quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

SMS 544. Chegou a hora de não dizer adeus

19 dezembro 2013

Neste Natal, poucos ou ninguém está à espera de grandes presentes e de alegres surpresas. E os apelos à solidariedade, vulgares na quadra mas que ainda há pouco tempo pareciam coisas estranhas, já não são tanto apelos à solidariedade entre ricos e pobres mas solidariedade entre os menos pobres e os abandonados pelas sucessivas gestões públicas. À minoria dos ricos cada vez mais ricos, resta-lhes a caridade sem a qual não adquirem o estatuto de bom-tom e de efémero perdão divino. As instituições que são o elemento comum a todas as explicações sobre as as razões porque algumas nações prosperam e outras ficaram para trás na marcha da história humana, refletem nos seus orçamentos e planos para 2014, a situação geral de crise que, sem dúvida, mudou a sociedade de alto a baixo, para o bem e para o mal. Na ausência de instituições respeitadas, funcionais e independentes dos humores dos que se alojaram na democracia com desígnios escondidos, com planos nada claros e rasgando promessas e compromissos assumidos até à véspera do poder, não pode existir esperança de riqueza pública, de distribuição social ou de capacidade coletiva capaz de assegurar à sociedade a possibilidade de progredir num cenário sustentável de estabilidade política, económica, e, talvez mais importante, de estabilidade moral.

Mas não podemos nem devemos deixar-nos soterrar nos escombros da crise. Vivemos em sociedade, felizmente livre e que em momentos agendados faz livremente escolhas e corrige escolhas anteriores, e é apenas em sociedade que podemos encontrar caminhos e soluções. Ninguém fechado na sua casinha, seja esta casinha uma freguesia, um concelho ou mesmo a região, pode julgar que o temporal passa e que nada tem a fazer fora da sua casinha, pensando que chegou a hora de fazer adeus aos vizinhos e que sejam os vizinhos a resolver a crise. Ora, chegou precisamente a hora de não dizer adeus. Chegou o momento de, no maior número possível, os cidadãos clamarem em uníssono que querem o fim da crise e sanar erros e causas da desesperança, assumindo responsabilidades, compromissos e escolhas. E, em democracia, não é preciso esperar pela hora das eleições, sejam estas meramente indicativas como as próximas europeias ou decisivas como as que lhes seguirão. A palavra esperança deve fazer-se ouvir, para já, nas assembleias municipais e de freguesia que nos prolongados anos de distração funcionaram, na generalidade, com ambientes de enterro e para cumprimento de formalidades em tono de figuras que tanto deram para caciques jogadores, como para almas generosas e probas.

E já agora, o melhor presente que o Algarve poderia receber neste Natal, é ter uma voz no sapatinho. O Algarve precisa de ter uma voz, e isso apenas a sociedade a pode oferecer.  Com urgência, o Algarve não precisa de brinquedos tem muitos para brincar, não precisa de roupas novas (os guarda-fatos, sobretudo políticos, estão cheios de roupa), não precisa de jogos de computador (está cheio de jogos e de jogadas) – precisa de ter uma voz. Coisa tão pouca e que não pesa no orçamento. Ofereçam-lhe isso porque a voz do Algarve só é possível saindo das gargantas de todos, a começar pela palavra esperança. Chegou a hora de não dizer adeus.

Carlos Albino
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Flagrante comida: O melhor que o reconhecimento da Ementa Mediterrânica pela UNESCO pode provocar, é não termos vergonha da comida dos nossos pais e avós, vermos nela um sinal de riqueza e que seja posta, com cinco estrelas, na mesa de cada um.

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