quinta-feira, 30 de maio de 2013

SMS 515O Correio de Boliqueime

30 maio 2013

Se volto a Boliqueime, é porque isso é o prenúncio de muito que por aí vai acontecer. Depois do encerramento da estação de comboios e de ser retirada a direção autónoma à sua escola que era modelar, essa terra acaba de ser alvo da decisão consumada dos CTT em fechar os correios. E fizeram-no sem informação bastante aos cidadãos, e, ao que se sabe, na sequência apenas de troca de ofícios com a autarquia local nos quais se deixou enrolar. Não há muitos anos que o edifício dos correios foi inaugurado com ar modernaço – dinheiro portanto sem planeamento e deitado à rua –, as pessoas viam naquilo, enfim, a última das suas inexpugnáveis fortalezas locais, mas os sinais já estavam a ser dados – os carteiros de giro passaram a vir de longe, cartas e cartas algumas de responsabilidade trocadas nas caixas postais, o mensageiro deixou de conhecer e de ser conhecido pelas pessoas, restava o balcão que foi encerrado e que era um dos poucos centros de confiança pública, agora transferido para uma loja, tomara ela vender os iogurtes com prazo de validade. Suspeito que esta decisão dos CTT, a que não será alheia a senda da privatização, não ficará por Boliqueime, irá ocorrer aí pelo Algarve afora.

Ainda está no ouvido o slogan propagandeado pelos CTT no propósito de firmar prestígio e confiança. "Queremos estar onde os portugueses estão", dizia esse slogan se é que ainda não continua a dizer. Mas parece que, pelo contrário e pelos factos, os CTT não querem estar onde haja portugueses, pretendem é que os portugueses tenham que ir onde os CTT estão. Como nas mercearias privadas. E até se admitiria que assim fosse, se aos CTT não competisse estatutariamente “assegurar o estabelecimento, gestão e exploração das infra-estruturas e do serviço público de correios”. Pelo menos por enquanto, os CTT têm nas mãos a rede pública de correios e o leque de atividades subsidiárias designadamente financeiras, de cobranças contratualizadas e de parcerias fiscais. E se detêm a rede pública e o serviço postal público, para qualquer mexida na rede, por ser pública, os CTT mesmo sendo uma sociedade anónima, têm que ouvir os legítimos representantes do interesse público. E estes, caso sejam eventualmente ouvidos, não podem nem devem guardar essa correspondência como se fosse confidencial, remetida por deuses e destinada a deuses entretidos numa brincadeira de cartas pouco azuis embora registadas com aviso de receção. Devem dar conhecimento aos que representam, pelas regras da atempada responsabilidade e do bom senso.

Carlos Albino
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Flagrante presença: Por acaso, numa manifestação improvisada, em Boliqueime, contra o encerramento dos Correios, a presença apenas de um deputado algarvio – Paulo Sá (CDU). Foi nesta segunda-feira, o dia em que os deputados estão livres de S. Bento para, segundo o seu estatuto, os “encontros com o eleitorado”.

quinta-feira, 23 de maio de 2013

SMS 514. O erro alemão, deutsch fehler

23 maio 2013

Não é de crer que a Alemanha queira ou deseje provocar mais um grande conflito europeu como os dois que armou no século XX, um no típico estilo prussiano e outro na lógica de uma ditadura erguida sobre uma democracia indolente e mal avisada. Todavia, o facto de não querer ou não desejar, não significa que a Alemanha não resvale para essa tendência sem que se saiba até que ponto ela pode ser contida, emendada ou até rejeitada pelos próprios alemães. O governo da chanceler Merkel, animado por alguma popularidade interna episodicamente mais alta ou mais baixa, está hoje longe dos pressupostos que estiveram na base da constituição das Comunidades Europeias e que ditaram o rumo para uma União Europeia, incompleta como união e longe de esconjurar nacionalismos que têm tudo menos de europeu. É impossível uma união que não ultrapasse o patamar de mero grémio ou sindicato de soberanias que só por hipocrisia se recolhem e que por isso mesmo prosseguem as clássicas estratégias de intervenção. Este tem sido o erro alemão que antes da crise económica e financeira era latente mas que ficou exposto mal a doutrina dos factos revelou o estado dramático em que a Europa projetada se encontra. Com uma Comissão Europeia tibiamente burocrática, sem golpe de asa e que se arrasta quotidianamente no oportunismo político, não se falando das outras figuras de retórica e meramente decorativas a que correspondem as instituições europeias decorrentes do Tratado, a Alemanha permitiu-se interferir nos outros Estados parceiros, a começar pelos mais fragilizados pela crise, pondo condições, aconselhando intempestivamente orientações sobretudo na política económica e nos modelos sociais, estigmatizando por conveniências próprias os "países do sul" como exemplos a punir, e arrastando os países satélites de Berlim nesse entusiasmo de divisão, alguns dos quais não se coibiram de ser embaixadores do propósito que passou a ser mais germânico que alemão, no simbolismo trágico que os adjetivos acarretam. O erro alemão consistiu e continua a ser prosseguido nessa interferência condicionante e intervenção declarada do "Estado mais forte", a tal ponto que não apenas os alemães mas já grande parte da Europa chegou a pensar que a União Europeia era ou é uma realidade paga pela Alemanha, pelo que a Alemanha terá ou tem direitos próprios de exceção democrática, ou que a Europa, incluindo os países do sul não pagaram absolutamente nada para que a Alemanha seja o que é, designadamente para a sua recomposição territorial. Por esse erro alemão, os Estados mais fracos da almejada união, serão os primeiros a pagar, como já estão a pagar. Mas chegará a vez, possivelmente em último lugar, de ser a Alemanha a pagar pelo seu próprio erro.

Carlos Albino
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Flagrante pergunta pública: De vez em quando, pergunto privada e discretamente ao diretor Fernando Reis: “Estou a servir o Jornal do Algarve e os seus leitores?”. Desta vez a pergunta é pública: “Estou a servir?” É que a cada leitor corresponde um eleitor…

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Neste blogue

Além da Página PRINCIPAL, como se pode reparar nos botões acima, estão criadas páginas suplementares: PARA que CONSTE e NOTA do DIA. Basta clicar no botão para abrir a página respetiva.

Na NOTA do DIA será colocada observação datada, sempre que se justifique.

quinta-feira, 16 de maio de 2013

SMS 513. Não dá para acreditar

Foto disponibilizada pelo deputado Mendes Bota
16 maio 2013

Lêem-se as perguntas diretas do deputado Mendes Bota ao Governo, designadamente ao Ministério da Economia, e custa a acreditar. Custa a acreditar que seja necessário um deputado a denunciar o que está a acontecer no aeroporto de Faro, sem que antes a comunicação social, as instituições a quem compete o zelo regional e os próprios interessados, não o tivessem feito desde a primeira hora. E custaria a acreditar no que o próprio deputado denuncia se ele não se tivesse munido de fotografias. A principal porta de entrada do Algarve, para o que interessa, é deveras o aeroporto, e a imagem da região cai por terra logo aí.  Afirma o deputado que as ações praticadas pela concessionária ANA, indiciam situações de abuso de posição dominante, prepotência e coação sobre cerca de 40 pequenas empresas algarvias de rent-a-car, forçadas a subscrever uma declaração humilhante. Mas não é apenas isso que está em causa. O que está em causa é a imagem do Turismo algarvio e a ideia que se faz de quem nos visita como se quem nos visita e de quem o Algarve precisa tivesse que ser tratado como parte de um rebanho de cabras, sem a mínima consideração, atenção e acolhimento.

Desconheço se outros deputados cá do nosso círculo se interessaram pela questão, mas se um oitavo da situação de Faro ocorresse no Porto, estou convicto de que as televisões já se tinham encarregado de arvorar um escândalo nacional, que as rádios sem coração a Sul reportariam sem parar, e que os jornais e lóbis do Norte que estão atrás das respetivas fichas técnicas já tinham desfeito em pedaços as inteligências que estão colocadas na portaria do Algarve, forçando o governo a mexer-se. Como é no Algarve, boi manso, paciente e sem grande voz ativa, as coisas chegam ao limite e ainda bem que Mendes Bota denuncia esse limite.

Obviamente que só por ingenuidade se espera que seja a ANA a acautelar e a defender os interesses do Algarve numa atividade da qual a região depende. A ANA não é uma autarquia eleita, não é uma delegação estatal, não é um órgão de comunicação regional e muito menos uma representante sufragada pelo círculo eleitoral do Algarve. Sendo uma empresa concessionária, é bem possível que tenha as suas razões e motivos face a quem gere o Aeroporto de Faro ou face a entidades responsáveis pelo turismo e cujo descuido fica sugerido. Mas então explica, remete ou endossa, como se queira.

Quando havia obras no aeroporto, eram as obras. E agora? Não dá para acreditar. A gente, por exemplo, vai à Suíça e só falta levarem os turistas num andor. Aqui são tratados como intrusos vindos do sertão, atirados para ali, a um canto. Que se amanhem. Há que pôr um ponto final a isso.

Carlos Albino
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Flagrante laxismo: A sinalética cultural (património arqueológico, histórico, natural e artístico) do Algarve não existe. A região parece um sítio ermo de história. Pior que os terramotos é o sismo que abala as inteligências.

quarta-feira, 15 de maio de 2013

SMS no Facebook

Para além deste blogue, estes apontamentos passam a constar também no Facebbok → SMS-Apontamentos. De gosto em gosto se enche o entreposto.
Meramente simbólico. É que precisamente hoje, 15 de maio, perfaz dez anos sobre o início dos apontamentos "SMS", no Jornal do Algarve, a convite do seu diretor, Fernando Reis. Foi isso uma espécie de reencontro com os leitores algarvios dessas páginas onde, na década de 70, mantivemos também longa série de apontamentos, então massacrados pela censura. Chamava-se "Filtrações", apontamentos coevos de outros do mesmo período e também algarvienses, sob a designação de "Sintaxe Oportuna", publicados no bem escrito "Correio do Sul", sob a direção do saudoso e bom homem Mário Lyster Franco. Digamos que o Algarve podia ficar-me longe da vista, mas esteve sempre perto do coração. Ora, dez anos de pequenos e modestos apontamentos não se celebram com bolos, muito menos com foguetes, jamais com galas. Uma página no Facebook que os recolha, basta.

quinta-feira, 9 de maio de 2013

SMS 512. O Algarve em risco de implosão


9 maio 2013

A advertência vem de vários sítios, seja a propósito das provas de crise social profunda, seja pelas evidências do estado da economia da região, seja pela asfixiante constatação da falta de política coerente e esperançosa, seja ainda pelo jogo do empurra por parte dos responsáveis que não assumem erros de ação ou de omissão.

Quanto à crise social, o desemprego algarvio é o mais elevado do País, a situação de fome não é já contabilizável e a exploração do trabalho barato atinge níveis que apenas podem ser sinais de uma sociedade em profunda angústia. A voz mais recente a erguer-se foi a da Igreja da região que, com o que disse e com o alcance dos avisos que lançou, não hesitou no incómodo de ser quase uma voz a clamar no deserto, pois na verdade o Algarve não tem voz que protagonize o bem-comum com firmeza reivindicativa, com argumentário acima de interesses parcelares e com propostas que não decorram meramente do combate político sumindo-se nesse combate como a água na areia.

Quanto ao estado da economia, não são dois meses e meio de turismo a preços de saldo que irão evitar a trajetória para a implosão da atividade da qual a região está dependente e até prisioneira, se não houver uma política firme e sábia que salve o que pode ser salvo, política essa que não pode ser apenas política fiscal, obsessivamente fiscal e fundamentalmente fiscal. A cultura, da criação à animação, que é uma das asas indispensáveis para um Turismo viável e integrado numa estratégia de desenvolvimento, tem a coluna vertebral partida e não tem agenda. A promoção externa e interna é uma lástima. O acolhimento lástima é. As coisas vão acontecendo como se bastasse despejar pessoas nas praias até à hora de embarque. A caminharmos assim, pouco faltará para que o património hoteleiro construído tenha o epílogo das fábricas de conserva cujos silvos de chamada ao trabalho outrora acordavam algumas vilas e cidades para um sonho de efémera prosperidade mas que acabaram geralmente no abandono, com telhados caídos e paredes em ruínas. Os sinais da derrocada estão já aí no desemprego que não é apenas causado pela paragem da construção civil e pela ausência de obras públicas, é em grande parte corolário da perda de ritmo e da falência por ora adiada da atividade.

A regionalização não foi implantada porque o poder central chamou a si a responsabilidade de conduzir diretamente os destinos à exceção de umas derivas que um municipalismo sem quadros, sem meios e sem suficiente entrosamento e inter-ligação deu como ilusória proximidade entre administração e administrados, e também à exceção de uma malha de delegações governamentais que longe de delegarem, funcionam como sinecuras, mordomias calculadas e pespontos desenraizados. Muitos choram confrontados com os efeitos mas omitem as causas, furtam-se a atacar as causas, evitam o debate das causas e fogem da identificação das causas como o diabo da cruz.

A agravar o quadro, o Algarve tem ou sofre de um gravíssimo problema de comunicação. A sociedade algarvia desconhece-se a si própria como tal, entregue a localismos cada vez mais reduzidos de tal modo que é já quase regra geral que pouco saibam o que acontece na própria rua, a começar pela fome, pelo desemprego, pelos factos da insegurança. E uma sociedade sem política e sem comunicação, além de se abandonar aos oportunismos mais inconcebíveis e de se conformar com os vira-casacas transformados em santos milagreiros, não pode ter esperança, e se algum rumo pode ter, esse será um rumo caído ao acaso do céu, como alguma chuva inesperada consoante a nuvem. 

É hora de fazer alguma coisa contra o risco da implosão. Numa democracia, a hora do voto é o momento adequado para responder, mas não basta. E não basta porque a economia regional está nas lonas, estriçada pelo fisco e pela anemia política; porque a fome já não é apenas um espectro, é uma multidão de seres; e porque o desemprego não é já vício de uns tantos, mas calamidade social. Identificar o problema, e assumir o problema, é o ponto de partida para alguma solução. Para uma solução que encontre porta-voz.

Carlos Albino
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Flagrante símbolo: Volta a estar atual o velho mas abandonado símbolo constante do brasão de armas do Algarve – dois reis mouros e dois reis cristãos...

quinta-feira, 2 de maio de 2013

SMS 511. Facebook, blogues, websites...

2 maio 2013

É a tentação do clique. Não se pode falar em inundação, mas em cheia. A contrastar com uma Imprensa que, em particular no Algarve, se debate numa crise sem precedentes (crise sobretudo por excessiva dependência de fontes noticiosas estranhas, por inevitável produção sediada a centenas de quilómetros e por cada vez maior desligamento do potencial leitor), aí temos a região inundada por blogues, por websites, pelas mensagens do facebook, pelos emails distribuídos por listas mais ou menos amplas, enfim, pelos vídeos do youtube em que, descontada a paisagem, até se conseguem filmar inverdades. E há de tudo. Há o belo e o feio; há o limpo e o porco; há o bom e o mau. O feio, porco e mau, por regra, é anónimo, e tão mais anónimo quanto os alvos são bem identificados e dados como alvos a abater, embora os fins não sejam confessos. O belo, o limpo e o bom, também por regra, parte de gente que assume a autoria ou que, por pudor, se fica pelas iniciais, mas cuja generosidade, sentido crítico e interesse pelo bem-comum são patentes, haja convergência ou divergência com os pontos de vista.

Depois de algum período de incerteza e também de desconfiança quanto ao valor e eficácia, os novos instrumentos de comunicação instalaram-se no Algarve e vieram para ficar. Dos websites mais ou menos aprimorados de instituições às páginas de associações culturais, cívicas ou recreativas, dos portais das câmaras melhor ou pior entrosados no serviço público aos sites de empresas, escolas e bibliotecas uns mais parados que outros, do reclamado online dos jornais que resistem com papel mas que viram nos novos meios sistemas complementares e de promoção dos seus cabeçalhos aos espontâneos navegadores da internet, o Algarve não fugiu à regra do mundo, juntando-se a isso, as newsletters de deputados e de candidatos que se prezam, os emails apelativos ao seguidismo político ou à participação em “eventos”, e sobretudo, as irresistíveis mensagens no facebook e os blogues de cidadãos, uns que nascem para funcionar como pretendida espécie de jornais locais ou até regionais mas também morrendo longe disso, outros que brotam como sinceras páginas literárias ou como recursos de intervenção política, da geral à local, mas que se esboroam ou pelo cansaço ou pelo laxismo dos que não conseguem conviver com a crítica.

A enxurrada de informação expedida e recebida é já apreciável, sem dúvida que foi criado um público destinatário novo, ainda não contabilizado mas que é um nicho na sociedade, aqui maior, ali menor, mas nicho. Esta enxurrada de informação, com as suas verdades e inverdades, corre abertamente mas em grupos fechados, enquanto os tradicionais meios de comunicação não saíram do ponto onde se encontraram sempre no Algarve, e que, quanto ao papel, é o ponto da insuficiência tecnológica de produção e da relutância à leitura em que o algarvio é incorrigível, porque quanto à rádio é gira-discos com verbos de encher, e quanto à televisão é inexistente. Resumindo e concluindo, apesar dos novos meios e do esforço que alguns meios tradicionais fazem, o Algarve tem um problema de comunicação. Um grave problema de comunicação, apesar do facebook, dos blogues, dos websites...

Carlos Albino
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Flagrante ouro: A atribuição da medalha de mérito (grau ouro) pela Câmara de Loulé a Guilherme d’Oliveira Martins, antigo ministro da Educação, das Finanças e da Presidência, e atual presidente do Tribunal de Contas, com fortes ligações familiares a Boliqueime que até considera a sua terra natal, significa que Boliqueime não é só isso ou se resume a isso. E o ouro também ao deputado Mendes Bota, é justo reconhecimento pelo seu trabalho no Conselho da Europa, designadamente pelo seu desempenho e brio em levar a bom porto a Convenção para a Prevenção e o Combate à Violência contra as Mulheres e a Violência Doméstica.