quinta-feira, 15 de setembro de 2016

SMS 684. Nós, os políticos…

15 setembro 2016

A palavra paradigma aplica-se com justeza a José Manuel Durão Barroso. Já andámos por muito tempo e cansativamente à procura de “um novo paradigma” para a política portuguesa, os políticos que se dizem fora da política ativa para não falarem das coisas pelos seus nomes usaram até à exaustão a palavra paradigma, para os que surgem a pregar nos canais de televisão como tempos dissimulados de antena e nas colunas partidárias cativas em jornais já foi paradigma para um lado e paradigma para o outro, houve um tempo em que Portugal era uma chuva continuada de paradigmas sem que alguém explicasse com clareza a que paradigma de referiam. E como as modas paradigmáticas pegam, nas campanhas eleitorais lá saltava da boca a palavra paradigma, desde o candidato a deputado que, omitindo ideias por vezes por manifesta impotência, pronunciava o seu paradigma como dentífrico, passando pelo candidato à câmara que não botava discurso sem 47 paradigmas, até aos concorrentes das freguesias - houve um que, verberando o presidente de saída por falta de obras públicas e prementes, se propôs, caso ganhasse, à “construção e inauguração de um grande paradigma no centro da freguesia”… Pelos vistos, toda esta gente, ao falar de paradigma, além de gastar a palavra, parece que não sabia o que estava a dizer. Não é o caso de José Manuel Durão Barroso que sabe muito bem o que é um paradigma, e agora mais sabe até porque ele próprio se converteu num triste caso paradigmático, a contrastar com o teor dos discursos laudatórios, quer do condecorante quer do condecorado, mal deixou de ser um paradigmático presidente da Comissão Europeia, por supostos serviços prestados ao paradigma nacional.

Em simultâneo com a “era dos paradigmas”, foi também inaugurada a fase dos discursos dos que mal abriam a boca, usavam o plural majestático - “Nós, os políticos…” Talvez para fazerem crer que os  políticos, assim auto-discriminados, eram uma espécie em vias de extinção a qual urgia ser protegida, talvez para inculcarem a ideia de que tal espécie humana incluía apenas sacrificados em nome de um difuso interesse público, ou então predestinados, sabe-se lá por que critérios divinos, para servirem os outros heroicamente. A vida política era assim apresentada como que um “sacrifício público” sem paga possível. E para justificar a falta de qualidade de tais sacrificados ou predestinados, chegou-se a espalhar o receio de que ninguém, nenhum quadro ou nenhuma inteligência reconhecida queria “entrar para a política” e assegurar a continuidade da espécie. Na verdade, quem os ouvia e infelizmente ainda ouve, também se referiam e referem aos imolados usando o “Vós, os políticos…”

Os factos acabaram de anular os receios - são bastantes, muitos e cada vez mais os que querem ser políticos, desde que a política lhes faculte o paradigma de uma carreira, pela qual subam até mais não, por via dos paradigmas filtrados e administrados por pequenos colégios ou grupos (locais, provinciais e nacionais, porque europeus ainda são uma ficção sem hino sentido, sem constituição a sério e sem bandeira que ocupe o lugar número um do estrado). Os paradigmas saídos dessas minorias (quanto mais locais, mais padigmáticas) , ainda assim podem invocar a ética política, enquanto o seu escrutínio pela sociedade for meramente formal e gerida pelos que tanto dizem “Nós, os políticos…” como pelos que se isentam com o “Vós, os políticos…”, não se saindo daqui.

José Manuel Durão Barroso é um mero caso paradigmático de quando a política e a ética não se apresentam como duas retas paralelas que garantam a qualidade da Política e da Ética. Fez-se vítima da ratoeira do seu próprio paradigma. É um caso paradigmático de topo, é certo, mas há mais, muitos mais casos de tais paradigmas: nacionais, provinciais e locais.

Carlos Albino
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Flagrante prova de RTP Regional do Porto: A Universidade do Algarve segue na tendência de consolidação do número de candidatos colocados na 1ª fase do Concurso Nacional de Acesso ao Ensino Superior acima da média nacional (51%). O noticiário nacional da televisão pública feito a partir do Porto, foi ali à Universidade do Porto, à distância de um braço que Marrocos fica longe. Isto é que é regionalite aguda.

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