quinta-feira, 28 de dezembro de 2006

SMS 190. Apenas 12 coisas das 287 que ajudam a justificar a vida

28 Dezembro 2006

Bem contadas, há 287 coisas simples que apenas poderei fazer ou encontrar no Algarve como um dos lugares do mundo que justificam a vida, mas por ora destaco apenas 12:

1 – Dar uma volta completa à Doca de Faro, quando a maré está cheia.
2 – Oferecer aos amigos uns bolinhos de amêndoa da Ti Marquinhas de São Brás.
3 – Beber um copo de vinho da Nave do Barão que vale mais que 100 verdades.
4 – Subir e descer as ruelas de Ferragudo.
5 – Parar frente ao mar de Quarteira que é o único livro de água que a Terra tem.
6 – Aqueles mariscos de Olhão.
7 – Sentar-me, recolhido comigo mesmo, na Sé de Silves.
8 – Fazer um pedido à Mãe Soberana, mesmo sem acreditar.
9 – Armar um presépio com pedras da Ribeira da Tôr.
10 – Sentir de perto séculos, possivelmente milénios, pondo-me a pensar perante o grande relógio solar de Sagres.
11 – Uma ida e volta pela ponte de madeira da Quinta do Lago rente às águas da Ria Formosa.
12 – Andar ao acaso pelos caminhos rurais de Alcoutim e sentir a noção de paz.

Carlos Albino

Flagrante contraste: Uma ceia de Natal, e, logo nas segunda-feira, uma funcionária de hiper-mercado, confidenciar-me que, no dia 23, alguém tinha ido lá comer uma lata de comida de gato.

quinta-feira, 21 de dezembro de 2006

SMS 189. Macário começou pelo telhado

21 Dezembro 2006

Para nada serviram reparos e observações feitas com enorme cortesia – Macário levou até ao fim a sua ideia de um hino com letra saída de um concurso público e música de encomenda, o que não está em causa no que politicamente importa. O que está em causa é, mais uma vez, começar-se a obra pelo telhado – um hino, mesmo que a letra seja mais genial do que o samba numa nota só, e, glosando o outro, esteja a cantoria para a consciência colectiva assim como a música clássica está para a música militar, um hino não gera símbolos, ele tem que ser antes de tudo um símbolo, o símbolo, tem que possuir uma carga simbólica que não se obtém por decreto, muito menos por concurso público e jamais por teimosia política. Por outras palavras, é o símbolo que gera o hino e não o contrário, mas Macário, à falta de um discurso político galvanizador, distanciado e sobretudo sábio, insistiu, e, quanto a isto, Apolinário tem toda a razão ao classificar a iniciativa do hino como uma acção «forçada» e «inconsequente». E disse pouco, porque a iniciativa pisa o risco do provincianismo e do ridículo. Pisa o risco, não – um hino do Algarve, tal como Algarve está e é, sem alicerces de Região e sem pedra angular que legitime alguma autonomia, é uma manifestação de ridículo provincianismo. Claro que todo o provincianismo é inofensivo, mas torna-se ridículo quando insiste em começar a obra pelo telhado. Para brincadeira, bastou o MIA, que até teve piada.

Carlos Albino

Flagrante contraste: Tanta e tão rica inteligência

quinta-feira, 14 de dezembro de 2006

SMS 188. Um personagem e um intérprete

14 Dezembro 2006

Quer se queira ou não, ou por mais que alguns desejem outra coisa, o Algarve político está praticamente reduzido ao PS e ao PSD, porquanto o PCP é um colectivo de marcar presença com a honra de alguns bons argumentos gerais, o CDS, após uns fogachos de enriquecimento eleitoral sem justa causa, deixou oxidar a prata da casa, e quanto ao Bloco, este parece que bloqueou. Mas, além do Algarve político estar reduzido ao PS e ao PSD, acontece que o PS, proporcional e convenientemente, reduzido está ao nome de Miguel Freitas com tudo o mais acomodado, e o PSD, cabalmente com os resultados da reeleição, é sinónimo de Mendes Bota com o resto entre parênteses. Todavia, a personagem do PS instalou-se em Bruxelas, e o intérprete do PSD acabou de afirmar que já comeu «o pão que o diabo amassou» mas que está «em plena travessia de um deserto eleitoral», o que vai dar na mesma.

Nas bancadas parlamentares, os deputados algarvios ficaram-se pela ponte de Alcoutim que não existe e a que ninguém do poder de Lisboa ligou; a Associação de Municípios não perdeu, e está longe de perder, o ar de grémio ou de refém das cortesias políticas; a Junta Metropolitana tem letra mas não tem música – foi outro engano, traumático engano; as delegações regionais de ministérios estão confortavelmente sentadas (algumas ducalmente, eximindo-se ao escrutínio público) nos sofás da maioria absoluta, e a única instituição restante das veleidades da regionalização, a RTA, vai ser convertida em agência, como já era.

E pelas bandas da intervenção cívica não partidária, a tal sociedade civil, não há nada politicamente de relevo, até porque os ecologistas já encontraram todos os linces e todos os bufos reais. Essa sociedade civil troca o jeep pelo último modelo, decide tecnicamente pelos presidentes de câmaras, vende moradias, algumas excepções por bom tom fazem-se amigas do Teatro das Figuras, e, claro, amassam o pão em nome do diabo, telefonam para Bruxelas e fazem de alegres dromedários nesta estafante mas também divertida travessia .

Ou seja: o Algarve tem todas as condições para que um populista manhoso ou um manhoso que não abra a boca, tenham êxito. Obrigado, oh Democracia que nos desenvolveste até este ponto!

Carlos Albino

Flagrante contraste: Com os que se perfilam para a Agência de Turismo do Algarve e com tanta falta que isso faz, não haver um referendo sobre a Interrupção Voluntária da Sensatez.

quinta-feira, 7 de dezembro de 2006

SMS 187. Silves. Quem diria!

7 Dezembro 2006

António Carneiro Jacinto assumiu publicamente querer candidatar-se à Câmara de Silves, depois da sua prestação, por muitos questionável, como adjunto de dois ministros dos Negócios Estrangeiros. E fez o anúncio declarando que não conta com apoios partidários, sendo estranho que o PS não lhe dê suporte à partida, e que a condição dos elementos para a sua equipa de trabalho é a de que sejam «menores de 45 anos», fasquia de que ele próprio se exclui, porquanto Carneiro Jacinto tem 55 anos (nasceu em Lisboa, a 7 de Setembro de 1951). Portanto, quem em Silves já tiver 45 anos e dois dias, por mais competência e seriedade que se lhe reconheça, que tire os cavalinhos da chuva - tivessem nascido dois dias antes.

Mas, para além do cabal esclarecimento de um antigo episódio fatal de Belém, e da justificação que Carneiro Jacinto possa dar para o facto de ter conseguido receber salários e abonos de Conselheiro na Embaixada em Paris trabalhando em Lisboa como adjunto nas Necessidades, até poderemos considerar que António Carneiro Jacinto (se, o que atrás se referiu, fosse esclarecido ponto a ponto) teria um bom perfil para Silves se conseguisse dissipar duas dúvidas.

Primeira das dúvidas, sobre as suas habilitações - Segundo o que no Anuário Diplomático se declara, António Carneiro Jacinto é «licenciado em Direito, pela Faculdade de Direito de Lisboa» e como licenciado se deixou oficialmente tratar desde Guterres a Freitas do Amaral. É mesmo licenciado?

E segunda dúvida, sobre a sua conversão ao Algarve - Carneiro Jacinto foi convidado, há largos meses, para se integrar como sócio na Casa do Algarve em Lisboa, mas recusou evadindo-se em reservas. Porquê este inesperado amor, agora, por Silves e Algarve de que Silves - desculpem os de Faro e Portimão - é o inegável e que deveria ser o palpitante coração histórico? Apenas agora e porquê?

Carlos Albino

Flagrante contraste: Em terra de turismo, continuar a não estar disponível o directório oficial dos cônsules honorários no Algarve, nos portais do Governo Civil, RTA e AMAL. Com todos os nomes, sem excepção.

quinta-feira, 30 de novembro de 2006

SMS 186. Reforma de miscelânea para miscelânea

30 Novembro 2006

No sentido de conjunto confuso de coisas diferentes, as regiões de turismo têm sido miscelâneas. E, em um ou outro caso que o Algarve até conhece, a miscelânea até recuperou o significado inicial da palavra latina – alimentação dos gladiadores.

Ora, quando este governo anunciou uma reforma dessas estruturas anómalas, esperava-se, no mínimo, que se desse coerência ao sistema e se acautelasse, de uma vez por todas, esquemas nada claros e jogos de poder desenvolvidos a coberto da aparentemente cândida parceria entre Estado, municípios, patrões, empregados e mais gente que nem é uma coisa nem outra mas que aparece na parceria apenas porque há turismo que é a alimentação dos gladiadores. Mas não – pelo que se sabe, a reforma da miscelânea resulta noutra miscelânea a que se chamará agência, será tudo menos inequívoca descentralização (descentralização, de resto que chegou a ser anunciada, para as associações de municípios), e tudo menos o acabar com a alimentação dos gladiadores.

Naturalmente, isto não é reforma – é baralhar e dar de novo, e, pelo que se sabe, é lícito admitir que as cartas estejam marcadas com sinais do conhecimento de apenas algumas das dez futuras agências. E o Algarve, sem força e sem peso no Estado embora com enormíssima presença de receitas, perderá, quase de certeza, neste jogo desleal em que a descentralização não o trunfo, parecendo que, já se fugindo da regionalização como o diabo da cruz, até se começa a fugir da própria descentralização. Mas também é verdade que o Algarve político não tem feito nada para que assim não aconteça.

Carlos Albino

Flagrante contraste: Tanta chuva com as hidroeléctricas a rebentar e Castro Guerra não se ter baixado o preço da electricidade

quinta-feira, 23 de novembro de 2006

SMS 185. A ponte e sem medo

23 Outubro 2006

Toda gente ficou a saber que Hugo Nunes (a emergir no PS, irá lá mas tem que ter cuidado), Jovita Ladeira (que está a ser agradável surpresa como especializada em especialidades), Mendes Bota (com mais ponderação no PSD, a idade vai obrigando a isso) e Miguel Tiago (que até parece pseudónimo do PCP no contexto das lideranças regionais), pois toda a gente sabe que os nossos deputados, do poder e da oposição, se uniram por causa da malfadada ponte Alcoutim-San Lúcar.

Exigem saber a «quem ficou incumbida a realização dos estudos e projectos preparatórios do projecto» que se arrasta desde a década de 90 e se o tema figura na agenda da próxima cimeira luso-espanhola. Não sabemos se uma pergunta destas deve ser feita a Lisboa que já nos habitou a poses reverenciais, ou a Madrid que já se acostumou a impor as regras.

Os nossos deputados (nunca com tanta propriedade se pode dizer nossos) deram, em todo o caso, um inédito exemplo de conjugação na defesa de um inequívoco interesse regional, tão inédito que, para efeitos da ponte, foi uma verdadeira união nacional – no bom sentido, há o mau. Só que o Ministro das Obras Públicas, Mário Lino, não há meio de ver as coisas com adequação e rigor. Numa intervenção na Câmara de Comércio e Indústria Luso-Espanhola (18 de Outubro), Mário Lino referiu-se à ponte de Alcoutim como exemplo, um mero exemplo para contribuir para «a redução do isolamento de algumas zonas transfronteiriças». O ministro ainda não percebeu que essa ponte é estratégica para o desenvolvimento da região, de toda a região, e não apenas para reduzir o isolamento de uma zona, enfim de uma coitadinha zona. Ora, a resistência de Portugal à Espanha e da Espanha a Portugal, hoje, não se faz com fortes e fortalezas com o medo fortificado lá dentro – faz-se com ligações. O ministro, pois, não deveria referir-se a Alcoutim receosa e vagamente como «um exemplo», mas sim como uma prioridade estratégica a inscrever na agenda luso-espanhola, com princípio, meio e fim, porque o Algarve precisa daquela porta de Alcoutim como outrora precisou daquele forte. O receio, o medo – coisa que os espanhóis perderam - isso, sim, o medo é que é mau iberismo, péssimo iberismo porque o iberismo é próprio de quem tem medo.

Carlos Albino

Flagrante contraste: Uma doação de 10 mil dólares por emigrantes a algo no Algarve e o cheque ter sido levantado em Espanha.

quinta-feira, 16 de novembro de 2006

SMS 184. Passar de uma fase a outra

16 Novembro 2006

Apenas por masoquismo ou por estranha punição, é que, ano após ano, década após década, uma eternidade, se aguentará andar sempre à volta da mesma coisa e nunca se passar desta fase. E a «coisa» para o Algarve está naquele discurso de que Lisboa não olha para nós, que o poder se esquece dos algarvios, que o Algarve caiu na injusta desconsideração do Estado, e que, portanto, todos os males e incapacidades de Algarvios não só se explicam pela alegada repulsa que o centralismo do Estado manifesta para o Algarve, como também as culpas próprias ficarão perdoadas.

Naturalmente que o Estado se esquece do Algarve, sempre se esqueceu ainda era Reino. E que o Governo esquecido está, na hora do Orçamento, dos grandes projecto e dos grandes planos, da infra-estrutura à cultura e pela ciência e ensino. E não apenas o Governo, é tudo por aí abaixo, por vezes escandalosamente e em pormenores que quase roçam a provocação, porque mal roçam, aí vem por aí abaixo um secretário de Estado ou até mesmo um Ministro com a missão de ressuscitar o entusiasmo dos enteados. E se não ressuscita, pelo menos cala e silencia. Esta do plano ferroviário foi a última, havendo mais antes, para não recordar o folhetim da auto-estrada e da célebre secretaria de Estado apresentada como bandeira da descentralização do poder e foi o que se viu – continuou a tradição do quartel onde se instalou: o regimento não ganhou uma única batalha e até se fardava mal.

Só que não se pode morrer nisto, andando à volta, partindo de um ponto e voltar ao mesmo lugar. Será talvez aconselhável passar de uma fase a outra, começando por identificar o que o Algarve pode fazer sozinho por si próprio, em conjunto. Por outras palavras, que se passe de uma fase à outra. Que fase? Bom tema.

Carlos Albino

Dois flagrantes contrastes: 1 - Vale do Lobo e petróleo. 2 - Vilamoura e co-icineração.

segunda-feira, 13 de novembro de 2006

Sobre o estado do Algarve. Para breve, novo espaço

Em breve, além destas SMS que, desde há três anos (Maio de 2003) temos mantido com objectivo e limites claros - a exposição dos breves apontamentos semanais publicados no Jornal do Algarve -, vamos abrir novo espaço para intervenção diária, e, deste modo, mais próxima de acontecimentos, de factos e de decisões políticas com relação directa e útil para o Algarve. Mas também sobre as omissões. Dentro daquele princípio traçado por António Sérgio - abrir as avenidas largas da Crítica. Quanto às SMS, estas continuarão o seu caminho próprio de apontamentos, meros apontamentos, mas, para nós e para muitos leitores, importantes apontamentos.

Carlos Albino

quinta-feira, 9 de novembro de 2006

SMS 183. Paciência de burro…

9 Novembro 2006

Bem queria ter-me enganado! Quando, em 2003, na cimeira da Figueira da Foz, Durão Barroso e Aznar puxaram do calendário salvador dos comboios, para que os circunstantes acreditassem que o futuro viria sobre carris, eu estava presente, mas confesso que não acreditei e disse-lhes não acreditar. E quando seguidamente me entregaram uma cópia do mapa de traçados com meio-metro de riscos bem coloridos para encher o olho e datas mais ou menos apelativas, mais para o Norte e menos para o Sul como sempre, tornou-se-me evidente que o Algarve estava a ser tratado como tradicionalmente – refugo. Além disso, senti alguma areia nos olhos, com a cultivada confusão entre TGV e Alta Velocidade, cultivada para efeitos mediáticos, sabendo-se que nem toda a Alta Velocidade é TGV. No Algarve funcionou – toda a gente falou então em TGV sem se aperceber das diferenças, ou então aperceberam-se e, por serventia política, ampliaram a confusão.

Em todo o caso, foi dito e assinado que a Alta Velocidade Porto/Vigo se concretizaria até 2009 (com Lisboa/Porto a ser da exclusiva responsabilidade doméstica, até 2013); Aveiro/Salamanca até 2015; Lisboa/Madrid (por Évora/Badajoz, com Elvas a sair do mapa) até 2010, e se Faro/Évora iria para as calendas domésticas, já Faro/Huelva teria concretização até 2018... E neste remate de negociações que Portugal foi forçado a aceitar, ficou mais uma lembrança da tibieza ou lassidão diplomática de Guterres que, enquanto foi tempo, decididamente não teve pulso – Barroso viu-se confrontado com a inevitabilidade das conveniências espanholas. O traçado por Badajoz foi de facto uma derrota negocial portuguesa.

E quanto ao Algarve, ficou o sonho de 2018 – que para coisa destas não é já amanhã mas depois de amanhã – o troço Faro/Huelva, melhor dito Huelva/Faro, nem mais um quilómetro à frente, muito menos Albufeira, fora da hipótese Portimão, e então Lagos!, que fique nos confins do mundo, o troço é uma metáfora que, sem polidez, põe à prova a paciência de burro que o Algarve revela. E sendo 2018 tão próximo para estes efeitos, o que espanta é que com tanto plano de ordenamento, plano de protecção, plano para a orla e plano para a borla, o que espanta é que mesmo esse pequeno troço, que não pode ser construído nas nuvens mas em terra sólida, não esteja à cabeça da discussão, da política e do interesse geral que, sublinho, deve ser sinónimo do bem-comum.

Carlos Albino

Flagrante contraste: A política que se auto-reclama do Algarve ou algarvia, e o que se sente ou o que a gente sente no dia-a-dia…

quinta-feira, 2 de novembro de 2006

SMS 182. Que bando de passarinhos!

2 Novembro 2006

Sabem os leitores, e disso dei conta há precisamente 182 semanas – bastante tempo já para ainda haver distraídos – que estes apontamentos, meros apontamentos, se destinam a verter a inquietação, as inquietações de quem sente o Algarve e não pactua para fingir. A inquietação não é obviamente angústia. Aqui não há angústias, há apenas o desafio de, dentro do possível ser claro, e dentro do civilizado ser frontal, naquele fio da navalha que por vezes corta por verdade e outras por erro. Digamos que, ao longo destas 182 semanas, e porque de apontamentos, meros apontamentos se trata, temos seguido à risca aquela regra segundo a qual para bons entendedores, meia-palavra basta… É que não sejamos ingénuos - quem estragou, quem está a estragar e infelizmente quem vai continuar a estragar o Algarve, sabe o que está ou vai fazer, é um bom entendedor, aliás se não entendesse e bem, não estragava, embora se faça desentendido - o fingimento e não o segredo, para essa gente, é a alma do negócio. E então como essa gente gostaria que estes apontamentos fossem assim, deste género: «Os passarinhos de Aljezur a Alcoutim, coitadinhos, fazem os seus ninhos com mil cuidados. Arrancam as penas para aquecer os filhinhos nos beirais dos telhados, coitadinhos dos passarinhos, tão lindos são que comovem qualquer coração…» E por aí fora. Seria a melhor forma de não incomodar os que fizeram, fazem e farão o estrago. Por outras palavras – desejariam estragar à vontade. Mas pior do que aqueles que estragam, são os que, passando por desentendidos, beneficiam do estrago e passam por passarinhos, coitadinhos, nos seus beirais… São os oportunistas, tais avezinhas – grande bando!

Carlos Albino

Flagrante contraste: Alcoutim e Albufeira.

quinta-feira, 26 de outubro de 2006

SMS 181 Convido as Câmaras...

26 Outubro 2006

Não é por nada, mas é cá por coisas, convido as Câmaras Municipais do Algarve – todas sem excepção – a publicitarem, com rigor, quantos projectos de grandes superfícies e equipamentos correlativos têm para aprovação e onde, quantos «pedidos de informação prévia» de grandes urbanizações ou urbanizações de monta choveram sobre os serviços, quem os pediu e para onde, e, já agora, com quantos processos de reclassificação de terrenos ou áreas lidam, onde e para que fim. E faz-se este pedido não é por nada, mas é cá por coisas.

É que não basta dizer-se que o Presidente da República teve razão no 5 de Outubro, como do PS ao PSD se disse, com muita gente a assobiar para o lado. Dêem mostras de transparência, provem que não se teme a transparência, e que aquilo que, num regime transparência, se designa por investimento – como é moda e de bom tom – é mesmo investimento, e não, no todo ou em parte que seja, apenas revestimento. Não é por nada, mas é cá por coisas.

Carlos Albino

Flagrante contraste: O facto da PJ de Faro ter concluído que a morte, em 1997, de António Colaço (vereador de Almodôvar) fora devida a um «acidente» de carro (o gasóleo a incendiar a viatura!), e, agora, depois do roubo do crânio do autarca vitimado, os peritos do Instituto de Medicina Legal revelarem a convicção de que se tratou de um homicídio. Será muito difícil encontrar o homicida, até 2012?

quinta-feira, 19 de outubro de 2006

SMS 180. Sinais de racismo nas escolas

19 Outubro 2006

Pelos sinais e testemunhos que me chegam, por aí está a grassar racismo nas escolas algarvias. Ainda é um apenas aqui e além, alguns casos em infantários para onde se transporta sem filtragem as mensagens domésticas, não é, felizmente, caso geral, mas vale mais prevenir do que remediar. Também, pelo me chega, não se trata de racismo de crianças portuguesas face a qualquer das proveniências da imigração – os casos envolvem sobretudo crianças e jovens provenientes da Europa Central e de Leste face a crianças e jovens de origem africana, em alguns episódios até, de nacionalidade portuguesa com ascendência africana. Independentemente de nacionalidades e ascendências, isto não se pode tolerar na Sociedade Algarvia, aberta por natureza e história, acolhedora por carácter e convivente por regra de velho costume.

Não se pode admitir que uma criança ucraniana, já em exercícios de desdém de raça, chame «preto», «macaco» e outras coisas aprendidas ou ouvidas em casa porque nenhum escola as ensina ou ensinou, a uma criança de tez africana. Claro que o problema não está na criança, mas nos pais, o problema está lá em casa, está no que os pais são, dizem e como procedem ou gostariam de proceder – problema que, por ora, apenas vai parar ao infantário ou à escola, sendo facilmente gerível, mas que, amanhã, pode, com desaforo, abanar a Sociedade Algarvia. Aliás, já está a abanar. Diz-me quem sabe que, em certos aglomerados outrora acolhedores de imigrantes africanos ou descendentes destes como à vista desarmada se poderia constatar, este foram praticamente varridos por ucranianos, nem se sabe como. E tenho conhecimento directo de um episódio – um casal romeno recusou o contrato de aluguer de uma casa que já tinha apalavrado, pura e simplesmente porque em frente vieram a saber que morava um casal russo, só por este russo…

Há que dizer a esta gente que não pode ser assim. A Sociedade Algarvia tolera excepções porque também tem as suas excepções, mas temos que saber dizer um rotundo não à importação do Racismo seja entre quem for. E há que fazer prevenção. Prevenção cuidada e eficaz. Trabalho para o Governador Civil e para as Câmaras Municipais às quais, em primeira linha, se exige a mais cuidada atenção. Tenho verificado que pouca coisa está a ser feita nesta matéria.

Carlos Albino
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Flagrante contraste: O PIN da Ria de Alvor, o PIN da Altura/Praia Verde, e o pino do PROTAL a dar já dois pinos enquanto é tempo.

quinta-feira, 12 de outubro de 2006

SMS 179. O discurso de Cavaco

12 Outubro 2006

O cidadão comum do Algarve, tão bem ou talvez melhor do que no resto do País, compreendeu o alcance e a oportunidade do discurso de Cavaco Silva no 5 de Outubro, e que foi um verdadeiro libelo contra a corrupção. Esta, como toda a gente sabe e porque resulta da própria definição de corrupção, não tem número público de telefone, não tem endereço postal acessível, não tem bilhete de identidade – a eficaz e certeira corrupção, a grande e a pequena, anda e age às escondidas, mexe-se por debaixo das secretárias, tem a cara da ronha, as mãos do manhoso e os olhos do falso santinho que por arte (bem paga a outros artistas) passa por entre as lacunas e omissões da lei.

Claro que ficou na mente do cidadão comum do Algarve a mensagem endereçada pelo Presidente da República a destinatários certos, ao reiterar que «é necessário chamar a atenção, de uma forma particularmente incisiva, para as especiais responsabilidades que todos os autarcas detêm nesta batalha em prol da restauração da confiança dos portugueses nas suas instituições». Mais: «para que as instâncias de controlo persigam os prevaricadores de uma forma célere e eficaz, é necessário que o combate à corrupção seja assumido como um esforço a que todos são chamados, nomeadamente pelo sistema da justiça, cuja dignidade e credibilidade devem ser reforçadas perante os Portugueses».

Tenho-me por insuspeito para afirmar que Cavaco sabe do que está a falar e para quem está a falar. Pela segunda vez na História, um Presidente algarvio põe o dedo na maior ferida do País, independentemente dos partidos, doa ao partido que doer e invocadamente para salvaguarda da ética republicana. Só que há agora Europa, não se pode calar agora o mundo da comunicação como outrora se podia fazer calar, e o apelo é à Justiça e não às tropas. Mas sobretudo há Europa e limites para não ter vergonha na cara, por isso.

Carlos Albino
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Flagrante contraste: O “jornalista” assessor e o “ assessor” jornalista.

quinta-feira, 5 de outubro de 2006

SMS 178. Façamos o hino

5 Outubro 2006

A política algarvia parece ser um objecto perdido, se é que não é perdido mesmo. Claro que não são os políticos que estão perdidos, esses até são uns achados, muito embora não façam deveras política, fazem quando muito cálculos que passam à tangente pela política. Aliás, a arte dos políticos que perderam a política é precisamente passar à tangente da política simulando entrar nela, uns por mero folclore activista, outros já por verdadeiro interesse profissional pois, pesando bem os salários, converteram-se em profissionais da política e como tal fazem carreira. Nestas circunstâncias, a política algarvia está praticamente reduzida à escolha de listas de candidatos (autarcas, deputados), às nomeações de titulares dos cargos públicos tutelados pelas tangentes da política ou pelo jogo tangente da política, e também de vez em quando, para ornamentar a secção de perdidos e achados do que se faz passar por política, reduzida esta está a uns ataques descabelados e a uns contra-ataques sem sentido para que o povo, enfim, se recorde de que ainda há poder escrutinado pela Política e ainda há oposição com a mesma parte de alma da Política. Mas, na verdade, a Política – sobretudo a Política algarvia - parece ser um objecto perdido e que os profissionais pouco interesse revelem em achar. Há clubes à espera do jogo ou dos jogos do calendário, há massas associativas que até não se importam com a contratação para as suas hostes do mais terrível adversário de ontem desde que amanhã ele marque golos com a nova camisola, há jogadores, portanto. Toda esta gente, obviamente, não ficará muito agradada se a PSP ou a GNR encontrarem por aí esse estranho objecto da política no quintal de trás de algum político tangente, e muito menos agradada ficará se os agentes comprovarem que o objecto da política algarvia foi roubado tal como as estátuas do Palácio de Estoi. Como diria Macário, à falta de regionalização, façamos o hino.

Carlos Albino
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Flagrante contraste: O prémio e a prática.

quinta-feira, 28 de setembro de 2006

SMS 177. A questão do suborno

28 Setembro 2006

A OCDE, em Outubro, envia a Portugal uma missão para avaliar o que as autoridades portuguesas têm feito no combate ao suborno, especialmente em matéria de grande corrupção em mercados internacionais, estando na mira o suborno de titulares de cargos públicos em negócios de nível internacional, autarcas incluídos. Ora, com muito respeito pela OCDE e mais respeito ainda pela Convenção Anti-Suborno que Portugal ratificou em 1997, o problema não será tanto o de ver ou de consultar papelada sobre o que as autoridades públicas do Estado Português (do mais importante Ministério à mais recôndita Câmara Municipal) fizeram ou dizem ter feito no combate ao suborno, mas sim o de verificar se alguma vez o Estado soube ou quis combater o suborno, impedir o suborno, acabar com o suborno – do grande ao pequeno, a começar sobretudo pelo grande e não pelo pequeno que de vez em quando tem servido apenas para dar mostras de haver combate e não mais. Naturalmente que o suborno a sério, o grande – então na imobiliária! – por natureza e por garantia de eficácia, tem as características do segredo de Estado, e quando faz parte da cultura do Estado confunde-se com o próprio segredo de Estado ou faz-se passar, aos olhos do cidadão normal, como segredo de Estado quando só e apenas é cancro do Estado, a doença mais incurável do Estado. Todos os dias vamos sabendo de histórias que, contadas obviamente à boca calada, não chegam aos ouvidos da OCDE. Se no Algarve fosse criada uma linha verde anti-suborno, não direi que os telefones entupiriam mas muita gente autárquica e dos serviços do Estado ficaria entre o amarelo e o azul, as cores que dão no verde...

Carlos Albino

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Flagrante contraste: O orgulhoso, impante e empresarial Farense de há uns anos, e o humilhante, cabisbaixo e mercearesco Farense de agora.

quinta-feira, 21 de setembro de 2006

SMS 176. O género de Câmaras que temos

21 Setembro 2006

Ficou-se a saber que a esmagadora maioria das câmaras municipais do País não respondem aos e-mails dos munícipes, e igualmente se tomou conhecimento de que por entre as câmaras relativamente mais bem comportadas nessa matéria não consta nenhuma do Algarve. Não espanta. É claro que, no caso das mensagens serem dirigidas a serviços municipais, a culpa ou a responsabilidade directa não será, à partida, dos presidentes ou dos vereadores eleitos mas dos assessores entalados por mordomia e dos funcionários, de alguns funcionários ou do algum género de funcionários – os chamados de costas quentes - que a administração local sempre teve emblematicamente e que acabam por determinar o género de Câmaras que temos. O mal, de resto, vem de cima – à excepção explicável do Ministério das Finanças, mais concretamente dos departamentos ligados aos impostos, quase nenhum responde a correio electrónico justificado que não provenha dos ministérios pares ou de instituições acima. No caso do Algarve, é verdade que não há câmara que não faça gala de uma página de autopromoção na internet nem mesmo junta de freguesia que não disponha de endereço electrónico. Mas, caro leitor, tente escrever expondo dúvidas, pedindo uma informação, apresentando uma reclamação ou formulando uma sugestão, que receberá a resposta na eternidade. A cunha e o tráfico de influências, isso, é rápido.

Carlos Albino
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Flagrante contraste: A interdição do funcionamento nocturno do heliporto do Hospital de Faro antes de uma morte, e o pedido para a permissão e a permissão dada para o funcionamento apenas depois da mesma morte.

quinta-feira, 14 de setembro de 2006

SMS 175. Estádio do Algarve sem escadote

14 Setembro 2006

As recentes histórias sobre o heliporto feito à toa no Hospital de Faro e sobre o deboche do Estádio do Algarve são apenas dois maus presságios para esta região porque são sinais de políticas de improviso, sem seriedade e aprumo. Mas a do Estádio do Algarve, apesar de não ter sido tão trágica como a do heliporto em part-time do hospital, é o cúmulo – as redes de uma das balizas com um buraco que obrigou a atraso do primeiro jogo oficial da época (com multa para o clube anfitrião), o relvado do campo numa lástima, o placar electrónico paralisado (é preciso pagar horas extraordinárias ao presumível técnico que não se sabe o que fará durante a quinzena), as bancadas sujas e imundas de uma ponta a outra... Para o conserto das redes valeu a perícia de um voluntário das bancadas embora a tarefa mais difícil tivesse sido a de encontrar um escadote naquele estádio que nasceu com o lema «Construímos vitórias» mas que a continuar assim poderá morrer com o epitáfio «Apenas não vencemos as mordomias». Nem vale a pena gastar mais espaço com delongas: a administração do empreendimento, das duas uma – ou explica bem as coisas deste deboche ou deve demitir-se por falta de escadote. O circo chinês foi há muito.

Carlos Albino
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Flagrante contraste: As cartas de condução «compradas» por tuta e meia pelos imigrantes na Ucrânia e em Cabo Verde, e o rigor das brigadas da GNR nos cruzamentos estratégicos.

quinta-feira, 7 de setembro de 2006

SMS 174. Uma provocação inútil

7 Setembro 2006

O ministro do Ambiente, Nunes Correia, teve a infeliz ideia de ter sugerido em Aljezur que o financiamento da Barragem de Odelouca – vital para a Região – venha a ser conseguido através da factura da água que os algarvios consomem. E avançou com o peregrino argumento de que «é justo que sejam os cidadãos beneficiários a pagar o custo». Por certo, o ministro Nunes Correia deve ser mais um a ter uma noção de Algarve construída a partir das vivendas dos nossos conhecidos amigos com duplas piscinas e relvados à beira mar, ou aquela que Sampaio tinha e que pouco mais excedia que o perímetro dos campos de golfe acrescido do peito condecorável dos respectivos proprietários. A ideia de Nunes Correia não só foi infeliz, mas também por várias razões – todas elas políticas – foi uma provocação inútil aos Algarvios do Algarve e não tanto aos Algarvios sem papéis. É claro que Mendes Bota, líder do PSD, contra-atacou e, com razão e até fundamento, desafiou o ministro a que as receitas fiscais que o Estado arrecada no Algarve fiquem na região, caso o Governo aplique esse princípio de que quem quiser obras que as financie. Na verdade, Mendes Bota tocou num dos pontos essenciais da regionalização – o destino e uso das receitas fiscais obtidas no Algarve e das quais a região beneficia uma parte ínfima, a conta-gotas e muitas vezes tarde e a más horas. Gostaria de ter ouvido Miguel Freitas, líder do PS, a dizer alguma coisa sobre esta infeliz ideia, mas até agora não ouvi nada. Deve estar já em Bruxelas.

Carlos Albino
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Flagrante contraste: A memória que devíamos ter e o inofensivo sericoté do Hino do Algarve nada referir dos Descobrimentos, do saber náutico. Gil Eanes não vai perdoar a Macário Correia este hino que é um hino do Sotavento...

quinta-feira, 31 de agosto de 2006

SMS 173. A política está sem fôlego

31 Agosto 2006

Embora os políticos algarvios que por aí foram surgindo não tenham tido grande golpe de asa, o certo é que de vez em quando tinham ou simulavam ter fôlego, gritando como se exige a bons funcionários de partido. Agora nem isso, pois vociferar dois ou três pensamentos profundos retirados de algum livro que ninguém descobre ou supostamente conhecerá, não é o mesmo que gritar. Os nossos deputados, sobretudo os líderes partidários regionais que apenas chefiam, lá vão aguentando cada um o seu barco muito pianinho, os presidentes das câmaras à cautela não levantam muitas ondas e até os das juntas de freguesia, sobretudo ex-electricistas falhados e ex-mecânicos de oficinas falidas, já imitam aquele antigo Presidente da República que sabia como ninguém que no calar é que está o ganho. Toda esta gente em que a democracia faz acreditar, fogem como o gato da água a falar do Desenvolvimento, da Educação, da Cultura, da Segurança, da Saúde, da Administração Pública (estatal e autárquica), da Imigração, fugindo sobretudo a falar da Política para o que preciso ter preparação, quadro mental e, obviamente, o fôlego que advém da autoridade moral, do prestígio ético e da sabedoria política. E nessa arte da fuga, grudam nos discursos altíssimas preocupações com o corriqueiro, com o sericoté, com a trivialidade e com a conjugação do tal verbo Eu – eu Eu, eu Tu, eu Ele eu Nós... Dizia Lautréamont que todo o figo come o seu burro.

Carlos Albino
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Flagrante contraste: A grossa e porca poluição nas praias de Vale de Lobo e a atribuição de «responsabilidades» às límpidas águas das chuvas quando copiosamente vão pela Ribeira de Carcavai a qual, pelos vistos, terá um r a mais.

quinta-feira, 24 de agosto de 2006

SMS 172. Isto não augura nada de bom

24 Agosto 2006

O ambiente não é deveras famoso: o incumprimento sistemático da lei por alguns que julgam ter o rei na barriga, pois em terra de cegos o zarolho é rei; a onda de falta de civismo que varre a sociedade de alto a baixo, sendo até já de mau tom invocar essa horrível palavra do civismo porque da civilidade nem se fala; o egocentrismo impante que se tornou regra nas relações humanas; o desvirtuamento da política ou a transformação da política praticamente na correria aos bons empregos ou na luta por um emprego político melhor, com a secundarização do interesse geral e do bem-comum numa só cajadada; o horror paulatinamente consolidado ao escrutínio dos cargos públicos, sendo até já de mau tom questionar comportamentos espúrios ou pôr em causa decisões, mesmo as que, à evidência, denotam total falta de ética – o que é isso, a ética?; o que se sabe do funcionamento por dentro das câmaras e de alguns serviços do Estado, mas que ninguém ousa ou quer revelar tim-tim por tim-tim por receio fundado de represálias ou porque já fez a outros o mesmo, ou ainda pior; os campeões supostamente endinheirados que vêm de fora e no Algarve se instalam com muletas escondidas, concitando o respeito geral expondo como boa a lei da selva; a cultura popular que por aí há e bem financiada, mas que é contra o povo, recoberta já daquela erudição das papas e bolos com que se enganam os tolos; por aí fora... Isto não augura nada de bom, não digo o naufrágio, mas qualquer coisa próxima do pior da Sicília. Oxalá me engane.

Carlos Albino
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Flagrante contraste: a Região Metropolitana ainda à espera do hino e da letra posta a concurso público por Macário, e a tanta música que se dá no Algarve e aos Algarvios

quinta-feira, 17 de agosto de 2006

SMS 171. Dois casos de polícia

17 Agosto

Primeiro caso: o espavento dos cassetetes. É hábito antigo – vou àquela estação de serviço comprar jornais, encher o depósito do carro, trocar as bilhas de gás e, como é ponto de encontro de quem vai ou vem, há sempre dois dedos de conversa num encontro inesperado de Agosto. É verdade que, por esta época, a discoteca em frente, onde o fim da madrugada equivale à manhã alta do comum dos mortais, despeja o inacreditável para as bermas do cruzamento daí lavando as mãos ou pensando que lava as mãos. É igualmente verdade que a autoridade policial também há muito sabe que o desacato é, naquelas bandas, uma rotina diária, pelo que a mais elementar das regras da ordem pública sugeriria, para ali, uma prevenção constante em vez da repressão à última hora. Mas não – ao espectáculo da visível degradação humana estampada nos rostos dos que saem da discoteca, volta e meia soma-se o espectáculo da degradação da segurança, o espavento circense de suposta força a dissimular a fraqueza do sistema de prevenção que, desde logo, deveria atacar as causas pela raiz como em todo o mundo civilizado onde há discotecas desta espécie e produtos deste género, se faz. Esta semana presenciei o simultâneo desses dois espectáculos degradantes, cada um vivendo do outro. Uns cinco ou seis rapazes filhos da noite, perante larga assistência de primos-irmãos da mesma confusão entre madrugadas e manhãs, embalados pelo produto interno bruto da sua longa madrugada, tentaram fazer o que todas as manhãs fazem – uma detestável prova de vida através do desacato e da provocação. Perante isto, desceram-se as grades de ferro da estação de serviço, a porta encerrou-se transformando aquilo numa jaula, alertou-se a autoridade, chega um carro patrulha, chega outro em sentido contrário, mais outro em contra-mão com brusca travagem e ligando a sirene para afastar quem estava no bom sentido, outro ainda mais e por fim um jeep certamente preparado para transportar delinquentes. E eis como um bom número de agentes empertigados de bastões no ar perante meia-dúzia de rapazolas cuja heroicidade precária se esgota em enfrentar a autoridade fardada – porque, na ausência de prevenção, é isso o que apenas querem, julgando-se nivelar – transformam amiúde aquele pacífico e afável ponto de encontro numa faixa de Gaza.

Segundo caso: Valentina Calixto. Em nome do chamado Plano de Ordenamento da Orla Costeira, expirado um prazo de dez dias no dia 7, marcou-se para fosse executada à noite, ou pela calada da noite, a demolição de quatro apoios de praia em Quarteira. Para já, não se percebe porque é que o Estado, pessoa de bem e que não tem propriamente alma de vagabundo, tenha que executar essa boa acção pela calada da noite e não à luz do dia. Depois, muito menos se percebe que a vice-presidente da CCDR, Valentina Calixto, perante o fracasso dessa operação secreta, tenha comentado que «a acção revelou-se mais complicada do que se esperava» porquanto, disse ainda, «o empreiteiro não deu garantias de desenvolver o trabalho durante a noite»... Esta obsessão de executar demolições legais à noite e com os directamente implicados a dormir, é que choca – não é humano e só pode partir de quem tem do ambiente uma daquelas noções que mais contribuem para o aquecimento global . E choca porque a lei é lei, e sendo lei, é legível durante o dia mas torna-se ilegível quando tenha que ser executada apenas pela calada da noite por um empreiteiro que «dê garantias» de apenas fazer «o trabalho» como polícia nocturno. E mais ilegível se torna quando as próprias autoridades marítimas tomaram posições para essa guerra esconsa, sabendo-se afinal que a Capitania de que dependem, emitiu e cobrou licenças válidas até 30 de Setembro, pelo menos para um dos apoios na mira. Mas, deixando a Capitania com as suas licenças, suponhamos que uma dúzia, duas dúzias de chalés, sobretudo os que, a partir de apoios semelhantes aos de praia ou pouco mais do que isso, se ergueram na Ria Formosa, que não cumprem o POOC ou que um POCC a sério deveria tornar ilegais, um dia destes são demolidos pela calada da noite por um empreiteiro que «dê garantias de desenvolver o trabalho». Claro que chocará «um trabalho» desses durante a noite ou que apenas tenha que ser feito à noite, e, como diria Valentina Calixto numa ironia ao ambiente, «a acção revelar-se-á mais complicada do que se esperava». Fiquemos por aqui.

Carlos Albino
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Flagrante contraste: o barulho de José Vitorino e o silêncio de José Apolinário.

quinta-feira, 10 de agosto de 2006

SMS 170. A doença infantil das auditorias

10 Agosto

Bem nos recordamos de como antes de cada ciclo de eleições locais e quem quer ganhar anuncia, exige e promete sob honra auditorias às contas municipais. O anúncio é feito de forma a sugerir graves prevaricações, a exigência é descrita com argumentação vaga cuja explicitação é remetida para momento oportuno e a promessa é, com alguma sabedoria, transformada em prato forte da captação dos votos daqueles que são sensíveis à moralidade nas coisas públicas. A auditoria é assim tratada como que poção mágica para sufrágios renhidos, a tal ponto que quem está no poder, iluminado pelo velho princípio do quem não deve não teme, já se vê na obrigação de anunciar auditorias à sua própria gestão, antes que o adversário que lhe ambiciona a cadeira tome a iniciativa em primeiro lugar.

Se por acaso uma oposição passa ao poder, a primeira conferência de imprensa festiva e o primeiro comunicado são dedicados à reclamadíssima auditoria, mas, depois, passam os meses, largos meses, meses mais do que suficientes para pôr o preto no branco e o assunto é deixado cair – e então como o Verão Algarvio facilita os esquecimentos! E se também por acaso quem estava no poder não o perdeu, a tal auto-auditoria igualmente vai caindo no conveniente esquecimento, pois quem perdeu, por tradição que não deixa de ser esquisita, bate com a porta, vai à vida e declara-se desiludido com a política. Mas o que é mais espantoso é que na hipótese de ter havido auditoria mesmo e a sério, a investigação de contas, decisões e procedimentos não tenha afinal revelado qualquer resultado escandaloso, ilícito de monta ou crime manifesto como as suspeitas sugeridas ou as invocadas honras pessoais iniciais – conforme os casos - levavam a presumir.

Ora, assim, a política não é jogo limpo.

Carlos Albino

quinta-feira, 3 de agosto de 2006

SMS 169. Estratégias é que não faltam

3 Agosto 2006

Aí temos em discussão pública a proposta para um Plano Regional de Ordenamento do Território do Algarve cuja sigla (PROTAL) a maior parte conhece mais do que o conteúdo, sabendo a maior parte também que, independentemente dos resultados, a totalidade do desordenamento consumado fica legitimada. De qualquer forma, talvez para descargo de consciência dos poderes públicos que tentaram a concertação possível para não se estragar mais o que já está definitivamente estragado ficando, no caso, prejudicados os que a tempo não beneficiaram do regabofe, de 14 de Agosto até final de Novembro aí temos a bendita discussão pública no âmbito da qual, todos e cada um tem a oportunidade de julgar ou até de se autoconvencer que vai salvar o mundo. Depois disto, a proposta, que é uma larva, metamorfosear-se-á no plano propriamente dito, o insecto que, aprovado em Conselho de Ministros, ficará apto a pôr de novo ovos dando origem ás futuras e previsíveis larvas em terrenos propícios para a continuação da espécie – o terreno da estrutura regional de valorização e protecção ambiental, o terreno das regras de concretização dos investimentos estruturantes e o terreno da protecção do litoral, para enumerar os terrenos principais de que larvas e insectos tanto gostam.

É claro que este PROTAL não é uma estratégia do Algarve, é apenas uma táctica de Máximo Divisor Comum entre as muitas estratégias que há no Algarve, algumas contraditórias entre si – estratégias da imobiliária, estratégias da hotelaria, estratégias dos ecologistas (que no Algarve aparecem sempre em casamentos do monte), estratégias dos autarcas (alguns dos quais surgem tão rapidamente no poder como águias reais como rapidamente passam a linces na oposição), e, claro, na lista de muitas mais estratégias não faltam as estratégias dos xicos-espertos tanto os que conservam todo o dinheiro junto do coração como aqueles que, directamente ou por interpostas pessoas e empresas, jogam com o dinheiro inimaginável que manobram em paraísos fiscais. Portanto, estratégias há muitas e se o PROTAL multiplicar por setenta a burocracia que já existe - como tudo leva a crer que vai acontecer -, vão ver como a impunidade reinará, sem apelo nem agravo. Não vendam tácticas por estratégias.

Carlos Albino

quinta-feira, 27 de julho de 2006

SMS 168. Cheios de razão e de motivos

27 julho 2006

As gentes de Vila do Bispo protestam contra o abandono da Fortaleza de Sagres e do Forte de Santa Catarina e insurgem-se contra o facto do Farol de Sagres estar encerrado. Os protestos têm, obviamente, o endereço do IPPAR que tutela e gere o segundo lugar mais visitado do País, arrecadando receitas que não reinveste naqueles monumentos. Pois os de Vila do Bispo, estão cheios de razões e motivos.

Para não falar do mamarracho que se permitiu, o IPPAR tem normalmente olhado para Sagres de soslaio e, nessa atitude, não está só, porquanto o estranho desprezo e o desleixo escrutinador com que a Comissão Nacional da UNESCO tratou do processo de candidatura do Promontório a Património Mundial chocaram os espíritos atentos mas inconformados face aos que sabem tudo. Parece até que alguém teme que em Sagres se possa identificar com segurança algo de incomparável mas que, em função daquele soslaio, desprezo e desleixo, anda entre a boa embora escassa informação e a lenda.

Claro que o decisor em última análise do IPPAR, no seu gabinete em Lisboa, e a ministra da Cultura, no alto do Palácio da Ajuda, não são nem podem ser fiscais directos e no terreno do que se passa com o património e com a cultura no Algarve – para tanto dispõem no Algarve de extensões, o Ministério tem uma Delegação Regional e o IPPAR conta com uma Direcção, igualmente de nome, Regional.

Mas não direi mais do que o seguinte: quanto à Delegação do Ministério, tenho saudades de João Ventura nesse posto, do seu entusiasmo, dos seus conhecimentos, melhor, da sua constante procura de conhecimentos, e quanto à Direcção a conversa acabou quando verifiquei que não valia a pena, nem valendo a pena recordar. E sendo assim junto-me aos de Vila do Bispo nos seus protestos e nas suas razões.

De facto, nesta matéria, justifica-se uma «mexida regional».

Carlos Albino

quinta-feira, 20 de julho de 2006

SMS 167. Inadmissível

20 Julho 2006

A forma como, sem supervisão adequada e sem fiscalização preventiva (aqui é que bate o ponto), se permitiu a descarga de seis toneladas de lamas de esgotos em terrenos xistosos, na cabeceira de uma das linhas de água do Caldeirão a verter para a barragem de Odeleite e a escassas centenas de metros dos furos municipais que abastecem as populações da Cortelha, Barranco do Velho e Vale Maria Dias, é inadmissível. Com o calor, foi o cheiro nauseabundo, além de que, como se sabe, as moscas não pedem licença à Direcção Regional da Agricultura nem os mosquitos solicitam parecer à CCDR. Sabe-se que idêntica falta de respeito e ausência do mais elementar civismo ocorreu igualmente em São Bartolomeu de Messines. Inadmissível também, desconhecendo-se se os «autos de notícia» levantados para os dois casos, começam, terminam ou têm lá pelo meio a transcrição da tal quadra de Aleixo que, obviamente recebeu antes da DGA e da CCDR nascerem, o parecer favorável do povo algarvio:

Uma mosca sem valor
poisa c’o a mesma alegria
na careca de um doutor
como em qualquer porcaria.


É claro que episódios como estes chamam à memória a saga da construção do aterro sanitário do Sotavento, precisamente naquela mesma Cortelha, em área da proclamadíssima Rede Natura, saga que ao fim e ao cabo foi um «negócio político» assinado com a mesma alegria com que a mosca sem valor pousa nesta inadmissível política feita com as lamas dos esgotos da burocracia. Negócio político anti-natura que é, forma uma rede, uma rede anti-natura.

É por estas e outras razões e motivos que se deveria passar a designar proeminentes ecologistas por egologistas – ou peritos na ciência do eu. Porque servem o eu. Perderam a consciência e o bom cheiro da origem etimológica daquele eco (do grego oíkos, casa) e nesse eu que é a sua alegre casinha, o bicho homem conta menos que a mosca - mesmo que o bicho homem esteja em extinção na Serra do Caldeirão, pelos vistos com parecer favorável e licenciamento aprovado desde que se cubra o bicho no prazo de 48 horas como a burocracia determina para as lamas.

Carlos Albino

quinta-feira, 13 de julho de 2006

SMS 166. Ambiente escaldante

13 Julho 2006

No momento em que os fundos comunitários para o Algarve, até 2013, vão quase pela certa sofrer um corte de 75 a 80 por cento (a região, por assim dizer, terá de se contentar com 254 milhões de euros por, à luz fria das estatísticas, estar a sair artificialmente do chamado «objectivo de convergência»), pois é neste momento que o Plano Regional de Ordenamento do Território entra em discussão pública, com cada um a puxar para ao seu lado, o pequeno e já delido lençol algarvio.

As câmaras estão divididas procurando algumas, sem grande autoridade moral em matéria de ambiente, acautelar os quintais costeiros que restam; os investidores ameaçam, e, como se o capital financeiro tivesse sede na região e beneficiasse directamente o Algarve, só agora reclamam por «regras claras no turismo» quando nestes últimos 20, 30 ou 40 anos, nenhuma clareza reclamaram para os processos de financiamento e de recuperação; e como se tudo isso não bastasse, lá surgem uns quantos com ar melífero mas para quem a defesa do ambiente se esgota em malandramente acariciar um imaginário lince ou a cheirar tomilho, enquanto não conquistam algum bem remunerado posto de consultor ambiental, calando-se depois, cada um à sua vez.

Sem dúvida que o problema ambiental do Algarve é grave, atrever-me-ei a afirmar que, em termos de segurança, de bem-estar colectivo e de identidade, este será até o mais grave dos problemas que o Algarve enfrentou ao longo da sua velha história, porquanto, hoje o Algarve dos Algarvios não teme apenas um Remexido, que até era de mau tom e pior aspecto, mas teme, sim, umas boas dezenas de Remexidos, todos eles com muito bom tom e melhor aspecto apesar dos indisfarçáveis tiques próprios dos salteadores.

De facto, não sou eu que digo agora – tem sido voz corrente nos últimos anos que «o Algarve está ao assalto». Quem tiver dúvidas, que olhe para aquelas falésias de Albufeira ou mesmo para muito do que já foi domínio público marítimo.

Carlos Albino

quinta-feira, 6 de julho de 2006

SMS 165. Manuel da Luz Afonso, louletano

6 Julho 2006

Vem a propósito: o seleccionador dos célebres Magriços, Manuel da Luz Afonso, era de Loulé, terra que tem dado ao País políticos, engenheiros, literatos e militares de nomeada. No desporto, anos a fio, esse louletano tem sido uma referência incontornável, mas, até agora, a sua terra não lhe fez a homenagem adequada e devida. Creio que nenhum dos Magriços sobreviventes recusaria estar em Loulé para uma evocação condigna, designadamente Simões e Eusébio.

Na verdade, vendo o panorama, Manuel da Luz Afonso foi a personalidade ímpar louletana que mais se notabilizou na área desportiva, pelo seu carácter firme, digno e correcto, pelos seus testados conhecimentos e pelos insofismáveis feitos. Ele fez uma escola que galvanizou gerações de desportistas.

Não sei, então, porque é que Loulé espera para dar o nome de Manuel da Luz Afonso ao belo Pavilhão Desportivo da cidade.

Seruca Emídio tem a palavra para que Loulé salde de vez a dívida. Uma grande dívida. Pelo meu lado, gostaria de chegar ao fim daquela avenida e ler em letras de gente agradecida – Pavilhão Manuel da Luz Afonso, seleccionador dos Magriços. E já agora, porque há dinheiro para tanta criancice, não me repugnaria ver, num recanto arrelvado, um grupo escultórico com o Manuel da Luz Afonso de braço erguido, com os 11 Magriços cada um na posição de campo… Eusébio e Simões, de certeza, fariam de Loulé paragem obrigatória. Estou para ver.

Carlos Albino

quinta-feira, 29 de junho de 2006

SMS 164. A Ex.ma Sr.ª Dona Corrupção…

29 Junho 2006

Depois do que foi revelado pelo coordenador da investigação da criminalidade económica da PJ/Coimbra, Nuno Maurício que, no Centro de Estudos Judiciários, afirmou que um terço dos inquéritos sobre corrupção tem as câmaras municipais como alvo e que, ficando-se a saber que entre 2002 e 2005, dos 6.976 inquéritos abertos envolvendo crimes económicos e financeiros, os da corrupção somaram 1.251, bem!, depois disto nem se percebe tanta polémica à volta do lugar da Igreja Católica no Protocolo de Estado, a que se segue a presente disputa entre os conselheiros do Tribunal Constitucional e os do Supremo Tribunal de Justiça, cada um a não querer ficar atrás do outro na fila de precedências do mesmo protocolo, como se a honra de entrar primeiro fosse o principal problema da honra do Estado. A Ex.ma Sr.ª Dona Corrupção, ao que se sabe, nunca se preocupou com o seu lugar no Protocolo, mas, a avaliar a gravidade das advertências de Nuno Maurício, um quadro superior da Polícia Judiciária, ela está de pedra e cal na lista de precedências do Estado e com a consciência tranquila, porquanto essa tão poderosa quanto benemérita senhora que, numa democracia saudável apenas viveria quando muito com um estatuto de meretriz reformada, sabe que os inquéritos que contra si movem, na maior parte, são arquivados ou geridos até calculada prescrição, por mais que Nuno Maurício e outros que não são poucos, fiquem a protestar contra o à vontade dos «infractores de luxo».

Advertindo que a corrupção é uma «séria ameaça aos pilares da democracia e ao próprio progresso social e económico», Nuno Maurício não especificou quais as regiões do País onde aqueles 1.251 inquéritos tiveram cenário, quantos, por exemplo, foram abertos no Algarve e destes, quantos resultaram em acusação e quantos descansam em paz no arquivamento. Em todo o caso, lembrando ele que a Ex.ma Sr.ª vende o seu corpo à custa de meios de pressão ilegítimos para obter determinado resultado que, segundo um processo natural, não seria porventura conseguido, não é difícil a cada um dos nossos leitores olhar à sua volta e verificar se na sua rua, na sua terra ou na área do seu Município não haverá uma acompanhante dessas que, como todas as acompanhantes no activo, garante o maior sigilo e apartamento privado se calhar em turismo rural, ganhando pela calada da noite aquilo que com grande espavento mas sem justificação aparente à excepção do decote, exibe à luz do dia.

Carlos Albino

quinta-feira, 22 de junho de 2006

SMS 163. Cônsules honorários…

22 Junho 2006

Ou pelo turismo, ou pela mão-de-obra, ou por negócios (uns claros, outros nem tanto…), ou por exigências de serviço a comunidades estrangeiras aqui radicadas, ou ainda por um bom número de razões insondáveis, o certo é que se registou em Portugal um boom de cônsules honorários. No Algarve, ao certo, ninguém sabe quantos eles são, quem exactamente são eles, como operam e onde estão os escritórios consulares. Pelas Páginas Amarelas, que não são propriamente uma folha oficial, os cônsules honorários no Algarve serão sete e, destes sete apenas um se revela com nome e rosto - o cônsul alemão, Michael Bruno Bach, com representação sedeada em Faro, cidade que alberga mais três escritórios consulares (Holanda, México e Canadá), havendo um outro em Almancil/Loulé (o da Suécia), mais um em Portimão (Cabo Verde) e outro ainda em Vila Real de Santo António (Espanha). Para além das Páginas Amarelas, a informação que é de interesse público é escassa ou nenhuma – o Ministério dos Negócios Estrangeiros é tradicionalmente omisso na matéria, o mesmo acontecendo com o Ministério da Administração Interna e com as antenas institucionais do Governo nos distritos como são os Governos Civis. Ainda no caso do Algarve, esperar-se-ia que a RTA colocasse no seu site oficial (excelente, diga-se) a listagem de consulados e cônsules, mas nem isso. Restará outro caminho, o das embaixadas acreditadas em Lisboa, mas também por aí a informação peca, e basta citar o caso da missão diplomática do Brasil que nem refere a existência de um suposto cônsul honorário brasileiro no Algarve que apenas se lobriga através do site particular da Casa do Brasil, como passando os seus dias no Apartado 1084 em Vilamoura… Ora, um cônsul num apartado, mesmo sendo honorário, perde a honra.

Estou em crer que haverá no Algarve mais do que os sete cônsules das Páginas Amarelas, seis dos quais sem nome público e em endereços descaracterizados – serão agências de viagem? Escritórios de advogados? Empresas de construção civil ou imobiliárias? Não fica claro.

Não é preciso gastar muito espaço a explicar porquê, mas é já o momento do Governo Civil ao menos por uns motivos, mas também a RTA por outras evidentes razões, publicarem directórios completos e oficiais dos consulados honorários no Algarve, onde fique patente quem é quem e onde opera, porque o assunto é mais sério do que à primeira vista parece. Não há decreto que obrigue mas há motivos que aconselham.
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P.S.: Claro que lemos o relatório da Universidade do Algarve sobre Faro/Capital da Cultura. Uma conclusão útil: há no Algarve 42 opinion leaders!


Carlos Albino

quinta-feira, 15 de junho de 2006

SMS 162. A integração dos imigrantes

15 Junho 2006

Não há, no Algarve, uma política ou políticas de integração dos imigrantes que, no conjunto, formam já uma apreciável faixa da população residente e que vive à margem, à excepção do que a força de trabalho faz supor. Os municípios não estimulam a criação de associações próprias e abertas dessas comunidades nacionais (algumas indecorosamente sem qualquer apoio também dos Estados de origem) e são raras as iniciativas que visem dar a conhecer a cultura da comunidade que as acolhe e as vias e valores de participação no muito que, no dia a dia, acabam por ter em comum.

Fora o trabalho, é um viver de costas voltadas uns para uns outros quando a verdade é que a cada esquina todos dão de cara uns nos outros. Claro que a integração não é fazer de cada ucraniano um português, de cada romeno um algarvio, de cada cabo-verdiano um quarteirense ou de cada moldavo um vereador da Câmara de Faro. Nada disso! A integração é a descoberta das responsabilidades de quem abre as portas e de quem por elas entra; é a partilha do que pode e deve ser partilhado para que não se corra o risco da formação de guetos; é o sistema de tácita vigilância para que o bem-comum se mantenha bem-comum e não capa protectora dos marginais que se organizam dentro das margens postergadas; é o apoio jurídico, social e cultural a quem optou por viver entre nós ou entre nós tenta uma vida melhor com contrapartidas que, na maior parte dos casos, são duras, violentas e sem protecção de qualquer espécie. Os municípios, nestas matérias, têm deveres que não estão a assumir. E não é por falta de dinheiro, é por falta de sensibilidade e por ausência de vontade política. Assunto para continuar.

Carlos Albino

quinta-feira, 8 de junho de 2006

SMS 161. As contas do Parque

8 Junho 2006

A nomeação de Rogério Gomes para o comando do Parque das Cidades, foi, até ver, uma coisa sensata. O Parque das Cidades não foi inventado para se constituir em «terceiro município» ao lado de Faro e de Loulé e, ainda que de forma palpável a sua existência não vá além do Estádio, o parque encerra potencial – um potencial que depende em primeiro grau do nível de entendimento entre os dois municípios fundadores, e depois, naturalmente, da vontade política do governo que é a condição e a condicionante. Portanto, a gestão do Parque só por insensatez poderia ser entregue a um «politiqueiro falhado» que veria ali, sobre o antigo aterro, a oportunidade de vingar às mil maravilhas sucessivos fracassos de um super-ego trapalhão, sem consistência ideológica e sem seriedade, pois oportunidades não lhe faltariam para dar bordoada política ora a Faro hoje, ora a Loulé amanhã, ora à AMAL e à Junta Metropolitana uma vez por mês, ora ao Governo, e se calhar, à UE e até bordoada à ONU – sim, porque por megalomania haveria de se encontrar pretextos para responsabilizar Kofi Annan por não termos já ali, no Parque, o almejado Complexo Desportivo, o desejado Centro de Congressos, o reclamado Hospital Central, e, dentro daquilo que se delineou ser a área verde polivalente, um Jardim Botânico a sério e um Circuito de Manutenção que não seja para brincar!

Por outras palavras, o líder da empresa criada pela associação de municípios Loulé/Faro, poderia converter-se através de uma meia dúzia de conferências de imprensa, de uns oito comunicados e por um contrato com uma agência de comunicação, em personalidade mais importante que o presidente de Faro, o presidente de Loulé, qualquer presidente, sem que os problemas do Parque ficassem ou fossem deveras resolvidos. Sabemos como em muitas terras deste nosso Algarve se aprecia e até se estimula a luta de gladiadores, porquanto o nível de eficácia da discussão política parece depender, nessas mesmas terras, das espadeiradas e punhaladas mortais, da arte do golpe baixo e das prosas de franco-atiradores que obviamente não querem servir o Algarve mas tão só servirem-se a si próprios, valendo tudo até o arrancar olhos ao mais fiel amigo e matar a mãe. Até ver, a escolha de Rogério Gomes para liderar um projecto defensável – defensável e importante para todo o Algarve – afasta à partida aquele cenário daquela gente que faz política à custa do sangue derramado. O PSD conhece gente dessa e o PS conhece também essa gente.

Ora o que se espera, para já de Rogério Gomes? É simples: que, apesar o seu ordenado ter descido da categoria B1 para C1, faça o que até agora não foi feito – faça e torne públicas as contas do Parque – que ponha em dia os planos de actividades, os orçamentos e as contas anuais de gerência… Rogério Gomes é jurista, pelo que me garantem é pessoa séria e, portanto, sabe que sem transparência é impossível o ganho de causa.

Carlos Albino

quinta-feira, 1 de junho de 2006

SMS 160. O elefante incolor

1 Junho 2006

A Associação de Municípios Loulé/Faro, que é uma pessoa colectiva de direito público, gere, como se sabe o Estádio Algarve o qual, bem vistas as coisas, é um elefante branco e também a bandeira do chamado Parque das Cidades. Por sua vez, este Parque (225 hectares) foi atirado aos olhos da população como «um projecto estruturante para o Algarve» que iria albergar «importantes infra-estruturas complementares ao Estádio», enumerando-se um Complexo Desportivo, um Centro de Congressos e um Hospital Central. No pressuposto de que o elefante não iria ser branco por muito tempo mas colorido de promessas políticas, acrescentou-se ainda que o Parque iria dar guarida a um Jardim Botânico e a um Circuito de Manutenção, rematando-se as promessas com aquele fórmula que apenas engana algum analfabeto distraído que tenha entrado ilegalmente no Paraíso – a fórmula das «outras valências de carácter lúdico, desportivo e didáctico»… Creio que para este Parque e para esta Associação intermunicipal que possui um conselho de administração bem pago, muito bem pago para o que faz e pode fazer, chegou a hora da verdade, porque o elefante branco já é, pior será se vier a ser incolor. Diremos mais, na próxima semana. O que recentemente se passou à volta da escolha do «presidente do conselho» afinal do Parque, justifica mais umas linhas até porque o elefante é uma pessoa colectiva de direito público e não propriamente uma caixa de correio de mordomias.

Carlos Albino

quinta-feira, 25 de maio de 2006

SMS 159. Conferência regional de segurança

25 Maio 2006

Penso que não exagerei, na semana passada, com o alerta para a segurança e com os sublinhados para uma vigilância mais atenta, mais responsável, dissuasora e preventiva, com efectiva visibilidade e presença continuada das autoridades policiais em locais e corredores estratégicos. A GNR, onde não há PSP, não pode limitar-se com razões de sobra a fazer o expediente das vítimas; a PSP, onde a GNR a não substitui, não pode converter-se com fundados motivos em vítima sistemática do expediente; as restantes autoridades (polícias de investigação e de imigração) não podem comprazer-se apenas com os resultados de operações esporádicas por mais evidente que seja o êxito e a tonelagem do crime perseguido; e os Municípios, os 16 em conjunto e cada um por seu lado, não podem continuar a assobiar para o lado nesta matéria da segurança.

É impensável, por exemplo, que a GNR no Algarve obedeça a três ou quatro comandos diversos se não é que não são longínquos e que nada têm a ver com Algarve e com os problemas especiais do Algarve, conforme o caso, desmotivando quem, sendo militar, está a postos. É impensável que a PSP no caso peculiar e especialíssimo do Algarve que em metade do ano vê a sua população subir dos 400 mil e picos para mais de um milhão e meio, não esteja presente com organização, meios e recursos adequados em cada uma das cidades, grande parte das quais se atravessa, seja de dia seja de noite, sem se ver um agente à vista desarmada, com excepção para as braçadeiras da polícia de trânsito que só adianta o trânsito. Como também é impensável que os municípios, que há bem poucos anos deram mostras de febre securitária com a reivindicação de polícias municipais, agora se isentem da chamada de competências, da pressão política e das trancas à porta.

Naturalmente que não culpo as pessoas, a pessoa dos responsáveis, sejam agentes da administração ou eleitos. Culpo o sistema que está desadequado, desfasado e que, no caso do Algarve inesperado que temos, actua como se isto fosse o Alto Alentejo ou a Beira Litoral, que não é e está longe de ser, pois a segurança autónoma dos aldeamentos turísticos de porte não é a segurança do Algarve e dos Algarvios.

Por isso, julgo que seria oportuna a convocação de uma conferência regional de segurança envolvendo todas as partes implicadas (agentes políticos, da justiça e das polícias) e da qual saíssem pontos de situação credíveis, recomendações ao Governo e algum sinal para a população do Algarve, sobretudo a residente que, pelos factos e pela doutrina dos factos, está deveras indefesa e à mercê do acaso ou da sorte. Claro que o Governador Civil e o Presidente da Junta Metropolitana teriam ou terão uma palavra a dizer. Estou em crer que o Algarve em peso agradeceria tal palavra.

Carlos Albino

quinta-feira, 18 de maio de 2006

SMS 158. Prioridade à segurança

18 Maio 2006

Na última semana, para além de ter sido inusitadamente bombardeado com telefonemas, e-mails e conversas de café dando conta de diversos assaltos nas zonas rurais em redor de Loulé, roubos de monta em estabelecimentos comerciais das principais cidades do centro algarvio e descaradas actuações de delinquentes envolvendo negócios criminosos um pouco por toda a parte, então não é que eu próprio fui vítima? Primeiro, em plena tarde, foi um inacreditável assalto à minha residência numa das principais avenidas de Lisboa e, dois dias depois, dois brasileiros assaltaram-me à mão armada, na mesma zona. Não pelo que me aconteceu, mas por aquilo que está a vitimar todos os dias dezenas e dezenas de cidadãos, penso que chegou o momento para, de forma clara e inequívoca, todos reclamarmos por mais segurança, por esquemas preventivos e dissuasores mais eficazes das autoridades com funções policiais, por critérios mais sopesados por parte das autoridades da imigração e, sobretudo ou acima de tudo, poses sem lassidão dos decisores políticos que muitas vezes se comportam ou justificam medidas como se fossem membros de uma ONG ressabiada. É que há um género de anti-xenofobia que acaba por ser xenófona com todas as letras e que acaba por favorecer o pasto para incrementar a verdadeira e temível Xenofobia que ninguém que seja sério deseja ou quer ver nos seus dias.

Nada adianta a cada um dos responsáveis – desde políticos e polícias, a tribunais e agentes de imigração – descartar culpas para cima dos ombros de cada um dos outros, deixando o cidadão atónito perante este jogo de lavar de mãos que pode garantir sucesso para abertura de telejornais e manchetes de tablóides, mas que não passa, tal jogo, de manifestações secundárias de adolescentes tardios da democracia. Igualmente nada adianta jogos de estatística, de percentagens ou de comparações com outros países e outras regiões, quando a insegurança é um facto e, além disso, quando a criminalidade se revela cada vez mais violenta e executada por gente, essa sim, sem dúvida, xenófoba, impiedosa e desumana.

Carlos Albino

quinta-feira, 11 de maio de 2006

SMS 157. Direitos adquiridos

11 Maio 2006

«Diga lá! O ké ke kéri?» - foram estas as primeiras palavras que a funcionária, bem aperaltada e com ares de mestrado em prepotência municipal, me dirigiu, além disso espetando o dedo como bico de pita na minha inicial tentativa de dizer boa tarde, pelo que apenas disse boa e engoli a tarde. E estava eu mastigando em silêncio aquele venenoso formulário de atendimento público, quando a funcionária volta à carga, fazendo subir a voz como o clarinete de Paderne a disfarçar a fífia - «Vá! O ké ke kéri? Diga lá!». Claro que perante esta ordem municipal para eu dizer , disse imitando tanto quanto possível o contra-baixo da banda de Portimão e retirei-me sem tratar do caso. É que não tenho mesmo nenhuma paciência para aturar estes plebiscitos de duas pernas que se sentam nas repartições públicas como direitos adquiridos e que degolam qualquer educação cívica e qualquer instrução pública. Disseram-me depois que aquele plebiscito está ali apenas por ser afilhada de um padrinho, e se aqui trato deste caso de mordomia poluída sem nome e sem local, é porque também me disseram que o caso é mais geral no Algarve do que eu antes supunha e que não ocorre apenas com bicos de pita, enfim sempre são pitas, mas que se repetem com árvores de maior porte que a desconcentração e descentralização por aqui planta...

Carlos Albino

quinta-feira, 4 de maio de 2006

SMS 156. Nem a Mãe Soberana entende

4 Abril 2006

Ali, no alto daquele monte, a vez não é dos políticos, nem dos actores, nem dos animadores de tertúlias, nem dos homens ricos por serem ricos, nem dos pobres encartados por serem pobres e muito menos dos jornalistas. Ali, a digna vez é dos padres, é a vez de um padre que, de ano para ano, se costuma designar por «orador sagrado» e de cuja boca, também de ano para ano, se espera que diga palavras que de alguma forma sagrem a convivência humana e um raro momento em que os inimigos esquecem inimizades, os adversários enterram machados de guerra e os desconhecidos se tratam por conhecidos. Falo da Festa da Mãe Soberana que, em Loulé, leva em triunfo para o alto desse monte largos milhares de seres humanos numa feérica movimentação da qual, uma vez acabada, apenas resta uma coisa que é uma grande coisa – um momento raro de fraternidade humana. Pois, lá no alto do monte e pelas encostas do monte, misturam-se crentes convictos, ateus de conveniência, agnósticos por vários motivos (sendo eu um dos mais fracos motivos), mas também indiferentes por cultura, distraídos da vida arrastados, e pelo meio da amálgama uns quantos desesperados sem causas à espera de um sinal de esperança a que se mistura gente de sucesso para quem a vida tem sido um mar de rosas ou talvez mesmo um pântano de expedientes. O certo é que todos sobem, uns limitam-se a saudar com entusiasmo contagiante, outros acompanham mesmo a Mãe Soberana num exercício secular que apenas pode ter uma explicação que é uma grande explicação – um exercício raro de paz humana, além do mais transbordante de alegria. A isto não se chama espectáculo, chama-se fraternidade.

E mal anda o «orador sagrado» se não percebe isso, se não entende quem tem à frente e se pretende impor um discurso codificado, findo o qual toda a gente, à excepção do próprio, diz que falou muito bem mas não compreendeu rigorosamente nada, apesar da voz bem colocada e da frase bem construída a custa de códigos, tal alguns economistas usam para a crise económica sem nunca enunciarem claramente uma solução ou tal como alguns dentistas para ingloriamente explicarem ao paciente uma terrível dor de dentes não sendo esse o momento para teorias. Foi o que este ano aconteceu, porque há discursos «fraternos» que são contra a fraternidade – prática em que o fundamentalismo, qualquer fundamentalismo (então o islâmico!) é useiro e vezeiro. Pois o «orador» deste ano, vendo aqueles milhares de crânios, o que fez? Desfasado daquela entusiasmadíssima Festa de paz e sem compreender aquela alegre Festa de fraternidade, o «orador» como que descobriu a grande e irrepetível oportunidade histórica de derramar para aqueles crânios as coisas de peso do Antigo Testamento, do Novo Testamento e admito até que do Futuro Testamento, insistindo no filho morto quando todos, todos ali desde ateus a crentes e passando por agnósticos tementes, só vêem o filho vivo, e mais grave, fazendo incidir a oratória sagrada na Mãe Súbdita quando todos, todos desde desesperados a peritos em expedientes da vida só vêem a Mãe Soberana. É claro que, nestas circunstâncias, abandonei o mais rapidamente que pude o alto do monte, como nunca fiz. Ali, ninguém contesta e até todos desejam que a Igreja faça prova de vida o que não consegue com um sermão que nunca se sabe se é mais semelhante ao que no século XVIII antecedia o auto de fé ou se é repetição, ainda que vaga, do que se seguia à purificação dos condenados.

Loulé, melhor, a Festa da Mãe Soberana merece um «orador sagrado», mas um orador que sagre. De outra forma, nem a Mãe Soberana entende porque há no seu património valores que excedem a Festa e que jamais podem ou devem ser alienados – a paz e a fraternidade, coisas entendíveis apenas numa linguagem sem aqueles códigos que não vão ao problema, sem aquela presunção de frase bonita mas que põe em crise a convicção, sem aquelas fórmulas que desumanizam e que por mais que divinamente inspiradas pareçam ser, acabam por dar para o torto.

Carlos Albino

quinta-feira, 27 de abril de 2006

SMS 155. Palavra de general

27 Abril 2006

É claro que o general Mateus da Silva ao afirmar que o Algarve precisa de «um Alberto João Jardim» não estava a dizer que o Algarve precisa de Alberto João Jardim. Nada disso. Precisa de um, não precisa de. E é verdade – o Alberto João Jardim não faz aqui nenhuma falta, mas um faz. O que o Alberto João Jardim é, todos sabemos – homem inconsequente e que desafia a civilidade por todos os poros, provocador consoante as conveniências e figura do mais recuado provincianismo, o Alberto João Jardim está para a Maria da Fonte assim como o Remexido estava para o Ali Babá e seus 40 ladrões. Mas quando se fala da necessidade de um Alberto João Jardim o que se pretende dizer é que o Algarve precisa de líder, de projecto de afirmação, de ideia que reconduza à identidade, que foi exactamente o que um Alberto João Jardim conseguiu dar à Madeira, porquanto quem por certo se lhe seguirá, já não poderá fazer recuar a Madeira para o estado de estagnação e de descaracterização em que se encontrava. E é por esta ordem de ideias que poderemos afirmar que até os Açores tiveram até agora não um mas dois Albertos – Mota Amaral e Carlos César. O Algarve não teve nenhum.

Alguns homens, em certo momento, até tiveram condições para liderar o Algarve, mas faltou-lhes ideia, projecto, discurso e sapatada nas mordomias. Assim aconteceu com Luís Filipe Madeira que tem discursado muito mas feito pouco ou mesmo nada (será quando muito um líder provinciano em que a manha oculta ideias) e em certa medida assim aconteceu com José Mendes Bota que é um CD regravado. A Júlio Carrapato faltou aquele acessório do brilhantismo e sobraram-lhe as navalhadas nas costas, algumas tão discretas quanto fatais. A José Vitorino faltou sobretudo a Enciclopédia Luso-Brasileira, da letra A até à letra Z. A Cabrita Neto faltou perceber que a política não é uma empresa e, quanto a figuras, poucas mais saltam dos registos destes 32 anos de democracia não havendo portanto azo para pedir desculpas para eventuais omissões, até porque Macário Correia ainda não deixou de ser apenas o presidente da Câmara de Tavira. Bem, vem aí a geração mais jovem de políticos que ainda não provaram nem tiveram tempo, muito embora alguns não deixem de ser meros afilhados de vícios antigos e quanto à quota de mulheres, obviamente que não chegam lá apenas por via de convocação de conferências de imprensa e comunicados provincianos para jornais que tomam igualmente por provincianos. Por exemplo para Miguel Freitas a prova de ter ou não ter chama, apenas agora começa, aguardemos.

Assim, as declarações do general Mateus da Silva, algarvio confesso e espírito inquieto com o que se passa na Terra, são uma verdadeira e inesperada pedrada no charco. A política algarvia está reduzida às coisinhas de indivíduos contra individuozinhos das coisas, está confinada à disputa de lugares para listas mais ou menos futuras de deputados, empregos políticos e comissões partidárias e está bloqueada por gente que tem da democracia uma ideia de proveito próprio. O Algarve precisa de um, de dois, de três Albertos que não se transformem no Alberto João Jardim. Mas que precisa pelo menos de um, lá isso precisa. A palavra do general foi um tiro certeiro e não foi um tiro curvo.

Carlos Albino

Nota: As ilustrações escolhidas para este apontamento reproduzem os, até agora, mais credíveis símbolos do Algarve. Em cima, o brasão de armas, e, em baixo, a bandeira, conforme nos descreve o reconhecido perito em hieráldica, Simas Alves de Azevedo. Coisas a ter em conta pelo Governo Civil e pela Junta Metropolitana.

quinta-feira, 20 de abril de 2006

SMS 154. Uma questão de puro civismo

20 Abril 2006

É difícil encontrar região do país pior que o Algarve, em matéria de estacionamento, de ruído e de asseio. O que verifico em Loulé, não encontro em Bragança nem em Castelo Branco e muito menos na Feira; o que se passa em Faro, é difícil em Viseu; o que há em Portimão, seguramente não se vê em Aveiro; as bandas de Albufeira não se comparam às bandas da Figueira da Foz, andar por Silves não se compara a andar por Évora; e o que se avista em Lagos nem por um canudo se enxerga em Braga. Não é que as terras da comparação sejam paraísos, mas não são tão infernos onde o civismo arde e pena. E como eu gostaria que o Algarve fosse uma Terra de Civismo!

Qualquer um, no Algarve, estaciona o carro onde quer desde que descubra uma nesga, qualquer um faz o barulho que lhe apetece e qualquer um atira para o chão o que muito bem entende. Estaciona-se em cima de passadeiras de peões, de calçadas acabadas de fazer, em segunda e terceira fila, onde quer que seja, para não se andar a pé uns metros até à cama ou até à sala; motas e motoretas por aí andam de escape aberto num festival de ruído e em afirmações de poder pelo estrondo do escape; e, quanto à noção de asseio público, nem vale a pena descrever o espectáculo de imundície com cães ou sem cães porque a imundície é sempre de raça apurada. E o curioso é que pouca gente protesta abertamente, que raros são os municípios que levantam o dedo contra este estado de coisas, e que raramente se nota a autoridade a pôr ordem nisto e a zelar pela aplicação da lei, cada um à sua maneira assim contribuindo para a deterioração do ambiente público, da paz urbana e do bem-estar nas ruas onde todos e cada um de nós passamos, afinal, grande parte da vida ou mesmo o melhor da vida.

Por princípio, sou contra a repressão, como sou, também por princípio, a favor de campanhas de instrução pública (sim, digo instrução, não tenho medo da palavra), a favor de campanhas de sensibilização, de acções que previnam tudo aquilo que a repressão não cura nem pode curar – a repressão, apenas em último caso e como último recurso, quando apenas a autoridade pode evitar o confronto directo ou a impunidade continuada e desafiadora dos que fingem não saber viver em sociedade ou, pior, querem mesmo provocar os mais sensíveis alicerces da vida em sociedade.

E como em tudo, há terras piores e terras melhores, e mesmo dentro das melhores há zonas de evidente decoro imposto e outras zonas completamente ao deus-dará – não vou, por agora, citar casos concretos, para que não se diga que torço pelos de Aljezur contra os de Alcoutim ou que enxerto carrapatos em Ferragudo esquecendo-me das pulgas dizimadas em Moncarapacho. Não vou por aí. Mas em todas as terras, os municípios podem e devem fazer mais do que fazem através de posturas e de acções de sensibilização; em todas as terras, as forças com funções de polícia podem e devem actuar mais do que actuam, por vezes abrindo mais os olhos que convenientemente fecham; e todos nós, os cidadãos para quem a palavra civismo foi inventada, podemos e devemos reivindicar, em todas as terras, o bom jogo dos deveres e dos direitos. Mesmo que os deveres sejam difusos, não é sr. Cabrita?

Carlos Albino