3 junho 2010
A propósito do apontamento da semana passada, fizeram-me várias observações, algumas em tom de reparo, por aqui se ter insistido nessa evidência de que o Algarve não tem uma liderança regional, sem que se tivesse adiantado um linha sobre o que será uma «liderança regional», as condições para que seja isso e as características dessa entidade... Limitámo-nos a referir não basta liderar a fração regional de um partido para automaticamente se ascender a esse patamar de liderança política regional, mesmo que tal fração partidária seja eleitoralmente esmagadora. É claro que toda a gente sabe isto, mas é sempre bom recordar isso porque dessa confusão tem resultado o erro político do Algarve, por certo erro incontornável porque a confusão é também círculo vicioso.
Numa ditadura, ou, em palavras mais amenas, num regime autoritário, não é coisa muito difícil que uma elite coloque um líder na praça da consideração pública, seja essa a mera praça regional, envolvendo-o com a fama de liderança – basta que ele tenha um bengalim na mão ou coisa que isso finja (uma simples esferográfica pode resultar...), bigode a dar ares amedrontadores ao lábio superior, uns óculos escuros se o olhar for ralo, e, naturalmente, uma dúzia de capatazes à volta aptos a desdobrar ordens e a negociar perdões.
Numa democracia, não é assim, nem pode ser assim – aí, um líder tem que necessariamente sair de um escol (não de uma elite...) e de um escol gerado e alimentado pelo confronto de ideias, de projetos de sociedade, de programas políticos e propostas de atuação. O líder, em democracia, sai daí, desse escol, e, se de facto é líder, sai com um golpe asa quanto a ideias para a região, com um projeto para a região, um programa para a região, propostas para a região, e com provas de denodada generosidade para com a região. Não é a oratória que se lhe exige, embora a oratória seja muleta, é a ideia, o programa, o plano, a proposta e, naturalmente, é a definição de valores que identifica um rosto de líder à légua pela sua credibilidade. E só depois disto tudo é que, se for o caso, vai a votos, ganhando ou tendo que dar lugar a outro, pelo que, já agora se acrescente que não é o cargo que faz um líder, podendo haver líder sem que seja algum cargo a sugerir tal função.
Desiludamo-nos, não é a regionalização do Algarve que por si só vai criar líderes algarvios ou uma liderança algarvia suportada com serenidade pelas alternativas dos partidos. Por palavras mais precisas, será melhor que não haja regionalização se não houver escol, pois o escol (e não a elite...) é a condição para a formação de líderes e lideranças sufragadas.
Ora, no Algarve, elites temos muitas, o que não falta por aí são elites – mas não temos escol, com bilhete de identidade. E tem o Algarve tido também chefes, muitos chefes, cada qual com uma montanha de interesses sobre os ombros mas sem um grama daquele peso pelo qual um escol apenas poderá certificar um espírito como tendo golpe de asa.
Carlos Albino
- Flagrante inevitabilidade: Cortes a doer nos municípios, e se não se começar pelas mordomias será mau, muito mau. Mau e feio. Feio e perigoso.
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