Pelos maus motivos conhecidos, Alberto João Jardim antecipou-se-nos
mas não é lá por isso que, pelos bons motivos, devamos pôr de lado o convite à
chanceler alemã para visitar o Algarve e ver com os seus próprios olhos como
somos exemplo a seguir na aplicação dos generosos dinheiros europeus. Jardim
convidou Ângela Merkel para verificar que na Madeira o regabofe não foi assim
tanto como dizem. Quanto a nós, nada disso, antes pelo contrário o convite
destina-se a que a chanceler certifique o bom exemplo que o estóico e
civilizado Algarve é. Senão vejamos, com dois exemplos.
Construiu-se, em grande parte com dinheiros da Europa a fundo perdido,
a única via rápida da região que era para ser de três faixas mas foi alargada
para quatro para ter a fama de auto-estrada, mas apesar disso foram
introduzidas portagens para lucro do Estado e intermediários no que é
verdadeiro mealheiro. Não é este um bom exemplo de boa aplicação de fundos
estruturais? Além disso, ao longo de anos e anos, foi prometida a chamada
requalificação do ziguezague do século XIX que, no século XX recebeu primeiro a
designação de Estrada Nacional 125 que de nacional nada tinha, e já no último
quartel haveria de se chamar “estrada da morte”, pois em cada curva e em cada
lomba a meio de cada pequena reta com casas de habitação e de comércio a cada
lado, lá está a memória de incontáveis mortos ceifados no melhor da vida, mesmo
com a célebre tolerância zero na circulação a 50 Kms à hora e correspondente
caça à multa, porque aquilo é só caçar. Houve, na verdade, aqui e além uns
arremedos de requalificação que mais não são do que muros de Berlim separando
gentes e haveres, e, exemplo do horror, emparedando por exemplo o Centro
Cultural de São Lourenço ditando a extinção deste, como cedo se tornou óbvio.
Não se chama a isto uma boa aplicação dos fundos estruturais? Senhora Merkel,
venha cá ver os bons exemplos de um Algarve nada perdulário.
Mas há outro exemplo. Pela engenharia estatística, tirada a média
dos apreciáveis lucros do turismo e afins (em grande parte com código postal em
paraísos fiscais) e dos magros lucros dos pobres algarvios, concluiu-se que a
região é rica a ponto de perder acesso a fundos europeus destinados a áreas
deprimidas. A verdade é que os algarvios continuam deprimidos mas os que para
isso contribuíram parece que não. Mas com cara alegre, elegendo deputados que
quando deputam não delegam e quando delegam não deputam, com muita ginástica de
rins dos municípios (senhora Merkel, não se esqueça de ir a Alcoutim, por
exemplo), e com santa paciência face aos emissários do centralismo regra geral
opulento e sobranceiro no uso da sua arma predileta que é a burocracia, o
Algarve suporta essa fama de rico, sendo pobre, assimétrico, desprovido e para
o qual o Orçamento de Estado é sistematicamente mau padrasto, sem que, apesar
de tudo isso, o Algarve reclame da Europa o que a Europa lhe deveria dar sem
favores mas por retorno (a lista dos que aqui bebem é conhecida).
Senhora Merkel, venha cá.
Carlos Albino
Carlos Albino
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Flagrante errata: E logo com a Universidade. No apontamento da semana passada deixou-se sugerido que a Universidade do Algarve deveria ter avaliado o programa Allgarve sem esperar pela encomenda mas por motu próprio. Por razões alheias, em vez de motu saiu moto, gralha suficiente para se perder graduação honoris causa, a avaliar pelo telefonema de reparo. Nada de gralhas com a universidade.
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