quinta-feira, 27 de maio de 2010

SMS 364. João Soares disse a verdade


27 maio 2010

O facto. Sabe-se que, no passado sábado, durante o jantar que levou ao Arco da Vila a nutrida comissão parlamentar de Assuntos Económicos que anda por aí e bem a tomar o pulso ao país real, o deputado do PS, João Soares, afirmou alto e bom som que o problema de fundo do Algarve é o da “falta de liderança regional”. Mais disse João Soares, surpreendendo muitos, que esse problema jamais poderá ser resolvido pelo governo central – o atual ou mesmo o que se lhe seguir, provavelmente em 2011 – e que nem sequer a regionalização o resolverá.

Primeiro ponto, então. João Soares disse a verdade, tem carradas de razão e não lhe pode ser imputado qualquer sinal de incoerência, antes pelo contrário, todos os algarvios (sejam do PS ou não) apenas podem ficar-lhe gratos pela coerência manifestada, coerência essa, oxalá fosse seguida pelos demais deputados sejam eles do PS ou não, pois a todos, nesse caso, deveríamos ficar gratos não assobiarem para o lado ao menos uma vez na vida. E é importante sublinhar que João Soares não disse que o Algarve precisava de uma liderança partidária ou de lideranças partidárias, mas sim de liderança regional – o que tem a ver mas pode também não ter a ver com apenas partidos. Naturalmente que os partidos ou as estruturas regionais dos partidos elegem os respetivos líderes sejam estes assim ou assado, por interesse do cozido ou ao serviço do frito, mas são eleitos e não consta que haja lugares vagos. O problema de fundo não é, pois, partidário, mas de liderança regional e o lugar desta, sim, é que está vago. Aliás esteve sempre vago e, bem avaliados os intérpretes e personagens (todos) da política algarvia desde 1974, nunca a região teve uma liderança nem um líder que verdadeiramente a protagonizasse. Uns arremedos, quando muito.

Segundo ponto. Um líder - e então um líder do Algarve! - obviamente que não é feito nem pode ser feito por decreto, como se bastasse para tanto um primeiro-ministro da simpatia despachar coisa do género “nomeio fulano tal, líder do Caldeirão ao cais da lota de Faro”. Além disso, como ficou provado, o líder não pode depender da eleição partidária interna (pode coincidir mas não depende), o que se viu de forma muito clara nas últimas eleições: é verdade que os partidos algarvios, num primeiro momento, elegeram os que julgaram ser os seus “líderes partidários” regionais mas, a começar pelas três agora principais forças políticas, tais líderes foram desautorizados para a representação democraticamente mais refinada. E a desautorização, aceite, tolerada ou colaborativamente consumada, é o quanto basta para impedir que uma qualquer liderança partidária evolua para liderança regional.

Terceiro ponto. É claro ainda que o tal líder ou a tal liderança regional também não cai do céu por obra e graça do Espírito Santo, e, em democracia, jamais se pode aceitar que seja alguém que, por nascimento, fortuna ou fanfarronice se julgue predestinado a chefe, ou portador de desígnio insondável, desígnio este que por regra anda com a máscara do populismo, sobretudo quando a democracia se transforma em permanente carnaval de uns quantos foliões à custa do erário e do interesse público – o Algarve tem conhecido disto e é por isso mesmo que mais uma vez, reconheça-se, João Soares tem razão: não é regionalização que vai ou poderá resolver o problema da falta de liderança política do Algarve, porque uma regionalização sem liderança e sem pluralismo de líderes não passará de um baile populista que, passados três dias de democracia frágil, redundará num perfeito entrudo.

Carlos Albino

    Flagrante esquecimento: O de alguém, crente ou não, que em nome ou em representação do Algarve, tivesse oferecido uma caravela ao papa. Até do nosso maior milagre já nos esquecemos?

quinta-feira, 20 de maio de 2010

SMS 363. Tudo ao molho e fé em Deus


20 maio 2010

Mesmo com todos os sinais que estão à vista, alguns que não são poucos continuam a não querer perceber a crise em que estamos metidos, e, pior do que não querer perceber, é camuflar os sinais e adiar a discussão dos possíveis caminhos de saída. Para o Algarve, estes caminhos são escassos, porquanto a região depende precisamente de tudo o que pelo mundo afora e no país está em crise ou que inesperadamente ameaça entrar em crise, pedindo-se a todos os santos para que a crise não se transforme em colapso, como é o caso preocupante das ligações aéreas. Tenho vindo a dizer, desde há semanas, que estamos entregues ao acaso, o que é desagradável, e pior do que isso, não temos estratégia decente e segura – temos táticas, por sinal pequenas táticas atiradas para o ar na esperança de que a coisa resulte e haja sorte. Infelizmente até a sorte tem faltado e oxalá que não cheguemos a um momento em que a regra seja aquela de “tudo ao molho e fé em Deus”. Um exemplo de tática pífia atirada ao ar, por exemplo, aí esteve patente nos discursos de esperança no mercado espanhol para compensar a quebra do mercado britânico, no turismo claro. Como se a crise não estivesse já instalada em Espanha, com os espanhóis a braços com os mesmíssimos males de que padecemos – do desemprego ao défice. Outro exemplo de pífias táticas atirada para o ar, aí a temos também, com as veleidades segundo as quais a exploração de pequenos nichos de mercado, mesmo que seja a pretexto de coisas festivamente marginais e de duvidosa paz, ajudará a matizar a crise… E é assim que instituições que temos entre nós e que já deviam ter produzido estudos com linhas alternativas de orientação, ou que já deviam ter instalado observatórios com alertas para o que der e vier, andam nas nuvens ou olhando para o umbigo. Refiro-me sobretudo às instituições que deviam ser as últimas em que a sociedade deve perder a confiança.

Carlos Albino

    Flagrante calafrio: O fracasso do Museu da Cortiça. O fracasso não foi apenas de Silves mas do Algarve no seu todo. Além disso um sinal de aviso e que não é pequeno.

quinta-feira, 13 de maio de 2010

SMS 362. Quem se pica, alhos mordica


13 Maio 2010

E em vez de se avaliar a realidade (a que temos pelos olhos e a previsível) continua-se a fazer vaticínios, conjeturas, hipóteses e exercícios de esperança sem fundamento que é a pior das esperanças. Em vez de preparar isto para enfrentar o pior, porque para o melhor não são necessários preparos, ainda se está a amaciar e a pintar o céu de azul quando as nuvens carregadas entram pelos olhos. Além disso, em vez de se reconhecer que o poder central está, na sua quase totalidade e nos postos-chave, na dependência dos grupos de pressão onde o Algarve e os algarvios não contam como tal, ainda alguns por aqui julgam que o tal Zé Pagode já não percebeu que a moda virou desde que os decisores deixaram de ter interesses directos ou indirectos neste quintal, que a política volta a ser dirigida quase em exclusivo para onde secularmente se tem dirigido sempre e que é onde o país se julga sentir país, considerando o resto como um pequeno território inofensivo e adjacente tal como aquelas ilhas que já foram adjacentes e hoje, pelos vistos, não. Portanto, pequeno território que não levanta ondas e mesmo que as levante está sob controlo porque o próprio território perdeu o controlo de si próprio – o controlo económico há muito que o perdeu ou não o soube construir quando podia e devia, e o controlo político naturalmente que foi sacrificado a bem das disciplinas nacionais. O turismo como motor de desenvolvimento do Algarve pode estar à beira de um estrondoso fracasso se a sorte faltar, porque o turismo, além de não viver de cálculos com desfecho improvável e de notícias artificiais, também não é motor de desenvolvimento quando não está ancorado onde opera – e o turismo algarvio não se ancorou, é um extenso balcão de quem está fora com a carteira. Além disso, o mar está esquecido e o que dele se ouve parece oratória nas nuvens, e a terra resume-se a umas poucas experiências-piloto, a meia-dúzia de resistências e a campos abertos a qualquer género de ladroagem. Não admira, pois, que o discurso político no Algarve abuse do vaticínio e se sirva da ingenuidade circundante, até porque quem não aceita as regras deste jogo que é um jogo infame numa democracia, está feito. Aliás, pouco faltará para que a própria democracia não esteja feita. E quem se pica, alhos mordica.

Carlos Albino

    Flagrante incógnita: A do estafado Hospital Central do Algarve... Obra adiada, suspensa ou para ir até ao fim?

quinta-feira, 6 de maio de 2010

SMS 361. O triunfo do Zé Pagode…



6 maio 2010

Há um personagem que volta a andar por todas as ruas e aflora amiúde à mente de toda a gente, não há ninguém que o não conheça embora não apareça nas televisões nem seja tido muito em conta pelos jornais, nunca se candidatou a câmaras, sempre o recusaram para listas de deputados e, não estando contra os partidos, também não se importa que estes o olhem com desdém não desejando a sua presença em reuniões em que alguma coisa se possa decidir. Esse personagem, silencioso por natureza, sabe mais do que se julga quanto a jogadas que abusam do interesse público, a procedimentos que roçam a ilegalidade e tocam-não-tocam na corrupção e a golpes que resultam sempre em enriquecimentos sem justa causa, em usufruto de mordomias e empregos de favor, e em estratagemas que pouso a pouco vão diluindo a confiança nos poderes eleitos e a crença nos processos de escolha dos que em última análise decidem a vida colectiva e determinam a maior ou menor felicidade de se viver numa sociedade aberta e livre. Claro que esse personagem tem um nome embora o seu nome não conste em nenhum bilhete de identidade, nunca se absteve sem que alguma vez tivesse fisicamente aparecido em qualquer mesa de voto de Aljezur a Alcoutim e, como mais ninguém, interfere na opinião pública possível de Vila Real a Sagres. Pois não é segredo dizer-se que esse personagem é nem mais nem menos que o Zé Pagode. Exactamente: o Zé Pagode.

Ele, o Zé Pagode está na sua e dificilmente o demovem da convicção de que o aparelho público, tal como está, das juntas e câmaras às repartições, divisões, delegações, entidades e direcções desconcentradas ou descentralizadas dos ministérios, que tal aparelho, de um modo geral não existe para servir a população, mas para ser sustentado por ela. Pode até não ser assim, mas o Zé Pagode pensa isso e tem motivos para pensar assim – ou pelo sinal de imobilismo transmitido por esse aparelho no trato das questões centrais do Algarve que dependem exclusivamente não só do livre mas sigiloso arbítrio do estado mas também dos que o Zé Pagode acreditou para serem seus representantes, ou pelas provas patentes de que é pura e simplesmente uma perda de tempo esperar a colaboração do estado em qualquer medida que vise a devolução do poder aos administrados com a consequente diminuição da fisiologia política do aparelho público que só revela alguma humildade mês e meio antes de cada eleição, seja esta qual for e consoante o nível que seja da eleição. Ora o Zé Pagode que de ingénuo nada tem, naturalmente que anda por aí irritado por o terem tratado como se tivesse nascido e sido criado pela ingenuidade, ingenuidade esta, como se sabe, é já de si um promíscuo harém da democracia.

Resumindo e concluindo, o Algarve, tal como no distante século XIX, está cheio de duques, condes e viscondes mas sem nobreza própria, e, tal como no recente e acabado século XX, está cheio de regedores e com proeminentes figuras no santuário da representatividade popular, mas não chegam aos dedos de uma só mão os que em vez de mostrarem que sabem defender os interesses dos eleitores, não se livram da fama de apenas defenderem os interesses pessoais e políticos dos que integram o carro alegórico da pescadinha de rabo na boca em que os partidos tristemente se converteram aos olhos do Zé Pagode que não é propriamente uma ilustre figura da democracia e, pior, não tem o código genético desta, sendo mais um filho do harém…

Carlos Albino

    Flagrante entalanço: O da entidade do turismo com as verbas do orçamento. Pois o modelo não foi acabar com a evolução da defunta RTA? O que se esperava com o modelo, se o modelo foi para isso?