quinta-feira, 20 de março de 2014

SMS 556. O que une os portugueses

20 março 2014

Mais um estudo, por aí lançado e apresentado, sobre o que une os portugueses. Pelo que foi apresentado nas ideias mais fortes, parece que aquilo que une os portugueses é o fado, o futebol e Fátima, com alguns acrescentos. Confesso que não sei para quê estudar-se tanto. Com as televisões, designadamente a do “serviço público”, a desconstruírem na mira de audiências, dia a dia, noite a noite, aquilo que as Escolas tentam construir, reservando, por sua vez, para canais fechados aquilo que uma minoria da sociedade entende, não admira absolutamente em nada que os portugueses se julguem unidos pelo preço certo, não porque o mereçam, mas porque os produtos “à venda” são praticamente aqueles e apenas aqueles.

É claro que o estudo não refere algo mais evidente que une os portugueses, talvez porque não tenha sido referido nos inquéritos. Por exemplo, o oxigénio ou o ar que se respira. A omissão é lamentável num estudo desses, porquanto, à partida, o oxigénio une os vivos e certifica os mortos. Há outras realidades e factos que unem os portugueses, mas não nos compete completar o estudo. Fiquemos pelo oxigénio que já vai faltando à grande parte se não à maioria dos portugueses.

Mas, com ou sem ar para respirar como factor de união e como condição para articular palavras, os portugueses que citam o fado, o futebol e Fátima como instrumentos de coesão, não o fazem por medo. Fazem-no por pavor. O medo, até se expressa. O pavor, não. O pavor engole-se, torna-nos mudos, torna a sociedade muda e, paradoxalmente, até se transforma em factor de união.

O pavor do desemprego, o pavor dos salários baixos aceites pelo medo de nem isso se ter, o pavor por quem contrata livre de condições, o pavor do fisco do qual ninguém tem medo mas pavor, a que se acrescenta para muitos e para cada vez mais, não o medo mas o pavor da fome. Para não se falar do pavor do isolamento e da exclusão, o pavor da saúde se transformar num produto de mercado deixando de ser direito, o mesmo podendo acontecer com a educação, por aí fora, salvando-se apenas o fado, o futebol e Fátima. Não é preciso estudar muito, nem fazer-se grande esforço para os portugueses, na sua longa História, não por medo mas por pavor, mais uma vez se declararem muito agradecidos ao Clero, à Nobreza e ao Povo, por aquilo que os une. Obrigado.

Carlos Albino
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Flagrante capacho: Para as televisões do Porto e de Lisboa (não há outras), o Algarve é um capacho.

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