quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

SMS 401. Os números do setor e do segmento

24 fevereiro 2011

Não incomoda mesmo nada que, para uns tais efeitos estatísticos, o turismo seja setor e que, para outros tais, seja segmento. O que incomoda é o jogo de números ora a bem do setor e mal com os segmento, ora a bem do segmento e mal com o setor. Parece uma brincadeira em três atos. Precisamente na véspera da abertura da bolsa de turismo de Lisboa, são revelados pelo Banco de Portugal os dados do turismo relativos a 2010, garantindo-se que o setor registou o melhor resultado de sempre, com as receitas a subirem mais de 10 por cento, num total de 7.611 milhões de euros.Além disso, mais se garante: que britânicos e franceses continuam a liderar os gastos em Portugal, seguindo-se espanhóis e alemães; que os angolanos entraram no ranking e que os chineses aumentaram em 75 por cento as compras em território português; que ouros mercados mais cresceram, como nos casos do Brasil e dos EUA, tudo a subir, tudo a crescer, parece que estamos salvos. E tanto mais que logo se espalhou a conclusão de que o êxito do setor foi tal que nem o “mau desempenho” da Madeira foi sentido no segmento.

É claro que será uma visão infantil e irresponsável ver as estatísticas de um setor sem as ligar com as dos outros segmentos, mas, mesmo centrando as atenções no segmento do setor que é como no Algarve isso desgraçadamente se vê, é legítimo perguntar: então, com tanto êxito, porque razão o segmento despediu tanto no setor? E porque motivo tantos trabalhadores do setor foram empurrados do trabalho estável para as bolsas de emprego temporário que os exploram indecentemente? E porque fecharam tantos hotéis do segmento para sugestiva remodelação do setor? E quais as causas da taxa record de desemprego do Algarve que está praticamente na dependência total do setor? Há muitas, muitas mais perguntas possíveis, mas a bota não bate com a perdigota.

Carlos Albino
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    Flagrante democracia direta: A dos partidos que substituíram secções e núcleos por crónicas, e a dos autarcas que em vez das respostas adequadas em assembleias municipais preferem fazer colunas de 600 caracteres e responder aos munícipes: “Já escrevi sobre isso, não vou repetir!”. Um exemplo para o norte de África.

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

SMS 400. São Lourenço da Poesia

17 fevereiro 2011

Outrora Ermida de São Lourenço dos Matos, depois e agora Igreja Matriz de São Lourenço de Almancil, é um lugar de culto e não só – é um lugar culto, jóia inestimável de Almancil e sítio que obriga à recordação quem por lá passe. As imagens andam pelo mundo, fascinam, atraem, cativam e mesmo quem não queira ou resista recolher-se, recolhe-se e medita mesmo que não medite em nada, porque aquilo provoca o êxtase do olhar e até o ar que se respira é um ar que não se sabe se é azul decifrável se é aquele dourado que apenas algumas palavras têm em comum com o sonho, a ideia e o pensamento. Ou seja: está ali a Poesia e pensa-se. Daí que não me custe, nalgum intervalo de culto, admitir que São Lourenço, sem prejuízo dos Matos ou de Almancil, possa ser São Lourenço da Poesia. Ainda que numa só noite de Agosto, ou de Julho ou mesmo de Setembro. Não sei, mas vejo ali o lugar perfeito para que a Poesia aconteça com a sua arte gémea, a Música sem que qualquer das gémeas esteja ao fundo da outra. Ou seja: nem Poesia com Música ao fundo, nem Música com Poesia a sair dos fundos. As duas, num momento. Um Acontecimento, instante que seja, de Poesia e Música. Da Música haveria que falar com Osvaldo Ferreira, da Poesia admitir-se-ia convocar para o pensamento inicial, um intróito de António Ramos Rosa, um credo de Gastão Cruz, uma consagração de Nuno Júdice, um pax tecum de Casimiro de Brito, uma aliança de civilizações de Abú Ibne Isa Cutair e uma partilha fraterna de António Aleixo, havendo ainda tempo para um ofertório de João de Deus e um rito de conclusão de João Lúcio, não sendo sacrilégio associar a presença e voz da poetisa alemã nascida na Roménia, Herta Müller, Nobel de Literatura de 2009. Por exemplo, para os devidos efeitos de Acontecimento marcante. Quem, sendo culto, não iria, ou tudo não faria para ir a São Lourenço da Poesia? É apenas uma ideia, uma sugestão. O lugar é sagrado, como se sabe, mas isso não destoaria da sagração. Voltarei ao assunto, mas creio que não será necessário traduzir por miúdos o requerimento. Ali, é um dos melhores lugares e mais belos do mundo.

Carlos Albino
    Flagrante luva branca: Sim, ali em Almancil, com Poesia e Música em dia bem combinado, até Guimarães ficará mais povoado… Basta querer.

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

SMS 399. Abriu-se um grande parênteses

10 fevereiro 2011

Dizem os dicionários que o parênteses é um sinal usado em matemática para significar que as operações indicadas dentro dele se devem considerar efetuadas. Fora da matemática, o entendimento geral é que tais operações não são as efectuadas mas as suspensas, pelo que, tudo o que ficar entre parênteses, está suspenso. E, não tenhamos dúvidas de que, salvo esta ou aquela pequena coisa, foi aberto para o Algarve um grande parênteses. A ligação ferroviária de alta velocidade Faro-Huelva? Suspensa, claro. E o turismo pelas contas mal feitas e irresponsáveis por quem não quer ver que a oferta não é grande espingarda em comparação com a concorrência? Suspenso. E a reposição da RTA como era? Tão suspensa que nem é reclamada. E a regionalização? Suspensa e, mais, sem existir já é culpada... E a extinção desse cargo inútil que é o do governo civil? Suspenso. E a racionalização de meios e recursos por tanta direção regional que nem é direção nem regional, cheirando a mordomias, tal como tantas empresas municipais outras que tais? Essa racionalização está suspensa, outras racionalizações não... E um debate a sério sobre se vale a pena o Algarve ter os oito deputados que tem, mais de metade dos quais nem sente e os da outra metade já se esqueceu a não ser aí nuns almoços de anúncios e lanches de promessas misturadas com encómios que entram por um ouvido e saem pelo outro? Debate mais que suspenso, postergado. E quanto a medidas também a sério, portanto credíveis, de combate e prevenção da criminalidade e não para inglês ver? Mais que suspensas. E quanto a Hospital Central? E quanto a..., a..., a... Se o Algarve viveu durante séculos e séculos entre parênteses, não é agora que isso vai deixar de acontecer.

Carlos Albino
    Flagrante vendaval: Ali na Costa Vicentina onde, apesar de ser em grande parte Algarve, o governo diz que não quer ver aí o Algarve repetido...

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

SMS 398. O desânimo é o pior

3 fevereiro 2011

Nada disso, o deixar cair os braços é o pior. O desânimo e o desalento foram os inventores dos becos sem saída e nisso tiveram a ajuda dos artistas do fogo de artifício, aqueles que atiram para o ar ideias que estoiram muito e rilham na noite mas que se dissipam rapidamente, não se sabendo até onde a cana caiu. É verdade que estamos a pagar os custos do apagamento do Algarve e por certo mais custos iremos pagar, mas o pior é deixar cair os braços. E que apagamento foi esse? Apagou-se a representação cívica da região fora do seu território como se a representação política (deputados, um outro ministro de vez em quando, algum secretário de estado) fosse suficiente e até segundo alguns com ideia errática de democracia, como se isso fosse conflituante – e foi assim que se deixou cair a Casa do Algarve em Lisboa tal como se atirou para o fundo do cesto todas as Casas do Algarve. Apagou-se o Congresso do Algarve cuja evolução lógica deveria ser, não tanto o folclore e vaidades misturadas com analfabetismos que perderam a vergonha, mas uma ligação profunda com as universidades e institutos superiores da região, fomentando a criação de centros de estudos, observatórios, organizações cívicas, estruturas de promoção das atividades da região sem dependências do Estado e dos acólitos da missa oficial, pois claro – o esforço e por certo o entusiasmo dos promotores foi enorme e sério, mas com o delirante apagamento da região isso acabaria por ser água a sumir-se pela areia. Mas o mais triste é que o apagamento do Algarve foi tão longe como foi, com a colaboração dos próprios algarvios, numa espécie de estratégia suicidária política e cultural coletiva. Temos muito bom mas o muito bom que aqui temos, nem uma nem duas vezes, foi humilhado dentro da nossa própria casa, a troco de umas vénias a gente que as não merece e que sempre que abre a boca ou mexe os olhos, aparentemente em nome do Algarve, até arrepia.

Carlos Albino

    Flagrante múmia paralítica: É que não há uma palavra que dê confiança e, enfim, alguma esperança às populações diariamente acossadas pelos assaltos, roubos, crimes, violência de toda a ordem, na falta de patrulhamento, de polícia de proximidade e de justiça sem medo.