quinta-feira, 24 de novembro de 2005

SMS 133. Umas tristezas que por aí andam

24 Novembro 2005

Não são muitos, não chegam aos 500 mil algarvios de raiz, nem sequer somam os 30 ou 40 mil imigrantes que no Algarve se fixaram ou pela mão-de-obra ou para descanso da vida reformada. São, quando muito uns 18, talvez 22, sendo que cada um deles dá a entender que é o único génio durante escassos oito dias que o período quando mais se olham ao espelho de frente, de lado e por interpostas pessoas. E o que fazem? Nada menos, nada mais: escrevem, publicam, as câmaras e coisas afins financiam as edições cheias de disparates e de exercícios próprios do divã do psicanalista, quando o que escrevem, publicam e conseguem editar não passa de meros plágios de filósofos esotéricos e de pensadores de meia tigela de que até os adventistas do sétimo dia riem. No fundo são apenas ignaros ousados, bússolas avariadas que por aí andam a enganar a direcção Norte assim enganando também o Sul, o Oeste e Este. Outrora, quando a Escola era uma instituição – há-de voltar a ser, creio firmemente – esses sujeitos que à Escola voltaram costas tinham um nome por entre vários. Se sabiam escrever mas escreviam até sem erros de ortografia com ares de autoridade sobre o que não sabiam porque não estudaram, tinham o nome de Ignorantes – assim, com maiúscula. E se por acaso até sabiam algumas coisas mesmo que as não tivessem estudado mas escreviam com sete erros em cada linha e duas trocas de letras em cada palavra, também tinham nome – eram Analfabetos. E era assim neste quadro que Ignorantes e Analfabetos mais dia, menos dia, pela ordem natural das coisas ou se conformavam com a correspondente vergonha de terem fugido à Escola ou assumiam uma justificada revolta por não terem podido aceder à mesma Escola.

Hoje, os mesmíssimos Ignorantes e os mesmíssimos Analfabetos intitulam-se Autodidactas. São quando muito uns 18, talvez 22, sendo que cada um deles dá a entender que é o único génio do mundo durante os escassos oito dias em que com alguma mestria ou esperteza conseguem enganar ignorantes de letra minúscula e analfabetos de letra minúscula também.

Carlos Albino

P.S.: No final da semana, encontrei-me com um autarca reeleito, naturalmente que o felicitei pelo êxito eleitoral e pedi-lhe que a sua Câmara não pactuasse com os que recobrem os espinhos da Ignorância e do Analfabetismo com o cetim do pomposo título de Autodidactas. Se serei atendido, não sei porque sobre alguns mecanismos sou mesmo ignorante e com letra minúscula.

quinta-feira, 17 de novembro de 2005

SMS 132. A Casa Madeira

17 Novembro 2005

Desconcertantes foram os termos usados por Luís Filipe Madeira sobre a candidatura presidencial de Soares. «Não pertenço à Casa Soares – sou um cidadão, não sou um criado de serviço», disse o homem de Alte que, repetidamente, é apresentado como «figura nacional» e que nos meandros políticos de Lisboa é, por deferência de serviço, tido como «líder do Algarve» mas cuja obra mais notável a favor do Algarve terá sido, como a população sabe, a rectificação da curva da 125 nas Ferreiras, há uns vinte anos, e pouco mais para além dos discursos pois Filipe Madeira discursou muito e pouco fez. Naturalmente que a população igualmente sabe que se Madeira não pertence à Casa Soares, também Soares não pertence à «Casa Madeira», e fiquemos por aqui porque a continuarmos por aqui, seria fazermos o mesmíssimo jogo dos que têm estragado a democraticidade interna dos partidos no Algarve, aquela democraticidade real, não a formal ou a politicamente correcta – nomeadamente a do PS, mas sem excluir a do PSD que também tem as suas «casas», não tanto gentílicas mas de interesses difusos.

Em síntese e por aquilo que veio a lume, parece que Filipe Madeira dedicou-se à sua casa pelo não avanço da regionalização, muito embora ele saiba que a regionalização do Algarve ficou em definitivo e há muito postergada quando foi retirada da Constituição a possibilidade da criação das regiões-piloto, por obra e graça de magníficas abstenções, silêncios oportunistas e votos dos criados de serviço da época. O amuo aparente de Filipe Madeira não tem pois justificação, e porque não tem justificação, ele sempre fez política de casa, naquele sentido formal e de jogo ou de jogada, ou por si próprio ou por interpostas pessoas. Filipe Madeira está e não está, conforme lhe convém, e agora, a demarcação desconcertante face a Soares, não passa de uma conveniência para ele estar. Ora, um comportamento político destes não é o de um líder mesmo na reserva, e porque comportamentos destes abundam no Algarve – nomeadamente face a Cavaco também – eis uma das razões porque não temos líderes regionais na coerência forte do termo, e o motivo porque os líderes circunstanciais apenas são «figuras nacionais» enquanto forem criados de serviço.

Carlos Albino

quinta-feira, 10 de novembro de 2005

SMS 131. Sampaio, uma tristeza

10 Novembro 2005

Agora, já no final do mandato, Sampaio veio ao Algarve de raspão por causa de uma «presidência aberta» sobre turismo que lhe deu para ir a quase todo o lado, do Porto Santo a Esposende, terminando tudo em Tróia naturalmente com mais uma cena de condecorações que é uma coisa que Sampaio gosta tanto fazer como João Paulo II gostava de fazer santos. No Algarve, houve um poiso na Fortaleza de Sagres, um salto a Vilamoura, uma passeata de helicóptero sobre as belas obras das falésias e foi tudo para além das palavras. E quanto a palavras, Sampaio não trouxe nenhuma novidade – repetiu um bocadinho, apenas um bocadinho do que muitos têm dito há 30 anos e que, por terem dito, foram espezinhados, humilhados e esquecidos. Portanto, Sampaio veio chorar sobre o leite derramado e conviver à portuguesa com alguns que provocaram o derrame do leite ou com outros que bem o querem derramar ainda mais. Sampaio, nesta deslocação ao Algarve foi uma tristeza.

E Sampaio foi uma tristeza porque só o Algarve justificaria, em tempo certo e que já passou, uma presidência aberta, sendo agora tudo muito tarde, mesmo de raspão, assim como quem dá uma tacada de golfe. Mas para isso, para uma «presidência aberta» a sério no Algarve, Sampaio teria que ter tido coragem que é uma coisa que se aprende em todos os desportos, incluindo o desporto da política, mas que não existe no golfe. Coragem para, em vez de ir a poente depois de Lisboa ter maltratado e adulterado Sagres de todas as formas e feitios, ir a nascente que é onde ficam Vila Real de Santo António, Castro Marim e Alcoutim e aí defender uma nova estratégia do turismo algarvio face ao desafio espanhol. Coragem para, em vez de pela décima milésima vez jantar com empresários do turismo, a maior parte dos quais nem são algarvios nem põe os pés no Algarve reinvestindo sistematicamente fora da Região o que no Algarve lucram se é que não fazem as suas operações através dos paraísos fiscais, ouvir ao longo da 125 quem da 125 vive ou ainda vive, e preconizar um «destino metropolitano» para a mesma 125. Coragem para ouvir os agricultores, as gentes das serras incendiadas, os pescadores de Quarteira e Olhão, os artesãos a quem as portas do mesmo turismo empresarial se fecham, andar pelas universidades nascidas a martelo, indagar como tantas presidências autárquicas foram uma farra, enfim, coisas de coragem não faltariam a Sampaio em tempo oportuno, como agora coragem teve Seruca Emídio em tocar no assunto do Hospital. Mas desconfio que Sampaio já não tenha tempo para condecorar a coragem de Seruca Emídio.

Carlos Albino

quinta-feira, 3 de novembro de 2005

SMS 130. Formiga branca

3 Novembro 2005

Até agora, pelos menos aparentemente, o Algarve tem estado imune ao mal que, aqui e ali mas cada vez mais em mais lugares, ataca as traves mestras da democracia, que é o um mal em tudo idêntico ao da formiga branca. Sem que se note, o bicho consome tudo deixando apenas uma fina película exterior a dar o aspecto de que o mundo está normal. Apenas há um pormenor que o bicho não disfarça - o cheiro. E quando cheira a formiga branca há que pelo menos desconfiar. Ora, no Algarve, embora o mundo, sobretudo o mundo autárquico e a película exterior do poder sufragado, pareça um mundo normal, alguns, possivelmente muitos de nós sentimos esse cheiro a formiga branca que anda nos ares. O tráfico de influências envolvendo alguns barões reformados dos partidos é notório, amiúde reforçando o indevido poderio do clã; os negócios da imobiliária envolvendo paraísos fiscais são coisas faladas à boca calada, mas são coisas; o enriquecimento sem justa causa fornece uns quadros bem pintados mas discretos como mandam as regras do enriquecimento sem justa causa, e por aí fora, sem falar na intensa economia paralela que é a metamorfose alada da formiga e que desova à vontade quando a justiça, também ela, está corroída . É claro que não temos autarcas algarvios, do presente ou do passado recente, à berlinda como a formiga branca de Felgueiras, mas cheira. Cheira. Também não temos casos como os que na Andaluzia, há poucas semanas, levaram à prisão de vários eleitos locais precisamente pelas ligações perigosas entre exercício do poder e imobiliária, mas cheira. Cheira a formiga branca e pergunto a mim mesmo se em Portugal houvesse uma Operação Mãos Limpas a sério como a que houve na Itália, também aqui os partidos, todos sem excepção, não teriam que mudar de nome como condição para a sobrevivência do ideal democrático. E, ou muito me engano, ou um dia que não será longínquo, estaremos a falar de nomes. Prefiro que me esteja a enganar.

Carlos Albino