quinta-feira, 31 de março de 2005

SMS 99. A "melhor sapataria" desta rua...

31 Março 2005

Francisco Pinto Balsemão, assim se espera, vem ao Algarve, no sábado da próxima semana (dia 9), falar sobre a Imprensa Regional no Século XXI. É um tema aliciante porque no Século XX esse foi um desafio que, salvo dois ou três casos e mesmo assim configurando êxitos relativos e circunstanciais, Portugal não conseguiu ganhar e o Algarve muito menos. Factores vários podem explicar o insucesso, mas sempre que esse tema vem à baila recordo-me daquela saborosa historieta de duas modestas sapatarias que, sendo as únicas e frente a frente na única rua de uma recôndita aldeia, encetaram forte competição entre si. Os leitores saberão da história mas não faz mal recordar. Um belo dia, o dono de uma das sapatarias resolver afirmar-se e colocou um grande letreiro sobre a porta dizendo assim: «A Melhor Sapataria da Aldeia». A resposta do concorrente não tardou muito pelo que, escassos dois dias depois, podia ler-se sobre a porta da outra sapataria um letreiro mais persuasivo: «A Melhor Sapataria da Província». O outro, porém, não ficou de braços cruzados e, ainda a tinta do adversário estava fresca, não hesitou em emendar o letreiro inicial para isto: «A Melhor Sapataria do País». Naturalmente que a aldeia entusiasmou-se com esta guerra de tabuletas e qual não foi a surpresa quando, no outro dia, surge na sapataria da frente letreiro supostamente mais convincente: «A Melhor Sapataria do Mundo»... Aqui, chegado a este patamar de qualificação, o dono do estabelecimento respirou de alívio convencido de que o seu competidor estava derrotado em definitivo. O outro dono ficou deveras perturbado, passeou rua abaixo rua acima matutando, matutando... e, num daqueles momentos em que o instinto de sobrevivência faz com que a esperteza humana obrigue o corpo a dar um salto, pois deu o salto, abriu o escadote e emendou o letreiro para «A Melhor Sapataria desta Rua».... E com isto ganhou a batalha e terminou a guerra.

É claro que a fábula ensina que a Imprensa Regional deve pretender sempre ser a melhor «desta Rua», porque o País - e então o Mundo! - tem muito mais ruas, ruas com outros meios e interesses, tantas ruas! Só que no Algarve é a rua do Algarve que interessa. Por outras palavras, já Victor Hugo se interrogava - «Entre o telescópio e o microscópio, qual deles a melhor visão?» Aguardemos então pelo que Francisco Pinto Balsemão nos vem dizer à nossa rua. Seja benvindo!

Carlos Albino

quinta-feira, 24 de março de 2005

SMS 98. Algarve-Andaluzia, uma parceria óbvia

24 Março 2005

O diálogo entre o Algarve e a Andaluzia tem sido insuficiente e a cooperação entre as duas unidades históricas do sul da Península, na prática, é insignificante – há umas «coisas» por ali e por aqui mas decorrendo do voluntarismo e das meras boas vontades. Não há um plano, uma estratégia concertada entre os dois lados, uma ideia grande. O que é estranho, porquanto entre o Algarve e a Andaluzia não há conflitos fronteiriços, não há preconceitos de monta nem sequer suspeições de que Sevilha queira tomar Faro, ou que Huelva queira suplantar Vila Real de Santo António. Os andaluzes, nisso – estou em crer – estão a quilómetros e quilómetros dos estremenhos que começam logo por mentir nas fronteiras. Entre o Algarve e a Andaluzia esse problema não existe.

Ora, uma cooperação aprofundada, um diálogo consistente e uma afirmação consolidada deste verdadeiro arco mediterrânico não é coisa que caia do céu. Até há pouco tempo, o Algarve poderia queixar-se de não ter um instrumento institucional, mínimo que fosse, para encetar caminho e falar para os andaluzes e com os andaluzes. Agora tem. Tem esse mínimo que se chama Junta Metropolitana a que se exige mais do que olhar para o umbigo, ficando à espera do trem e do sábado que vem. Uma liderança regional não se constrói por decreto e até será desejável que não dependa de decreto, mas sim da sua capacidade de rasgar horizontes, de abrir o Algarve para lá das duas fronteiras que o empalham – a fronteira do Alentejo que está a transformar a Província numa venenosa Costa da Caparica e a fronteira da Andaluzia que, vencida – como poderia e deveria ser vencida – poderia dar à Província um bilhete de identidade menos condicionado pelas mentalidades provincianas que imperam tortas.

Devemos então dizer a Macário Correia que se desejar um hino para o Algarve, aí está o melhor hino – entoar um diálogo bem cantado com Manuel Chaves, o Presidente da Junta da Andaluzia. E se desejar uma bandeira, aí está a mais bondosa bandeira – uma cooperação que mobilize e movimente o melhor que entre os dois lados pode cooperar. O Algarve não tem governo como os andaluzes, não tem parlamento como o que se reúne em Sevilha presidido por Mar Moreno, mas ao menos poderia e deveria para já, convidar Manuel Chaves e Mar Moreno para, aí em algum auditório sem pretensões a capital em falsete da cultura, nos explicar o que Andaluzia pensa de si própria e do Algarve… Não vou ensinar o padre nosso ao santo cura.

Carlos Albino

quinta-feira, 17 de março de 2005

SMS 97. Areia para os olhos

17 Março 2005

E aí está alguma polémica com as chamadas «Secretarias de Estado deslocalizadas», designadamente com a do Convento de São Francisco em Faro. Chamou-se a essa «deslocalização» quase tudo: ora era regionalização ou anunciado passo para isso para logo se corrigir para desconcentração, e depois, vendo-se como a emenda aumentava a asneira, passou a falar-se de descentralização… Mas independentemente destes jogos de palavras, o Estado continuou centralista – como sempre foi e por cero continuará a ser – cometendo aos secretários de Estado «deslocalizados» a função de fazer promessas, de amolecer justas pretensões e de satisfazer a vaidade de meia dúzia convencida de que ao apertar a mão do secretário de Estado estaria a apertar a mão do Estado…

Um secretário de Estado do Turismo em Faro – já aqui foi dito – era mau para Faro e mau para o Algarve. Mau porque qualquer decisão normal, vulgar e lógica que tomasse, seria entendida pelo País fora como suspeitosa, como estando a favorecer o perímetro do gabinete e os interesses gravitacionais dessa área política. Além disso, o Ministro do Turismo do Resto do País sentia-se assim isentado para as questões do Algarve e para as responsabilidades com o Algarve – «Falem com o secretário de Estado!», era a resposta sem expediente. Viu-se o que foi feito para a Região Centro, para o Douro, o que foi prometido para o Alentejo… e o que foi feito para o Algarve, nomeadamente para Faro onde esse pormenor do projecto da capital da cultura ficou com um orçamento praticamente igual ao da restauração do Teatro de Ópera Micaelense e pouco superior ao da restauração do teatro de Estremoz! O turismo – principal interessado na façanha – fez ouvidos de mercador e a programação, pelo que foi dito, equivale à programação normal da Câmara de Cascais e nem uma acção apresenta com o nível da que na Póvoa do Varzim (um dos principais estuários dos casinos) se consegue. Basta citar apenas este pormenor, não vemos mais longe.

Adivinhava-se que um secretário de Estado «deslocalizado» em Faro, como aconteceu com o outro «deslocalizado» em Coimbra e com os restantes cada um na sua capelinha local, das duas uma: ou se convertia num vereador do presidente da Câmara local, ou num capataz com direito à primeira fila nas missas, ao centro da mesa nos almoços e ao fim das sessões com discursos. Esse secretário de Estado, bem vistas as coisas, não estava «deslocalizado» – palavra horrível! – mas sim deslocado. Deslocado, e a atirar areia para os olhos porque toda a gente sabe onde a sede do capital financeiro das empresas turísticas que operam no Algarve a começar pelo jogo, salvo honrosas excepções, está – fora do Algarve.

A decisão de acabar com a palhaçada que nunca deveria ter começado, foi boa. O Algarve ficará mais favorecido com uma Direcção «Regional» de Turismo (as aspas justificam-se!) que desconcentre a sério, melhor ficaria com uma Direcção Regional sem aspas, que corporizasse verdadeira descentralização e preparasse caminho para uma autêntica regionalização. Mas esta, o Estado não quer, e sendo assim que não atire areia para os olhos.

Carlos Albino

quinta-feira, 10 de março de 2005

SMS 96. O que se passa nas ruas e estradas é muito feito e muito mau…

10 Março 2005

O que está a acontecer, dia e noite, nas estradas do Algarve e nas ruas das nossas cidades e vilas, é demais e não tem comparação com o que se passa no resto do País. Refiro-me ao trânsito selvagem, ao caos do estacionamento, à falta de civismo geral, ao desleixo das autarquias em matéria de educação pública, planos de persuasão e campanhas de prevenção, refiro-me à manifesta passividade das autoridades (não é só a falta de meios e incentivos…) e, sem dúvida, refiro-me a um estado geral de permissividade – até parece que ninguém se sente lesado.

São motas a voar por ruas principais e secundárias a 140 à hora, são automóveis a fazerem de simples travessas circuitos do Mónaco, são veículos uns estacionados sobre os passeios aos montões como camelos a dormir em Casablanca, outros estacionados no sentido inverso da marcha, é o escape aberto como regra geral, são as buzinadelas mesmo na alta madrugada para chamar um amigo do terceiro andar sem sair do carro, é a condução ilegal e indocumentada, é o trânsito nocturno dos intermediários e traficantes da droga que para tanto devassam recônditos caminhos rurais, são os pesados na Via do Infante a acelerarem como se fossem aviões a levantar voo no aeroporto de Faro… Ora entram em vigor novas medidas do Código da Estrada mas duvido que as novas coimas sejam eficazes se as autarquias não se empenharem na instrução pública (é a expressão), se as autoridades não começarem a levantar o dedo para além da caça à multa e se a sociedade não se indignar a sério, caso não se queira ter por aqui um filme ao vivo no género do que Ettore Scola realizou em 1976 - os «Feios, Porcos e Maus», exactamente.

Para já, neste 2005, o modo como se estaciona nas nossas cidades e vilas é feio, como se faz intencionalmente barulho com os veículos é porco, e o procedimento de autarquias e autoridades é mau.

Carlos Albino

sexta-feira, 4 de março de 2005

SMS 95. O Algarve sem sinais de si…

4 Março 2005

Anda-se por essas estradas para o Algarve e no Algarve e não há meio de haver sinais da terra! É verdade que há uns tempos, a gente via, antes do desvio para Messines/Silves uns valentes painéis a indicar a Rocha da Pena e a Fonte Benémola, duas para cá e duas para lá. Valentes e despropositados, porque a rocha fica muito longe em Salir e a fonte mais longe ainda em Querença – portanto aquilo foram coisas pensadas em gabinete por cabeça que apenas olhou para o mapa das estradas com esquadro e compasso na mão. Havia a promessa de colocar os sinais de que o Algarve obviamente precisa e recordo-me que numa resposta ao deputado José Apolinário, o governo se desculpou em que a sinalética era cara (julgo ter sido adiantando a quantia de oito mil contos por cada sinalização…), que era necessário o estudo daqui e o parecer dali mas que, em breve, as coisas do Algarve iriam ficar bem assinaladas. Ora nada disso e pior do que isso.

De repente eis que me apercebo de que aqueles quatro enormes monumentos de analfabetismo geográfico desapareceram e não só o Algarve voltou a não dar sinais de si, como também, pelos vistos, trinta e dois mil contos foram à viola.

Naturalmente que antes do desvio para Silves o que haverá de assinalar que não a portentosa Sé e o magnífico Castelo daquela cidade? Tudo se aceitaria ali, até a igreja de Messines se aceitaria, tudo menos a Rocha da Pena e a Fonte Benémola… Ora não queremos aqui discutir e muito menos escrutinar sinais, sinalizações e sinalética – é trabalho para deputados… Apenas queremos dizer que há uma enorme irresponsabilidade, uma total falta de respeito pela História e pelo Património do Algarve e uma infantil desconsideração pelo Turismo do Algarve que obviamente carece de consolidação. Assim não vamos longe.

Carlos Albino