O nosso
Teixeira Gomes, como se sabe,
cultivou uma ideia helénica do Algarve. Em páginas ou passagens apuradas, ou
ele não fosse um dos maiores estilistas da língua portuguesa, deixou-nos a
ideia de um mar grego, rochas gregas, praias gregas, rostos e corpos gregos.
Apenas não referiu a existência de cidades-estado porque, também, no seu tempo,
Portimão não era Esparta, Faro não era Atenas, Tavira muito longe de ser Tebas,
e Loulé ainda mais longe de ser Tróia embora fosse a Turquia do Algarve. Sem
cidades-estado à vista, Teixeira Gomes construiu um Algarve lendário e tudo o
que a realidade apresentasse como mau exemplo de civilização e de cultura, isso
estava ao nível das ruínas, ainda assim belas ruínas para reforçar
romanticamente a última zona da terra ainda povoada de heróis, deuses, ninfas,
com sibilas e seus maridos, para não falar de algum Menelau em Olhão, algum
Agamemnon em Albufeira, um Heitor em Monchique, Acrísio em Alcoutim, Teseu em
Castro Marim, Príamo em Lagos, Aquiles em Lagoa, Jasão em Vila Real, um
Estentor na RTA, um Belerofonte na CCDR, algum Odisseu em Aljezur, certo Academo
na UALG, imaginem, um Ájax em São Brás, e qual Leonteu em Loulé, Neoptólemo em
Tavira, Páris em Portimão, Pátroclo na AMAL, Protesilau em Vila do Bispo, um
inesperado Sufax em Faro, e, muito embora a frase vá longuíssima, ainda cabe um
Astíanax em Quarteira numa homenagem aos mega-aldeamentos turísticos cheios de
gregos, às empresas municipais cheias de troianos e aos majestosos hotéis
cheios de cavalos de madeira low cost.
Todo este
mundo helénico que Teixeira Gomes
não conheceu nem anteviu, permitiu-lhe ver no Algarve, a Grécia Antiga que
modelou a Europa. Hoje ser-lhe-ia difícil sustentar a lenda, embora o céu
continue azul, as praias estejam cheias de deusas desembarcadas, e o mar seja
um mediterrâneo um bocadinho maior do que aquele que Ulisses atravessou mas
permitindo que cada cidade-estado tenha o seu mar Egeu sem as mil ilhas – Faro
e Olhão ainda têm algumas mas não chega, sobretudo com as demolições.
Estamos,
portanto, com as nossas cidades-estado
cheias de heróis, de deuses e até de guerreiros, com um brutal senão: sem
cultura, mesmo a clássica. Muita animação de heróis, muito espetáculo de deuses
e até muita gritaria eufórica de guerreiros, mas sem cultura, na definição
clássica. Numa Grécia destas, em algum ano próximo, até Agosto deixa de ser
Azul.
Carlos Albino
Flagrante condecoração: A Polónia, dia 12 de Maio no Palácio Foz, por intermédio do seu Embaixador em Portugal, Prof. Bronisław Misztal, confere a José Mendes Bota a Cruz de Cavaleiro da Ordem de Mérito da República da Polónia. Mais um louletano distinguido, no caso, por factos, independentemente dos argumentos.
Sem comentários:
Enviar um comentário