Sim, a identidade é um caleidoscópio – agita-se e os mesmos elementos surgem sempre diferentes. A gente bem pode estar ver o Algarve antropológico e até se pode julgar que se vê, mas ao mínimo movimento as peças desarrumam-se e o que se pensava ser um genuíno contributo de Aljezur em nada passa a diferir de Castro Marim. E com o Algarve sociológico? Mexam o assunto que aquilo que aparece arrumado se desarruma como em todo o lado. O que será então “ser Algarve” que leve a considerar que alguma coisa, conforme a fronteira, possa “não ser Algarve”? Traçar a identidade no mapa é fácil – todos sabemos que, por aquela linha, Almodôvar não é Algarve e que o Vascão, ribeira que de vez em quando parece arremedo de rio, é metáfora política em momento de prova de vida. Só que o mapa não é critério podendo ir mais além ou ficar mais aquém e nomes de mapa são nomes – tanto podem servir para certidão de nascimento como para epitáfio. Também fácil será demarcar a identidade pelas tradições ou por aquilo que, segundo a tradição, se julga ser a tradição, por aquilo que é velho e sabido costume... Muito da identidade do Algarve tem sido escavado por aí, por vezes escavado até à exaustão e à ficção, diga-se. E então “ser Algarve” será mais ou menos o que “era”ou se julga que “foi Algarve” e, não se indo além do circunstancial, ou a tradição atropela a História ou é esta que atropela a tradição. Fica assim sem explicação, aquele corridinho polaco a um canto, a cataplana polaca noutro canto, o gnómon de Sagres mais velho que as urtigas na sala corporativa de historiadores rasos, a chaminé dos lares romanos ao abandono e à espera que a substituam por uns buracos em cimento moldado à macaca na Mealhada, um “mák’jêto” a figurar na palhaçada da anedota, umas chapadas de cal para a fotografia ou uma velha muito velha a cavalo num burro, mesmo que isto seja corriqueiro na Sicília, uns quantos advérbios idênticos aos de Trás-Os-Montes e outros filhos da Galiza sem que se saiba ou queira saber como voaram sobre as Beiras e o Alentejo, uma aguarela de um caíque e haver aguarela é uma sorte, uns folhetos do turismo que, sobre o Algarve, nem sequer copiam a parte melhor da velha enciclopédia de que Mário Lyster Franco foi o redator regional... E andamos nisto há anos, sem o trabalho de identificar o Algarve pelo reconhecimento dos valores ou pelo entendimento dos elementos de coesão que existem no Algarve, mesmo os seus elementos nómadas, e que determinam que o Algarve seja isso mesmo e não mera bandeira ao vento.
Dá para continuar.
Carlos Albino
Carlos Albino
________________
Flagrante questão: Não será adequado pedir-se à televisão da Andaluzia para, no interesse público, dedicar atenção ao Algarve? Em castelhano que seja.
Sem comentários:
Enviar um comentário