quinta-feira, 25 de dezembro de 2003

SMS 33: Prenda no sapatinho

25 Dezembro 2003

Prometi, na semana anterior, falar dos eurodeputados que o Algarve tem mandado ou aceitado mandar para Bruxelas e Estrasburgo. Porque é Natal, evito o tema por esta semana – seria estragar a festa a alguns cidadãos impolutos e, muitissimo mais importante, os leitores merecem assunto adequado à quadra e não coisa triste. É claro que não se pode fugir às prendas no sapatinho. Que se pode pedir, então, para este Algarve? Deve-se pedir coisa de que, para já, precise e que lhe possa dar aquela suavidade perfumada de acreditar no futuro. E aqui está não tanto o embaraço da escolha mas a impossibilidade de se encontrar coisa perfumada. Procurei e não encontro. O Governo tem a cabeça no Norte, o coração da forma de uma carteira no Centro e o aparelho digestivo em Lisboa. Dos partidos, sobretudo os tais dois partidos com vocação de poder, só prendas envenenadas, ou pela vocação ou pelo poder que têm ou ambicionam ter. E aqui no Algarve cada um trata da sua vida pelo que o individualismo tem a classificação de cinco estrelas. Neste Natal de 2003 o Algarve tem que se conformar – o sapatinho fica vazio. E outra coisa não seria de esperar pois no mesmo dia em que se inaugurava um Estádio de 35 milhões, começou nas ruas um peditório para a finalização das obras da unidade de radioterapia que Faro engavetou num logradouro cercado de prédios e para onde, em décadas, se prometeu sucessivamente um jardim, um parque infantil, um silo para estacionamento... sei lá, só faltou prometer uma estufa de flores. O presidente de Portimão. Manuel da Luz, tem razão: o Algarve está hipotecado. O que que dizer que governos e partidos andaram nos últimos anos a brincar ao Pai Natal. «Haja no Céu uma Estrela, já não há quem tenha amor...», cantava-se nos natais antigos pelo Barrocal e pelas Serras. Podemos voltar a cantar isso. Eu canto.

Carlos Albino

SMS 32: Região do Algarve, líderes e listas

18 Dezembro 2003

Já se vai percebendo o frenesim. Aproximam-se as eleições europeias e já uns poucos sujeitos (poucos porque não podem ser muitos) fazem contas com alguma sorte na rifa, sendo a rifa o equivalente a um chorudo ordenado e uma emigração de luxo em Bruxelas e Estrasburgo. E ainda as eleições autárquicas estão na linha do horizonte e também outros tantos sujeitos, se estão na oposição dizem estar na linha de partida, e se estão no poder exibem o ar mais displicente deste mundo como se exercer o poder fosse um acto de caridade para os Algarvios daqui e dali ou então alguma mesmo uma generosidade equivalente a imolar a vida ou como se ser Presidente de Câmara fosse o mesmo que Cristo a lavar os pés dos pobres. As listas estão a ser forjadas. Nisto, os líderes dos principais partidos do Algarve – o PSD e o PS – esquecem ou fingem esquecer a questão-chave que é a da Região do Algarve, questão postergada mas chave. Nem uma palavra, nem um projecto, nem uma iniciativa. Mas compreende-se: os estados-maiores dos partidos, para cuja massa cinzenta que é noventa e sete e meio por cento do Caldeirão para cima, não têm interesse em ressuscitar a questão e para essa gente o Algarve só conta para banhos, para tantas aventuras sociais quantos os divórcios e para, nuns salmonetes grelhados na Ilha de Faro e enquanto palitam os dentes, desvanecerem-se em considerações com selectos apaniguados locais (algarvios, claro) dando instruções políticas para o futuro. E como o ideal da Região do Algarve foi substituído pelo culto da personalidade, começamos a ver o espectáculo. Na próxima semana trataremos desse triste espectáculo que tem sido Bruxelas e Estrasburgo e nalguma semana a seguir, se Deus me der vida, saúde e paciência, havemos de tratar dos cultos de personalidade que não é apenas triste mas sobretudo um sórdido e pornográfico espectáculo.

Carlos Albino

quinta-feira, 11 de dezembro de 2003

SMS 31: Aquele Quarto 13 da Pensão Estrela

11 Dezembro 2003

Nos dias que correm, ouvir dizer bem de um Algarvio é coisa que recebemos com alegria e com gosto. E se esse Algarvio ainda é ou foi um político, será caso de especial celebração porque estaremos então perante um fenómeno. Foi o que há pouco aconteceu na Argélia. Ao receber Jorge Sampaio que ali foi em visita de Estado, o presidente do parlamento argelino, Karin YounSs, como todos os chefes parlamentar em qualquer parte do mundo, foi buscar o melhor para o discurso alinhavado para receber o Presidente Português. Esse melhor foi Teixeira Gomes. Com orgulho, Karin YounSs afirmou ter nascido e crescido precisamente na terra – Dedjaia (outrora Bougie) - onde o nosso Algarvio se exilou nos últimos dez anos da sua vida e onde morreu em 1941. E porquê esse orgulho do argelino? Porque, testemunhou ele a Sampaio, ainda hoje muito gente de Dedjaia, sobretudo pescadores, se recorda de Teixeira Gomes como «um homem sábio que gostava de conversar com a gente simples e contemplar com eles as maravilhas do mar». E Teixeira Gomes ficou de tal forma no coração dessa gente que o Quarto N.º 13 que ocupou na Pensão Estrela ainda em laboração, está preservado como quarto-museu, à disposição de historiadores, biógrafos e visitantes. Ouvir dizer na Argélia que estimam ali um Algarvio porque ele era sábio e falava das maravilhas do mar com a gente simples, isso é um grande lenitivo para os dias que correm. Se Teixeira Gomes tivesse sido um analfabeto reciclado à força pelo papel da política e tivesse falado com os da gente simples apenas pela bazófia de lhes sacar futuros e potenciais votos, de certeza, o Quarto N.º 13 já teria ido à viola. Bem, celebro com alegria e gosto a veneração por Teixeira Gomes em Dedjaia mas ainda não desesperei de encontrar, para já em Estrasburgo ou em Bruxelas, quartos preservados onde tenham estado Algarvios sábios…
Carlos Albino

segunda-feira, 8 de dezembro de 2003

SMS 30: Droga, álcool e barulho

4 Dezembro 2003

Se, como o bispo do Algarve deve ter dito ao abençoar o estádio de São João da Venda, há três virtudes fundamentais – fé, esperança e caridade – há neste Sul do País três males opostos: droga, álcool e barulho. Quanto à droga, cujos traficantes e consumidores parecem preferir, agora, estradas e caminhos esconsos do interior para negócios da noite, soube que, na semana passada, um agricultor do Barrocal, já farto desse movimento junto da sua fazendinha, pegou na caçadeira e, com uns tiros para o ar, afugentou o extenso grupo que entre si trocava sacos de produto por gordos maços de notas... Quanto ao álcool, à revelia da lei, por aí continuam bares – eu tenho visto! - a vender o inimaginável a menores e maiores, mais os menores que os maiores, até às cinco e seis da madrugada que já é outro dia. E quanto ao barulho, mesmo os surdos ouvem – o que não é milagre. Pois que resultará desta salada social de drogados, alcoolizados e gente sem as mínimas noções cívicas? Resultam assaltos, roubos e, infelizmente, matanças seleccionadas aqui e ali, ou o receio justificado. Acresce a isto, uma emigração cuja componente clandestina é um barril de pólvora com rastilhos que, bem pensadas as coisas e conforme informações seguras, vão dar a todas as mafias. Perdemos, assim, a fé na segurança, os motivos de esperança são cada vez mais ténues e não há vontade de ser caridoso para uns quantos brutos que estragam a convivência algarvia. O que está a acontecer é pior que o incêndio de Monchique.

Carlos Albino