bem identificado.
È óbvio que o Algarve não precisará de eleger turistas, mas também
ficará mal servido se eleger representantes que mais não sejam do que agentes
de exceção sediciosa contra os seus interesses, contra o seu interesse, tapando
o sol com a peneira das carências.
Carlos Albino
Carlos Albino
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Flagrante Aleixo: Porque será que nós temos/ na frente, aos montes, aos molhos,/ tantas coisas que não vemos/ nem mesmo perto dos olhos?
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