Até há pouco tempo, o bom autarca era apenas aquele que apresentava obra. Sem obra, a reeleição estava liminarmente arrumada. Todo o pau servia para fingir qualquer obra e alguns autarcas traídos nesse frenesim de poder chegaram a cair no ridículo de venderem dois palmos de esperteza por três votos sem inteligência. Por isso aí temos cidades e vilas cheias de mamarrachos não tanto porque não houvesse leis mas apenas porque se autorizava para «haver obra», e mesmo que tais mamarrachos nada tivessem a ver com os bicos de obra da política eles sempre foram garantindo, por esta ou aquela via, uns retornos no apoio às campanhas eleitorais – não é por acaso que alguns desses mamarrachos se situam onde antes tinham funcionado sedes partidárias graciosa ou simbolicamente cedidas, por certo com segundas intenções.
Agora, o critério do eleitor já não vai sendo tanto a obra mas o perfil, e no perfil a moral, mais precisamente a moral política. Um autarca pode ter obra na mão, até muita obra ou obra a dar com um pau, mas se aos olhos públicos se revelar sem moral política, ele não tem hoje as chances que tinha no passado recente – os critérios mudaram. É assim que um autarca que o seja e insista, ou outro que tenha sido e queira retomar, se o sábio olhar público o identificar como comandante trapaceiro, peru miliciano de represálias, devasso sorridente ou traficante de influências fardado em São Francisco descalço, esse autarca bem pode dizer que sem ele a terra não teria cinco arranha-céus ou que se não tivesse sido ele a terra teria sido riscada do mapa, bem pode dizer isso e mais, com a pose de salvador único e insubstituível, mas, desprovido da tal moral política, quanto mais diz mais perde, sobretudo na democracia local onde o engano pode durar mas não perdura muito.
Por essas e por outras, pelo menos na fase em que o país está (com a justiça na lástima e a educação à mercê de experiências de laboratório impostas por uns brincalhões) sou pela separação de eleições locais e eleições nacionais, pois de outra forma a verdade eleitoral não virá tão bem ao de cima.
As próximas eleições autárquicas vão ser sobretudo um teste de moral política – para quem está e quer continuar, para quem ousa iniciar-se e definitivamente para quem eventualmente se julgue um messias de regresso mas que sem moral política na cara não passará do frete de fazer de messias.
A honestidade não é uma questão de marketing, o eleitor já sabe e por isso mudou os critérios. Ainda bem.
Carlos Albino
- Flagrante figura triste: A dos deputados por substituição que por aí andam, como se treinar para a Fórmula 1 da política fosse apenas andar à boleia.
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