O mais
correto seria colocar aspas nas duas
palavras do título deste apontamento: “políticos” e “técnicos”. Ou então, aspas
numa e noutra não. É claro que, em função daquilo a que a generalidade das
autarquias chegaram, me refiro às duas classes que determinam o mapa dos corredores
por onde circula quem decide, e também dos gabinetes onde são congeminadas as
decisões. Os políticos são eleitos, chegam e partem como entraram, ou mais ou
menos avantajados, mas um dia partem, acompanhados da corte ou por metade dela;
os técnicos são nomeados, seja qual for o desvio ou atalho, não têm corte mas
têm hierarquia, e o chefe, das duas uma – ou leva muito a sério a importância
de não ser eleito e faz o que quer, o que lhe apetece e o que lhe interessa; ou
não leva isso a sério e permite que sejam os políticos a fazerem o que lhes
interessa, o que lhes apetece e o que querem. Conforme os casos, assim uns e
outros merecerão dos eleitores e dos contribuintes, aspas ou não, se é que
eleitores e contribuintes, já eles mesmos não sejam contribuintes entre aspas e
eleitores entre comas.
É claro
que há técnicos que não têm nem
podem ter problemas com as aspas. Assim por exemplo, o técnico municipal que
iça as bandeiras, trabalho, como se sabe altamente especializado e para o qual
se exige no mínimo um mestrado. Em contraste, há outros técnicos que apenas têm
problemas e estes são, de manhã até à noite, problemas com aspas. Assim, também
por exemplo, engenheiros e arquitetos, que são os “técnicos” que, nas
autarquias, podem colocar aspas ou retirá-las ao sistema de saneamento ou
escoamento dos interesses e à armação da “arte pública” do favorecimento
privado, são os que estão mais à vista, alguns até auto-convencidos de uma infalibilidade
em que nem o papa já acredita.
Há
políticos que, temerosos, assinam de cruz o que os técnicos lhes ditam; há técnicos que, impedantes, vão
colocando os políticos na cruz. Também há o contrário, mas em todos os casos, o
único acordo tácito entre uns e outros e que traduz uma das poucas “sabedorias”
adquiridas nestas décadas de democracia, é que procedem e decidem com um fito
nunca deveras reciprocamente confesso – o da fuga à acusação de favorecimento
indevido, e o evitar deixar pernas de fora nos esquemas da mesma sabedoria.
Atrás de cada
um destes “eleitos” e de cada um destes “técnicos”, há pequenas legiões de
funcionários proletarizados, grupos de burocratas em que o cumprimento de
formalidades, algumas horrorosas, suplanta o espírito de função e missão
pública. E é assim que algumas autarquias em que eleitores e contribuintes sem
aspas, na hora da eleição e do pagamento dos impostos, acreditaram que haveria
mudança, se converteram em pólos de descrença. Descrença nos “políticos” e
“descrença” nos técnicos, sobretudo na hora em que se verifica que, em matéria
de aspas, estão uns para os outros.
Carlos Albino
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Flagrante constatação: As demolições na Ria Formosa que são um abuso quanto à forma e uma falta de bom senso quanto ao conteúdo…
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