quinta-feira, 11 de agosto de 2016

SMS 679. Os jovens correm ou… fogem

11 agosto 2016

É vulgar ouvir-se da boca de programadores, de agentes culturais e de gente mais ou menos envelhecida que por rotina diletante ou por ritual social assiste a tudo, não perde nada e para quem tudo está bem, que é preciso e imperioso “ganhar públicos novos”. E com isto querem dizer que é necessário ter os jovens nas plateias e, melhor ainda, disputando as primeiras filas de melhor vista e não se conformando com arrumação nas últimas, como que para cumprir algum serviço faz de conta. Na verdade, os jovens, descontando alguma música de alguma estrela de estrondo, estão longe das plateias, seja para música que salas semi-vazias aplaudem com “Bravó!”, muitas vezes para fazer de conta; estão longe da sala, seja uma conferência de filósofo de nomeada cujas palavras e sabedoria dificilmente se repetirão em tempo no mesmo local; longe estão se ocorre teatro, ainda que anunciado e reconhecido com elevada qualidade artística; e longe estão das Bibliotecas para requisitarem obras de mérito ou candidatas ao mérito. Para muitos e muitos jovens “ouvir poesia”, mesmo bem dita, é uma “enorme seca”, o que para a poesia mal dita se justificaria. Por aí fora. Esta constatação é comum não apenas nos pequenos centros, nas terras da chamada “periferia cultural” ou nas localidades onde a iliteracia é regra e é de tal modo lei que já não incomoda ninguém, mas é também comum nos grandes centros demográficos onde, seja onde for e a propósito do que for, se encontram mais ou menos sempre os mesmos com as mesmíssimas mesuras.

Mas porquê, isto? Porque motivo os jovens consideram que a cultura pensante num salão de reflexão é inimiga da cultura recreativa de discoteca? Uma impede a outra? Será porque os jovens não foram “conquistados” como público, ou porque há um erro de paralaxe dos que rapidamente se esquecem o que é um jovem, e um jovem, por natureza, se ou quando se sente que o querem tratar como velho precoce, não só corre como foge?

É claro que há bolsas de exceção que podem ser identificadas com maior ou menor dimensão em filarmónicas, ranchos, centros comunitários e “casas de cultura” cujos dirigentes e promotores não sejam jovens serôdios ou, eles próprios, velhos precoces.  Nessas bolsas de exceção, luta-se contra moinhos de vento e, muitas vezes, contra a irracionalidade de quem decide e tem o poder da massa na mão.

Mas, escolas com professores desenraizados e queimando 95% das energias em burocracia tão competitiva quanto inútil; bibliotecas entregues a gente que se debate entre o ser burocrata a cumprir eternamente serviços mínimos. e o ser proeminência sem justa causa; associações que se resumem ao número legal das direções menosprezando que a doença crónica do subsídio causa AVC cultural; uma região com o aparelho de Comunicação esfacelado ou mesmo destruído, embora os aparelhos de propaganda sazonal se revelem afinados; falta de políticas culturais coerentes por parte de entidades públicas (do Estado ou das autarquias) por insuficiência de recursos ou de golpe de asa; e, para pior ainda, uma avantajada e notória tribo nómada que por aí anda a colher os “frutos” da Cultura como uma etnia desprotegida ou auto-marginalizada colhe alfarrobas, tudo isto põe os jovens a correr e, claro, a fugir.

Quando um público foge, a última coisa que se pode ou deve fazer, é tentar “conquistá-lo”. E a primeira que se deve fazer é identificar as causas da fuga e resolver o problema identificado: na escola, na biblioteca, nas associações, na comunicação, nas entidades públicas, e nos que só apanham frutos em devassada terra alheia.

Carlos Albino
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Flagrante oração: “Meu Deus! Livrai-me de me recordar de Manuall Pinho que financiou muita parra para tão pouca uva e que, depois de espremida e pisada, não deu em nada. Ámen.”

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