
Vem isto a propósito de um pouco por todo o Algarve, a três meses das eleições, haver obras por todo o lado. Rotundas disciplinadoras do trânsito que poderiam e deveriam ter sido feitas há anos, só agora é são implantadas; estradas esburacadas que poderiam e deveriam ter sido reconstruídas há muito tempo, só agora é que são objecto do frenesim político; projectos de construção que estavam na gaveta, como que por milagre enchem as ruas de andaimes e os pinhais de hotéis mesmo com os pisos a mais que também durante anos estavam interditos, mas, agora, pelos vistos, deixaram de estar. Por aí fora, para não falar dos repuxos, da sementeira de esculturas de gosto duvidoso, enfim, da praga de congeminações dos arquitectos municipais impostas sem discussão pública e muito menos com a pedagogia da discussão pública. Com isto não queremos dizer que as eleições devem proibir as obras, apenas deixamos sugerido que a excepcional simultaneidade de tanta obra no pino do Verão é de molde a tornar as eleições quase proibitivas e, claro, suspeitosas. Muita obra, mas pouco plano estratégico, aliás, basta ler bem os slogans das campanhas por esses concelhos, tanto dos poderes locais como das oposições – são de uma pobreza extrema e de uma linearidade confrangedora.
Ora, este obsessivo obreirismo eleitoral é a verdadeira doença terminal da política. A política existe para fazer obra segundo o calendário do interesse público e para fazer prova de obra em função da legítima aspiração da sociedade ao bem estar e à modernidade, seja a obra cultural, de cimento ou de alcatrão. O que é assombroso é que o calendário do interesse público degenere em mero calendário eleitoral apenas para fins políticos escusos, para não falar da obtenção por terceiros de ganhos financeiros directos com a discreta oportunidade do momento. A política, assim, tem os dias contados, morre, ou a doença não seja terminal. A política só não morre se o eleitor usar a memória que já tem.
Carlos Albino
Sem comentários:
Enviar um comentário