O Algarve dispõe de uma biblioteca pública com o nome de Sophia de Mello Breyner Andresen. Ou melhor, Loulé batizou assim a sua Biblioteca Municipal, ainda antes do falecimento de Sophia, embora a cerimónia de atribuição já tenha ocorrido depois, o que aconteceu sob forte clima emocional.
Os portugueses gostam de Sophia, os
algarvios, muito. Não admira. O facto de ter escrito sobre o Algarve, de ter
tido residências por estes locais, e de várias vezes ter assinalado o valor e
os riscos por que poderia correr esta região, fazem dela nossa parente dilecta.
Mas, mais do que por esses motivos, nós gostamos de Sophia. Gostamos,
sobretudo, porque a sua poesia tem limpidez meridional, síntese clássica, traços
de paisagem luminosa, inspiração em rostos que lembram que ela viveu aqui e
amou este mar, esta paisagem e os nossos rostos que ela procurava como pérolas
no Mercado de Loulé.
Agora, que passam dez anos sobre a sua
morte, alguns que muito a amam e a lêem, e outros que nem olharam para a
lombada de um livro seu, resolveram aproveitar o momento para fazer passar os
seus ossos do local onde estava para o Panteão Nacional. Não vamos discutir o
que fará Sophia ao lado de Amália e eventualmente de Eusébio, mas que o seu
diálogo à sombra daqueles mármores deve ser interessante, lá isso deve. Seja
como for, já que o critério de escolha de quem para lá vai sempre será
aleatório, e sempre acarretará ridículo, deixemos que as coisas estejam como
estão. Lá estão os restos mortais de Sophia naquele lugar abobadado, e será uma
forma de se lembrar que Sophia, Eugénio de Andrade e Ramos Rosa, são poetas
imensos.
Mas há um ponto que é de ressaltar. É
que existem vozes de familiares indiferentes ao Panteão a que a sua mãe acedeu,
refutando a honra e lembrando que antes a sua obra fosse estudada nas escolas
de onde foi não completamente varrida, mas quase. E nós também estamos de
acordo. Mas o que nos magoa, e é bom que se diga, é que nenhum dos familiares,
sabendo que a Biblioteca que leva o nome de Sophia no Algarve, faz uma divulgação
extraordinária das obras da sua mãe, junto dos jovens, jamais tenha tido a
honra de receber um dos filhos, sobretudo os que são ligados às Letras, ao
menos para dizer ao bibliotecário, Obrigado.
Isso dá-nos que pensar e muito. Talvez a Sophia, que soube dar os nomes às
coisas, tivesse um nome para essa atitude. Nós também temos um nome, mas não o
dizemos em voz alta.
Aqui, no Algarve, dizem que as pessoas falam muito alto. Falam alto,
para não dizerem o que lhes dói em voz baixa.
Carlos Albino
Carlos Albino
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Flagrante complicação: A burocracia oficial impõe que se chame “Biblioteca Municipal de Loulé Sophia de Mello Breyner Andresen”, nove palavras para um nome de coisa tão simples e que entra no ouvido: Biblioteca Sophia. Basta.
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