8 Fevereiro 2007
E vou ser claro: digo Sim, no dia 11, antes do dia 11 e depois do dia 11. E digo Sim para que se abra uma porta das poucas portas aceitáveis, senão a única, para que, sem equívocos e sem hipocrisias, se comece a acabar com o aborto clandestino e com as desmanchas, até que, algum dia, todos os que queiram ter um filho o tenham por gosto. É preciso tender para isso e fazer tudo para que esse dia chegue. A despenalização, o aconselhamento e a assistência são os três pilares indispensáveis para esse edifício moral de que a sociedade carece. Deixemo-nos de equívocos e de hipocrisias.
Por formação, a que não posso fugir, se há coisa que profundamente me toca é o mistério da vida que, além de me tocar, fascina-me precisamente por ser mistério, e, neste mistério, a questão da alma, da alma racional, da alma humana é ponto central. Quando e porque é que é essa alma racional começa a ter existência na evolução da espécie de corpo que temos, é a questão que a ciência escrutina e as religiões fazem por intuir, designadamente o cristianismo que nega o baptismo e proíbe exéquias eclesiásticas aos fetos abortivos mortos, nem sequer sob condição, e por maior força de razão, aos embriões inviáveis – isso está claro no direito canónico, no antigo e no que vigora desde 1983. E com isto, o cristianismo impede, no seu âmbito, que os embriões e fetos gorados tenham nome porque, nesse entendimento, não terão recebido aquela alma que nos distingue das plantas e dos animais – a alma humana. Felizmente que, nesta matéria, o cristianismo não pensa como o islamismo e como o hinduísmo, sendo chocante que alguns hipócritas, por uma questão política, não sendo a questão política, e por uma questão partidária, não se percebendo como é que os partidos se metem nisto depois de abdicarem do uso dos poderes de legislação, lavando as mãos e remetendo o caso a referendo popular, pois não se percebendo como é que alguns católicos têm sobre a origem da alma e o momento de haver alma humana, os mesmos argumentos dos islâmicos fundamentalistas. Sou agnóstico, mas se tivesse que ser assim, confesso, preferiria que fosse Deus a criar a alma humana como os católicos acreditam e não como os islâmicos impõem, tal como prefiro que seja a Mulher a escolher responsavelmente – e oxalá que todas escolhessem – que o embrião que eventualmente transportem, receba essa dádiva misteriosa, para alguns divina. Os machos hipócritas não têm legitimidade para criminalizar quem queira ter uma cumplicidade humana com um Deus civilizado que o fundamentalismo, qualquer fundamentalismo não oferece.
E por causa desta deriva, hoje não há flagrante contraste.
Carlos Albino
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