11 junho 2015
Se em vez de uma Cantata da Paz,
como escreveu, Sophia de Mello
Breyner redigisse hoje uma Cantata dos
Deputados, voltaria a usar as mesmíssimas palavras iniciais do poema de
outrora: Vemos, ouvimos e lemos, não podemos ignorar… E o que é que o eleitor
comum vê, ouve e lê? O eleitor vê que os partidos têm o dever e a obrigação de
não condicionarem a democracia com a proposta de maus deputados (maus por
impreparação, afetação a interesses difusos ou inconsciência militante da
representação que lhes é depositada); o eleitor ouve que oitenta por cento dos
que já foram deputados não passaram do turismo parlamentar, do voto de
ginástica rítmica em função do medo de se atrasarem na “carreira política” e do
uso de binóculos para verem o Algarve ao longe no dia seguinte à tomada de
posse; e, finalmente, o eleitor não pode ignorar que não pode votar a sério se
o círculo onde vota não fica com deputados também a sério. Ou seja: deputados
que reportem no Parlamento os anseios gerais da Região e os problemas de
primeira grandeza que fraturam a Sociedade Algarvia, reclamando soluções pelos
meios que lhes são próprios. Fazerem isso, não é um incómodo, é o seu dever,
estejam as suas simpatias no governo ou na oposição, pelo que a “alternância do
poder ” em nada justifica a “alternância da apatia” dos que se revezam. O
eleitor algarvio, muito particularmente no recorte da representação parlamentar
do País, tem visto, tem ouvido, tem lido e não pode ignorar que o seu Círculo a
coincidir com a sua postergada Região, nestes já eternos quarenta anos de
eleições, apenas tem saído prejudicada com a também já enorme fila de apáticos,
muitos dos quais discursaram muito mas não fizeram nada. E enquanto não houver
Região, sem deputados a sério, também não haverá lideranças mobilizadoras,
aceitáveis, credíveis e sobretudo respeitáveis. Será, por certo, uma Região de
Excelentíssimos Senhores mas que falarão sozinhos cada vez mais.
E como nisto se intromete a questão das quotas, já aqui se falou das mulheres, falemos agora dos
homens. Os partidos até agora considerados “pequenos”, a que se juntam os
“novos”, podem escolher homens à vontade para os primeiros ou últimos lugares,
que pouco se alterarão os resultados expectáveis – mais coisa para este, menos
coisa para aquele. Para os chamados “grandes”, o caso mais bicudo será o do PSD
e sua carruagem atrelada (outra quota). Com a saída de José Mendes Bota, perdeu
sem dúvida um peso-pesado, ficando com plumas. Poderá resolver a questão com um
independente, mas um independente, por mais qualidade e currículo que tenha, a
pouco tempo político já das eleições, será como aquele caso do sacristão
católico de velha cepa que de um momento para o outro se transfere para bispo
da igreja universal – perde-se um excelente sacristão, ganha-se um bispo com tiques
de sacristia. Haverá outra solução: alguém de fora do Algarve. Claro que haverá
bastantes para esse papel de D. Sebastião ou de… Filipe, que o eleitor já viu,
já ouviu, já leu e não poderá ignorar o resultado eleitoral da esterilidade do
cardeal D. Henrique.
Quanto ao outro “grande”, é
bem possível que poucos ousem dizer em voz alta ou em letra de forma sobre o PS,
a coisa mais errada deste mundo, erro imperdoável que é este: o PS, nesta sua
travessia do deserto, não soube capitalizar valores para uma liderança sólida e
sobretudo com argumentário para a região. Mas o seu problema é menos bicudo, se
conseguir alinhar gente nova com programa, com ideias, com as virtudes e
pelúcias do projeto, e sem os espinhos do carreirismo, ou do aparelhismo
fundamentalista que determina e condiciona aquelas jihads internas de que
apenas resulta abstenção ou dissensão. O eleitor desta área já viu o
suficiente, já ouviu o quanto basta, já leu o essencial e não pode ignorar o fundamental
- o PS não terá problema bicudo se, como agora se diz por todos os cantos,
“mudar de paradigma”. E não é preciso trocar mais por miúdos.
Carlos Albino
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Flagrante verdade de Monchique: ”Adeus Algarve que vou para Faro” .
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