No terreno, sejamos
claros, as empresas que operam no Algarve, colocam-se completamente à margem do
Algarve e à margem das pessoas do Algarve, ou seja, à margem da sociedade. Há
pequenas exceções, que são pequenas, muito pequenas. E porquê? Porque vêem o
Algarve como um bom balcão e nada mais do que balcão para venda dos seus
produtos, sejam estes produtos uma dormida, uma garrafa de vinho, uma entrada
para o golfe, um bilhete de avião, um aluguer de carro, um saco de plástico. O
Alentejo vende aqui vinhos, queijos e artesanato (muito deste, fatela), como se
o Algarve fosse apenas o seu balcão; os dois ou três homens mais ricos de
Portugal e mais dois da Alemanha aqui têm os seus hipermercados, supermercados,
fóruns e shopings, tratando o Algarve como seu balcão; os casinos, enfim, lá
têm que deixar alguma “generosidade” mas por imposição legal, não é convicção
por quanto a convicções elas ficam todas lá no Norte do País; as cadeias de
hotéis têm os seus centros decisão longe do Algarve e para tais centros a
“sociedade algarvia” diz-lhes tanto como uma caravana de camelos estafados indo
da Argélia para a Mauritânia; a gente vê e ouve os aviões e sabe que aterram no
aeroporto de Faro, mas fora o IVA, os aviões passam por cima da sociedade e o
aeroporto é um ducado sem duque; a gente também sabe que há uns quantos cartões
gold que por aqui se instalaram mas a quem a sociedade algarvia não lhes
respeito, como se isto aqui fosse mera extensão da pata descalça da Índia e da
China; para os dos golfes, também, a mesma sociedade algarvia é apenas mais um
buraco.
Claro que quando há
“projeto” para mais balcão e quando há plano “calculado” a pôr em crise o
ordenamento, todos, desde os das grandes superfícies até aos dos buracos,
passando pelos dos hotéis, aproximam-se visivelmente da sociedade, ou do que da
sociedade lhes interessa, não pela porta da frente mas pela porta de trás. Daí
que alguns até nem tenham hesitação em dar a cara ou fazer pressão nos pleitos
eleitorais locais, para que o apoiado lhes facilite o projeto de balcão e o
plano calculado. Estes são os chamados “artistas”. Fora isso, a sociedade
algarvia e as pessoas, não lhes diz respeito, porque para esses o Algarve é um
balcão e estar no Algarve ou operar no Algarve pouco mais será do que estar ao
balcão e venha a clientela.
Fora dos tempos de
crise, a atuação destes artistas e o tipo ou grau de consciência que
revelam, até passa ou passou despercebida porque Estado e Autarquias,
designadamente por via da chamada “animação”, compensam ou compensavam
generosamente o divórcio das empresas para as quais o Algarve não tem pessoas,
muito menos Sociedade, mas apenas clientes. Em plena crise, o retrato dessas
mesmas empresas de costas voltadas para a terra onde operam mas da qual não
dependem está bem revelado a preto e branco, e mesmo a cores. Qual apoio à
cultura! Qual apoio social! Qual apoio à educação! Qual inserção na Sociedade!
Nada. Os algarvios, para essa gente, e gente ao balcão que começa logo aqui ao
pé da porta, no Alentejo, são uma espécie de condenados a cumprir pena
domiciliária com pulseira eletrónica. Por mais que digam que não, é assim que
vêem.
Carlos Albino
Carlos Albino
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Flagrante aparelho fonador: Ouvi dizer que Jorge Botelho disse que a AMAL vai ser a voz dos algarvios. O problema é que a voz depende do aparelho fonador, a saber – pulmões, traqueia, laringe (cordas vocais e glote, lábios, dentes, alvéolos, palato duro, palato mole (véu palatino e úvula), parede rinofaríngea, ápice da língua, raiz da língua e ainda o nariz. Está tudo dito.
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