quinta-feira, 25 de julho de 2013

SMS 523. A A-22 e a EN-125


25 julho 2013

Não é pelos protestos mas pela premência do tema que é inevitável regressarmos à questão da Via do Infante. O governo tratou o assunto de ânimo leve, olhando apenas para os traços do mapa e para a caixa registadora, sem atender às características da região e que são radicalmente diferentes de quando a EN-125 ficou construída. A questão não se limita a pagar ou não pagar portagens, a questão é de ver a região, pensar a região, servir a região. A EN-125 concebida inicialmente para atravessar longitudinalmente o litoral do Algarve, ligando antiga terra a terra antiga desde Vila do Bispo a Vila Real de Santo António, há muito que deixou de ser essa travessia rural por entre hortas e herdades agrícolas, hoje é uma rua, uma extensa rua em grande parte densamente ocupada por casas e estabelecimentos de comércio e de serviços. Onde outrora existiam apenas sítios e aldeolas, hoje estão prolongamentos urbanos cheios de vida e de movimento. A Via do Infante surgiu e assim foi saudada para ser a nova e única travessia do Algarve, com as principais cidades, vilas e sobretudo aglomerados de relevo a adaptarem as entradas e escoamento de tráfego a essa solução que levou décadas a ser concretizada, quando, com a previsibilidade do que o turismo iria instalar na região, era por aí que se devia ter começado. Mas, enfim, toda a gente compreendeu que nem sempre o planeamento é possível e que era incontornável aguardar-se pelos dinheiros europeus. Aliás, os algarvios só entenderam que tinham entrado da União Europeia quando os cartazes de financiamento das obras deixaram claro sobre quem as pagava, não por caridade mas por solidariedade. Acreditou-se nisso.

Com a introdução das portagens, o tráfego voltou a ser empurrado para a antiga estrada com promessas de requalificação do que é impossível ser requalificado. A requalificação onde houve, ou onde foi projetada, consistiu no alargamento das faixas e na implantação de extensos separadores, aumentando a insegurança, destruindo vizinhanças consolidadas e potenciando a EN-125 como um corredor da morte. Na verdade, uma requalificação da EN-125 apenas seria compreensível e até admissível como rua aqui, avenida ali, e não como “estrada”.

Estragou-se tudo. A A-22 deixou de servir muita gente, além de introduzir o caos, má imagem e desmotivação junto dos visitantes de quem o turismo depende, e a EN-125, ainda mais do que já era, passou a ser o inferno transversal do Algarve, jamais travessia, desconhecendo-se os efetivos ganhos com as portagens além da imoralidade de taxar obra paga por entidades terceiras na maior parte a fundo perdido.

Lamentável foi e continua a ser é que as chamadas “forças vivas” representativas da região não tenham mostrado nem força nem vida, num comprometimento entre o receio de perda de mordomias, fidelidades partidárias espúrias e o rosto com que enfrentam as populações. Depois de um “não” tímido inicial, passaram ao “não-mas-sim”, e deste  ao “sim-devido-à-crise”. Ora, a verdade é que a A-22 aumentou a crise e a a EN-125 vai resolvendo a mesma crise mas nos cemitérios.

Carlos Albino
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Flagrante esquecimento: No apontamento da semana anterior, a propósito das lojas do senhor Belmiro e do senhor Alexandre, ficou por dizer que acabámos por comprar fruta autêntica numa casinha tradicional – pêssegos de Paderne (só no paraíso!), melancia da Patã (que até o Papa Francisco bisaria), laranjas do Vale Telheiro, maçãs de Messines… 

quinta-feira, 18 de julho de 2013

SMS 522. A loja do Senhor Belmiro

18 julho 2013

Em todas as ruas principais há uma seta a indicar a loja do Senhor Belmiro, nenhuma a sugerir as pequenas lojas de comércio tradicional. E querendo comprar alguma fruta, lá fui esta semana à loja do Senhor Belmiro depois de ter ido à loja do Senhor Alexandre para ter uma ideia, verificando que é tudo mais ou menos igual quanto a “estratégias” embora tudo relativamente diferente quanto a “logísticas”. Aos olhos, quer na loja do Senhor Belmiro, quer na loja do Senhor Alexandre, as frutas e as verduras são esplêndidas, as cores magníficas, e se os olhos comessem aquilo é que seria fruta. Já quanto ao cheiro, nada, sabendo-se que a fruta começa pelo cheiro. E quanto ao tato, a coisa ou era dura que nem pedra, ou era mole que nem alforreca. Então, era de fazer a interrogação sobre a origem daquilo tão bonito aos olhos.

Pois na loja do Senhor Belmiro, percorrendo os expositores de ponta à ponta, os limões e as mandarinas eram do Uruguai e as toranjas da África do Sul; havia maçãs da Bolívia, do Chile, da Nova Zelândia, de França e da Polónia; as nectarinas, melancias, meloas e melões verdes, de Espanha; ameixas e pêssegos, também de Espanha; romãs e ameixas pretas, de Chipre; bananas às rodelas, das Filipinas; miolo de amêndoa, ainda de Espanha, e já o miolo de amêndoa torrado, dos EUA, como dos EUA era também o miolo de noz. E o amendoim torrado com casca? Da China. Havia mais de todo o lado. Enfim, a loja do Senhor Belmiro, quanto a frutas, parecia a ONU.

E de Portugal, para não precisar do Algarve? Pois de Portugal, a loja do Senhor Belmiro apresentava umas laranjas que ou já foram laranjas ou então poderiam vir a ser, e umas bananas da Madeira. Mais nada.
Perante isto, fica-se sem saber se a loja do Senhor Belmiro, tal como a loja do Senhor Alexandre, visam beneficiar o consumidor que não tenha cheiro nem tato, já que em nada favorecem o produtor português, e mesmo assim se isso favorece de algum modo os produtores da Nova Zelândia, da China, de Chipre, das Filipinas, por aí fora, porque caridade não é.

Carlos Albino
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Flagrantes sondagens: Os partidos que têm ainda algum dinheiro ou alguém lhes dá fizeram sondagens locais, aqui e ali, mudando inclusivamente candidatos já apresentados e alterando “estratégias” em função das sondagens. O certo é que, hoje, quinta-feira, faltam já 72 dias para as eleições autárquicas e não há sondagem que emende o carácter e a honra.   

quinta-feira, 11 de julho de 2013

SMS 521. Os estrangeiros nossos vizinhos

11 julho 013

Os estrangeiros com residência permanente no Algarve são muito mais que os 6.731 que se inscreveram como eleitores para estas autárquicas de setembro, mas esse número já é apreciável e há que ter em conta. E embora os estrangeiros inscritos nos cadernos eleitorais da região, na sua maior parte, possam eleger e ser eleitos, até agora não é conhecida qualquer candidatura a cargo local ou participação expressiva em lugar elegível nas listas. Ou seja: bastantes dos nossos vizinhos estrangeiros participam, por certo irão votar, mas não querem meter-se diretamente no barulho. E compreende-se porquê. A população estrangeira está muito dispersa pelo Algarve, na maior parte das freguesias confina-se em microcomunidades, e, por uma questão cultural, é uma população discreta e aversa à intrusão. Em todo o caso, contam e cada vez mais, até porque começa já a existir uma segunda geração nada e criada no Algarve, perfeitamente integrada e inserida.

É curioso verificar que é o concelho de Loulé aquele que apresenta o maior número de eleitores estrangeiros inscritos: 1.322 (831 cidadãos da UE e 491 de países extra-UE). Segue-se Albufeira, com 1.193 inscritos (451 da UE e 742 extra-UE). Depois Silves, com 687 (554 UE e 123 extra-UE); Tavira, 673 (609 UE, 64 extra); Lagos, 646 (616 UE, 30 extra); Portimão, 521 (292 UE, 229 extra), enfim, cá já em baixo Faro com 297 eleitores estrangeiros (134 da UE e 163 extra-UE).

Toda esta gente, nossa vizinha, é em número esmagador uma gente culta, conhecedora de como funciona ou deve funcionar a democracia, muitos com vivência e experiência dramática da história, quase todos tendo surpreendido Portugal já em democracia, têm muito para dar, com raras exceções falam português, muitos lêem e escrevem a língua de acolhimento, e todos usam o sorriso como linguagem universal de simpatia que é algo que entre nós, os nacionais, vai faltando porque dar os bons dias já quase desapareceu e dizer obrigado só muito bem pago.

Ora os nossos vizinhos estrangeiros, ao inscreverem-se nos cadernos eleitorais, querem dizer antes de tudo que estão presentes, que vivem os problemas, e que, embora com discrição, querem participar através do voto na escolha de soluções. A partir das câmaras e das juntas há olhar de maneira diferente do passado, para estes vizinhos com muitos dos quais só temos a aprender.

Carlos Albino
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Flagrante soma: Faltam 80 dias para as eleições autárquicas. Infelizmente para alguns, talvez muitos, é a soma de 40 dias para enganar e de outros 40 dias para ser enganado,

quinta-feira, 4 de julho de 2013

SMS 520. Lagos esqueceu-se? Possivelmente não.

4 julho 2013

Neste sábado (dia 6, 18:30) debate-se em Lisboa, na Casa da Achada (Rua da Achada, n.º 11, na Mouraria), a questão do bairro da Meia Praia, questão de Lagos mas que vai sendo um emblema dos tempos. Vale a pena recordar porquê, bastando seguir as palavras dos promotores da iniciativa.

Quando se deu a revolução de Abril de 1974, as barracas de zinco de uma comunidade de pescadores, em Lagos, desapareceram desse lugar. Através do serviço ambulatório de apoio local, conhecido como projecto SAAL, o governo cedeu o terreno, o apoio técnico e parte do dinheiro, e as populações avançaram com a mão-de-obra.

O fim do bairro de lata de Lagos ficaria a dever-se ao arquitecto José Veloso. Foi difícil convencer os moradores do bairro. Desconfiavam das promessas e chegaram a ameaçar correr José Veloso à pedrada. O arquitecto não desistiu. Aos poucos, os pescadores acreditaram que poderiam ter direito a uma casa.

A população, ansiosa por deixar as barracas, organizou-se em turnos. Quando os homens estavam no mar, eram as mulheres que trabalhavam nas obras. Havia duas regras: as habitações tinham de começar a ser construídas ao mesmo tempo e todos teriam de ajudar na construção de todas as casas.

O realizador de cinema António da Cunha Telles decidiu fixar em imagens a transformação que estava em marcha no documentário «Índios da Meia Praia» e José Afonso criou a música com o mesmo nome.

Quase quarenta anos depois, o bairro, localizado a poucos passos da praia, numa zona de expansão turística e ao lado de um campo de golfe, parece ter os dias contados.

Nesse debate vão estar presentes precisamente o arquitecto José Veloso e o sociólogo João Baía. Esperemos pelas conclusões.

Carlos Albino
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Flagrante contagem de eleitores: A 87 dias das eleições autárquicas (a partir de hoje, quinta), segundo o mapa oficial publicado esta semana, no Algarve estão inscritos 373.714 eleitores, dos quais 366.983 são cidadãos nacionais, 2.023 são estrangeiros residentes e 4.708 são cidadãos da UE.