quinta-feira, 17 de outubro de 2013

SMS 535. Aparelhismo, o Alzheimer da democracia

17 outubro 2013

Fazem-se os partidos para a conquista do poder ou da representação através do voto geral. As escolhas de quem se apresenta para essa conquista, a nível regional (deputados) ou local (municípios e juntas) fazem-se pelos mecanismos da chamada “democracia interna” segundo critérios em que deveria imperar a competência aliada à probidade, o dinamismo aliado à criatividade e também as incontornáveis provas públicas. Nem sempre estes critérios são tomados em devida conta, com os partidos a deixarem-se ir na onda dos jogos de influência pessoal ou a deixarem-se arrastar por interesses apostadores, voltando costas a princípios, valores, programas e ideias e a focarem o poder pelo poder na mira do poder ser exercido em função de interesses difusos ou de afirmações pessoais. Quando isto acontece, de vez em quando os partidos entram também na chamada “rutura interna”, do que resultam facções dominantes ou literalmente dominadas ou, então, mais tempo menos tempo, dão azo, por enquanto apenas a nível local, a candidaturas independentes, umas com êxito, outras não, conforme a implantação da facção dissidente e a bitola da dissidência. Também acontece, os partidos chegarem ao ponto de que se convencerem de “não terem ninguém”, recorrendo a independentes cuja independência apenas significa não estarem inscritos em partidos, o que é muito pouco ou mesmo nada para traduzir independência. Isto é normal, não é por aí que a democracia se corrói, antes pelo contrário, pode contribuir para os partidos se confrontarem com a sua própria verdade. A democracia apenas ganha com as escolhas feitas pelo critério de excelência e probidade dos candidatos, independentemente da militância ou não dos candidatos. Claro que também podem surgir os independentes fora dos mecanismos partidários mas que, na prática, não deixam de configurar uma espécie de “partidos espontâneos” ou partidos ad hoc”, com maior ou menor duração, por vezes a exercerem o escrutínio dos partidos formais e que estes internamente atempadamente não fizeram. Somos livres e o sufrágio manda.


O problema é quando os partidos, a nível regional ou local, julgando-se isentos do escrutínio público ou com resultados à vista que pensam ser favas contadas, propõem a sufrágio listas emanadas do clientelismo, umas vezes impostas pelos diretórios de Lisboa, outras vezes prefigurando a mera distribuição, entre compadres, dos lugares tidos como elegíveis. Ou seja, listas de nomes do aparelho e da vontade circunstancial do aparelho, sem atender a critérios de competência e probidade (uma coisa, na hora do voto, não se desliga da outra, e raramente o marketing político compensa essa falta de visão, como estas autárquicas, aqui e ali, comprovaram). A nível local (municípios e juntas), o fator de proximidade pode corrigir a distorção do clientelismo. Já a nível regional (eleição de deputados) essa proximidade apresenta-se muito mais rarefeita, se é que existe dado que a “vivência regional” ou identitária, no caso do Algarve, é uma figura de estilo que pouco passa para além da realidade geográfica.

As eleições para o parlamento aproximam-se (as europeias são apenas fator de consideração dos diretórios de Lisboa e o Algarve nelas pouco conta como se tem verificado) e se queremos ter deputados que representam a sério a região e desta sejam porta-vozes com constância e excelência, é esta a hora de lembrar que o aparelhismo é o Alzheimer da democracia. O Alzheimer da democracia interna dos partidos e o Alzheimer da própria democracia onde os próprios partidos se fundamentam e justificam.

Carlos Albino
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Flagrante esquecimento: Contrariamente ao que acontece com outras regiões (Açores, Beiras, Alentejo, por aí fora) o Algarve esquece e deixa cair como velharia inútil  a sua Casa do Algarve em Lisboa, quando dela a região tanto precisaria. Sinal dos tempos.

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