quinta-feira, 17 de novembro de 2016

SMS 692. Municipalismo e Cidades-Estado

17 novembro 2016

Tal como nas marés, a contagem das ondas indica a preia-mar ou a baixa-mar, assim também com eleições mais ou menos à vista e em matéria de regionalização, descentralização e outras minudências populistas, a contagem de anúncios temporãos, intenções baratas ou promessas falsas indica a vazante ou a enchente da política, aliás da má política ou da política que mata a Política e que pouco a pouco vai minando a confiança dos cidadãos. Depois de tanta descentralização para as autarquias sem que estas – os seus quadros políticos e técnicos para isso estivessem ou estejam preparados -, com a contagem decrescente para as eleições autárquicas aí estão a surgir promessas, intenções e anúncios de mais descentralização, não para as regiões (assunto que ficou na gaveta) mas para as regiõezinhas mapeadas pelo poder local. Com esta prática e invocando-se em vão o nome sagrado do municipalismo, não se conseguiu, não se consegue e não se conseguirá qualquer descentralização, mas apenas a criação de sucursais do Estado, ampliando-se medonhamente a burocracia sobretudo onde e quando a burocracia se cruza com interesses inomináveis. Onde devia existir Região e não existe, como é o caso do Algarve, as sucursais locais do Estado criam uma teia burocrática mais complexa que a própria burocracia do Estado cujos excessos, à partida, foi anunciado e prometido combater. Além disso inviabilizaram qualquer ideia de região a sério, embora essa ideia seja mantida à custa de órgãos decorativos absolutamente inúteis e ineficazes que o cidadão desconhece e que apenas serve para mero prestígio socia dos empossados.

As burocracias municipais que configuram a sucurssalização do Estado e não a sua descentralização, mais longínqua ficando a regionalização, acabam por ser um travão para as pessoas, para as empresas, para todos. Nunca com tanta internet, tanto correio electrónico, tanto Google e tanto digital, foi necessário tanto papel para tanto postigo e tanta capelinha, onde as interpretações fundamentalistas da lei são o pão nosso de cada dia. O serviço público, assim, em vez de cumprir a missão de ajudar o cidadão, parece existir apenas para complicar a vida de cada um. Em vez do exercício pacífico do poder local, aí temos de volta o exercício do poder de secretaria, por vezes com tiques de autoritarismo sem travão. Pior, sem escrutínio. Pior ainda, poder que não tendo sido eleito, acaba por condicionar, interferir e dar voz de comando ao poder eleito. Nunca, com tanta cidade-estado, a região esteve tão longe, nomeadamente como desiderato e finalidade.

Naturalmente que nas regiões onde o imobiliário e actividades adjacentes é a principal se não até a única “indústria”, a burocracia apenas não é religião porque se rege pelo velho e nefasto princípio segundo o qual o segredo é a alma do negócio. E quanto mais desta “descentralização”, melhor para tal segredo. Infelizmente, a contagem das ondas desta alma e deste segredo, indicam vazante de Política, e não maré enchente.

Carlos Albino
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Flagrante liderança regional: Ninguém.

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