quinta-feira, 25 de agosto de 2016

SMS 681. A AMAL não tem presença que se veja e sinta

25 agosto 2016

Foi tendo vários nomes, mas tal como a mulher de César, teve sempre epíteto de bom tom - AMAL, que lhe vem do batismo, em 1992, como Associação de Municípios do Algarve. Quando devia estar já crescidota, foi crismada, em 2004, como Grande Área Metropolitana do Algarve mas, para manter o bom tom, continuou AMAL. E já na idade de casar, casou com marido desde logo perdido ou desaparecido, com o nome de Comunidade Intermunicipal do Algarve, mas continua sendo a AMAL que sempre se chamou até porque, tal como com a mulher de César, era de mau tom e até de pouca originalidade ser tratada por CIA. Mas não entremos por nomes, coisa que pouco interessaria se a AMAL tivesse tido ao longo destes anos presença que se visse e se sentisse. Presença, não daquela que lhe decorre do aparato burocrático que é bastante, tanto que dá para um aspeto de Terreiro do Paço provinciano, mas presença, sim, que lhe viesse e se lhe sentisse de efetiva liderança regional, de voz apurada da região, de firmeza e constância em posições provinciais comuns. Nada disto aconteceu nem acontece, revelando-se a AMAL apenas como um estendal onde a roupa provinciana de 16 municípios se pendura a secar.

A AMAL, fosse associação, área metropolitana ou comunidade nunca foi o traje solene da política, a indumentária de autoridade moral, ou a vestimenta institucional do Algarve. Quando muito tem sido mero complemento de salário político de uma ou outra autarquia. Não entrou pelos olhos e ouvidos da população algarvia como voz indelével e imagem confiável da região.

Primeiro, era o governo civil que lhe fazia sombra política quando a sombra era meramente protocolar; depois, passou a ser a CCRDA a gerir os holofotes, por natureza, ligados às tomadas do governo que vai estando. Aos olhos e ouvidos da população algarvia, e também aos olhos e ouvidos que estão para além do Caldeirão, a AMAL, por falta de liderança autóctone ou por lideranças sempre condicionadas pelas hierarquias partidárias que fazem a trança de mordomias que despedaça o País, nunca foi a voz do Algarve, ou pelo menos uma das vozes, ainda que só pudesse cantar ópera apenas na banheira.

Pela sua missão e objetivo estatutário, compete-lhe potenciar o desenvolvimento dos municípios e reforçar a identidade conjunta da Região, mediante a articulação de interesses e criação de sinergias, e anunciadamente, também ser o guia e impulsionador dos Parceiros Regionais, capaz de conciliar e harmonizar as estratégias para o desenvolvimento sustentado da região. Para isto, tem que ter voz, ser a voz ou uma voz que não faça de conta, gerar uma liderança credível, culta e sábia.

Porque a região merece e espera.

Carlos Albino
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Flagrante elevador: Nada contra um elevador na Ponte sobre o Tejo para uma vista panorâmica a oitenta metros, com o custo de quatro milhões e meio. Mas um “programa cultural” de 365 dias para todo o Algarve por um milhão e meio, permite concluir que entre o Turismo e a Cultura há uma ponte muito baixa.

quinta-feira, 18 de agosto de 2016

SMS 680. Os burlões armaram a tenda nesta feira

18 agosto 2016

Uma coisa é a crença ou são as crenças, outra muito diferente é a charlatanice, o embuste, o dolo. Até nisto, bruxas, feiticeiros e curandeiros já não são o que eram, passe a gasta expressão. Outrora esta gente, na ausência de medicina e de médicos, usava segredos da natureza à mistura com rituais para curar. E às vezes até curavam, não pelos rituais mas pelos segredos que hoje são matéria-prima das medicinas alternativas já colocadas nos tronos universitários. Em nome de crenças, muita dessa gente foi queimada em ondas da justiça mais ignóbil. Que a memória não falte, já que Deus, pelo que dizem, não esquece. Hoje, a liberdade de crença, coisa que jamais se saberá onde começa e acaba (por vezes, com os fundamentalismos, acaba mesmo mal), hoje essa liberdade intocável não só suscitou um largo campo aberto à convivência das crenças como também facilitou a atuação de todo o género de trapaceiros que não são bruxos, toda a espécie de vigaristas e aldrabões que não são curandeiros, toda a fila de intrujões, tramoeiros e bilontras que não são feiticeiros. Mais grave é quando os embusteiros, já organizados, dissimulam a falcatrua com a crença, recobrem os espinhos da impostura com o veludo de objetivos humanitários, ou quando pintam o ardil com as cores divinas que até Deus desconhece. E isto tudo para dizer que o Algarve parece uma feira visitada por ingénuos, na qual cada burlão montou a sua tenda.

Há de tudo. Desde o “doutor” com nome de batuque no sertão e, supõe-es, com osso de rato no nariz, à especialista de búzios e cristais “especializada em casais” que, para credibilizar a sua “clínica de orientação espiritual”, assegura que se tornou na “parapsicóloga mais bem desenvolvida da Europa”, toda esta gente, à falta de médicos no Hospital de Faro, apela a que se pare de sofrer, que se acabe com insónias e depressão, que se vença impotências disto e daquilo, que o negócio traga lucros, que “vidas passadas” e a “maldição familiar” sejam riscadas do cartão de cidadão, ou até que “problemas no tribunal” fiquem resolvidos com um estalido de dedos.

Os que não têm rosto, invadem as caixas de correio mesmo que estas tenham a indicação de recusa de publicidade não solicitada, e colocam papelotes em tudo o que seja vidro de automóvel. Os que têm rosto, andam de dois em dois, à custa de mansinhos voluntários pensionistas e de desempregados de longa duração interpelando abusivamente com quem se cruzam como se Deus deles precisasse para assinar a rogo. Toda esta gente olha para a Sociedade em que deliberadamente não participa, como se a mesma Sociedade onde montaram tenda, fosse terra para invadir e para conquistar. É claro que invadem o mundo dos ingénuos e conquistam os crédulos que são maltratados ou marginalizados nos lugares onde a Saúde, a Segurança e o Direito deviam ser garantias de serviço público e não como coisas equiparada à adivinhação por búzios.

Pela quantidade das tendas da crendice, pelo número de burlões e pela desfaçatez dos espertalhões, não quero ter essa crença, mas tudo leva a crer que este é um dos sinais da terceiro-mundização do Algarve. E esta terceiro-mundização que formata uma “cultura” e até as crenças, não se pode eliminar por decreto, mas faz decretos e influencia os decretos.

Carlos Albino
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Flagrante praga: Nada de confusões. Uma coisa é o mundo dos criadores de cultura e de ciência. Outra, bem diferente, é o mundo dos parasitas da Cultura criada e da Ciência conseguida. E quando cheira a subsídio, os parasitas são uma praga.

quinta-feira, 11 de agosto de 2016

SMS 679. Os jovens correm ou… fogem

11 agosto 2016

É vulgar ouvir-se da boca de programadores, de agentes culturais e de gente mais ou menos envelhecida que por rotina diletante ou por ritual social assiste a tudo, não perde nada e para quem tudo está bem, que é preciso e imperioso “ganhar públicos novos”. E com isto querem dizer que é necessário ter os jovens nas plateias e, melhor ainda, disputando as primeiras filas de melhor vista e não se conformando com arrumação nas últimas, como que para cumprir algum serviço faz de conta. Na verdade, os jovens, descontando alguma música de alguma estrela de estrondo, estão longe das plateias, seja para música que salas semi-vazias aplaudem com “Bravó!”, muitas vezes para fazer de conta; estão longe da sala, seja uma conferência de filósofo de nomeada cujas palavras e sabedoria dificilmente se repetirão em tempo no mesmo local; longe estão se ocorre teatro, ainda que anunciado e reconhecido com elevada qualidade artística; e longe estão das Bibliotecas para requisitarem obras de mérito ou candidatas ao mérito. Para muitos e muitos jovens “ouvir poesia”, mesmo bem dita, é uma “enorme seca”, o que para a poesia mal dita se justificaria. Por aí fora. Esta constatação é comum não apenas nos pequenos centros, nas terras da chamada “periferia cultural” ou nas localidades onde a iliteracia é regra e é de tal modo lei que já não incomoda ninguém, mas é também comum nos grandes centros demográficos onde, seja onde for e a propósito do que for, se encontram mais ou menos sempre os mesmos com as mesmíssimas mesuras.

Mas porquê, isto? Porque motivo os jovens consideram que a cultura pensante num salão de reflexão é inimiga da cultura recreativa de discoteca? Uma impede a outra? Será porque os jovens não foram “conquistados” como público, ou porque há um erro de paralaxe dos que rapidamente se esquecem o que é um jovem, e um jovem, por natureza, se ou quando se sente que o querem tratar como velho precoce, não só corre como foge?

É claro que há bolsas de exceção que podem ser identificadas com maior ou menor dimensão em filarmónicas, ranchos, centros comunitários e “casas de cultura” cujos dirigentes e promotores não sejam jovens serôdios ou, eles próprios, velhos precoces.  Nessas bolsas de exceção, luta-se contra moinhos de vento e, muitas vezes, contra a irracionalidade de quem decide e tem o poder da massa na mão.

Mas, escolas com professores desenraizados e queimando 95% das energias em burocracia tão competitiva quanto inútil; bibliotecas entregues a gente que se debate entre o ser burocrata a cumprir eternamente serviços mínimos. e o ser proeminência sem justa causa; associações que se resumem ao número legal das direções menosprezando que a doença crónica do subsídio causa AVC cultural; uma região com o aparelho de Comunicação esfacelado ou mesmo destruído, embora os aparelhos de propaganda sazonal se revelem afinados; falta de políticas culturais coerentes por parte de entidades públicas (do Estado ou das autarquias) por insuficiência de recursos ou de golpe de asa; e, para pior ainda, uma avantajada e notória tribo nómada que por aí anda a colher os “frutos” da Cultura como uma etnia desprotegida ou auto-marginalizada colhe alfarrobas, tudo isto põe os jovens a correr e, claro, a fugir.

Quando um público foge, a última coisa que se pode ou deve fazer, é tentar “conquistá-lo”. E a primeira que se deve fazer é identificar as causas da fuga e resolver o problema identificado: na escola, na biblioteca, nas associações, na comunicação, nas entidades públicas, e nos que só apanham frutos em devassada terra alheia.

Carlos Albino
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Flagrante oração: “Meu Deus! Livrai-me de me recordar de Manuall Pinho que financiou muita parra para tão pouca uva e que, depois de espremida e pisada, não deu em nada. Ámen.”

quinta-feira, 4 de agosto de 2016

SMS 678. Alarme social

4 agosto 2016

Num debate em Faro a propósito dos furos, se houve concordância entre todos (mesmo de discordantes à defesa) foi a de que o processo nasceu inquinado, obscuro, sem transparência. Foi inclusivamente dito sem contestação que está a ser denegada documentação legalmente de acesso público por parte de entidades administrativas que têm obrigação de o fazer. Designadamente, pelo que foi afirmado, pareceres iniciais dos mais diversos responsáveis regionais implicados na matéria, desde as do ambiente, da coordenação, da economia, por aí fora, até a autoridades marítimas e terrestres (só faltou a força aérea, dada a direção dos furos) e que permitiram o andamento dos contratos, não são disponibilizados como deveriam ser pelo bê-á-bá do Código do Procedimento Administrativo que, por estes e outros tantos casos, se transforma no Código do Alçapão Supositivo.

Assim sendo, falar de furos, discutir furos, avaliar a justeza, viabilidade e adequação de furos, não é propriamente provocar alarme social, como alguns responsáveis já o têm afirmado, porque o alarme social, e esse sim, alarme social arrepiante, é aquele que decorre da falta de transparência do Estado, das entidades da Administração do Estado face aos administrados e dos que lidam com as coisas do interesse público como se fossem da sua propriedade privada.

Independentemente dos furos darem gás, petróleo ou cerveja, há uma questão prévia por resolver e que deve ser resolvida - a da Transparência, com maiúscula. Esta não é uma questão de geologia e de geólogos, não é uma questão de opção entre energias já obsoletas ou para aproveitar nas últimas, e não é uma questão de parcerias avençadas mal ou bem por interesses espanhóis - é uma questão de segurança coletiva.

É claro que, entre nós que ninguém nos ouve, a falta de transparência e o incumprimento difuso da lei que impõe regras de transparência, já faz parte de uma “cultura” que vem de longe. Chegou-se a pensar que o Código de Procedimento Administrativo seria uma barragem inicial para as atuações que desvirtuam as finalidades do Estado, designadamente de um Estado democrático. Mas os factos desapontam. Desde repartições da administração central até a guichés municipais, é do quotidiano verificar-se que, quando a coisa dá para o torto, os administrantes manipulam com arte o Código do Alçapão, e, ou dilatam se é que não mandam para as urtigas o do Procedimento Administrativo, para o qual o indefeso cidadão tem que fazer um furo.

Carlos Albino
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Flagrante vantagem: E pelos vistos, fazer furos para construir lá fundo da terra onde não há sol nem vista para o mar, não paga IMI e se calhar ainda obriga o Estado a pagar indemnizações… por falta de vista.