quinta-feira, 1 de setembro de 2016

SMS 682. Sim, por uma sociedade decente...

1 setembro 2016

É um título de livro. Calma, que não é súplica, apelo ou, muito menos, reprimenda. Cheguei à página final, a 268, e dei por mim a repetir – “Este homem pensa, precisamos de pensadores como este”. Sim, “Por Uma Sociedade Decente”, é o livro* mais recente de Eduardo Paz Ferreira, um professor catedrático da Faculdade de Direito de Lisboa que nos fala terra a terra. Aliás, seria bom que falasse e fosse ouvido de terra em terra. Não vamos aqui falar sobre o livro, mas do livro. Oito capítulos, cada capítulo com uma mão cheia de breves ensaios que acabam por ser um filme das esperanças e pavores dos nossos dias. Filme pensado sobre o que há a fazer e nos deve comprometer no que esperamos de bem, e pondo o dedo nas feridas de que nos queixamos quando nos apercebemos que a vida apenas faz sentido em sociedade. Numa sociedade que seja decente. A vida só não faz sentido numa sociedade indecente.

Vale a pena descrever ou seguir à letra as cenas deste filme de ensaios de Eduardo Paz Ferreira, com tomadas e planos que dão interpretação às cenas dos nossos dias, as quais suscitam discussões, geram inquietações, e, se ou quando o filme for falado em língua não materna, só tem legendas decentes na hora do voto, seja este sim, não ou nim. O filme abre com uma interrogação: “Setenta anos depois da Segunda Guerra Mundial: o que ficou do espírito de 45?”. Segue-se a cena de que tantos falam, poucos entendem e bastantes se aproveitam para enriquecimento sem justa causa: “Estado Social: ascensão e crise”, a que se segue um diagnóstico já do tempo de gente hoje madura - “A década de 70: um mundo novo, valores em mudança”. Depois, uma pergunta sacramental para famílias sem empresa, empresários sem família e ofícios correlativos: “O Estado pode pouco?”. E não poderia ser omitida a cena que, em língua materna, tem por título “O declínio dos sindicatos e a economia do biscate”. A seguir, a cena que se entende por gestos como no cinema mudo, mas que poucos ousam dizer decentemente em voz alta: “A desigualdade mata as pessoas. A desigualdade mata as economias”.  E tal como na linguagem cinematográfica há um elemento essencial que se chama corte, lá se segue o corte: “A sociedade de consumo: as avenidas da liberdade”. E para remate da ação, uma cena titulada entre aspas porque pega no título desse notável livro de poemas de Luís Filipe Castro Mendes: “A Misericórdia dos Mercados”.

Eduardo Paz Ferreira chamou à cena final deste filme de ensaios – “Em jeito de conclusão: uma proposta modesta, começar de novo”. Aqui é que surge um senão, porquanto é de lhe pedir que não conclua – continue. Uma conclusão pertence a tratados, e ensaios são para continuar, continuar e continuar a luta por uma sociedade decente.

* “Por Uma Sociedade Decente - Começar de Novo vai Valer a Pena”, Eduardo Paz Ferreira (Marcador Editora/Presença, julho de 2016)

Carlos Albino
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Flagrante deficiência: Com tanto festival por aí imitando-se uns aos outros, falta um festival - o dos Macacos de Imitação.

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