quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

SMS 393. O problema está no próximo

30 dezembro 2010

É que, quanto a mensagens, o país não tem razão de queixa – somos um povo rico em mensagens. É do chefe de estado, é do primeiro-ministro e de alguns ministros e, em tática antecipação de todos eles é a mensagem do titular do governo civil, é a mensagem do cardeal antes do bispo ou do arcebispo antes daquele, é do presidente da câmara, é do regedor, é do líder de oposição (desta vez, como nos velhos tempos das conversas em família – lembram-se? -, com lareira atrás), é mensagem lustrosa do homem da empresa pública impressa em papel couché, por certo com motivos para se sentir num estado dentro do estado, enfim, as mensagens partem de onde menos se espera, do chefe do futebol que lê mal o que outro lhe escreve, ao chefe de escuteiros. Ainda não agora, mas pelo andar da carruagem, pouco falta para o arguido célebre ir com todas as honras à televisão comunicar a sua mensagem, ou até mesmo para o delinquente que escapou por um triz nos entrar casa adentro com cara do próximo santo feito pelo papa pois neste país basta não ter sido condenado para um algum camelo artista passar pelo fundo da agulha com uma tremenda e esmagadora lição de nora. Portanto, estamos ricos em mensagens, embora de toda essa montanha de prosa do final do ano, a rigor apenas interessam duas: a do Presidente da República que é escolhido, e a do Primeiro-Ministro que é eleito – daí, as maiúsculas que se lhes destinam.

É claro que as mensagens do Chefe do Estado e do Chefe do Governo – continuamos com maiúsculas – tiveram a sua piada. A do primeiro porque é escolhido; a do segundo porque é eleito. Não está aí o problema. Quanto ao primeiro que é escolhido, ele sabe que não pode falar de Natal sem ter em conta o denominador comum e que também não pode falar do Ano Novo alheio ao máximo divisor comum – é uma questão de fazer bem as contas. Quanto ao segundo que é eleito, também não há grande problema sabendo ele que cada mensagem tanto pode equivaler a queimar os últimos cartuchos como também a preparar o próximo foguetório – é uma questão de jogo.

Então onde está o problema? O problema, voltando às minúsculas, está no próximo chefe de estado que não deve estar longe do escolhido e do próximo chefe de governo que, em democracia, está sempre perto de ser eleito. Pelo que ouvimos e sabemos, resumindo e concluindo, para pior já basta assim. Estamos feitos.

Carlos Albino

    Flagrante momento de serenidade: O do concerto do Ano Novo da Orquestra do Algarve, desta vez no Casino de Vilamoura. Obrigado ao maestro Osvaldo Ferreira e obrigado a todos os músicos, do primeiro violino até aos da percussão, lá atrás, que nós, os espetadores, estamos fartos de ser os bombos da festa.

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

SMS 392. Anónimos e cobardes

23 dezembro 2010

Deus não foi totalmente previdente na escolha do local e do momento para o seu filho humano nascer – escolheu um estábulo e não esperou pelo século XXI, fez mal. Assim, deixou que o diabo faça nascer não apenas um mas os seus milhares de milhares de filhos nesse local que onde tudo o que apareça fica aparentemente eterno – a internet. E aí temos os diabos à solta, sob anonimato e cientes da impunidade, atacando sem fundamento seja quem for. Insultam, caluniam e mentem sem consequências. Sabem que a justiça não lhes pode bater à porta, ou que, quando pode, demora dez anos a subir o degrau da soleira; sabem que a delinquência impera tornando os delinquentes solidários entre si por questão de sobrevivência, e sabem que a cobardia já quase tornou num valor moral, tanto que é pela cobardia que exibem que a maior parte desses diabos chega a usufruir de consideração pública e até de prestígio.

Bem vistas as coisas, esses pobres diabos não fizeram mais nada na vida do que roubar, aldrabar e fugir em algum momento em que prevejam acerto de contas. Mas agora que a internet proporciona a qualquer ladrão arvorar-se em figura proba e que faculta a qualquer delinquente fazer de juiz aparentemente imparcial, aí temos esses filhos do diabo a vingar o facto de algum bem ter nascido num estábulo e sobre palhas.

Sem que a gente proba disso se tenha dado conta, esses diabos instalaram já um clima de guerra civil, matando à queima-roupa quem lhes descubra o rabo-queimado de mafarrico. O que tais diabos conseguem fazer já está a ultrapassar as marcas, mas é o que querem: fazer da vida dos outros: um inferno.

Carlos Albino

    Flagrante postal de festas: Bom Natal para todos os leitores

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

SMS 391. O escaravelho da palmeira


16 dezembro 2010

Os estragos deste bicho estão à vista, o leitor sabe do que se trata. Por mais antiga que seja a árvore, por mais robusta que pareça e por mais amores que tenha coberto no jardim público ou confrontos que tenha testemunhado sem olhos na avenida da terra, aquele animalzinho ataca, mina num mundo que ele constrói no meio de um barulho arrepiante para nós, os humanos, mas que para ele é a sua música clássica.

Por regra, esse bicho adota a designação de dinâmico, veste como qualquer pessoa que se preze, percebe das causas e dos efeitos da crise pátria, entra nos cafés quase sempre sorridente com bom dia para a direita e boa tarde para a esquerda, enfim, é um senhor, mesmo que em criança, mexido como sempre foi, sentisse o tom pejorativo do que o pai ou mãe, vendo-o desmedidamente irrequieto, lhe dizia – “Moço! Até pareces um escaravelho!”.

Quando a idade lhe dá carapaça retirando-lhe o líquido viscoso de larva, é então que ele se dedica à sua principal missão e que foi sempre a mesma: roer o tronco onde se encontra alojado.

Se está num partido, rói para ocupar o espaço dos outros e sugar a melhor seiva porque a estratégia do escaravelho não é o bem comum e muito menos o interesse público. A sua estratégia é alimentar-se o melhor possível e saltar sobre qualquer outro escaravelho que lhe apareça, julgando-se nisso genial e imensamente protegido. Pois se rouba, mesmo que o assalto seja contra o colega do tronco, ele sabe que isso fica no segredo da palmeira, tão certo que está que nenhum veneno lhe interrompe a existência, seja esse veneno administrado pela calda da justiça ou pela desinfestação do voto. Contra ele, o escaravelho sabe que todos os esforços são inúteis, além de dispendiosos e que ninguém o pode enxotar.

Mas, desmiolado como esse bicho é, ele não se apercebe que as ramadas da palmeira secam, a árvore morre e com ela também fina os seus dias de escaravelho e a sua missão de roer. Tanto barulho no tronco para nada.

Carlos Albino
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    Flagrante post it: Agora que os partidos, mais ou menos, já se preparam para abrir caminho aos candidatos que vão ocupar o lugar dos presidentes de câmara em último mandato legal, será aconselhável que escolham gente com mãos limpas e sem passado confuso . O povo pode não ter ou perder a memória mas tem lembrança.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

SMS 390. O que mais choca nisto tudo

9 dezembro 2010

Sim, por entre tantas dívidas, e depois de tantas receitas, o que mais choca é a dívida de diálogo, a dívida de explicação, a dívida de consideração. Dívida política do eleito para com o eleitor, dívida cívica do nomeado para com o administrado, dívida anímica do que vive dos dinheiros públicos para com o contribuinte, dívida usurária do poder central para com cada um dos deveres regionais ou locais, como se queira. Nenhuma destas dívidas se justifica com a dívida pública. E isto que se diz não se aplica apenas às portagens – aplica-se à segurança, à saúde, ao ensino, à política ambiental, à cultura, à defesa das atividades económicas da região, por aí afora, com a sobranceria a servir de pesponto e alinhavo em muita casaca ou vestido de carapau de corrida que se intrometeu nesta democracia que devia ser estimada e não é.

É chocante que perante os argumentos da região quanto à Via do Infante e quanto à estrada 125, o ministro das Obras Públicas não tenha vindo ao Algarve assumir, explicar, ouvir, debater, rebater. Choca que um eleito para ser responsável e para representar, tenha chegado a firmar em comunicado para efeitos de Lisboa, que as portagens são apenas contestadas “por uns quantos insatisfeitos”. Choca que face à situação dramática da segurança, o ministro da Administração Interna só venha ao Algarve para inaugurar uma pen drive, cumprimentar a governadora civil e meia dúzia de graduados, pois quanto ao resto cada um que se governe e que as forças de segurança, sem meios, sem recursos e sem ancoragem, se amanhem no balcão de atendimento a que cada vez menos as vítimas recorrem. E por aí fora.

A metáfora que ocorre para descrever este dia a dia de sobranceria que mina a democracia julgando-se eterna e auto-suficiente, tem muito a ver com o escaravelho da palmeira ou com a formiga branca, esses bichos que, depois da distração vital de comerem tudo, acabam vítimas de si próprios. Fica para a semana o apontamento precisamente intitulado “Os Escaravelhos da Palmeira”...

Carlos Albino

    Flagrante imaginação: Essa, a do convite ao príncipe britânico para uma lua-de-mel no Algarve. Ao menos houvesse a certeza prévia da aceitação, como mandam as regras para quem não quer fazer papel de ingénuo. É que um príncipe daqueles fazer uma lua de mel com tais efeitos não é propriamente o mesmo que entrar num concurso da TVI...

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

SMS 389. Eles perdem a razão esta noite

2 dezembro 2010

Quando a anterior ministra da Educação humilhou os Professores, fui dos que se insurgiram contra essa perversão política, sem deixar de reconhecer aí pelo meio alguns (poucos) pretextos da governante em algumas (também poucas) situações de manifesto abandalhamento – também não era por via da humilhação que tal mal se curava. Continuo a pensar da mesma forma quer perante a perversão política quer face ao abandalhamento, pois é sempre abandalhamento qualquer divórcio da Sociedade.

Naturalmente que aos intelectuais ou aos que fizeram dos livros a vida, e do ensino uma missão como numerador e profissão como denominador, não se exige que encham o Estádio Algarve e gritem contra o árbitro num afamado Benfica-Cachopo, como também ninguém esperará que sejam os magalas recrutados à força em Albufeira, os nómadas da Andaluzia, ou ainda os calceteiros marítimos de offshore e os canalizadores aeronáuticos que dão em gestores públicos quando falhada eleição os subtrai de emprego político, ninguém espera que essa gente do subterfúgio componha a sala algarvia, qualquer sala onde se ouça alguém que seja referência do pensamento, da arte, da história, da economia ou da ciência. Aí, nessa sala, seria de encontrar e até se exigiria encontrar como mancha predominante da assistência, não os putativos assessores mentais da ex-ministra mas, sim, os Professores, sobretudo os da terra e arredores. Infelizmente, ocorra isso na sala nobre de Portimão e as presenças são quinze exceções e já é bom; em Lagos são onze dos cinquenta que deveriam estar; em Tavira, sempre a meia-dúzia; em Lagoa, ficam no Carvoeiro; em Silves, os sete da simpatia circunstancial e, com sorte, mais sete arrastados; em Olhão, quem não vai descarta-se sempre com a tal desculpa que os caixeiros-viajantes de outrora usavam para a noite fora de casa; e até em Faro, santo deus, se não há convite personalizado e confirmado, as altas importâncias ficam nas pantufas, pois na sala, dos cento e vinte e quatro aguardados, é o quarteirão do costume.

Dir-me-ão uns que isto acontece por efeito do “desenraizamento”. Outros, que foi falta de “comunicação”. Outros ainda, que os “bilhetes” são caros. E poucos, lá confidenciam num assomo de sinceridade que o “evento” coincidiu ou com o Benfica-Cachopo, o Cachopo-Sporting ou o Porto-Coiro da Burra.

Não vale a pena bater mais no ceguinho: a ausência dos Professores dos atos culturais públicos, por mais piedosas que sejam as desculpas, é a prova de que não há Vida Cultural, pois não há vida cultural e cultura viva com os Professores divorciados da Sociedade e à margem de tudo o que aconteça fora das escolas – ou seja, que não sirva para curriculum e prejudique o conforto da pantufa.

Sejamos claros: se alguma coisa cultural de importante ocorrer esta noite, seja em Lagos, no Coiro da Burra, em Tavira, no Cachopo que é prova dos nove, ou nessa prova real que é Faro, e os Professores em peso lá não estiverem, eles perdem razão esta noite.

Carlos Albino

    Flagrante México in Algarve: O México não tem culpa, mas três encapuzados, nesta segunda-feira, entraram pelo snack-bar em zona rural, raptaram um homem, obrigaram-no a entrar para o seu furgão de distribuição de cigarros que roubaram, abandonando o infeliz em sítio ermo. Dois soldados da GNR à paisana presenciaram a ação mexicana e ninguém levantou um braço, e para quê se a justiça existe? Voltámos ao Remexido do século XIX, já nem é necessário recriação teatral.