Deve-me ter escapado algum depoimento mas julgo ter lido praticamente todas as declarações por palavras que não voam, i.e. imprensas em papel de jornal, ditas pelos cabeças de lista do círculo eleitoral de Faro. Todos eles, sobretudo os que se reputaram com a fama de elegíveis, não sendo oriundos do Algarve (o que é de somenos importância) nem tendo histórico político identificado com o Algarve a ponto de a legitimidade de o representar coincidir com a credibilidade cívica da ligação aos eleitores (e isto é que está em causa), pois todos eles se esforçaram por ou atenuar ou secundarizar a forma como tomaram ou tiveram que tomar cada um o seu comboio para o Algarve e em alta velocidade. Com particular curiosidade segui os depoimentos de Bacelar Gouveia (de Lisboa, PSD), João Soares (de Lisboa em parte por via da Fuzeta, PS), Cecília Honório (de Cascais, BE), Paulo Sá (de Guimarães, PCP) e Artur Rêgo (de Luanda, CDS). Cada um disse o que pensava sobre as questões essenciais do Algarve, tudo bem, são responsáveis, de maior e vacinados.
Mas há um depoimento que deveras me chocou e até me entristeceu. Foi o de Bacelar Gouveia. Para justificar a sua falta de ligação ao Algarve respondeu que há pessoas de referência da região que não são algarvias, dando como exemplos o bispo do Algarve (transmontano) e o treinador do Olhanense (do Porto), reduzindo depois essa questão a um «aproveitamento bairrista». Ora, Bacelar Gouveia adulterou o fundo da questão e as analogias que estabelece entre a eleição do principal representante da região no parlamento e o bispo do Algarve ou treinador do Olhanense, roça o insulto a quem vê a política e espera da política mais do que uma missa ou um pontapé na bola.
É claro que não basta dizer que se conhece o Algarve (o da vida diurna? nocturna? O dos golfes? o dos iates?) para daí se concluir que há uma identificação política – política, repita-se, na dignidade da palavra ou na dignidade que ela devia ter sempre – com o eleitorado, com os cidadãos que do Algarve fazem a sua vida e dele dependem. Também não basta ter-se nascido no Algarve para se ser algarvio, nem é preciso repetir a Bacelar Gouveia que alguns, e não são poucos, nasceram no Algarve mas são politicamente um erro da natureza. Não há qualquer «aproveitamento bairrista» exigir-se aos que se propõem representar o eleitorado algarvio no parlamento um perfil de identificação cívica e política com a vida algarvia, a que reside aqui, aqui trabalha e aqui vai morrendo em cada segundo que passa, e não a que para aqui vem em calção curto, começando o Algarve no Mar-e-Guerra e terminando no Patacão, cabendo num circuito do Minibus de Faro.
Bacelar Gouveia obviamente desconhece que os algarvios sabem muito bem o que é o bairrismo, sabendo melhor que o senhor bispo de Faro, por melhor transmontano que seja, dificilmente treinará bem o Olhanense, assim como se duvida que o treinador deste clube, treine ele melhor que ninguém, diga melhor missa e faça homilia mais excelente que o bispo. É preciso continuar?
Carlos Albino
- Flagrante naturalidade: Por acaso, João Soares até conseguiu fazer-se mais algarvio em oito dias do que o n.º 2 e a n.º 3 da lista do PS durante anos.
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