quinta-feira, 18 de abril de 2013

SMS 509. Esse desejo de ditadura

18 abril 2013

Dia a dia, somos confrontados por desabafos que velada ou abertamente têm, como traço comum, o desejo de ditadura. No fundo, os que desabafam, querem que alguma coisa ponha cobro a isto. E esse “isto”, regra geral, significa os atropelos à moralidade pública e a moralidade política como questão essencial. Na verdade, ao longo de anos, temos assistido a lamentáveis demonstrações do desprezo que representantes e decisores eleitos têm pelo decoro, pelas próprias normas de conduta e pela opinião pública. De vez em quando, há uma réstia de esperança mas rapidamente esbatida por malabarismos verbais, por incongruências e lentidão da justiça, por incumprimento ostensivo de promessas juradas na mira do voto, pelo artifício de encontrar culpados quando os erros são próprios, repetindo na política e na vida pública portuguesa a fábula do lobo e do cordeiro, com o lobo, no apuramento das culpas, a concluir que "se não foste tu foi o teu pai" e estrangulou o borrego. É claro que, amiúde, daqui e dali, nos dizem que o desafio é não esmorecer,

Como já prescrevia Montesquieu no século XVIII, “não se constrói uma sociedade baseada na virtude dos homens, e sim na solidez das instituições”. Nunca é demais lembrar que o fortalecimento das instituições depende – acima de tudo – de uma população bem educada, bem informada por meios de comunicação responsáveis e empenhada na manutenção da liberdade, de democracia e da justiça. Sem isto, as ideias nostálgicas propagam-se como os vírus, sobretudo quando se está no epicentro da crise e quando, quer decisores quer representantes julgam a agem como se os seus mandatos fossem propriedade privada, abusando dos efeitos daquilo que é a maior conquista de uma democracia – o direito de votar que nenhuma ditadura, por definição, aceita e tolera. Daí a responsabilidade dos eleitores numa democracia. Mas não basta essa responsabilidade, é preciso que as instituições, tal como leite na fervura, venham acima e não se revelem estragadas pois não é a virtude dos homens que as ocupam que evita estarem atalhadas.

Diz uma máxima de Goethe, o genial poeta alemão, que “o melhor governo é aquele que nos ensina a governarmos a nós mesmos”. Estamos longe disso e, de certa maneira, foi a sociedade portuguesa que, na implantação da democracia, ensinou a si própria a não esperar salvação pelas mãos do Estado e deu lições ao governo, tal como possivelmente está a dar, atónita, perante a sucessão de escândalos, aguardando apenas o momento oportuno de responder caso o governo não perceba que a sua presença forte deve ser sentida na garantia de oportunidades iguais para todos na educação, na saúde, na segurança pública, bem como na fiscalização do jogo económico e na aplicação das leis. A receita é tão rara quanto antiga. Está retratada de modo admirável num fresco pintado na cidade italiana de Siena, no século XV, por Ambrogio Lorenzetti: “Os Efeitos do Bom e do Mau Governo na Cidade e no Campo”. Tais efeitos, no Algarve, notam-se.

Carlos Albino
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     Flagrante flamenco andaluz: Esse pedido a Passos Coelho para abolir portagens a espanhóis nos fins de semana. Os portais eletrónicos identificam espanhóis?

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